Acordei no dia seguinte ainda me sentindo cansada. Meus pés doíam por terem sido forçados nos sapatos de salto alto e minha cabeça doía, assim como meus músculos que reclamavam de meus momentos de dança. Ainda estava cedo e assim que percebi isso me virei para retomar ao sono, mas a dor na cabeça aumentava e não me deixava relaxar. Suspirei e me levantei, andando com cuidado para não acordar Damen. Avistei de relance meu celular e o levei para o banheiro.
Deixei o aparelho na pia e tomei uma ducha quente afim de relaxar a dor nos pés. Assim que me senti melhor saí dali enrolada no roupão felpudo e cheiroso. Prendi meus cabelos e desci para comer alguma coisa.
Tomei o café, sentada no banquinho do balcão da cozinha elegante, olhando para a paisagem da cidade do lado de fora. Todas as janelas do apartamento eram enormes e eu amava perder o tempo olhando os outros prédios e o movimento lá embaixo. Porém agora eu só via o céu. Nem tão limpo, nem tão anuviado. Estava lindo a sua maneira. O sol começava a brincar por entre as nuvens, o que me lembrou do tempo. Olhei a hora e peguei mais uma vez meu celular para uma ligação.
- Bom dia - ouvi a voz de Isabel.
- Está pronta?
- Não. Tenho que me arrumar ainda. Você vem?
- Claro que sim. Te encontro aí.
...
Meia hora depois estavamos indo juntas para o aeroporto. Isabel e seu namorado Chris voltariam para Cancún levando lembranças para nossos pais, que não puderam comparecer a minha formatura. Meu pai havia fraturado alguns ossos da perna e do pé em um acidente de trabalho e minha mãe ficou cuidando dele.
- Vou sentir sua falta - Minha irmã sorriu ao me ouvir.
- Não demoro a voltar. Você precisa de supervisão.
- Eu não sou criança, Bel.
- Sabe muito bem do que eu falo - ela olhou para mim, esperando minha resposta. Ainda faltava algum tempo para seu vôo, então eu deveria ter aquela conversa. Suspirei e a encarei. Chris percebeu a expressão materna no rosto de Isabel e isso o fez "passear" pelo aeroporto, alegando que queria comprar fones de ouvido
- Você está falando do meu noivado, não é? - ergui uma sobrancelha depois que ele se afastou. - O que você espera que eu faça?
- Talvez parar de se jogar em qualquer coisa que apareça na sua frente.
- Eu não faço isso - repliquei.
- Liana, eu conheço você. Acredite em mim, só temos dois anos de diferença, eu sei. Você quer ser descolada, quer descobrir novas coisas e explorar o mundo. Sou de total apoio nisso. Sempre admirei essa sua paixão pelas coisas. O problema é quando você se frustra com algo e não consegue superar e...
Olhei para ela com uma expressão que ela já conhecia. Ela não tinha permissão para falar do passado.
- Eu estou bem, ok? - falei baixo.
- Ah é? - ela inclinou o rosto. - Espera passar sua vida toda com o Damen?
- Não sei. Talvez sim.
- Então onde entra seus planos de viagem? Onde está a Liana obstinada que saiu do seu país para fazer o que ama?
- Eu estou aqui.
- Não é você quem eu ouço - ela balançou a cabeça.
- Você já teve suas experiências. Me deixe ter as minhas e aprender com elas. - suspirei ajeitando os cabelos - Eu entendo perfeitamente o que você diz. Sei que se preocupa comigo, mas vai ficar tudo bem.
Isabel olhou para mim por um tempo.
- Eu prometo que vai ficar tudo bem - repeti.
- Você não tem falado com ele? - ela falou mais baixo.
- Não vou falar sobre isso - encerrei o assunto, olhando para outro lado.
- Certo... - ela assentiu e se espreguiçou antes de levantar. - Mas estarei sempre pronta para uma conversa.
- Ou sermão - revirei os olhos e ela sorriu, depois lhe acompanhei e nós rimos antes de eu me levantar e ir com ela para o portão de embarque.
