Voltamos aquele restaurante de comida oriental, onde ocorreu toda aquela confusão com os lobisomens. Enquanto Seth e Ruby conversavam finalmente pude ter minha refeição junto com as outras duas, para falar a verdade viemos para convencer Seth a lutar ao nosso lado, mas deixamos a responsabilidade para a ex-rainha e voltamos nossa atenção para os pratos em nossa frente.
— Isso certamente é preocupante... — Seth fala após ouvir a explicação. — Então, o que vossa majestade deseja de mim? — A segunda parte da frase é falado baixo, para que as pessoas ao redor não possam ouvir.
— Já tenho um plano preparado. — Ruby continua. — Mas, para que possa acontecer, a caravana de vocês não poderá sair hoje, irão acabar me atrapalhando, além disso, ficarão no meio de um campo de batalha.
— Sim, entendo o que está querendo dizer, porém tem um pequeno problema, apesar de ser o líder, pela parte dos aventureiros, não tenho poder o suficiente para isso, talvez se falarmos com os comerciantes... — Ele pensa um pouco. — Na verdade, tenho certeza que irão entender.
— Acho que não entendeu bem o que quero dizer... — Ruby diz dando uma breve risada. — Vim aqui para lhe convidar a lutar ao nosso lado, não há ligação alguma com a caravana, eu mesma posso lidar com os comerciante, posso não ser mais uma rainha, mas posso garantir que ainda tenho influência.
Seth parece um pouco confuso com as declarações.
— Não é querendo ser grosseiro, mas... — Parece tomar coragem para falar. — Infelizmente, não vejo motivo algum para que lute ao lado de vocês.
Ruby esboça um breve sorriso de canto, aparentemente tem todo mundo na palma de sua mão, tenho a sensação de que estamos todos sendo manipulados.
— Sou alguém bem informada, sabe? Posso ter algumas coisas que lhe interesse, esses últimos tempos tenho ouvido bastante sobre um certo grupo, principalmente um cara chamado Osíris, posso te dizer que certamente é muito interessante.
Ao falar o nome de Osíris as orelhas de Seth se levantam, parece que ele acaba de cair na armadilha.
~Pov Bianca~
Nos separamos de Ruby e Seth, que foram conversar com os comerciantes, para isso não precisavam de nossa ajuda, por isso decidimos andar um pouco pela cidade, afinal, essa era finalmente nossa oportunidade de fazê-lo, além disso Alícia também parecia estar muito ansiosa.
Alícia e Ioan caminhava um pouco a frente, olhando as lojas e conversando, enquanto isso apenas o seguia. Em determinada hora acabei me perdendo em meus pensamentos, faz alguns dias que estou me lembrando dos eventos do meu passado, meus pais e Clara... sei que não deveria pensar muito nisso.
— Bianca? — Ouço a voz de Alícia.
Seguindo sua voz seus olhos se encontram com os da pequena garota.
— Bianca está ficando para trás. — Em seguida estende sua mão para mim.
Dessa forma ela realmente parece uma criança, embora seja um pouco mais velha do que aparenta. Estendo sua mão para segurar a dela, sei que é exatamente disso que preciso, não preciso prever o futuro para saber que meu destino está ligado ao deles, não preciso ficar pensando sobre, vou apenas curtir o tempo que tenho com esses dois. Neste momento minha visão acaba embranquecendo.
Essa sensação, todas as vezes que sinto algo de ruim acontece, não está ligada a nenhuma boa lembrança.
Depois de alguns segundos recuperei minha consciência. O cenário ao redor havia mudado completamente, estávamos em um local alto, mas nem tanto, algo como um pequeno morro, ao redor haviam diversas montanhas, o que deixava o morro em que estávamos ainda menor. A melhor forma de descrever seria um grande buraco, com os morros como base e a planície, que estava no centro, como o fundo do buraco. Por estranho que pareça o lugar era natural.
