"Virão atrás de mim. Por favor, me deixe aqui e vá embora. Você pode me matar, mas não irá muito longe" enquanto era obrigada a caminhar a frente de seu sequestrador, Sona soava em meio aos pensamentos do rapaz que bufou com seu comentário, irritando-se e manuseando Rhaast até posicioná-lo no pescoço da princesa, forçando-a cessar seus passos imediatamente se não quisesse ser cortada pela lâmina.
— Podemos tentar a sorte se você não calar a boca — e aproximando-se do corpo da mulher, ele retrucava, sentindo o nervosismo que o sonoro do coração dela denunciava — Mas me diz uma coisa — com uma ideia atingindo-o, o ceifador logo afastava sua arma do corpo da garota enquanto se colocava na frente dela, a analisando curiosamente — Você escuta meus pensamentos?
Sona, por sua vez, aliviou-se ao ter a lâmina afastada de sua pele. E assim que ouvia tal pergunta, sorria negando. Havia achado tal insinuação engraçada. Principalmente quando foi se explicar.
"Eu me manifesto em seus pensamentos. Não os leio..." rindo, ela o via franzir a testa, aproximando-se perigosamente de seu rosto, fazendo toda sua graça sumir.
— Admiro como consegue rir mesmo caminhando para sua morte. Só não sei se é por pura burrice ou deboche — jogando os ombros, ele tocava nos ombros da mesma, conduzindo-a para que tornasse a andar.
"E por que irá me matar?" olhando por cima dos ombros enquanto caminhava, ela o questionava, deixando-o pensativo.
— Porque cansei dessa vida de merda que eu tenho. Ninguém mandou ser a princesa desse inferno, senhorita. Esse é o preço para eu me libertar — suspirando, ele girava a foice em sua mão como um passa-tempo.
"De quem?" e parando de andar, ela se virava, encarando-o.
Se pudesse converter a ideia de matá-la para uma outra menos trágica, ela tentaria até seu último suspiro.
— Continua, andando — dizendo pausadamente enquanto revirava os olhos, ele apontava com a cabeça para frente, perdendo a paciência que tanto prezava manter.
"Então eu serei apenas um sacrifício?!" arquitetando dezenas de teorias em sua mente, ela exclamava, talvez sentindo suas chances aumentarem.
— Para uma muda até que você fala muito, princesinha… — e olhando ao redor, ele logo a levava para fora da trilha que seguiam, tomando o caminho que os levaria até o outro lado do continente. Não estavam perto, mas aquele caminho era o que mais facilitaria para despistar os soldados que certamente já estariam atrás deles.
"E para um assassino, você está mais para babá" zombando em sua mente, Rhaast se manifestava fazendo-o estalar os lábios "Quanta enrolação para cortar uma garganta. Pff…"
— Cale a boca — vociferando contra sua arma, ele acabava por chamar a atenção da musicista que já havia se calado, franzindo a testa — Eu não falei com você — e desviando o olhar da garota para o caminho a frente, ele via que logo se espreitariam pelas redondezas do território vastaya, tendo de focar toda sua atenção por onde pisavam ou então não terminariam bem.
"Esse caminho nos levará para onde os vastayas habitam. Eles vãos nos matar!" e reconhecendo o ambiente através dos livros que lia sobre sua terra, a garota logo exclamava, arregalando os olhos. O repúdio que aquela raça tinha pelo reinado de Ionia era grande, e se a reconhecessem as coisas não seriam legais — não que ela estivesse caminhando para um final feliz. Mas ali, certamente não pensariam duas vezes antes de matar aquela que fazia parte do governo que os exilaram do povoado ioniano.
— Eles podem tentar a sorte — sorrindo, Kayn logo passava por trás das folhagens que tomavam conta do local, abrindo caminho com sua foice — Mas vamos evitar isso — e acenando com a cabeça na direção que seguia, logo tomava a frente — Olha por onde anda. Essa raça adora pregar uma peça, além de espalhar armadilhas por todo canto. Se tentar fugir, será pior para você — assustando a menina que apenas assentiu, o rapaz logo se contentava com a resposta da mesma que fora o seguir sem emitir um ruído sequer.
Caminharam por longos minutos. Graças a sua atenção, o assassino os poupou de duas armadilhas pelo trajeto. Passaram por uma corrente d'água onde mataram a sede, mas logo prosseguiram. E foi quando o maior passava por trás de um arbusto que voltou três passos rapidamente, esbarrando na musicista e puxando-a para baixo quando escondeu-se atrás das plantas após avistar um casal andando a poucos metros dali.
"O quê?" sentindo um frio na espinha, Sona ficava nervosa ao tentar enxergar entre as folhas, conseguindo ver a movimentação extremamente perigosa que tinha próximo a eles "Ai, droga! Vamos morrer!"
— Fica, quieta — segurando firme em sua foice, Kayn fechava os olhos pensando na melhor ideia para passarem por aquele lugar, já que com o que escutava do casal o fazia pensar que não deixariam o lugar nem tão cedo ao divertirem-se na presença um do outro.
