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História O Veneno Que Não Mata - Medo - História escrita por lilcyjn - Spirit Fanfics e Histórias
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História O Veneno Que Não Mata - Medo


Escrita por: lilcyjn

Capítulo 3 - Medo


Quando Damian voltou para que terminassem a gravação, o vermelho na visão de Taehyun já estava mais ameno, e seu corpo estava anestesiado o suficiente para que não se importasse tanto em repetir os mesmos versos várias vezes, ou em receber as críticas infundadas de sempre. Mesmo que fosse cansativo, sua mente ainda estava presa na sensação de ter alguém com interesse genuíno observando sua arte, e isso continuou sustentando o seu humor até o final do dia.

Fazia quantos anos desde a última vez que havia se sentido assim?

Foi tão bom que ele quase esqueceu que Damian continuava sendo uma praga em sua vida.

Além disso, ainda pensou sobre a banda Dawn Kiss e na possibilidade de eles assinarem com aquela porcaria de gravadora. Taehyun tinha avisado a Kai que não deveriam ouvir qualquer coisa que Damian falasse, mas não sabia o que realmente aconteceria, afinal, era fácil ser enganado por aquele filho da puta.

Mas, de qualquer forma, Taehyun já tinha problemas demais para se preocupar. Ele se lembrou disso quando voltou para casa e Damian segurou com força em seu braço, deixando bem claro que ainda teriam muito a melhorar na porcaria do single novo. O inferno ainda estava ali, então precisou fazer esforço para que não enlouquecesse de vez e tentasse cometer mais um crime.

Por isso, quando deitou na própria cama, decidiu pegar o celular e os fones e abriu o Youtube para se distrair. Ele começou a rolar a tela principal até que, curiosamente, apareceu uma entrevista da Dawn Kiss, e Taehyun clicou nela sem pensar duas vezes. Depois da intro do vídeo, os quatro membros apareceram sentados ao lado da entrevistadora, sorrindo com animação. Todos estavam vestidos com roupas rasgadas e estilosas, mas Taehyun não conseguiu tirar os olhos de Kai, suspirando ao se lembrar de como ele foi tão atencioso durante a tarde.

As perguntas eram bobas, mas Taehyun assistiu aos quinze minutos com bastante interesse. Os garotos tinham idades muito próximas da sua, alguns até mais velhos, porém era como se fossem muito mais novos pelo jeito apaixonado que falavam sobre a carreira deles. E não pôde evitar de sorrir sempre que Kai dizia alguma besteira e fazia os outros rirem, pensando que não deveria ter sido tão grosseiro mais cedo.

Eles eram apenas jovens que gostavam de fazer música e procurar por algumas encrencas, nada de errado. Taehyun até riu lembrando da cara de pau que eles tiveram ao tentar roubar o uísque, mesmo que tenha sido uma situação completamente estressante. No fundo, Taehyun também queria estar aproveitando assim, como uma pessoa comum de sua idade. A forma como eles interagiam era entusiasmante, e isso fez com que tivesse vontade de procurar mais sobre a banda.

Por isso, Taehyun abriu o Instagram da Dawn Kiss, vendo que a primeira postagem era sobre a agenda de shows do mês. Eles realmente estavam indo bem pela quantidade absurda de lugares que estavam passando, toda semana em um local novo além de vários sold out. E só então percebeu que nunca havia assistido um show ao vivo deles, ou escutando mais que três músicas. Seu interesse aumentou ainda mais, e Taehyun se viu imerso no Spotify deles, ouvindo o único álbum autoral que tinham.

Assim, foi fácil entender o porquê Damian estava tão interessado na banda; eles seriam um pote de ouro naquelas mãos sujas. As músicas eram viciantes e profundas, um equilíbrio perfeito de produção e autenticidade, e, como extra, os quatro garotos eram lindos.

Taehyun sentiu uma vontade absurda de vê-los ao vivo, então voltou para o Instagram e procurou pela agenda de shows novamente, se surpreendendo ao perceber que tinham um show marcado no dia seguinte. Começaria às dez da noite, e seria em um espaço grande no fim da cidade, onde Taehyun já havia feito algumas apresentações.

