- Pai, pai, abre por favor.
A mão esquerda da garota tentavam forçar a maçaneta enquanto sua mão direita batia na porta. As luzes estavam acesas, a família tinha acabado de chegar, mas ninguém os quis atender, deixariam os irmãos do lado de fora da casa. S/n olhava para a janela de cima, se afastando um pouco da casa para conseguir ver melhor, era seu quarto, onde estava Sandra se trocando.
- Pai, nos deixe entrar, não podemos passar a noite na rua. - A garota implorava, enquanto seu irmão apenas a observava - Será que tem como você me ajudar? - A garota falou, se virando para o rapaz.
- Não? - Se se sentou no chão, entediado - Ele não vai abrir, nem tenta. Que tal voltarmos para a casinha e deixamos que o tempo cure tudo? Amanhã é outro dia.
- Você está louco? - A gartora cruzou os braços - Eu não voltarei para a casita, principalmente hoje. Depois daquela vergonha que papai fez, os Madrigal devem estar uma fera, e até a casita. Eu nunca fui expulsa, e agora ela me expulsou.
O rapaz deu de ombros e seguiu olhando para sua casa. Já eram cerca de onze da noite e algumas casas já apagavam suas luzes. S/n não esperava que seu pai fosse amolecer, mas nunca foi deixada para dormir na rua pelo seu próprio pai. Os olhos dela estavam cheios de lágrimas de medo, pelo menos seu irmão estava ali com ela. Mesmo sendo uma vila segura, ainda tinha medo de algo acontecer. Encostou na porta de sua casa, se sentindo culpada por tudo, mesmo nada tendo sido sua culpa. Suspirou ao perceber que a última luz de sua casa apagou, e seu pai não abriu a porta. Encolheu seus joelhos e apoiou sua cabeça neles, queria chorar ali, mas não na frente de seu irmão.
Sua tristeza se tornou uma surpresa, quando ouviu passos apressados pela rua, Mirabel e Camilo. Ambos corriam apressados e ligeiramente desengonçados, fazendo s/n rir levemente.
- O que estão fazendo aqui? - S/n se levantou e foi até os dois
- A gente tava... Hu, espera um pouquinho - Mirabel falou ofegante, tentando recuperar o fôlego
- Pensamos que já estivesse em casa - Camilo falou quando recuperou o fôlego - Eu fui checar os burros pela última vez e os vi aqui, chamei Mirabel e viemos correndo. - Ele se aproximou de s/n falando baixinho - Trouxe Mirabel porque ela é muito engraçada correndo.
A garota riu e explicou toda a situação para os amigos, que ficaram surpresos com a atitude do pai.
- Mas que babaca - Camilo exclamou - Sem ofensas, óbvio.
- então vamos para a Casita, passe a noite conosco - Mirabel falou simples, mas s/n olhou com uma expressão preocupada
- Não, nem pensar. Eu não irei aparecer na casita por um bom tempo, foi horrível o que aconteceu no jantar, eu estou morrendo de vergonha - A garota tocou as bochechas, o que fez Camilo sorrir.
- Ah, pare com isso - Camilo falou sorrindo - Todo mundo ali ainda te ama, não vai passar a noite aqui sozinha, é perigoso.
- Eu não estou sozinha, meu irmão está aqui comigo. - A garota respondeu sorrindo colocando as mãos na cintura.
- Tá falando daquele que está entrando agora em casa? - Mirabel falou apontando para porta, que estava para trás de S/n.
A garota virou para trás assustada, e assim como a garota disse, a porta tinha acabado de ser fechada, deixando que seu irmão entrasse. A garota correu para a porta e tentou abrir a maçaneta, mas já estava trancada.
- Fala sério - s/n gritou, se afastando da casa, a luz de seu quarto acendeu e Sandra foi até a janela - Sandra, por que não me deixam entrar sendo que deixaram Manoel?
- Eu não sabia que você queria entrar também - Sandra falou, com uma falsa expressão confusa, deixando s/n cem vezes mais brava - Eu não sabia, eu juro.
- Como não sabia, sua sonsa? - A garota pegou uma pedra que estava no chão - Eu estou gritando faz meia hora pedindo pra que abram pra mim.
- É sério? Meu Deus, eu não ouvi, é sério - A mulher colocou as mãos no peito, como se estivesse surpresa - Desculpa. S/n. - A mulher chamou
- O que? - Respondeu irritada
- Eu te amo.
- Cala a boca - S/n jogou a pedra em direção ao quarto que estava a irmã, que acertou em cheio sua testa, fazendo a mulher gritar de dor.
Quase como imediato, a mulher bateu, de propósito, seu cotovelo na janela, a quebrando e começou a gritar de dor, fazendo todas as luzes da casa acenderem.
- Acho melhor a gente ir pra casita mesmo, tipo, agora mesmo - S/n saiu correndo dali sendo seguida por Mirabel ofegante e Camilo rindo alto, falando sobre como a pedra acertou em cheio o rosto de Sandra.
Quando chegaram à Casita, todos já estavam em seus quartos e as luzes apagadas. Eles subiram com cuidado as escadas, para não chamar a atenção de ninguém. Chegaram em frente ao quarto de Mirabel, e as garotas iriam entrar, entretanto, Camilo as impediu.
