Narcisa tinha conseguido se recompor alguns segundos depois que Snape saíra da sala e resolveu tratar de terminar de organizar suas coisas por ali e depois seguir para os aposentos novamente. Corrigiu trabalhos e conseguiu adiantar alguns planos de aula para a semana, aproveitando a forma extremamente energética que tinha ficado depois do breve momento que tivera com o marido.
Resolveu almoçar no quarto e Severo não apareceu para comer por ali também, imaginou que de duas, uma. Ou ele havia ficado preso até mais tarde na aula ou havia resolvido dar espaço para ela. Não tinha certeza se alguma das duas a deixava cem por centro satisfeita, mas mesmo assim podia ser o melhor para que ela ao menos refletisse sobre a discussão do dia anterior.
Podia dizer que a mágoa pelo o que havia ouvido já tinha passado ainda na noite anterior, dado apenas pelo tempo em que ela pode pensar no assunto depois que ficara sozinha no quarto. Assim, conseguira ver o lado dele na situação e esperava realmente que ele tivesse conseguido ver o lado dela. Mesmo que as palavras dele antes de sair tenham lhe parecido bem sinceras e convincentes, ela precisara se sentir segura para acreditar.
Querendo ou não a situação de agora traria uma carga de mudança para a relação deles, afinal estavam casados. E ela não havia tido boas experiências com casamento, nem de perto. E no momento que ele lhe cobrou mesmo que algo tão pequeno como aquilo, usando como argumento ela ser obrigada a fazer por ser sua mulher, havia lhe lembrado palavras que ouvira por anos com Lúcio. E depois, com o pedido de desculpas, não conseguira deixar de desvincular os dois no primeiro momento.
Mas Severo trazia nos olhos uma transparência que nunca vira no primeiro marido, além da preocupação clara de tê-la magoado com suas palavras. Eles não eram nem um pouco parecidos, e agora sentia-se mal em ter, mesmo que sem querer, comparado os dois.
Ainda na noite anterior, acordou-se quando ele chegou ao quarto, mesmo que tivesse se mantido o mais quieta possível na cama. Os gestos dele naquele momento foram tão valiosos quanto o pedido de desculpa que dera mais cedo. Fez o menos de barulho possível para acordá-la, mesmo que tomasse banho e se vestisse para dormir, e depois quando deitou com ela na cama certificou-se de garantir que estava bem coberta e lhe deu um beijo casto de boa noite. Naquele momento vira mesmo que ele estava arrependido, mas que respeitaria o tempo dela de lidar com as coisas.
O aprendizado era dos dois naquele momento.
Quando saíra dos aposentos naquela manhã, levando o livro que ele havia esquecido junto com seus materiais, tinha a intenção de que ele fosse até a sala dela e que conseguisse sondar como as coisas estava, já que tinha um breve ideia de como gostaria de levar a situação dali por diante. Como já havia dito para si mesma, a mágoa passara, mas o sentimento de uma breve e saborosa vingança ainda brincava livre pelo seu ser.
Claro que não poderia imaginar os rumos que as coisas tomariam quando ele chegou atrás do livro, e por breves segundos quase perdeu as estribeiras. Até porque, também já havia concluído como apreciavas aquelas tais habilidades que ele sabia usar tão bem. Foi inevitável balançar a cabeça ao lembrar de horas antes: o pequeno deslize a recordava tão bem de quando estavam apenas no começo da relação. Quando nenhum dos dois ainda conseguia admitir o que estavam vivendo e que, depois de brigas, esses momentos de instinto e breves descontroles de prazer tomavam conta.
Isso talvez não fosse algo que gostaria que perdessem, mesmo que esperasse que não viessem com tanta frequência quanto vinham há mais de dois anos atrás.
Por fim, acabaram não conseguindo se encontrar no restante do dia. Mesmo que ela tivesse sua folga, todos os horários do marido estavam ocupados e naquele dia ele teria aula um horário a mais do que no dia anterior. Resolveu, para que não ficasse totalmente sozinha o restante do tempo, sair até Hogsmeade, mesmo que estivesse frio, para que caminhasse um pouco.