Ele pensou um pouco sobre a possibilidade de ir, porém o horário não era tão favorável assim. Damian ainda estaria acordado e dificilmente o deixaria sair sozinho, já que continuava paranóico com sua possível tentativa de suicídio. Seu sangue inevitavelmente ferveu, mas ele não queria ficar abalado ou chorar por conta disso de novo. Porra, Taehyun só queria que tudo explodisse! Todas as vezes que sentia vontade de fazer algo, Damian sempre estava lá para foder com sua alegria e tornar seu mundo vermelho de novo.

E, enquanto estava queimando de raiva interna, Damian apareceu em seu quarto com o semblante cínico dele, como se fosse um dia normal dentro de um relacionamento tranquilo. Taehyun realmente o odiava, cada parte de seu corpo tremia só de olhar para ele.

— Não adianta olhar assim para mim, passarinho. — Damian disse, sorrindo, e foi procurar algo em seu armário sem sua permissão.

Taehyun quis xingar de volta, mas não estava com saúde para mais uma discussão, afinal, ele sempre perderia, não importava quais fossem os argumentos. Porém, dessa vez, quis fazer diferente. Mesmo que não naquele momento, mas Taehyun queria poder fazer da vida dele um inferno também.

Então apenas deitou na cama, e decidiu que iria ao show da Dawn Kiss no dia seguinte, nem que, para isso, tivesse que pular o telhado ou cometer outro crime. Seu coração acelerou e ele ainda demorou a dormir, pensando em algumas possibilidades de fugir daquela prisão que chamava de casa.

Era muito incerto, porém ele faria isso, independentemente das consequências.

Disso, não tinha dúvidas.

 

 

 

 

Dias de show sempre deixavam Kai hiperativo. Ele simplesmente não conseguia ficar dentro do camarim, e começava a andar por todos os cantos até que encontrasse algo que prendesse sua atenção por, pelo menos, alguns minutos.

Era comum que chamasse alguém para ir com ele, mas, naquela noite, ninguém quis, então decidiu ir sozinho até as coxias só para dar uma olhada em como a casa de shows estava, sorrindo largo ao ver a plateia lotada. Ainda faltava uma hora para o início do show, mas os fãs sempre chegavam extremamente cedo para que não perdessem um bom lugar. Era loucura pensar que todo aquele esforço era por amor a Dawn Kiss, e toda a admiração que recebia o deixava com mais vontade de mostrar o seu melhor para todos ali.

Ele sabia que os outros membros também se sentiam dessa forma, e era por isso que estavam indo tão bem. Os quatro garotos amavam o que faziam com a maior sinceridade do mundo, e não havia coisa alguma no mundo que os impediriam de crescer cada vez mais.

— Kai! — Ouviu Yeonjun gritar, e se afastou da beira da coxia, olhando para o amigo.

Ele estava longe, sinalizando com a mão para que fosse até onde estava, então Kai andou pelos fios infinitos no chão, tentando desviar deles naquela escuridão atrás do palco até chegar onde Yeonjun estava.

— O que rolou?

— Você não sabe quem apareceu aqui. — Yeonjun sorriu, e Kai franziu o cenho.

— Quem?

— Vem cá.

Yeonjun segurou seu pulso e praticamente o arrastou pelos corredores cheios de staffs para que voltassem até o camarim. Kai quase tropeçou pelo caminho, se perguntando quem diabos fez Yeonjun ficar tão animado assim, porém entendeu a ansiedade dele quando viu Taehyun no camarim, conversando com Soobin e Beomgyu.

Taehyun olhou na direção da porta, e quando ele e Kai se encararam, foi como se tivessem se visto pela primeira vez de novo. Taehyun parecia diferente, com o semblante um pouco mais relaxado que das outras vezes que se encontraram. Kai até mesmo pensou que estava delirando quando o viu sorrir, sentindo sua respiração ficar mais pesada.

— Ele queria falar com você. — Yeonjun disse, empurrando seu ombro de leve.

Kai ainda ficou estático por mais alguns segundos antes de começar a andar, não sabendo como suas mãos começaram a suar tão rápido, ou como suas pernas tremeram com tão pouco, mas sua curiosidade era maior que qualquer coisa naquele momento.

