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História O Fantasma do Quarto 305 - O colorido da nossa amizade - História escrita por BloodyMarie - Spirit Fanfics e Histórias
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História O Fantasma do Quarto 305 - O colorido da nossa amizade


Escrita por: BloodyMarie

Notas do Autor


OI MEUS AMORES, QUEM TA VIVO SEMPRE APARECE, NÉ NON?
Gente, meu computador ta de volta já faz uma semana, mas eu não consegui postar antes por motivos de: muitas costuras pra fazer, preguiça, um leve bloqueio criativo e meu irmão monopolizando o computador.
Mas pra compensar o sumiço, trago nesse capítulo 2k de palavras a mais e uma coisa inédita pra mim: fluffy.
Gente, eu sou um ser feito de angst, então escrever fluffy pra mim é um milagre.
E eu nem sei se ficou bom, mas é isso aí, quem gostou gostou, que não gostou vai arrumar uma louça pra lavar ♥

Capítulo 3 - O colorido da nossa amizade


De todas as coisas estranhas que teria de fazer em seu primeiro ano no ensino médio, esconder um filhote de gato na mochila definitivamente não estava nos planos de Otabek. Agora mesmo eram exatamente três e quarenta da tarde e era sua primeira vez fora do internato, sozinho, andando livremente pelas ruas de uma Moscou de fim de inverno, quando supostamente deveria estar frequentando as aulas do período vespertino. E aquilo não poderia ser obra de ninguém mais a não ser seu peculiar colega de quarto: Yuri Plisetsky.  
 

"Otabek, eu preciso que saia e compre umas coisas pra mim." – ainda se lembrava do tom marrento do loiro, ao praticamente jogar sobre si uma lista de compras e o empurrar para fora do quarto, sem muita cerimônia. Suspirou cansado, pensando em como as coisas estavam difíceis para si desde que conhecera formalmente o famoso morador morto do 305. A surpresa da existência do fantasma havia vindo para si como um baque, junto de inúmeras exigências, constantes inconvenientes e regras que lhe pareciam absurdas, sendo um espírito a exigi-las. 

Mas, apesar dos incontáveis pontos negativos, ainda assim não poderia afirmar que detestava a experiência, muito pelo contrário: Otabek sabia apreciar a companhia de seu colega de quarto, apesar de sofrer nas mãos do russo. Yuri não era nem um pouco fácil. De todas as pessoas com quem havia lidado, aquele loiro era o que tinha a personalidade mais forte, sempre arranjando briga, sempre discutindo consigo, sem lhe dar uma única brecha para se aproximar, como um gato arisco e teimoso. Entretanto, o moreno preferia daquela forma. Soava para si como um belo desafio conquistar a confiança do loiro. 

Desafio esse tão grande que até mesmo a escola toda reconhecia o "talento" do cazaque para com a assombração terrível que assolava o dormitório masculino. Só nessa semana havia conversado com cinco veteranos, ex-moradores do 305, dos quais ganhou o título "Otabek, o domador de almas penadas". Riu consigo mesmo pela lembrança, especialmente pela cara feia que Yuri fez quando contou a ele do ocorrido. Parecia que o mais velho tinha comido algo muito ruim, a ponto de poder lhe dar dor de barriga por séculos. 

E por falar no dito cujo, já fazia três semanas que estavam naquele pé de guerra: Otabek dormindo no sofá, acordando sempre com dor nas costas e irritado, e o bonito ficando na cama com todas as mordomias, lendo livros a noite toda – já que fantasmas não dormem –, fazendo a linha intelectual, enquanto devorava caixas e mais caixas de bombons de licor importados, caríssimos, que obviamente saíam do bolso do moreno. E ele sequer podia reclamar! Bastava falar um a para o outro soltar um "Foda-se, você concordou com isso, agora me aguente". Yuri era tão folgado que ultrapassava qualquer limite existente. 

O calouro preferiria poder dormir confortavelmente na cama, mas, como tinham um acordo, não havia o que fazer a respeito, ao menos não naquele momento inicial. Talvez com o tempo viessem a decidir algo mais justo, mas aquilo tudo ainda era muito recente, para ambos. Otabek ainda tentava digerir o fato de que estava morando com um fantasma. E não qualquer fantasma! Um fantasma que mais parecia um demônio, extremamente bonito, com aqueles brilhantes olhos verdes que lhe davam arrepios no fundo da alma todas as vezes que se voltavam para si. 

Não eram arrepios ruins. 

Não. A sensação que aquele olhar inquisidor lhe dava era totalmente diferente de algo perturbador. Na verdade, Yuri parecia querer traga-lo por inteiro cada vez que o olhava, convidando-o a se afogar no mar tempestuoso que era e a enfrenta-lo, encontrar o tesouro perdido no meio daquelas águas desconhecidas. 

Otabek gostava daquilo, apesar da confusão mental que lhe causava, já que os atos de Yuri eram totalmente opostos ao que seu olhar dizia. Não bastasse o caos que sua mente havia se tornado desde a chegada arrebatadora da assombração, vinha tendo ainda "sonhos estranhos" com o colega de quarto e tinha quase certeza que se tratava de seu sonambulismo, apesar de nem Otabek nem Yuri comentarem sobre os ocorridos pela manhã. 

E nesses sonhos sempre havia muito contato físico envolvido, na maioria das vezes abraços e carícias simples, como cafunés, apesar de na noite passada ter sido diferente. Ah sim, desse sonho ele se lembrava com clareza, o sonho que avermelhava até a última célula de seu corpo e o colocava em estado febril, mas uma febre boa demais para ser remediada. 