Em dois dias teria jogo de Quadribol, então depois de caminhar um pouco foi até a Dedos de Mel para comprar alguns doces para que tivessem durante o jogo. Comprou alguns Feijõezinhos de Todos Sabores para Draco, algumas Penas Açucaradas que eram um de seus favoritos e perdeu-se algum tempo olhando os diversos chocolates. Não lembrava-se muito bem se ver Snape comendo doces, mas sabia que na casa da Rua da Fiação sempre havia ao menos uma caixa de Diabinhos de Pimenta e algumas Varinhas de Alcaçuz, então pegou alguns também.
Caminhou um pouco pelo vilarejo, despreocupada com o tempo e aproveitando para espairecer um pouco. Voltou para a escola quando já estava frio demais para manter-se na rua, e nem de perto gostaria de acabar resfriada. Já estava passando um pouco das 16h30 quando entrou novamente em seus aposentos, deixou as coisas sobre a mesa de centro da sala e seguiu para o quarto.
~*~
Snape, pela definitiva primeira vez em toda a sua vida acadêmica, havia chegado atrasado em uma aula. Quando entrou novamente em sua sala, depois do breve encontro com Narcisa, a turma já estava toda esperando e por serem alunos antigos na escola que já haviam tido aulas com ele em algum momento, olharam surpresos para o professor assim que ele passou alguns minutos atrasado pela porta.
Não deu margens para comentário alguns, entrando na sala enquanto já falava sobre a matéria que iriam ter no dia, folheando o livro que estava em suas mãos e fazendo com que uma onda de agitação silenciosa tomasse conta dos estudantes que agora apressavam-se para pegar os cadernos e os lápis.
Severo acabou com o dia totalmente abarrotado de tarefas, sendo que nem ao menos conseguiu parar para comer direito, apenas passando pela cozinha e pegando algo rápido para comer e voltou para sua sala. Os pedidos da Enfermaria estavam chegando e a lista com o que faltava no estoque de poções estava feita, então tinha realmente muito trabalho para pôr em dia.
Depois de comer rapidamente, aproveitou o primeiro período livre e começou com o preparo das poções até que a turma seguinte chegasse. E logo depois de começar com a próxima aula, mal teve tempo de parar novamente.
Vez que outra, entre os preparos das poções e suas aulas, parava para pensar em Narcisa. Não havia se falado logo cedo e o breve encontro na sala da professora de DCAT estava ainda enuviando seus pensamentos quase que totalmente. Achou engraçado a forma como as coisas saíram do controle de maneira tão rápida.
Isso o lembrou muito bem de como as coisas tinham começado entre os dois, e como qualquer impasse entre eles gerava aquele tipo de tensão que era muito bem resolvida daquela forma. Isso era incrivelmente a cara deles, e por mais que ele admitisse ser bem melhor estar de bem, não havia nada como a reconciliação.
A tarde cheia terminou depois das 17h e por alguns segundos cogitou passar em Hogsmeade para pegar algumas coisas para o jogo do Quadribol que teria em dois dias, mas depois do dia cansativo e tendo ainda mais a detenção para a noite, deixaria pagar buscar essas coisas no outro dia quando tivesse algum tempo livre.
Resolveu, dessa forma, seguir direto para o quarto e tomar ao menos um banho antes de retomar a produção das poções. O jogo se aproximando trazia a urgência de certas encomendas que Madame Pomfrey havia feito e no próximo dia não teria tempo para fazer por conta das coisas de aula.
Entrou nos aposentos com a cabeça levemente avoada e percebeu Narcisa sentada em uma das poltronas, com as pernas pra cima e um livro nas mãos. Encostou a porta com um dos pés e se aproximou, vendo a sacola da Dedos de Mel sobre a mesa de centro.
- Boa tarde. – ele disse. A mulher ergueu os olhos para ele, mas não respondeu em primeiro momento. – Esteve no vilarejo?