- Boa viagem pra vocês - Sorri para Chris e me despedi. Ele me abraçou brevemente. - cuide dela, hein.
- Pode deixar - ele piscou um olho e sorriu mostrando os dentes brancos.
- Mande um beijo para o pai e a mãe. Diga que eu os amo e que logo ligo pra matar a saudade. - me virei para Bel.
- Pode deixar. Liga mesmo. Ou mande e-mails.
Nos abraçamos por um tempo e ela se foi. Isabel nunca foi muito melosa. Ela era como eu. Sentia tudo mas guardava inteiramente para si. Ela sabia que eu era assim. Por isso gostava de perguntar tudo sempre que podia.
Voltei para a estrada, mas em vez de eu ir para o apartamento de Damen, fui para o apartamento que eu dividia com duas meninas da faculdade. Eu tinha que resolver se ficava ali ou iria morar com o Damen, como ele havia proposto. Mas eu escolhi esperar. Até eu conseguir um emprego e alugar meu próprio cantinho. Por enquanto, profissionalmente eu tinha apenas uns bicos de fotografia em um Studio de modelos e alguns conhecidos de vez enquanto apareciam com um serviço ou outro.
Abri a porta e aparentemente estava sozinha. Suspirei aliviada e fui direto para meu quarto. Me joguei na cama e fiquei revirando minhas redes sociais, até lembrar do porque eu estava nervosa. Eu não tinha olhado meu e-mail ainda. Esperei alguns segundos, tentando pensar nos prós e contras de eu fazer aquilo.
Se ele tivesse respondido eu continuaria a conversa?
Se sim, voltaríamos a ter algum contato amigável?
Parecia errado.
Por outro lado, se ele não tivesse respondido eu ficaria mortalmente abalada, mas seria bom para eu seguir minha vida adiante sem expectativas.
Meu coração já batia forte pela possibilidade das duas opções. E de certo modo eu já tinha tomado a decisão.
Abri o e-mail.
# Um novo e-mail de: Tom Hiddleston.
Meus olhos se fecharam forte e eu sorri, soltando o ar com alívio.
Assunto: Novos horizontes?
Você não falou o nome da sua gatinha. Bobby está curioso.
E agora eu também. Você viajou de férias?
Se sim, não me diga que está perto ou em Londres?
Hiddleston, Tom.
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Como eu poderia ainda sentir tudo isso?
Tanto tempo havia passado e eu estava ofegante e molenga de nervoso porque ele me respondeu, dessa vez no mesmo tom de antes.Antes de responder analisei o que iria dizer. Eu queria continuar falando com ele. Mas sem deixar parecer o quanto eu estava desesperada.
Assunto: Novos horizontes!
Ela se chama Loki. Sim... De nada.
E adoraria conhecer o Bobby.
Não estou de férias...
Bem, tecnicamente estou. Terminei a faculdade então devo esperar um pouco até começar a trabalhar mesmo com fotografia.
Não estou perto de Londres, senhor. Sinto muito.
Blanco, Liana.
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Mandei a mensagem e fiquei aflita se ele interpretaria o "adoraria conhecer o Bobby" como um convite...
Mordi os lábios, aflita. E prendi a respiração ao ouvir o som da notificação.
Ele estava online!
Assunto: Quais horizontes?
Eu ri um pouco alto pelo adorável nome da sua gatinha. Você tem mesmo bom gosto.
O Bobby está disponível para um encontro, talvez.
Fico muito feliz de saber que se formou. Muito mesmo. Estou orgulhoso e contente. Parabéns!
P.s: ainda curioso pelo seu paradeiro.
Hiddleston, Tom.
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Senti um arrepio ao imaginar sua risada. E o som de sua voz.
Assunto: Uma dama nunca conta seus segredos.
O nome é bem legal, eu amo mitologia nórdica!
Sinto muito se você achou que eu me referia ao personagem da Marvel.
Obrigada! Estou feliz também com a minha formação. Foi um pouco sua ajuda. Me fez abrir os olhos e focar em mim, principalmente.