Ao sentir as faces se aquecerem com a lembrança, o garoto balançou a cabeça, afastando aqueles pensamentos de si, os olhos escuros focando no lugar onde se encontrava. Agora uma fina camada de neve caía sobre as casas, polvilhando as janelas com os pequenos flocos, como açúcar de confeiteiro em um bolo. Passou a mão pelos cabelos, cobriu a cabeça com o capuz e olhou para a lista de compras, lendo o último item do dia: dois frapuccinos da Starbucks, um de caramelo e outro de chocochip, tamanho venti, o maior e mais caro da loja, como esperado de Plisetsky, claro. 

Sem muita escolha, arrastou-se até a Starbucks mais próxima do colégio, as mãos cheias de sacolas, o gato miando impaciente em sua mochila e, pra ajudar, uma fila imensa que duraria no mínimo uns vinte minutos. Amaldiçoou-se mentalmente por ter concordado com aquilo, ele realmente deveria ter saído do quarto e deixado o fantasma idiota sozinho, teria sido muito mais fácil! 

Agora estava naquela péssima situação, tudo por conta de Yuri. E o gato não parava de miar nem por um segundo! As pessoas da loja já o olhavam estranho, talvez pensassem que estivesse sequestrando um animal raro ou coisa do tipo. E Otabek suava frio só de pensar em ter problemas com a polícia. O que ele diria? "Ah, meu colega de quarto queria ter um gato, mas ele é um fantasma idiota e folgado e não pode sair de lá pra buscar um". 

— Altin? – uma voz conhecida o tirou de seus pensamentos, fazendo-o olhar para o atendente, percebendo ser seu veterano Seung Gil Lee, o que o deixou um tanto quanto surpreso. 

Havia conhecido Lee na semana passada, logo depois de ter conhecido Yuri. Na manhã seguinte do dia do tratado de paz, um sábado ensolarado, Otabek seguiu sua rotina, acordando cedo, tomando um banho e indo para o refeitório com JJ lhe tagarelando sobre estar gravando um novo CD de músicas gospel – sim, ele era cantor e bem religioso, do tipo que quando escutava sobre os sonhos de Otabek com Yuri começava a rezar baixinho todo tipo de oração que via pela frente pra afastar o mal de si. Jurava ainda que se tornaria o melhor pastor de todos quando se formasse – o rei dos pastores – e que purificaria o mundo com suas canções e expulsaria todo o mal. Bom, existe louco pra tudo, não é mesmo? 

Até aí estava tudo normal, como sempre foi. Sentaram-se na mesa pra tomar o café da manhã – sem pressa já que naquele dia não tinham aulas obrigatórias, sendo final de semana –, Isabella e JJ lado a lado, Otabek a frente de JJ, todos prontos pra mais um episódio da premiada série "Na noite passada eu tive um sonho estranho com um loiro esquisito". O casal olhou o calouro com expectativa, esperando-o abrir a boca e contar mais uma de suas divertidas aventuras no quarto 305, mas naquele dia o cazaque permaneceu calado, os olhos fixos na torrada que tinha em mãos, passando nela uma generosa quantia de pasta de tomate seco e ervas finas, antes de dar uma mordida. 

— E então Otabek, como foi sua noite? – a voz de Isabella quebrou o silêncio, curiosa demais para tolerar mais um segundo de silêncio sequer. O moreno a olhou cansado, ainda menos animado do que já era normalmente, bocejando antes de se ajeitar na cadeira. 

E então, após se espreguiçar, seus olhos correram de um veterano ao outro, divertindo-se com a forma que eles lhe olhavam, segurando suas palavras ao máximo, incitando cada vez mais a curiosidade alheia. Os torturou por mais um longo minuto antes de finalmente decidir falar. 

— Eu admito, o fantasma é real. Fizemos um acordo na noite passada. – disse por fim, voltando a comer sua torrada, como se nada tivesse acontecido. 

JJ, que naquele momento tomava suco de laranja, se engasgou ao ouvir as palavras, tossindo como se não houvesse amanhã. Isabella empalideceu completamente, especialmente ao sentir um arrepio na espinha, incapaz de proferir qualquer palavra. O cazaque se controlava pra não rir, mas o loiro oculto ao seu lado já se desmanchava em gargalhadas. É claro que Yuri o acompanharia naquela manhã também, não podia perder o show! 

— Otabek, você é maluco ou o que? Não se faz acordos com fantasmas! Eu esperava mais de você! – JJ exclamou assim que saiu de sua crise de tosse, apontando o dedo pro cazaque, claramente chocado com a atitude do calouro. 

— O que tem? Ele não é assustador e eu preciso ficar no quarto, então fizemos um acordo, nada mais justo. – o novato deu de ombros, tomando um longo gole do seu café. 

— Estão falando de Yuri Plisetsky? – um asiático de cabelos pretos ligeiramente compridos e olhos igualmente pretos, as sobrancelhas um tanto grossas, se aproximou da mesa, analisando cada um dos integrantes daquele grupo esquisito, vendo-os assentir em resposta à sua pergunta. 

— Quem é você? E como o conhece? – a pergunta foi feita por Otabek, intrigado com aquele aluno desconhecido por si. Até onde sabia, era o único em contato com o fantasma e o único que sabia de seu nome, além dos veteranos com quem sempre andava. 

— Seung Gil Lee, terceiro ano na turma intensiva*. Não importa agora como o conheço, só acho falta de educação falar de uma pessoa que está presente. – os olhos do veterano rolaram até a cadeira supostamente vazia, onde o fantasma o olhava irritado. No mesmo momento ouviu-se um pequeno grito de JJ, que se encolheu em sua cadeira, paralisado em completo choque. 