Lutar enquanto se preocupava com a garota fugindo ou sendo capturada por aqueles certamente não o deixaria focar completamente, o que o deixaria vulnerável. Então, o melhor seria evitar o encontro indesejado e esconder-se até que a área estivesse limpa.
"Se me deixasse tomar o controle, conseguiria fazer tudo isso facilmente" ciente dos pensamentos recentes de seu hospedeiro, Rhaast nunca perdia a chance de tentar influenciá-lo a ceder aos seus pedidos. Mas como sempre, o rapaz mantinha sua decisão de ignorá-lo.
— Mas que porra… — estalando os lábios, em um murmúrio ele procurava um novo caminho para seguir, só restando a opção de retroceder um pouco o que andaram ao lembrar-se da caverna rasa que notou ter próximo ao riacho que passaram. E ao encarar a garota que encontrava-se inerte, logo movia-se lentamente, levantando-se e a puxando para que o acompanhasse.
"O que vai fazer?" com medo de que os vissem, a musicista seguia os passos rápidos e silenciosos do maior, que depois de cinco minutos naquele ritmo, olhou para trás, relaxando ao ver a área limpa.
— Malditas galinhas — xingando a raça que esbarrou, impedindo-o de prosseguir, o ceifador passava a mão humana no rosto enquanto a outra apoiava sua arma no chão.
Sona, ao vê-lo irritado e xingando de tal forma, conteve um sorriso que a divertira com tal ofensa. Mas ao olhar ao redor, via-se no meio do nada.
— Vamos dar uma pausa por um tempinho. Perto daquele riacho tem uma caverna que podemos ficar até escurecer. No claro vai ser complicado, mas Zed pode esperar um pouquinho. Temos tempo — pensando alto, ele a fazia franzir a testa.
"Zed?" Sona questionou. Já havia escutado aquele nome em algum lugar, mas não se lembrava de onde.
— É, Zed. Agora me ajuda a juntar o que der pra fazermos uma fogueira — ignorando a curiosidade da princesa em seu mestre, Kayn logo passava o olhar afiado pelo local à procura de algo útil para alimentar o fogo.
Passaram o restante daquela tarde dentro da caverna. Ele analisava a princesa de ponta a cabeça e se questionava de como ela estava agindo tão normal, mesmo que soubesse que caminhava para sua morte. Isso o deixava deveras confuso e inquieto.
Seria alguma armadilha planejada de maneira sem noção? Fingir aliar-se a ele? Fingir não se importar com o destino cruel que ela tinha a sua frente?
Tal curiosidade o fazia estalar os lábios, ignorando a ideia de questioná-la diretamente sobre sua peculiar reação. Principalmente agora quando todas as vozes haviam dado um tempo para sua cabeça. Sendo assim, enquanto a via atirar algumas pedras na fogueira, levantou-se sem lhe dirigir uma palavra, deixando o lugar e fitando o céu, vendo que o sol já começava a se pôr.
Lavou o rosto nas águas correntes que passavam próximo aonde estavam, em seguida sentou-se sobre a rocha que fazia o teto da caverna. E enquanto rebobinava todo o plano, trilhando os futuros passos, Rhaast o acompanhava silenciosamente. Mas falhando ao não conseguir conter o que pensava. Ficar preso em uma maldita arma conectada ao seu hospedeiro às vezes era um tédio, e a única diversão que tinha era quando conseguia desestabilizar o rapaz.
"Vai se livrar de Zed… mas e eu? Ele te ensinou muito, Kayn. Mas o poder que você tem é graças a mim, imprestável."
— Fica quieto. Depois disso eu não vou precisar mais de você — em um rosnado o ceifador respondia à sua arma, que riu achando graça.
"Isso. Faça isso, imbecil. Talvez saia com vida… ha-ha-ha! Ou esqueceu que estamos conectados? Me destrua e parte de você morrerá comigo. Será um belo drama." comentando, o demônio não se sentia ameaçado com as falas de seu hospedeiro. Sabia que o rapaz ainda prezava a vida que tinha — por isso aquele anseio por liberdade. Sabia que a ideia de deixar a sombra de Zed o faria mais propenso a deslizes — e por isso passou a maior parte do tempo sem questioná-lo sobre tal decisão rebelde. Kayn resistia ao ceder o controle, mas o Darkin pensava que parte também era por conta do rapaz ser aliado do mestre das sombras. Sem Zed no caminho, as coisas certamente se facilitariam. E o jovem era tolo por pensar que resistiria sozinho ao demônio que se hospedava em seu corpo. Era apenas uma questão de tempo. E enquanto isso, Rhaast continuaria o atormentando com tais comentários, nunca deixando de tentar antecipar tudo aquilo.
— Cala a boca, porra! — vociferando ao sentir sua cabeça doer. Sem querer, Kayn começava a perder o controle, colocando a cabeça entre as mãos e sentindo o lado tomado pela arma esquentar, o que acontecia quando ele passava por tais momentos de descontrole.