- por que não fazemos uma festa do pijama? No meu quarto - Camilo falou, sendo recebido por um sorriso de s/n, mas uma expressão cansada de Mirabel
- Eu estou muito cansada, não tô dentro, só quero dormir. - Ela abriu a porta de seu quarto - Vão vocês, e não atrapalhem meu sono
A garota entrou em seu quarto, deixando os dois no corredor, se olharam e então tiveram uma ideia: Pegar comida. O que foi bom , pois s/n não comeu nada no jantar. Pegaram algumas sobras e alguns doces que estavam guardados na geladeira. Faziam o mínimo de barulho possível, mas Camilo era muito desastrado, e acabava deixando algo cair, fazendo s/n rir. Sempre quando riam, o outro tentava conter, mas acabava rindo também. Quando já tinham uma boa quantidade de comida, resolveram sair da cozinha, mas se surpreenderam com a chegada de Bruno, sonâmbulo, na cozinha. Ele pegou um copo de água e encheu, mas o derrubou, tentando tomar. Era a primeira vez que Camilo via seu tio Bruno daquela forma. Eles riam baixinho enquanto passavam com cuidado por ele, para seguirem ao quarto de Camilo.
Chegaram lá e deixaram as comidas em cima da cama de Camilo, que tinha muito espaço. Se sentaram la e começaram a conversar sobre coisas banais, e sobre o Brasil também.
- Eu nunca saí daqui, você sabe - falou Camilo - eu queria sair para outros lugares, também.
- Esse lugar aqui é muito feliz, também. Eu amo. - A garota sorriu para Camilo colocando sua mão sobre a dele - e eu tenho certeza de que um dia você vai viajar pelo mundo.
Camilo suspirou, lembrando da conversa no jantar.
- Vai mesmo ir para o Brasil? - Camilo perguntou - Eu não quero te prender, mas...
-Eu não vou, relaxa - A garota pegou um nacho e comeu - Ele fala isso desde os meus 17 anos, acho que no fundo ele já desistiu de mim.
- Eu sinto muito pelo jantar, foi ideia minha - Camilo começou a falar, surpreendendo a garota - Eu queria que sua família se sentisse bem conosco, como nos sentimos com você. E então eu falei com a Abuela...
- Só não contou com a possibilidade da minha família ser horrível - A garota falou rindo e bebendo um pouco do famoso suco de manga e morando de Camilo, apelidado de Mangorango - Mas eu juro, se minha mãe estivesse aqui, o jantar seria incrível.
- A sua mãe parecia ser uma ótima pessoa, você não conta muito sobre ela.
S/n ficou em silêncio por um tempo, ela sempre se emocionava falando de sua mãe. Respirou fundo e fechou os olhos até se conter.
- Eu lembro da minha mãe todos os dias, todos mesmo. A minha mãe era muito bonita, ela que me ensinou a tocar violão e piano. Era muito inteligente, forte... Lutava muito pela causa dos colombianos e descendentes que estavam no Brasil - S/n encolheu os joelhos e tinha seus olhos brilhando - Ela era reservada, poucos sabiam dos vários talentos que ela tinha.
- Uau...
- Eu vejo ela como uma grande mulher. Ela infelizmente não teve um casamento feliz com meu pai, e separou - A garota sorriu - Tudo o que eu sou hoje e tenho orgulho veio dela, sabia? A música, a forma de arrumar o cabelo, de falar.
- vocês duas são...
- Mas ela tem uma coisa que eu não consigo ter ainda - a garota olhou para o fim do quarto de Camilo, triste - Ela sabia o seu valor, e se amava muito, eu ainda não consigo gostar de mim.
Camilo ficou surpreso com essas palavras da garota e se aproximou, abraçando seus ombros, deixando a garota descansar em seus braços, sentados na cama. A luz baixa do enorme teatro deixava o ambiente aconchegante. Camilo alisava as costas da jovem e pensou no que era mais sincero e reconfortante que conseguiu pensar.
- Eu gosto de você - Ele falou, sincero. A garota só olhou para o rosto do rapaz, abrindo um sorriso sincero.
- Eu também... Gosto de você - A garota abraçou Camilo sorrindo
Ficaram assim por um tempo, mas a garota os dipertou.
- Não acho que viemos aqui para só fazer isso, não é? - a garota falou, com uma animação repentina e segurando na mão de Camilo e o puxando para o palco - Vamos pensar no planejamento do festival, pois eu estarei aqui, sim!
- Do nada, isso é sério? - O rapaz reclamou, estava quase adormecendo abraçado em s/n, o que já era suficiente para ele ter feito seu dia valer a pena.
- Desculpa, é que eu tive uma super ideia, para peça - A garota dava pulos de animação - Hamlet.
- O que? - perguntou confuso
- Hamlet, a tragédia de Shakespeare - A garota explicou, mas o jovem ainda tinha uma expressão confusa - O filho do rei da Dinamarca, o fantasma, "ser ou não ser, eis a questão". É sério?
- Foi mal... - Camilo sorriu fraco e coçou a cabeça
- Não tem problema, bobo - S/n riu da expressão do amigo - Agora eu sei o que vamos fazer no festival, podemos começar desde já os testes para os atores, você me ajuda? - A garota pediu para o amigo, que não conseguiu dizer não
- Eu não consigo te dizer não, então, claro - A garota abraçou Camilo em agradecimento
- Então pode começar lendo o livro, amanhã te entrego ele, tenho na minha casa - a/n ia sair do palco em direção à cama de Camilo - estou morta de sono depois de usar tanto meu cérebro para resgatar Hamlet.
- E agora eu tenho que cuidar dos burros, ler um livro e fazer um teste para uma peça. - falou Camilo baixo, pensando que a garota não estava ouvindo - Aí, o que não fazemos por amor, não é?
A garota ouvia tudo à sua frente e sorriu com o canto do labio, e se virou, dando um beijo demorado na bochecha de Camilo, que sorriu bobo ficando vermelho.
- Você sabe que eu te amo muito, também.
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