Blanco, Liana.
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Esperei por um tempo, mas ele não respondeu e me senti estranha. Meu peito se esquentava e ao mesmo tempo minha garganta começava a fechar de angústia. Olhei para meu anel e para tudo o que ele representava. Aquela vida ficou no passado. Eu deveria focar no agora. O celular vibrou e me assustei.
- Alô - atendi, sussurrando.
- Estava dormindo? - Era Damen.
- Não. Levei Bel ao aeroporto e depois vim pra casa arrumar algumas coisas.
- Senti sua falta de manhã.
- Podemos sair para jantar mais tarde - sugeri. Eu falava normalmente, mas soava estranho. Eu não estava muito concentrada ali, mas em outro lugar. Em outra pessoa.
- Boa idéia. - ele concordou. - Está tudo bem?
- Sim, por que?
- Parece... Sei lá. - ele fez uma pausa. - você parece estranha desde ontem.
- Não estou estranha. Relaxa.
- Se você diz...
- Você me encontra aqui para o jantar? - mudei de assunto.
- Claro.
- Ótimo - falei e esperei um tempo para desligar. - Até lá. Tchau.
...
Enquanto ele falava sobre como esperava ser o casamento e a festa, eu viajava, pensando em como tudo aconteceu rápido. Era mesmo para eu ter aceitado aquele anel? E se eu tivesse recusado? Eu não poderia fazer isso. Se ele pediu, foi porque eu dei esperanças para que fizesse isso. Mesmo que a gente só tivesse namorado por dois anos, era um namoro sólido e eu não demonstrava que queria sair dele. Eu não tinha outra opção. Outra pessoa para pensar em trocar de parceiro. E agora, só de voltar a falar com Tom eu ficava assim. Vacilante. Julgando qualquer coisa e indecisa sobre tudo.
Se eu não tivesse puxado assunto, ele teria?
Por que Tom havia voltado a falar comigo?
Seria só como amigos ou ele ainda teria alguma esperança?
As perguntas se acumulavam em minha mente e eu me sentia totalmente avoada.
- Lia, você me ouviu? - Damen falou mais alto.
- Ah... Me desculpe. - Voltei a realidade. Ele estava sério.
- No que tanto pensa? - ele franziu o rosto. - O que a está preocupando?
- Meus pais - falei a primeira mentira que me veio a cabeça.
- Oh.. - ele se mostrou curioso e também preocupado. - Aconteceu algo? Seu pai...
- Está bem. É que sempre lembro de como era bom morar com eles. Estar sempre perto. - dei de ombros. Aquilo não era totalmente mentira. - Sinto falta.
- Já pensou em voltar para Cancún? - ele voltou a comer, me olhando.
- Não. Gostaria que eles viessem morar para cá. Ou não sei. Ainda penso em viajar bastante. Mas quando parar em um local fixo, pretendo ter um lugar para eles perto de mim.
- Podemos cuidar disso - ele assentiu.
- Já falamos sobre esse assunto. Você não vai fazer isso. Eu vou.
- Só dificulta as coisas. - Ele deu de ombros.
- Posso trabalhar e ter esse dinheiro. Não quero que me banque.
- Assim você me insulta - ele falou irritado. - Sei que é capaz. Mas eu já tenho o que precisa. Só quero ajudar. E de qualquer modo você vai ser minha esposa. Terá direito a tudo o que eu tenho.
- Vamos mudar de assunto? - sugeri.
- Se assim deseja, madame. Vamos adiar o assunto. Não quero brigar. - ele revirou os olhos e suspirou comicamente. - Vamos falar de viagem. Você disse que quer conhecer o mundo e eu havia dito que depois da formatura, faríamos uma... - ele pausou teatralmente.
- Começou a melhorar... - sorri, bebendo o vinho.
- Onde gostaria de ir? Pode dizer. Qualquer lugar.
- Londres - falei automaticamente. Damen sorriu .