— Oi, Taehyun. — Falou, sorrindo. — Eu não sabia que você viria hoje.

— Foi de última hora, mas também fiquei interessado no trabalho de vocês. — Respondeu. — E eu queria pedir desculpas por toda a grosseria dos últimos encontros. Eu não estava com a cabeça no lugar e acabei descontando em vocês, mas espero que isso mude.

— Não precisa se desculpar, de verdade. — Negou com a cabeça. — Já passou, né?

— Eu, o Gyu e o Soobs vamos ali pegar os microfones e já voltamos. — Yeonjun os interrompeu, empurrando os outros dois para fora do camarim antes que alguém protestasse. Kai riu, porque sabia exatamente o que ele estava fazendo, mas não interferiu.

— Kai… — Taehyun voltou a falar quando ficaram a sós. — Vocês não aceitaram o contrato com a gravadora, né?

— Não, aquele contrato realmente é uma armadilha. Mas estamos querendo propor um contrato pessoal para ele, com nossos termos e condições. Se Damian não aceitar, então procuramos outro lugar.

Taehyun franziu o cenho, parecendo incomodado, mas apenas assentiu.

— Acho difícil ele aceitar algo assim, mas entendo a tentativa. — Respondeu. — Espero que aconteça o melhor pra vocês.

— Obrigado. — Sorriu. — Eu ainda tô surpreso de te ver aqui.

Taehyun sorriu também, mas respirou fundo como se tentasse aliviar o aperto em seu peito.

— Eu comecei a pesquisar mais sobre a Dawn Kiss ontem, e gostei muito, então quando descobri que teria um show hoje, senti muita vontade de vir. Eu nem avisei a ninguém. — Riu. — Inclusive, eu gostaria que vocês não comentassem que eu apareci aqui hoje.

Kai estranhou, mas decidiu não questionar.

— Tudo bem, vou falar com os meninos. — Concordou. — Ainda falta um tempinho pro show começar, você quer uma água?

— Eu quero. — Sorriu com certa timidez.

Mas a verdade era que Taehyun estava completamente perdido ali.

Ele havia aproveitado o momento em que Damian foi tomar banho para fugir com as roupas do corpo como se estivesse saindo de uma prisão, e, mesmo que a analogia não fosse tão absurda, ainda sentia que estava fazendo algo muito proibido. Taehyun também desligou o celular para que Damian não chegasse perto de saber onde estava, portanto não tinha nada além dele mesmo ali, tendo que fingir que tudo estava na mais perfeita ordem.

Sua respiração estava pesada e seus sensos estavam em alerta, como se algo fosse dar errado a qualquer momento. Ele estava acostumado com sua vida desandando o tempo inteiro, por isso ter um momento de euforia parecia a queda antes de bater contra o chão.

— Taehyun? Aqui a água. — Kai disse, e só então ele percebeu que havia se perdido dentro da própria cabeça.

— Obrigado. — Agradeceu, pegando a garrafa plástica e a abrindo.

— Eu… eu queria fazer uma pergunta, mas tudo bem se você não quiser responder, ok? — Kai voltou a falar, coçando a nuca.

— Tudo bem, pode perguntar. — Assentiu, já imaginando sobre o que se trataria.

— O que tem de tão ruim em Damian? Eu sei que ele não é flor que se cheire, mas o quanto isso é verdade? — Foi direto, deixando sua curiosidade completamente à mostra.

Taehyun bebeu mais um gole d'água, pensando sobre como responderia àquela pergunta. Óbvio que não havia tanto assim a esconder, afinal, suas reações ao falar do contrato já tinham deixado bem claro que Damian era uma pessoa horrível, mas ainda era difícil de colocar em palavras.

— Ele é o tipo de pessoa que não sente remorso. — Começou, com seriedade. — Damian só pensa em dinheiro e no próprio ego. Ele não tem interesse na Dawn Kiss, ele tem interesse no sucesso e no dinheiro que vocês vão dar a ele. E pode ter certeza que ele vai fazer de tudo para se manter no topo.

Kai ouviu com atenção, já que não precisava de mais para que entendesse o que ele queria dizer. A indústria musical era cruel, e grandes empresários sempre seriam a maior chaga dentro daquele meio.