- O dia estava entediante. – disse. – Comprei alguns doces para o dia do jogo.
Ele ergueu brevemente a sobrancelha, achando curioso os dois terem pensado a mesma coisa. Aproximou-se da sacola e mexeu levemente curioso para ver o que tinha. Penas açucaradas, sapos de chocolate. Remexeu mais um pouco, não percebendo que a atenção dela havia saído do livro e ido para ele. Varinhas de alcaçuz e Diabinhos de pimenta. Ela não está mais tão brava afinal.
- Comprou chocolates para mim ou os diabinhos de pimenta foram uma questão de identificação pessoal? – ele resolveu provocar, voltando a olhar para ela com uma leve expressão de deboche.
- Identificação pessoal. – ela respondeu, voltando a ler o livro. – Se fossem para você deveriam ser bombons explosivos. – completou.
Teve uma séria vontade de arrancar o livro que ela estava nas mãos para que pudessem dar certa continuidade para aquele assunto e possivelmente terminar como ele estava imaginando. Mas já havia entendido que aquele jogo definitivamente ia ir longe, e estava começando a ficar extremamente curioso para saber em que momento um dos dois ia ceder.
Colocou de volta a sacola sobre a mesa de centro e fui em direção ao quarto, ainda achando um pouco de graça de ambos os comentários. Tomou um banho e vestiu-se novamente com roupas um pouco mais quente já que a noite estava trazendo um vento extremamente frio para dentro dos corredores do castelo e principalmente nas masmorras.
Narcisa estava pelo quarto organizando algumas coisas, enquanto cantarolava uma coisa qualquer de forma baixa. Ela encarou o marido pelo reflexo do espelho da penteadeira e em seguida o acompanhou com os olhos até que saísse do quarto. Sabia que ele já havia entendido que estavam jogando um com o outro e tinha quase certeza que ele achava que ela cederia antes dele. O provaria com gosto que estava enganado.
Provoca-lo sempre tivera um gosto especial. Depois dele a tirar do série, então, teria ainda mais.
Severo saiu do quarto com alguns de seus materiais e retornou para sua sala de aula. Teria que ficar ali mesmo, então aproveitaria para fazer as coisas ali e não parar a produção do que fazia dentro do laboratório pessoa. Um projeto mais importante que as poções da madame Pomfrey, definitivamente. Espalhou suas coisas sobre a bancada de centro e ajeitou-se para usar mais de um caldeirão ao mesmo tempo.
Quando a grande parte das coisas já estavam em produção, deixou apenas para o cozimento em fogo baixo e foi até sua mesa, sentando-se para riscar da lista as coisas que já estavam prontas. Riscou aquilo que estava pronto e fez observações nas que estavam para concluir nos caldeirões. Batidas na porta lhe tiraram da concentração em seus afazeres e recebeu, só então, que era a primeira vez que olhava para o relógio depois que havia voltado para a sala.
Faltavam cerca de 15 minutos para o horário da detenção e só depois de alguns breves instantes lembrou-se que havia dito para que Claire chegar mais cedo por conta do atraso do dia anterior. Deu permissão para que entrasse e ajeitou as costas contra a cadeira.
Claire entrou ajeitando o cachecol sobre os ombros e olhou para o professor com um meio sorriso. Definitivamente deveria estar esfriando da forma que ele imaginou.
- Boa noite, senhor. – cumprimentou.
- Pode ficar esperando por ai. – ele apontou para a bancada central. – Vai aguardar até o horário.
- Tudo bem. – ela respondeu.
Ficaram em silêncio novamente. A garota deu a volta na bancada, se aproximando do balcão e analisando as poções que estavam em cozimento. Snape ergueu levemente a sobrancelha enquanto a via aspirar o aroma de cada um dos caldeirões e sussurrar para si – espantosamente – de maneira correta.
Novas batidas na porta vieram e antes mesmo que ele pudesse responder algo, a mesma se abriu e a figura da esposa atravessou a porta.