— Ah meu deus... – foi a única coisa que Isabella conseguiu proferir naquele momento, evitando olhar pra cadeira vazia. 

— Yuri? – Otabek seguiu o olhar de Lee, franzindo o cenho. 

— Era pra ter ficado de boca fechada, seu coreano de merda! – gritou o loiro, com a certeza de que só Lee o escutaria, já que o coreano era o único médium** naquela mesa, levantando-se e saindo pisando do refeitório, não antes de mostrar o dedo do meio pro asiático, que tomou o seu lugar, agora vago. 

— Ele já foi, não precisam se preocupar. – revirou os olhos pros outros dois terceiranistas, focando no calouro. – Então você é o novo morador do 305? Como se chama? 

— Otabek Altin. 

— É um prazer, Altin. Por que não saímos pra conversar um pouco? – surpreendentemente, o coreano sorriu minimamente ao fazer o pedido, se levantando quando viu o cazaque assentir. 

Otabek, por sua vez, só virou o rosto na direção dos veteranos e soltou um "vejo vocês mais tarde", antes de sair pela porta do refeitório, acompanhado de Lee. Depois disso, ambos acabaram por se sentar em um dos bancos no jardim e foi lá onde o moreno escutou pela primeira vez sobre o que havia realmente acontecido com Yuri. 

— Ele está preso aqui desde outubro de 1987. – o veterano começou, fitando o céu azul – Meu pai o conheceu, eles eram da mesma sala, amigos próximos. Dizia que Yuri era um dos melhores alunos, apesar da fama de mimado. Muita gente não gostava dele por causa disso, sabe? E também porque ele era gay. Quer dizer, não inteiramente gay, mais ou menos. Ele ainda saía com garotas, mas definitivamente preferia os homens. De toda forma, esse foi o motivo da morte. 

— Ele morreu porque era gay? – o cazaque arqueou as sobrancelhas. 

— Também porque o consideravam promíscuo, já que a lista de ficantes incluía boa parte da escola. Yuri foi um adolescente totalmente livre e fora do padrão, especialmente para a alta sociedade conservadora de sua época, e tinha um grupo que pegava muito no pé dele por ser assim. No Halloween acharam que seria divertido esconder um corpo morto no fundo do lago, amarrado a um saco de pedras. Bom, segundo meu pai estavam todos no baile, então ninguém viu o que realmente aconteceu, só acharam o cadáver de Yuri uma semana depois, quando já estava em decomposição. 

— E como sabe que foi aquele grupo em específico que matou Yuri? 

— Obviamente porque Yuri me contou. Nós já tivemos tempo o suficiente pra conversar sobre o assassinato dele, apesar dele se recusar a contar certas coisas. O fato é que os autores do crime saíram impunes, porque não havia provas suficientes para incriminá-los e todos que tentaram levar o caso adiante acabaram sumindo do mapa ou sendo subornados pelas famílias dos bullies, e por isso Yuri está preso aqui até hoje. Essa pendência precisa ser resolvida, para que ele tenha paz. – o coreano tinha uma expressão sombria no rosto ao encarar Otabek com certa determinação. Os olhos do cazaque correram pela figura do veterano, a mente funcionando a mil, pensando em algo. 

— Espere, está me contando tudo isso por que...? – questionou por fim. 

— Bom, nem mesmo eu consegui ficar no 305, mesmo sendo o filho do melhor amigo do Yuri. Ele me expulsou sem nem hesitar, mas você é diferente, Altin. Você conseguiu se aproximar dele. Acredito que possamos ajudar Yuri a sair daqui, se juntarmos as informações certas. Meu pai atualmente trabalha em um cargo bem alto no governo, com certeza não seria problema reabrir um caso arquivado há trinta anos se tivermos provas do crime. 

E com aquilo Otabek entendeu o que acontecia. Aquele coreano maluco tinha um plano pra desassombrar o quarto 305 e o cazaque era o ponto central da ideia, quem deveria convencer o fantasma a dar os nomes exatos dos agressores e detalhes que mudassem toda a perspectiva do crime. Não sabia o quão ferrado estava ao aceitar fazer parte daquilo, mas já fazia uma semana que vinha reunindo informações sobre o caso, conversando com cada pessoa que poderia saber um pouco mais do que aconteceu. Agora já tinha uma pilha de jornais em seu quarto e diversas anotações reunidas, ainda que Yuri nunca parecesse disposto a lhe contar os detalhes da morte. Ele sempre desviava de assunto, irritado, ou simplesmente sumia. 

E quanto ao veterano, seus encontros se tornaram diários, para discutir sobre o fantasma do 305. Por vezes ficavam na biblioteca ou no lago onde Yuri foi encontrado, às vezes também iam ao terraço e até se atrasaram para o toque de recolher certo dia. Eles haviam se tornado algo como amigos confidentes e Yuri não gostava nada daquilo, Otabek sabia disso. Só não sabia o porquê dele se importar tanto, quer dizer, Lee nunca incomodava ou provocava Yuri. Pelo contrário, ele preferia manter distância. 

— E então, qual o pedido? – a voz do coreano, um tanto impaciente, o fez voltar à realidade, olhando em volta e percebendo uma porção de pessoas parecendo irritadas consigo. Provavelmente ele tinha ficado fora de órbita por um tempo. Suspirou profundamente, encarando o veterano no uniforme da loja, estranhando aquilo. Quer dizer, Lee trabalhando na Starbucks? Ele não precisava daquilo, sua família tinha montanhas de dinheiro, o suficiente pra financiar seus estudos no internato por mais de cem vezes. Então por que? O que ele fazia ali? 