Tudo o que podiam fazer era tomar cuidado.

— Então o relacionamento que vocês mostram em público não passa de encenação, certo?

— Eu diria que é mais um instinto de sobrevivência. — Suspirou. — Eu seria massacrado se algo andasse fora da curva.

— Tudo isso por causa de um contrato?

— Exatamente.

Kai trincou a mandíbula, ainda mais incomodado.

— Ele sabe que você tá aqui hoje? — Perguntou, ligando alguns pontos.

— Não. Inclusive, ele deve estar maluco por não saber onde eu tô agora. — Riu. — Eu nem sei o que vai ser de mim, mas não me arrependo de ter vindo.

— Então vou fazer questão de apresentar o melhor show da sua vida hoje. — Disse, com toda firmeza que tinha em sua voz.

— Depois de ter visto mais do trabalho de vocês, eu não duvido. — Sorriu.

Kai sorriu também, apesar de ainda estar sentindo raiva por tudo que Taehyun vinha passando. Ele tinha noção de que a situação era bem mais profunda do que o que havia ouvido até agora, mas fez o que pôde e tentou mudar o assunto para que ocupasse a mente de Taehyun também.

E como ele estava curioso para saber mais sobre a Dawn Kiss, Kai se animou para contar mais sobre como haviam começado e algumas curiosidades sobre a banda. Taehyun ficou surpreso quando Kai começou a fofocar sobre Yeonjun, Soobin e Beomgyu, dedurando a relação estranha dos amigos, confiando que Taehyun manteria aquilo em segredo assim como sabia que guardaria o segredo dele também.

Os dois conversaram até Yeonjun abrir a porta de novo, avisando que o show logo começaria e precisariam se arrumar para entrar.

— Bom show, Kai. Vou estar assistindo das coxias. — Taehyun disse, sorrindo e parecendo estar bem mais leve.

— Obrigado, Taehyun. Espero que você possa subir no palco com a gente algum dia também. — Respondeu, sendo completamente genuíno. — Aproveita!

E isso fez o coração de Taehyun bater na velocidade da luz, olhando para Kai com emoção nos próprios olhos. Era uma sensação nova, tão boa que quase ficou assustado. Mas ele não queria pensar em coisas ruins naquele momento, pois precisava aproveitar como se o mundo fosse acabar à meia noite.

Assim, foi com um dos staffs até a parte onde assistiria o show com um sorriso incomum no rosto. Era difícil lembrar a última vez que ficou tão feliz assim, não imaginando que um dos principais motivos para isso fosse o garoto que poderia ter morrido envenenado por sua causa. Taehyun queria agradecer Kai em vez de se desculpar, mas, de alguma forma, sentia que não precisava fazer isso com palavras. Ele parecia ser uma pessoa compreensiva, o que era bom, porque Taehyun não sabia se conseguiria expressar sua gratidão tão bem.

E toda essa gratidão duplicou quando a banda subiu ao palco, carregando uma energia única e autêntica. Taehyun não costumava escutar rock, mas se animou muito desde a primeira música como se fosse um ouvinte assíduo do gênero.

Ele desejou poder ser uma das pessoas na plateia só para sentir o calor da multidão gritando pelo mesmo artista, porque aquela adrenalina era uma experiência inconfundível e que não poderia ser encontrada de outra forma, e Taehyun tinha certeza de que seria difícil ficar tão eletrizado com qualquer outra coisa. Mesmo assim, assistiu o show inteiro como uma criança visitando um parque de diversões pela primeira vez, cantando e pulando como se tudo ali fosse uma grande novidade.

Taehyun quis ter gravado também, mas sabia que nenhuma foto e nenhum vídeo seria capaz de traduzir todos os arrepios em seu corpo, principalmente quando Kai olhou em sua direção e sorriu, quase como se perguntasse o que estava achando. Seu coração bateu na mesma frequência que a caixa de som, e Taehyun sorriu de volta para deixá-lo ciente de que aquele show estava sendo muito mais do que poderia explicar.

Afinal, a música era mágica em seu estado mais puro. Era o conforto em dias ruins. Era a grande salvação para sua alma quebrada.

Era o maior amor de sua vida.