Narcisa estava seguindo até a sala de Defesa Contra as Artes das trevas quando madame Pomfrey lhe entregou mais alguns frascos vazios de poções dentro de uma bandeja de madeira. Pelo o que havia entendido da explicação rápida, precisava de poções de urgência que não havia ido na lista, mas não tinha tempo de ir até Snape porque estava atendendo alguns alunos com intoxicação alimentar na Ala Hospitalar. Dessa forma, deixou as coisas com a professora que se voluntariou, quase obrigatoriamente, para deixar as coisas com o marido antes de seguir para sua sala. Estava perto das masmorras ainda, então não seria um problema.
Chegou em minutos a sala de poções e bateu somente para avisar que estava ali, já que haviam ainda mais de quinze minutos para as 20h, e abriu a porta. No lado de dentro da sala, parou ao observar Claire próximas aos caldeirões em cozimento e Severo com um olhar levemente fixo no que a jovem fazia.
- Atrapalho? – perguntou.
- Não. – ele respondeu simplesmente, voltando a atenção totalmente para Narcisa.
Ela aproximou-se, olhando de canto de olho para a aluna que parecia ignorar sua presença ali, mas não se abalou o suficiente nem para cumprimenta-la. Colocou a bandeja que Papoula havia lhe dado sobre a bancada e chegou até a mesa onde Severo estava, inclinando-se sobre ela e puxando o pergaminho em que ele fazia as anotações.
- Madame Pomfrey disse que esqueceu de algumas coisas. – pegou a pena que estava sobre a mesa.
Por dois segundos Severo analisou a estranha sensação de estar dentro da sala com Narcisa e aquela garota que tinha a estranha semelhança com Lilian. Era... desconfortante? Totalmente esquisito para falar a verdade. Cissa acompanhou com atenção o movimento dos olhos do companheiro entre ela e a outra e esperou até que ele voltasse a olhá-la. Quando aconteceu, o olhar estreito dele lhe analisou por um tempo, a fazendo sustentar da mesma forma sem entender muito bem o que ele estava pensando.
- Tem algo de diferente em você? – perguntou baixo.
Ela empurrou o pergaminho para ele e levou uma das mãos ao colar fino de ouro, com um delicado pingente de serpente em forma de S, que estava usando e passou os dedos por ele.
- O colar. – ele disse. Lembrava-se do colar.
- Desde de cedo. – ela respondeu, no mesmo tom em que havia sido questionada. – Mas parecia ocupado demais para reparar em mim. – ela indicou com a cabeça para trás.
Severo por um breve momento não teve certeza se ela indicou Claire ou os caldeirões que estavam por ali. Sendo uma das duas possibilidades totalmente absurda.
- Parece que ainda tem algo para me dizer. – ele ergueu a sobrancelha.
Narcisa espiou por cima do ombro e percebeu que Claire ainda estava de costas para os dois, fingindo totalmente que nada estava acontecendo por ali, e virou-se novamente para o professor.
- Espero você no quarto. – disse simplesmente.
Observou ela virar-se e sair da sala, fechando a porta em um baque silencioso. Snape balançou a cabeça brevemente e olhou a garota que agora fazia menção de mexer em algo no caldeirão.
- Não está maluca a ponto de fazer isso. – a voz dele saiu alta e a fez virar em um sobressalto. – Pode começar suas coisas, tem muito o que catalogar ainda.
Claire apenas assentiu, ainda sentindo o coração acelerado pelo susto, e passou a mexer nas caixas e nos livros de catálogo que havia começado na noite anterior e que agora estava abaixo da bancada. O professor voltou a escorar-se na cadeira, analisando os dois nomes novos de poções que Narcisa havia deixado anotado em um canto desorganizado de sua lista perfeitamente organizada.
- Mas parecia ocupado demais para reparar em mim.