— Dois frappuccinos venti, um de caramelo e outro de chocochip, pra viagem... – respondeu devagar, estreitando os olhos com desconfiança. 

— Deixe-me adivinhar... Yuri? São vinte pratas. – sorriu minimamente ao ver a confirmação nos olhos de Otabek, que arquejou com certo desgosto. – Ele está acabando com você, Altin. Veja só essas olheiras... 

— E eu tenho escolha?! – o mais novo reclamou, pegando a carteira e usando o resto de suas notas pra pagar as bebidas, dando espaço para o próximo da fila fazer o pedido, enquanto esperava o seu ficar pronto. Pra sua surpresa, o coreano o acompanhou, largando o caixa e se debruçando no balcão, frente a ele. 

— Aguente firme, Altin. Logo conseguiremos libertá-lo e eu garanto que o humor dele vai melhorar bastante. – ele riu, esticando a mão até o mais novo e bagunçando seus cabelos. 

— O que faz aqui, Lee? – o calouro desviou o assunto, sentindo as faces esquentarem ligeiramente com o toque do veterano. 

— Eu trabalho aqui. 

— Então não deveria estar no caixa? 

— Ah, eu não ganho salário, trabalho porque quero, então, se eu resolver sair no meio do expediente eu posso. Aliás, já ia voltar para o internato. – ele deu as costas para Otabek, indo até o bar e pegando dois copos do tamanho venti, para preparar os frappuccinos que o calouro havia pedido. 

— E qual o sentido de trabalhar sem ganhar dinheiro? – o cazaque o questionou, os olhos centrados nas costas do outro, em especial no laço do avental verde. 

Lee não o respondeu, certamente porque estava concentrado demais em fazer as bebidas. Tornou a se virar ao ter os dois copos em mãos, colocando-os sobre o balcão e pegando a caneta, anotando alguma coisa nas embalagens, antes de colocá-las numa sacola e entregá-la para Otabek. 

— Eu trabalho porque é divertido. Muitas pessoas diferentes vem todos os dias aqui, é interessante. – Lee respondeu por fim, tirando o avental verde e o pendurando num cabide. – Você espera um minuto? Tenho que pegar minha mochila lá nos fundos. Vou voltar pro internato agora. 

— Tudo bem, eu vou esperar ali fora. 

Já cansado de tudo, o cazaque apenas saiu pela porta de entrada da loja, sentando-se num banco e abrindo a mochila minimamente, somente o suficiente para entrar um pouco da luz do dia e iluminar a pelagem clara do filhote em sua mochila, que ainda miava. Era uma gatinha siamesa que havia achado na rua no caminho às compras. Yuri havia dito que queria um gato, era o primeiro item da extensa lista de quereres do loiro, mas tinha de ser especificamente um gato de rua, já que, segundo ele, haviam muitos animais desamparados precisando de um lar, enquanto outros são vendidos a preços absurdos. 

Aquele filhote havia lhe parecido uma boa ideia quando o viu, tinha os mesmos olhos verdes do fantasma. Por isso, teve o trabalho de pegá-lo e levar ao veterinário e ao petshop, enquanto se ocupava com os outros itens da lista. Agora a gatinha, antes suja, tinha os pelos bem cuidados e um laço vermelho no pescoço. Era impossível Yuri não gostar, certo? 

— Vamos Altin? – Lee o chamou, fazendo-o voltar a fechar a mochila e pegar as sacolas, ambos agora caminhando lado a lado pela rua, o internato à vista logo ao fim dela. 

Ambos engataram numa conversa sobre o dia a dia de Otabek com o fantasma, como de costume. O moreno revelou não ter conseguido descobrir nada além do que já sabiam sobre o caso de Yuri, o que deixou o veterano pensativo por alguns momentos. Eles precisavam de um plano melhor, um plano que funcionasse. 

No entanto, quando se deram por conta, já estavam nos corredores do dormitório e havia uma regra bem clara de Yuri: ninguém entra no 305 a não ser Otabek. 

— Bem, nos vemos mais tarde? – Lee perguntou, com certa expectativa. 

— Sim. Assim que Yuri me deixar em paz eu mando uma mensagem, tudo bem? – o moreno respondeu, enquanto já abria a porta do quarto, prestes a entrar. 

— Claro. – o coreano sorriu, bagunçando os cabelos do cazaque como havia feito na Starbucks, olhando para dentro do quarto pela pequena fresta da porta e sorrindo com certa malícia, de forma discreta, para o fantasma que observava a cena, torrando de raiva. Resolveu provocá-lo mais um pouco, abraçando o calouro, antes de olhá-lo nos olhos. – Até mais tarde, Altin. 

— Até mais tar... – Otabek mal teve tempo de terminar a frase, antes de ser puxado para dentro do quarto 305 por um Yuri irritado, o rosto contorcido numa carranca, enquanto trancava a porta e encarava o mais novo. – Qual é o seu problema?! Eu tava conversando! 

— Você demorou. Trouxe o que eu pedi? - o loiro cruzou os braços, sentando na beirada da cama. 

Suspirando profundamente, tentando manter a calma, Otabek colocou as sacolas em cima da cama e tirou a mochila dos ombros, com cuidado, estando parado à frente do Plisetsky. Abriu o zíper todo dessa vez, apoiando a bolsa no colo do fantasma e revelando a pequena gata no interior. No mesmo momento, a imagem da assombração raivosa se dissipou completamente, uma expressão afetuosa que o cazaque nunca tinha visto tomando conta do rosto do russo. Seus lábios se curvaram em um sorriso terno ao tirar a gatinha da mochila e aninhá-la no colo, acariciando sua cabeça e quase tendo um ataque ao escutá-la ronronar. 