"Eu poderia fazer isso se você não ficasse constantemente fazendo idiotices. Mas… caralho, Kayn. Você é um inútil. Talvez quando entender o sentido de viver e ver que você não tem mais lugar nesse mundo, se entregue logo. Porque puta que pariu…" frases do tipo eram e continuavam a ser ditas nos pensamentos do rapaz que encolhia-se enquanto lutava contra o demônio dentro de si “Seria mais fácil essa princesa te matar sem exitar do que você com ela”
E quando não conseguia aguentar mais, Kayn precisou extravasar. Do contrário, se guardasse aquilo seria pior, pois seria como um ponto a mais para sua arma, que a cada perda de controle, ganhava mais chances de se apossar do corpo do assassino, que gritou com toda sua força, surrando a rocha com a mão demoníaca e tentando restaurar sua respiração ofegante logo em seguida. Abrindo os olhos e fitando o céu alaranjado.
Por um instante, sentiu seu interior se revirar. Uma sensação horrível o tomava ao sua garganta doer após o rugido, junto a vontade de chorar que prendia.
Quando em bom humor, considerava que aqueles momentos eram a tortura consequente de seus pecados. Mas ali, instável, ele questionava o motivo de ter sido tão amaldiçoado assim. E ao apoiar-se sobre as coxas, ofegante, quase teve um novo descontrole ao uma voz surgir em sua cabeça.
"O que aconteceu?" a doce voz da musicista soava entre seus pensamentos, e aquilo foi um gatilho para sua postura se desfazer perante a garota que arregalou os olhos ao ele virar-se em sua direção.
— Para de falar, por favor — com o olho carmesim perdendo o brilho e voltando ao normal, o rapaz pedia, colocando as mãos sobre os ouvidos e negando com a cabeça — Sai da minha cabeça.
Não sabendo o que havia acontecido, Sona pensou em retrucá-lo. Mas vendo o estado daquele em sua frente, apenas o obedeceu, deixando-se agir pelos instintos ao tentar acalmá-lo; tocando no ombro do rapaz e assustando-se com o calor que ele emanava em sua pele. E ao Kayn subir o olhar para ela, a via apontar com a cabeça para a caverna que estavam se abrigando, logo gesticulando para se pronunciar, fazendo-o entender:
"Venha, fique aqui dentro. Pode ter chamado atenção de alguém."
E assim que o via se escorar na parede da caverna fechando os olhos, ela aguardou pacientemente até que ele voltasse a encará-la e vê-la gesticular suas falas.
"O que aconteceu com você?" assustada, a Buvelle observava o rapaz que vendo a expressão em seu rosto, franziu a testa, ainda irritado com tudo a sua volta.
— Eu vou te matar. Por que está agindo assim? — dando um passo na direção da garota, ele a fazia recuar outro. Não escondendo o medo que estava passando naquele momento, mas também não deixando de respondê-lo.
"Independente do que fizer comigo, não mudará minha essência. Eu vejo algo em você que vai além de um assassino." comprimindo os lábios ela delatava para aquele que apenas riu concordando.
— E está certa, princesa. Sou um hospedeiro fodido para esse caralho de demônio que tenta possuir o meu corpo.
Ouvindo aquilo, Sona assustou-se em como ele se descrevia. Como assim, hospedeiro? Demônio? Possuir? O quê?!
Tantas perguntas se formavam em sua cabeça que a deixavam nervosa. Mas vendo-o daquela forma, resolveu calar-se. Certamente aquele interrogatório não ajudaria a ele se acalmar seja lá pelo que fosse que estivesse passando. E com certeza, testaria sua vida.
"Tente descansar... Não sei para onde iremos, mas como ainda estamos próximos dos vastayas, precisaremos de bastante atenção ainda…" e franzindo a testa, ela lembrava-se de que ele não havia se apresentado "Aliás, qual seu nome? Você não disse." sentando-se no chão onde estava antes, a menina o via a encará-la com os olhos cerrados. Mas logo a respondia, sentando-se do lado paralelo ao dela.
— Kayn. Shieda Kayn.
Fechando os olhos, ele dava fim àquela conversa, escorando a cabeça na parede e apoiando a foice sobre o chão. O final da tarde de ambos havia sido daquela maneira. A musicista quem acabara dormindo após todo aquele estresse, enquanto ele ficou alternando a atenção entre ela e o lado de fora, calculando quando poderiam tornar ao caminho. Kayn tinha um acordo com seu mestre que havia um prazo de cinco dias para se cumprir. Caso contrário, o aprendiz falharia em seu objetivo de mostrar-se superior àquele que lhe ensinou. Zed sabia por onde Kayn andava. Tinha sombras por todos os cantos de Ionia, e assim que o prazo vencesse, não hesitaria em colocar fim na vida da garota ele mesmo, assim como na de seu querido aprendiz que sabia muito bem disso, mas que não era tão previsível e desequilibrado como era a um tempo atrás.
Shieda Kayn poderia ser seu pupilo. Poderia carregar um darkin dentro si. Mas o que nenhum dos dois males sabiam, era da ambição e ira caminhando lado a lado com o ceifador, que no momento certo, deixaria tudo explodir.
Até lá, levaria aquela missão a frente. Era o que ele esperava.
CONTINUA
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.