Ele balançou a cabeça novamente. Se nem antes de tudo acontecer ele deixava de reparar na mulher que Narcisa era, por que ele deixaria de reparar nela agora que era sua mulher?! Mesmo assim entendia o comentário nessa vez como entendera da primeira vez que ela fizera, ali em Hogwarts, meses antes quando deixavam a escola depois da batalha.
- Não fale como se reparasse em mim naquela época. – ouviu a voz dela novamente.
Reparava. Tanto agora quanto naquela época, e havia realmente demorado para encontrar esses momentos em suas lembranças. Mas eles estavam lá, em mais vezes do que ele sequer poderia supor. E aquele colar...
Severo chegou a Mansão Malfoy ainda antes dos demais convidados. Lúcio havia lhe enchido de correspondências insistindo para que parecesse em mais um desses eventos extremamente exagerados que ele fazia questão de promover. Hogwarts estava em plenas atividades e tentou usar isso como desculpa para furar o aniversário de 15 anos de casados dos casal Malfoy, mas todo o pequeno pretexto era motivo para que Dumbledore quisesse que ele fosse até lá sondar.
Os empregados estavam terminando de organizar o grande salão de entrada da Mansão e alguns pararam para cumprimentar o professor que passou sem muito rodeio por eles. Perguntou para uma das mulheres, que tirava o pó de uma das colunas com um vaso de rosas, onde Lúcio estava. Logo assim, subiu para o segundo andar e adentrou um dos corredores onde sabia ficar o escritório do dono da casa e, dentre as diversas portas, a suíte dele e de Narcisa.
- Snape. – Lúcio veio no corredor em direção a ele, balançando a bengala em uma das mãos. – Narcisa e eu já estávamos apostando se você viria ou não.
O professor obrigou-se a dar um breve sorriso de canto. Os dois trocaram um breve aperto de mão.
- E você me fez perder a aposta. – Malfoy completou.
- Ao menos trouxe um whisky para que possa beber sua derrota. – usou um falso tom de humor, entregando a garrafa de firewhisky.
Lúcio riu, uma risada brevemente forçada e os dois se encararam em silêncio um breve segundo. Snape não entendia muito bem o porquê de ainda ser convidado para esse circo que ele armava mais de uma vez ao ano, há muitos anos não se davam bem o suficiente para isso. Achava que talvez o outro sentisse certo prazer em esfregar uma família de sucesso. Ideia patética já que Severo sabia muito bem dos bastidores.
- Vou pedir que sirvam o seu... presente. – o anfitrião encarou o rótulo na garrafa alguns segundos.
Antes mesmo de responder Severo vagou a atenção para o barulho da porta no final do corredor abrindo-se, o fazendo desviar os olhos do homem de cabelos platinados para a figura da mulher que se formava no final do corredor. Narcisa vinha em um vestido verde esmeralda aveludado de alças e corte reto, marcando apenas sua cintura logo abaixo do decote em v que destacava seu colo, nos pés sapatos altos pretos, com dois pequenos detalhes dourados nos saltos, os cabelos presos em um coque chique com alguns fios soltos do cabelo emoldurando o rosto.
No dois segundos entre a fala de Lúcio e o momento em que ficou analisando a mulher, Snape viu o outro homem passar caminhando por ele em direção as escadas, alheio a imagem da esposa que vinha no corredor.
- Ouvi sua voz. – ela disse.
- Veio garantir que ganhou sua aposta? – Severo ergueu a sobrancelha.
- Aposta? – ela se aproximou. – Vim ver se poderia me ajudar com o colar, já que seu marido não parece ser civilizado ou solicito.
Narcisa estendeu uma pequena gargantilha de ouro com o pingente de uma serpente se enrolando quase em S em direção a ele e aguardou por alguns instantes com a mão parada no ar. O homem pegou o colar depois de sustentar o olhar no rosto dela alguns segundos, e a observou virar de costas para ele.