Estava deitada em uma parte deste morro, sabia de alguma forma que Alícia e Ioan estavam por perto, mesmo sem vê-los. Olhando ao redor entendo tudo, Ioan estava ao lado direito, enquanto Alícia estava atrás de nós, seus olhos estavam fechados enquanto murmurava algo.
— Onde nós estamos? — pergunto.
Tento falar com Ioan, mas ele parece que não consegue me ouvir, era uma visão. Nunca havia tido uma tão nítida antes.
— Isso será problemático. — Ele diz.
— Você está preocupado demais — responde Ruby.
Me assusto ao ouvir sua voz, ela estava do lado esquerdo, deitada assim como nós. Olho na direção em que todos estão olhando, era o centro do buraco, minha visão não é tão boa, então não consigo ver muita coisa, porém no canto, mais à direita, posso ver uma mancha branca andando. Aquele era o exército templário.
— Esqueceram quem está aqui? — Ruby sorri.
Minha mente começa a trabalhar, normalmente, quando tenho uma visão assim, algo ruim pode acontecer, talvez um ataque surpresa? Olho ao redor, mas não consigo ver nada de estranho, minha mente parecia quase estourar, mas antes que pudesse achar algo a visão começa a ficar clara novamente. Agora não, agora não!
— anca... — Uma voz baixa, parecia estar muito distante de mim, mas ao mesmo tempo parecia estar gritando para que chegasse próximo.
Uma voz que já ouvi antes.
— ianca...
Masculina.
— Bianca. — A voz fica muito mais alta, abro os olhos.
Estou caída no chão, Ioan está em minha frente, olhando para mim. Não sinto dor alguma, mas sinto meu corpo um pouco adormecido. Ele me ajuda a levantar.
— Vamos começar a recuar! — Ele grita. — Quero que você corra, irei te dar cobertura.
Fico perdida por algum tempo, não consigo reconhecer o lugar em que estávamos, uma grande destruição havia ocorrido. Após algum tempo lembro, estávamos no lugar onde estávamos observando antes, volto minha atenção para Ioan, em minha frente.
Acabo soltando um grito quando olho para ele.
Foi um grito de surpresa, mais do que qualquer outra coisa. Ioan estava muito machucado, mais do que ficou no fim da luta contra os homens-bestas, feridas por todo seu corpo, mas o que mais chamou atenção foi seu olho direito, que estava coberto por seu cabelo, porém podia ser visto que muito sangue escorria por baixo.
— Tenho que... — Ioan tenta falar algo, mas um som muito algo a sobrepôs sua voz.
Era um som parecido com que já tinha ouvido antes, na floresta, enquanto lutava contra os homens-bestas, o som do vento sendo cortado, porém desta vez era muito mais alto que antes. Depois deste som uma grande explosão se segue, tento olhar direção ao local, mas tudo ao meu redor perde a cor novamente, desta vez não era uma continuação da visão, apenas minha consciência esvaindo-se.
Agora a sensação desapareceu, mas mesmo assim ainda estou vendo imagens, essas agora eram de lembranças, pois meus pais estavam vivos.
Desde pequena consegui prever algumas coisas triviais, como chuvas ou mudanças no tempo, meus pais falavam apenas que tinha uma boa intuição, mas tudo mudou em uma noite, o primeiro dia em que tive uma visão de algo que iria acontecer, pude ver o que estava acontecendo, não apenas como um sonho.
Esta foi a visão da morte de meus pais, para falar a verdade, não era exatamente sua morte e sim o evento que causaria suas mortes. Quando tenho uma visão, normalmente, não consigo ver as pessoas morrendo, só percebi com o passar do tempo que esses eventos estavam ligados diretamente a morte de alguém, nas visões aparecem momentos antes ou depois da morte ocorrer, assim como quando previ Ioan aparecendo na floresta, logo depois da morte de meus amigos...
Naquela noite acordei gritando e chorando, chamando minha mãe, na visão pude ver um grupo de goblins surpreendendo algumas pessoas, meus pais estavam junto a eles.