- Eu tinha certeza de que diria isso. Fiquei com dúvida entre Paris e Londres. Você sempre diz que amaria conhecer.
- Paris pode ficar para a lua de mel. - pensei.
- Estamos nos entendendo - Ele aplaudiu e sorriu. Me lembrando de que era bem fácil estar com ele. E bastante agradável. Tentei esquecer qualquer coisa e mais uma vez focar na vida real enquanto conversávamos sobre viagens e lugares que gostaríamos de conhecer, das comidas e festas. Foi divertido, e no fim da noite, fomos para meu apartamento.
...
- Sua irmã chegou bem. - falou minha mãe do outro lado da linha. Eu havia passado o dia fotografando e no fim dele, voltava para o apartamento. Decidi ligar para ela ao chegar. - Mal ficou aqui e já foi para a rua com o namorado.
- Ela é uma figura - sorri enquanto falava. - O importante é que ela está feliz.
- O que me lembra... Você e Damen, como estão? - deixei a pergunta se mover por minha mente uns segundos antes de responder.
- Nós... Bem... Ele me... Pediu em casamento. - sussurrei o finalzinho, sentando no sofá.
- Isso é incrível - minha mãe respondeu com a voz animada, mas nem tanto. - isso significa que você não volta para cá né?
Senti o tom triste em sua voz e minha garganta se fechou.
- Eu vou voltar, ou vocês virão para cá. Só me deixe conseguir um lugar seguro e agradável para todos. Logo tudo ficará bem. Não vou deixá-los.
- Eu sei, querida. Não é comigo que me preocupo. Você tem certeza de que é certo casar tão cedo? Não tem muito tempo que você e esse rapaz estão juntos.
- Você tem razão, tem pouco tempo. Mas eu aceitei... Foi o certo a se fazer.
- Sei que ele é um bom menino, mas traga ele para passar uns dias aqui novamente. Tenho que prestar atenção um pouco mais, pra saber se continua sendo bom com você.
- Ele é incrível, mãe. Fica tranquila. - falei sorrindo e ouvindo o som da tv em alguma novela que minha mãe adorava.
- Irei acreditar em você. E confiar que serão muito felizes juntos.
- Obrigada. - senti uma lágrima rolar pelo rosto e logo a limpei.
- Queria muito ter estado aí com você na formatura. Seu pai está frustrado.
- Não se preocupe com isso. Ele deve se recuperar logo. Vou arrumar uma data na minha agenda para trazer vocês pra cá um dia. Vocês vão amar San Diego.
- Ele não para de falar de como estão as coisas aí - seu humor voltou e a habitual voz doce que sempre me acalmava, como a de Isabel.
- Vou enviar algum presente para ele.
- Qualquer coisa relacionada a futebol - ela riu e eu também.
Ouvi a campainha.
- Chegou alguém aqui - avisei. - ligo depois.
- Tchau, querida. Se cuida.
- Você também. Amo-te. - falei enquanto me levantava e abria a porta para Damen. Ele estava com algo escondido às costas.
- Nós te amamos. - minha mãe murmurou antes de desligar.
- O que você tem aí? - perguntei tentando espiar e guardando o celular.
- Um presente - ele continuou parado com a postura perfeitamente ereta. Os olhos negros me fitavam com divertimento ao saber que era o único a ter conhecimento sobre o que trazia.
- Não gosto muito de surpresas e você sabe... Anda, me mostra vai. - fiz um bico, como uma criança.
Damen sorriu e retirou as mãos, revelando envelopes grandes. Olhei curiosa.
- Vamos, pegue - ele incitou e eu peguei um, abrindo rápido e olhando espantada.
Eram passagens aéreas para Londres.
Ergui os olhos para ele, incrédula.
- Você disse que queria conhecer... - Ele deu de ombros e riu alto quando pulei em seus braços o abraçando.
- Não acredito!! - exclamei, animada. Quase gritei de tão feliz que me senti. - Obrigada, Obrigada, Obrigada!!!
Damen me sustentou nos braços, passando enfim pela porta e a fechando com os pés.
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