Aproximou-se mais um passo, enquanto em um movimento quase inevitável descia o olhar pelas costas nuas dela e umedeceu os lábios. Passou a gargantilha pelo pescoço dela, com as mãos agindo quase contra seus sentidos e sua razão e permitindo que as pontas dos dedos tocassem sutilmente a pele do pescoço dela.
- Não poderia ter usado a sua varinha? – ele disse por fim, enquanto prendia o ganchinho da joia.
- E privar você desse prazer? – ela o olhou por cima dos ombros com um ar levemente divertido.
- Narcisa... – ele repreendeu, mesmo sem querer repreender.
- Severo. – ela devolveu seu nome simplesmente, antes de soltar um riso fraco antes de levar a mão até atrás do pescoço, tocando os dedos nos dele sem querer ao ajeitar a corrente. O professor recolheu as mãos ainda a olhando.
A troca de olhares foi rápida, antes da mulher tomar novamente o caminho do corredor sem lhe falar uma outra palavra sequer e sumir pela porta do quarto novamente.
(...)
Snape passou por alguns convidados que conversavam parados próximos a porta da sacada, pedindo um “com licença” baixo apenas para que saíssem de seu caminho. De uma hora pra outra muitas outras pessoas chegaram na Mansão e a grande maioria o professor nunca tivera visto antes.
O lugar estava cheio e barulhento demais, precisava ao menos de um tempo para a cabeça antes de encontrar uma desculpa qualquer para poder ir embora. Então saiu para a varanda do quintal, que tinha duas escadas – uma em cada lateral – que desciam em direção aos jardins. A noite de primavera estava extremamente agradável e o céu estava limpo e estrelado.
Passou os olhos pelo lugar todo e identificou a figura de Narcisa escorada contra o parapeito de concreto, encarando os jardins bem iluminados a frente. Por um tempo pensou em voltar para dentro, mas claramente algo nela sempre lhe chamava. Tinha aquilo como algo curioso.
- Não deveria estar na sua festa? – ele colocou as mãos no bolso enquanto se aproximava.
Narcisa virou para ele com a postura impecável, segurando uma taça de vinho em uma das mãos. A expressão dela suavizou-se levemente ao ver quem estava ali, pensando que por um momento pudesse ser o marido. A mão livre dela alcançou a gargantilha que Snape tinha lhe ajudado a colocar mais cedo e mexeu no pingente.
- Meu adorável marido está tratando de negócios. – respondeu dando de ombros.
- No dia do aniversário de casamento? – ele se aproximou.
- Veio até aqui discutir meu casamento? – ela o olhou levando a taça de vinho a boca.
- Tem alguma sugestão mais interessante?
A voz dele saiu cortante e Narcisa sentiu como se uma lufada de ar frio lhe atingisse o rosto, mantendo o olhar filme nas íris negras do professor. Abaixou a taça em um movimento levemente tremulo pela forma que ele a encarava, sentindo o pouco de vinho que acumulou no canto de seus lábios escorrerem devagar rumo a curva de seu rosto. Snape adiantou-se, achando interessante como o olhar desafiador dela em instantes se tornou brevemente perdido. Tirou a mão de um dos bolsos e ergueu em a ela, alcançando o rosto no momento em que a mão dela alcançou a sua.
Ela foi na intenção de pará-lo, mas perdeu-se no momento em que sentiu o toque dele contra sua pele. Severo passou lentamente o polegar pelo lugar, secando a gota rubra que desceu insistente, sentindo a mulher apertar sua mão quase que involuntariamente.
- Professor! – a voz de Claire veio um pouco mais alta o fazendo sair dos devaneios.
Ele ergueu os olhos impaciente para a garota parada em frente a sua mesa e piscou algumas vezes, apertando o nariz entre os dedos.
- O que foi? – ele perguntou.
- Terminei minhas tarefas. – respondeu.
- Pode sair. – ele ergueu o olhar para ela novamente, percebendo que havia a intenção dela voltar a falar. – Agora. Saia.
(...)