— Ela é tão fofa, obrigado Beka! – o fantasma disse com a voz arrastada em um tom fofinho, enquanto agarrava a felina, apertando-a em seus braços. 

— Beka? – o moreno perguntou, confuso. Seus olhos eram incapazes de desviar da cena do fantasma tão feliz com a gatinha, que agora ronronava alto nos braços do loiro e brincava com seu cabelo. Ele parecia tão radiante, como nunca o havia visto. Quase como se estivesse vivo... 

— Uhum. É seu apelido de agora em diante. – explicou, sorrindo para o mais novo e esticando a mão até sua bochecha, apertando-a. – Até que você é legal pra um pirralho idiota ladrão de quartos, Beka. 

O calouro sentiu o rosto esquentar com aquilo, desviando o olhar para o guarda-roupa no canto oposto do quarto, fazendo Yuri rir ainda mais. Definitivamente, provocar Otabek havia se tornado o esporte favorito da alma penada. Adorava ver o mais novo daquela forma, todo vermelho por simples palavras, ainda mais por saber que ele só mostrava aquelas reações a si. Para os outros, Otabek era como uma parede de ferro sem expressão alguma. 

— Que nome vai dar a ela, Yura? – Otabek se pronunciou assim que se recompôs, o rosto ainda um pouco vermelho ao ver Yuri soltar a gata no quarto, indo xeretar as sacolas. 

— Yura, hm? – o loiro sorriu com o apelido do outro para si, fazendo-o desviar o olhar, novamente desconcertado – Não sei, Beka, mas vou pensar em algo foda pra nossa gata. 

— Nossa? 

— Claro, foi você quem a buscou pra mim, mas nós dividimos tudo, não? Esse quarto é nosso, tudo aqui é nosso, a gata também é nossa, obviamente. Ela é como nossa filha! – ele disse, distraído com uma sacola cheia de chocolates. – Ah, mas os bombons são meus, então nem pense em roubá-los quando não estou aqui! 

— Certo. Agora eu vou sair, ok? Lee quer conversar comigo. 

O mais novo se levantou da cama, prestes a sair do quarto, mas Yuri o segurou pelo braço, dizendo um "espera", o rosto voltando a se contorcer de raiva ao escutar que Otabek ia se encontrar com o outro veterano. Naquele momento, Yuri queria mesmo era que Lee explodisse e sumisse de vista, Otabek era o seu calouro, não dele! 

— O que é? Eu preciso falar com ele e logo mais tem o toque de recolher! 

— Faltam quatro fodendo horas pro toque de recolher, então faça o favor de sossegar a bunda nessa cama que eu preciso de você aqui comigo! 

— Pra quê? – o mais novo arqueou as sobrancelhas com desdém, mas acabou por voltar à cama, tirando os sapatos e se recostando nos travesseiros. 

Yuri não o respondeu, apenas recostou ao lado de Otabek, ligou a televisão usando seus poderes fantasmagóricos e escolheu o filme In Your Eyes na Netflix, dando o play. O mais novo o observou de canto de olho, notando enfim que Yuri só vestia um moletom vermelho e uma cueca preta, as pernas descobertas, cruzadas, os cabelos presos num coque desajeitado, com várias mechas soltas. Nunca havia visto o fantasma de forma tão informal, ele sempre estava usando parte do uniforme do internato. 

— Eu vi uma garota assistindo esse filme e fiquei curioso, mas assistir filme sozinho é chato, então fica aqui comigo. Depois você pode ir. – ele respondeu a pergunta enfim, sem desviar a atenção da tela, os olhos verdes refletindo as cenas iniciais do filme. 

E naquele momento, Otabek só conseguia pensar em como ele era bonito. Yuri era absurdamente bonito, em um nível que nem deveria existir. Não conseguiu se conter, antes de esticar a mão até os fios dourados de seu cabelo e tirar o elástico, vendo-os cair livremente por cima do moletom vermelho. Esperou o xingo que ia tomar, mas para sua surpresa, ele não veio. Entendeu aquilo como um sinal positivo, então continuou a mexer nas madeixas do fantasma, que tinha a expressão suavizada no rosto mais uma vez. 

— Yura, vem cá. – acabou por chamá-lo, indicando o espaço entre suas pernas. 

— Pra quê? – foi a vez do loiro arquear as sobrancelhas, mas acabou por se ajeitar entre as pernas do mais novo, se apoiando em seu peito. 

— Quero mexer no seu cabelo. – o cazaque respondeu simplista, antes de começar a trançar os longos fios loiros, concentrado. 

Otabek não conseguia ver o rosto de Yuri daquele ângulo e o fantasma agradecia por isso, porque agora era sua vez de ficar totalmente constrangido. Não que nunca nenhum garoto tivesse feito algo do tipo consigo, mas aquele era o seu pirralho, não qualquer garoto. E ele estava sendo fofo consigo, mesmo depois de mais de um mês de rebeldia e mau humor por parte da assombração – isso sem contar as exigências nada sutis. 

Os colegas de quarto ficaram naquela posição por uns dez minutos, até Otabek terminar a trança que fazia, amarrando-a com o elástico. Sorriu com o resultado, pegando o celular e tirando uma foto de sua obra prima, mostrando à assombração. 

— O que acha? – perguntou enfim, um sorriso mínimo iluminando seus lábios. 

— Wow Beka, quando abrir seu salão me coloque como o primeiro cliente. – o Plisetsky riu, o zoando, levando um pequeno soco no ombro do outro. 