— Filha, o que foi? — Minha mãe entra no quarto e se aproxima de mim, sentando ao lado de minha cama.
Não consigo me lembrar bem de como foi a conversa que tive com ela naquela noite, é algo que me acostumei com o passar do tempo, me esforçar a esquecer esses eventos, a única certeza que tenho é que falei sobre a visão, afinal, lembro-me dela até hoje nitidamente.
Não éramos uma família que tinha poder aquisitivo, claro, não ao ponto de passarmos alguma necessidade, graças a isso meu pai decidiu virar um aventureiro, junto com alguns de seus amigos. É senso comum que se tornar um é uma forma rápida de ganhar dinheiro, por causa disso é tão atrativo para as pessoas, mesmo tendo um risco tão grande quanto as recompensas. Minha mãe nunca foi muito forte fisicamente, então trabalhava com o farmacêutico da vila, ajudava-o a pegar algumas ervas e outros ingredientes para remédios, no entanto, não era um trabalho muito lucrativo, apesar disso era uma renda estável.
— Foi só um pesadelo. — Minha mãe passa a mão bagunçando um pouco meus cabelos. — Amanhã mamãe e papai vão sair para trabalhar juntos, mas não é algo perigoso, certo? Vamos apenas colher algumas ervas, como sempre, não irá nem perceber nossa saída de tão rápido que estaremos de volta.
Ela ficou comigo até que finalmente conseguisse voltar a dormir, como sempre costumava fazer quando tinha pesadelos, confesso que no fim não conseguir dormir, tive que fingir para que não ficássemos ambas acordadas a noite inteira.
Normalmente para colher plantas e raízes medicinais na floresta era necessário fazer um pedido a guilda dos aventureiros, uma missão de Rank relativamente baixo, mas, apesar disso, ainda um pouco difícil para novatos como meu pai, mas o farmacêutico viu uma oportunidade com meus pais, os contratou sem o envolvimento da guilda, dessa forma pagaria menos.
Na mesma tarde recebi a notícia dos sobreviventes. Foram cercados por um grupo de goblins que, apesar de não serem tão fortes, eram maiores em números, acabando com a derrota dos humanos e a morte de grande parte das pessoas que estavam no local. Fui culpada por um dos sobreviventes, um antigo amigo de meu pai que havia conversado com ele sobre mim no caminho, provavelmente brincando entre eles, afinal, não existiam muito goblins na área.
Fiquei conhecida como a garota que trazia o desastre, todos me olhavam com estranhos olhos depois daquele incidente, não conseguindo mais suportar me afastei das pessoas, porque me envolveria com alguém se no final acabarei machucando tanto o outro, quanto a mim mesma? Era assim que pensava até que conheci Clara, que me mostrou quanto é bom estar com outras pessoas e como precisava disso, porém a história se repetiu naquela floresta com os orcs, comecei a me perguntar se não é realmente verdade, talvez carregue uma maldição.
Abro meus olhos lentamente, o sentimento é diferente de quando tenho uma visão, nelas normalmente meu corpo fica mais leve, parece até que não tenho peso algum, mas agora sinto dor, está pesado, como se tivesse passado por um grande estresse físico. Olhando ao redor vejo que estamos de volta a barraca em que estamos acampando, Bianca e Ioan olhavam para mim da entrada.
— Bianca está bem? — Alícia pergunta aproximando-se um pouco.
Os dois me ajudam a sentar.
— Você está bem? — Ioan também pergunta.
— Estou...
Olho fixamente para os dois, eles são pessoas maravilhosas que me ajudaram em um dos momentos mais difíceis de minha vida, tenho certeza do que quero fazer.
— Eu tomei minha decisão — exclamo.
— Sobre?! — Ioan parece confuso.
— Vou lutar junto com vocês, essa é a minha decisão, quero continuar com vocês dois. — Os abraço.
Agora que tive a visão sei que algo acontecerá, dessa vez farei de tudo para os proteger.
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