Mesmo que tivessem chegado quase ao mesmo tempo de volta para os aposentos, não havia conversado muito novamente. Jantaram em silêncio e depois, ambos parecendo bem cansados pelo dia – tanto Severo pela exaustiva rotina nos preparos de poções, quanto Narcisa pelas suas próprias tarefas e pelas diversas coisas que tinha feito – organizaram-se para deitar.
Trocaram poucas palavras no processo, mesmo que Snape soubesse que ela ainda tinha o que falar sobre as coisas que aconteceram, esse era um momento que ela deveria decidir começar a conversa. Não iria pressionar, já que uma das principais coisas que havia aprendido com a recente briga era esperar o momento para que ela se sentisse confortável pata falar.
Ele sentou-se na cama, escorado nos travesseiros com as penas para cima, enquanto pegava o livro de cabeceira para ler. Narcisa ainda terminava de se aprontar dentro do banheiro. Logo a porta se abriu e ela passou para dentro do quarto indo em direção a cama, vestindo a mesma camisola da noite anterior.
- Não tem ronda hoje? – perguntou fingindo desinteresse.
- Não. – folheou o livro.
Ela assentiu, mesmo que não necessariamente certa do que fazer, e levantou a ponta da camisola subindo na cama, aproximando-se dele de joelhos e retirando o livro que ele fingia ler. Severo ergueu os olhos para ela e acompanhou atento a esposa jogar o livro novamente na mesa de cabeceira e subir no colo dele, pondo uma perna de cada lado de seu corpo e sentando sobre ele.
- Nunca mais fale comigo daquela forma. – ela começou, colocando as mãos sobre o peito dele. – E dessa forma eu prometo que sempre saberá aquilo que for necessário saber.
- Falei sério quando me desculpei. – disse. – Só não quero que continue achando que sou como seu ex marido.
- Leu minha mente? – estreitou os olhos.
- Não precisei. – disse. – Vi o jeito que me olhou. Só espero que não continue achando isso.
- Acha que eu estaria aqui se continuasse achando? – parou as mãos nos ombros dele e apertou de leve.
Severo inclinou-se brevemente para frente, dando a deixa para saber se ela iria recuar ao toque dele ou não, mas deu espaço suficiente para que ela alcançasse os cabelos dele e puxasse-o para um beijo. Chocaram as bocas com um calor semelhante ao do encontro que tiveram na sala dela mais cedo, enquanto moviam as cabeças no ritmo totalmente sensual do beijo.
Narcisa apertou mais o corpo contra o dele, enquanto sentia o marido lhe apertar as coxas e subir mais um pouco o tecido de sua camisola. Remexeu-se inquieta sobre o colo dele, deixando um gemido baixo escapar enquanto separava os lábios dos dele, inclinando levemente a cabeça para trás.
- Severo... – a voz dela saiu em um sopro.
Ele abaixou o rosto para o pescoço exposto dela, dando alguns beijos lentos no lugar. Ela mexeu-se novamente sobre o colo dele, fazendo que um ar saísse dos lábios do professor com uma lufada de ar contra a pele dela.
- Severo.. – disse novamente.
- Narcisa? – ele apertou mais as pernas dela subindo os lábios para próximo dos dela.
- Espero que ganhemos o jogo. – ela disse.
O homem afastou-se o suficiente para olhá-la. Narcisa abaixou o rosto para poder olhá-lo nos olhos.
- O quê? – perguntou sem entender.
- Slughorn nos dava sorte no Quadribol. – deu de ombros.
- Por que está falando sobre isso? – ele estreitou os olhos mantendo um ar de bom humor.
- Porque para a sua, e para a minha, plena satisfação... já sabe como isso vai terminar. – ela sussurrou no ouvido dele. – Claro, se a Sonserina ganhar.
Deu um beijo rápido nos lábios dele e voltou para o seu lado da cama, deitando-se sobre o travesseiro e apagando a luz do quaro com um aceno da varinha.
- Boa noite, querido. – disse, segurando o riso pelo leve choque que ele ainda estava, mesmo que bem humorado. – Tenha bons sonhos.
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