— Não enche, Yura. Ainda fiz o favor de arrumar esse ninho de ratos que tava no seu cabelo. 

— Não espere que eu agradeça por isso. Agora fica quieto que eu quero assistir! 

O Plisetsky colocou o indicador sob os lábios rosados, antes de se recostar em Otabek, deitando em seu peito. O cazaque sentiu o rosto se aquecer completamente. Quer dizer, ele esperava que o fantasma saísse de perto dele assim que ele terminasse a trança! – agora tinha os olhos fechados, tentando se acalmar com a situação. Não era nada de mais, certo? 

Pra não ficar como se tivesse achado estranho, acabou por passar os braços pelo corpo do outro, o abraçando, o que não foi nada sutil, diga-se de passagem. Yuri, porém, suspirou baixinho de satisfação, apagando a luz com seus poderes e vislumbrando a sacola da Starbucks, trazendo-a até si com sua telecinese. Olhou para os dois frappuccinos que havia pedido e os tirou da sacola, notando então a escrita peculiar nas embalagens. No de chocochip estava escrito "Otabek", com um coração desenhado do lado, e no de caramelo, seu favorito, estava escrito "Yurio, eu vou roubar seu homem". E aquela letra não podia ser de ninguém mais além de Seung Gil Lee, reconheceria aquela grafia há quilômetros! 

Sentiu seu sangue ferver na hora. Como ele sabia que chocochip era o sabor favorito de Otabek e que havia pedido aquele frappuccino pra ele e não pra si mesmo? E além disso ainda tinha a ousadia de dizer que ia roubá-lo de si?! Ah, mas ele estava ferrado! Lee era um homem morto! – mas agora precisava ter calma, não podia deixar aquela raiva transparecer e estragar o momento perfeito que estava tendo com o moreno. Por isso, ficou quieto e passou o frapuccino de chocochip para Otabek. 

— O que foi? – o mais novo perguntou, confuso ao pegar o copo. 

— É pra você. Eu pedi pra você. – o fantasma disse por fim, sem nem ao menos encará-lo, enquanto dava um gole longo no frapuccino de caramelo. 

— Pra mim...? 

— É, seu idiota. Você tem obedecido às regras e sido legal comigo, então vamos dividir a comida enquanto assistimos o filme. 

Otabek se calou. Sem saber o que dizer, sorveu um pouco da bebida, deixando escapar um "hm" baixinho de satisfação. Olhou então para os cabelos loiros de Yuri, encostado em seu peito confortavelmente, concentrado no filme. O que havia acontecido? Quem era aquele e o que tinha feito com o velho fantasma rabugento? Até o dia anterior os dois só sabiam brigar e gritar um com o outro, não existia paz naquele quarto até um ou outro saírem, era o próprio inferno na terra. 

Mas hoje não. Hoje ele estava diferente, mais calmo, parecia até feliz, o que nunca acontecia. Ou melhor, nunca tinha acontecido até o presente momento. Otabek nunca tinha visto Yuri sorrir daquela forma, como se estivesse no ápice de sua felicidade. Na verdade, Yuri nunca sorria – a não ser pelos sorrisinhos maliciosos, mas aquilo não contava realmente. Dessa vez ele parecia uma estrela brilhante, era um sorriso puro, um sorriso com paixão. 

— Obrigado. – Otabek enfim agradeceu, tomando mais um pouco da bebida e apoiando o copo na mesa de cabeceira ao lado da cama. Seus olhos finalmente se focaram no filme, vislumbrando a cena em que Rebecca e Dylan conversavam, ela na cozinha de sua casa imensa e ele há quilômetros, no trailer velho onde morava. O filme se tratava de uma conexão mental entre os protagonistas, era realmente interessante. 

— Eu acho que ele tá se apaixonando por ela. Olha só como ele sorri que nem um idiota! – Yuri comentou, metendo a mão no saco de doritos que havia acabado de abrir e enfiando uma porção na boca, levantando a embalagem na direção do mais novo em seguida. – Você quer? 

— O marido dela é um babaca, eles podiam ficar juntos. – Otabek contribuiu com os comentários, pegando uma porção de doritos e comendo devagar. 

— Eles são de mundos diferentes, Beka. Ela é rica, mora em New Hampshire e tem um marido cheio da grana. Já ele não tem nada, é um criminoso porque foi trouxa em confiar nos amiguinhos babacas e se fodeu, além de morar na puta que pariu né. Eles moram tão longe que até o fuso-horário é diferente! 

— E? 

— E daí que não tem como! – ele fez uma pausa pra enfiar mais salgadinho na boca – O marido babaca dela nunca aceitaria uma separação e eu aposto que ela não tem coragem de fugir. Já o Dylan, ele tá todo fodido da vida, preso na condicional. Se ele sair do estado já tem problemas. O mundo colocou uma barreira bem grande entre os dois, é praticamente a mesma coisa que um espírito querer namorar alguém que ainda tá vivo. 

A última frase do loiro fez Otabek estremecer. Tinha quase certeza que havia sido só um exemplo inocente, mas se fosse intencional, tinha conseguido atingir o garoto. Yuri havia pensado neles daquela forma alguma vez? Mas ele o odiava, não fazia sentido... Mas isso explicaria por que ele andava mais calmo e menos rabugento hoje, certo? Ainda assim, parecia absurdo... Se bem que Lee havia dito que ele era gay, então por que não? 

— Você sabe que, o simples fato de você, Yuri Plisetsky, assombração desse internato, estar aqui comendo salgadinho e bebendo frappuccino deitado em mim já é algo bem absurdo, não é? E ainda assim aconteceu. Então eu vou acreditar no amor dos dois, porque eu tenho certeza que eles vão acabar juntos. 

— Eu sei, não precisa me lembrar que eu tô morto. – o loiro respondeu em um tom triste, fechando os olhos para impedir que lágrimas começassem a escorrer pelo seu rosto. 

Morar num quarto, tomar banho, andar pela escola, comer besteiras, beber muito refrigerante, ter um colega de quarto e até um bichinho de estimação, todas aquelas ações serviam para afastar a morte de si. Ele não queria ser um fantasma, queria poder sair dali, fazer o que todos os jovens de sua idade faziam, voltar a ser alguém visto por todos, amado por todos. E ele queria amar também. Mas como poderia amar alguém se o seu coração não batia mais? Como poderia exigir que alguém vivo o amasse e se prendesse a ele, ao invés de viver sua própria vida? Não estava certo. 

E ainda assim, sua mente continuava a pensar de forma especial naquele calouro. Sua mente o torturava, fazendo-o imaginar como seria bom ser amado por alguém tão jovem e cheio de vida. Com certeza seria a melhor sensação de todas, a paz que ele procurava. A paz que nunca teria, que não aconteceria jamais. E ele nem podia ser egoísta quanto aquilo, não podia privar Otabek de ter uma vida normal, por isso o tratava com tanto ódio. Se Otabek o odiasse ele estaria livre pra viver como os outros vivos. 

Mas então o que fora aquilo na noite passada? Aquela crise de sonambulismo que o mais novo tivera... Aquilo havia deixado o loiro confuso. 

Devia ser por volta das duas e meia, três da manhã quando o fato aconteceu. Yuri estava recostado na imensa cama de casal, uma pilha de tabloides de moda e livros de ficção se erguendo à sua direita, outra de chocolates caros e latas de refrigerante à esquerda, sua figura ao centro, imóvel como a Monalisa, concentrada em um editorial da vogue que havia pedido para Otabek no dia anterior. Seus olhos devoravam as páginas com rapidez quando sentiu um peso a mais na ponta da cama. 

— Volta a dormir, Otabek. Tá muito cedo pra ir pra aula. – murmurou preguiçoso, com certa chateação, sem desviar a atenção para o moreno. Óbvio que ele não pararia o que estava fazendo pra prestar atenção em um garoto sonâmbulo! Se bem que era um garoto gostoso e sem camisa... 

Seus olhos correram pela figura do colega de quarto antes mesmo que pudesse se impedir, o abdômen trincado totalmente exposto, suado pela temperatura alta do aquecedor, uma gota do suor escorrendo livremente pelos gominhos. Estreitou os orbes inquisidores, como um felino faz ao presenciar sua presa, parando-os no rosto cansado do mais novo. Seus cabelos estavam deliciosamente bagunçados, alguns fios grudando na testa, e ligeiramente compridos, começando a cobrir o undercut, quase um pecado. Yuri queria encher as mãos com aqueles fios macios essa noite também, como havia acontecido nas anteriores. Não admitiria nem sob pena de morte, mas as madrugadas haviam se tornado mais interessantes para si desde que aquele garoto havia invadido sua vida. 

Antes que pudesse começar a divagar sobre como Otabek o animava e o irritava ao mesmo tempo, o peso da ponta da cama se moveu, engatinhando até a figura pálida do loiro, ambos vestindo um mínimo de roupas, os corpos quase nus agora se tocando ao moreno praticamente se jogar contra o loiro, puxando de suas mãos a revista e a jogando em um canto qualquer. Ele precisava de atenção, queria que Yuri olhasse pra si e queria que fosse agora! 

— Devolve a minha revista seu filho da..! 

— Yuri. – a voz ligeiramente grave do outro soou profunda, um tanto manhosa, interrompendo o chilique do russo. Os olhos escuros, praticamente nublados, se encontraram com os claros, em um diálogo silencioso, um duelo por dominância. Os lábios carnudos do moreno estavam entreabertos, um arfar constante escapando deles, a respiração quente a centímetros do rosto do mais velho. 

Aquilo era uma tortura. Ah, a pior das torturas! Yuri queria tocá-lo, mas ele era seu "inimigo". Queria reivindica-lo, impregná-lo com seu cheiro, seu suor, mas ambos eram de mundos diferentes. Otabek estava vivo, Yuri estava morto. Aquela boca parecia deliciosa, mas seria um pecado muito grande toma-la para si, certo? É como dizem, depois de morto não se pode ter mais nada... 

Ele não podia ter Otabek. E ainda assim, aquele maldito estava sentado em seu colo, quieto como um bom pirralho, os olhos nos seus, esperando por uma recompensa. Recompensa essa que ele não podia se permitir dar. Não, tinha n motivos pra não poder, mas seu coração dizia que era o certo. 

Antes que pudesse pensar em qualquer outra coisa, a paciência do mais novo se esgotou. Seus lábios curiosos tocaram a face do fantasma, fazendo-o ruborizar, antes de rumar para o ponto principal. E ao tocarem os lábios alheios, em um selar discreto e recatado, macio, foi como se o mundo de Yuri desabasse por completo e suas convicções caíssem por terra. O abraço era perfeito, mas o beijo era de outro mundo. Daquela forma era inocente e suave, quase como o toque de uma flor. 

Sem conseguir se controlar mais, o loiro fechou os olhos, os braços envolvendo o corpo do menor, seus troncos se chocando em uma fricção gostosa, frio e quente se misturando, fios dourados e negros espalhados pelos lençóis. A língua do mais velho ditou uma dança fogosa ao pedir passagem, demorada e intensa, e aquele Otabek inocente se desfez, revelando uma face mais bruta por debaixo do selar anterior. Ele correspondia Yuri com destreza, acompanhando seus movimentos, em total sintonia, enquanto se deixava ser dominado pelo veterano que tinha o peso do corpo sob o seu. Com necessidade, meteu os dedos naquela cabeleira loira, apertando os fios com força, como que com medo de se deixar levar pela correnteza selvagem que era Yuri Plisetsky. 

E foi naquele momento, em meio ao ósculo, que Yuri entendeu que estava no lugar certo. Para si, não havia nada mais certo do que a boca de Otabek na sua. Eles pareciam ter sido feitos um para o outro e olha que o loiro odiava essa melação toda. Na verdade, ele não suportava casais açucarados, mas com o moreno mais novo ele poderia até mesmo gostar disso. Com Otabek em seus braços ele podia tudo. 

Depois daquele beijo, o calouro sonâmbulo havia voltado a "dormir" em paz, então Yuri fez como nas outras noites: o pegou no colo como a própria bela adormecida e o deitou no sofá, jogando o lençol por cima de seu corpo e rumando ao banheiro em seguida, porque não se apaga fogo sozinho, não é mesmo? 

Era uma rotina ter Otabek em sua cama toda madrugada, mas ele nunca havia o beijado, e tinha medo do que aquilo poderia significar. 

— Desculpa, eu não queria magoar você. – a voz do mais novo o tirou de suas memórias da noite passada, fazendo-o olhar de soslaio para o outro acima de si. Ele parecia um tanto triste também, suas mãos acariciando o cabelo de Yuri. 

— Tá tudo bem, não é sua culpa. Eu nem deveria estar aqui mesmo. – o russo respondeu, meio rabugento, tornando a fechar os olhos, afastando-se de Otabek ao sentir uma lágrima escorrer do olho direito. Não queria que ele o visse frágil daquela forma, sabia que se não parasse de pensar imediatamente acabaria voltando à forma que ficou na noite em que foi despedaçado. Yuri definitivamente não queria assustá-lo, não mais. 

A cama de repente ficou mais leve e o mais velho escutou passos pelo apartamento 305, mas não estava com vontade de olhar o que Otabek estava fazendo. Não até sentir a sombra a sua frente, o olhando como se realmente se importasse, como se Yuri estivesse vivo ainda. 

— Tem razão, não é minha culpa. – o moreno segurou o rosto do loiro pelo queixo de forma delicada, usando a outra mão pra enxugar as lágrimas do fantasma com um lenço de seda – Mas é importante pra mim. Sofrer por trinta anos já é o bastante, não? Então se eu puder de alguma forma ajudar a aliviar esse sofrimento, eu o farei sem hesitação. Você é meu amigo, Yura. 

O Plisetsky ficou surpreso e sem reação por algum tempo, mas logo desatou em uma gargalhada gostosa, envolvendo a cintura do mais novo e o puxando para o seu lado, na cama. 

— Do que está rindo, idiota? Eu tô tentando ser fofo! – ele riu também, dando um soquinho no ombro do fantasma. 

— Amigos não se beijam no meio da madrugada, Otabek Altin da Silva Sauro. E nós dois sabemos que aquilo não foi um sonho, não adianta negar! – o loiro jogou a direta na brincadeira, rindo ainda mais ao ver o rosto completamente vermelho do mais novo. 

— É claro que amigos se beijam! Amigos coloridos, nunca ouviu falar? – ele respondeu, um tanto constrangido, mas também entrando na brincadeira. 

— Ah é? 

— É. 

— Engraçado que eu não tô vendo o colorido da nossa amizade. Cadê? 

— Bem aqui, seu fantasma idiota. 

E com isso, o mais novo se inclinou e uniu seus lábios aos do loiro em um selar. Yuri pôde sentir novamente aquela sensação incrível formigar em todo seu corpo, intensificando ainda mais quando moveu os lábios contra os de Otabek, que o correspondeu sem nem precisar de muito incentivo. O filme ainda passava ao fundo, mas nenhum dos dois estava interessando em ver como Rebecca e Dylan quebrariam a barreira que impedia seu amor, afinal, eles já haviam encontrado a resposta para aquela pergunta ali mesmo, no tão famoso quarto 305. O quarto mal assombrado. O quarto que ninguém em sã consciência ousava adentrar. 

Bem, isso não importava para Otabek, de toda forma. Afinal, ele era quem chamavam de "o domador de almas penadas". 


Notas Finais


*Turma Intensiva: é a turma auto-didata do internato, sem diferenciação de série escolar.
**Médium: Pessoa sensitiva, que vê, escuta e/ou sente a presença de espíritos e entidades em um ambiente. No caso do Lee, ele vê, escuta e sente, então o Yuri não consegue se esconder dele nem na forma totalmente fantasma.

Olá meus amores, aposto que por essa vocês não esperavam hein? Lee na história, fazendo ciuminho pro Yuri. A bicha é ousada, produção.
Mas nada temam que o rei dos pastores eliminará todo o mau que possa entrar no caminho.
Confiem no Otabek, o domador de almas penadas!
Well, agora estamos oficialmente no meio da história~
Aliás, fiquei bem triste que "In your eyes" saiu da Netflix em dezembro, porque é o filme de romance mais perfeito que já vi!!
Pra quem quiser ver, tomem aqui o link, legendado em português: https://www.tugaflix.com/Filme?F=2101569
E é isso aí meus amores, até o próximo capítulo e cuidado com os fantasmas!!

P.S.: Obrigada por todo o carinho com essa história de amor entre um fantasma idiota e um calouro lerdo, eu amo vocês e espero que possam se divertir com essa desgraça até o final ♥


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