Como poderia ter se esquecido disso?

 

 

 

 

Taehyun não queria voltar para casa, é claro. Depois de se sentir tão vivo, era difícil não querer morar naquele momento lindo.

Era quase uma da manhã, e ele ainda estava na casa de show, sentado no chão do camarim com os membros da Dawn Kiss, conversando e dividindo uma cerveja quente com eles. Estava tão divertido, que se esqueceram completamente do que havia acontecido da última vez, ou sobre o contrato com Damian. Parecia que eram apenas amigos em uma madrugada qualquer, falando besteira e rindo.

Porém a realidade voltou com tudo quando os organizadores avisaram que precisavam voltar para casa. Taehyun tinha certeza que não havia conseguido esconder o pesar em seu rosto pela preocupação com que Kai olhou para si.

— Você tem como voltar? — Kai perguntou.

— Não. — Riu. — Eu vim de Uber, mas desliguei o celular assim que saí de casa.

— A gente pode te dar carona. — Ofereceu.

— Vocês não voltam com o manager? — Ficou impressionado.

— Ainda não temos um. — Riu. — Nosso contrato é temporário com a gravadora que estamos agora, e nós podemos assinar com o outro assim que essa onda de shows acabar. Toda a equipe de organização é temporária também.

— Que loucura. — Taehyun respondeu, quase não acreditando. — Se organizar desse jeito deve ser difícil.

— Por isso estamos procurando por uma empresa decente. — Respondeu. — Mas é melhor continuar assim enquanto não encontrarmos algo definitivo.

— Vocês têm razão. — Concordou. — Se não for incomodo, eu aceito a carona.

Kai fez questão de falar que estava tudo bem, e os outros também garantiram que não tinha problema algum, então eles seguiram até o carro estacionado na área reservada para artistas. Taehyun ainda estava tão confortável, que não sentiu timidez por estar ali com eles pelo caminho de volta.

E sentar ao lado de Kai no banco de trás também foi divertido. Taehyun não entendia muito bem por que, mas estava gostando da sensação boa em seu coração de estar ao lado dele.

Porém tudo que era bom, durava pouco em sua vida.

Ele quase chorou quando parou na frente de seu condomínio, sentindo vontade de implorar para que eles o levassem para qualquer outro lugar, mas apenas abriu a porta do carro com um sorriso forçado.

— Obrigado por hoje, vocês são incríveis. — Disse, vendo eles sorrirem também.

— Você também é! — Yeonjun respondeu. — Vamos nos encontrar de novo.

— Verdade! Me passa seu número, Taehyun. — Kai pediu, estendendo o celular.

Taehyun ainda pensou se deveria ou não, mas terminou salvando seu contato no celular dele, esperando que isso não fosse causar problemas mais tarde, e se despediu com o coração pesado.

A madrugada estava fria, e o caminho da portaria até a sua casa foi coberto por um silêncio que poderia lhe engolir a qualquer momento. Bom, Taehyun gostaria que algo realmente o engolisse, assim não precisaria voltar para Damian, mas quando percebeu, já estava na porta de sua prisão novamente.

Ele digitou a senha e segurou a maçaneta sem rodeios, respirando fundo ao entrar. As luzes estavam apagadas, o que lhe fez ter um pouco de esperanças de que poderia dormir em paz.

Porém era ingênuo de sua parte pensar que Damian deixaria aquilo passar em branco.

A luz da sala logo foi ligada por ele, que estava segurando um copo de vidro com um líquido dourado dentro, que provavelmente era uísque. Taehyun engoliu em seco, mas não desviou o olhar ou demonstrou medo enquanto ele se aproximava.

— Onde você estava? — Foi a primeira pergunta.

— Não interessa.

No segundo seguinte, o copo voou em sua direção.

Seu reflexo o fez se abaixar, então tudo que ouviu foi o barulho do vidro se tornando vários cacos no chão. O cheiro forte de álcool também se espalhou, e o corpo de Taehyun tremeu com medo.

Não era a primeira vez que aquilo acontecia, mas tinha certeza de que não seria a última pelo jeito que Damian chegou bem perto e segurou seu rosto como de costume, o apertando para que Taehyun olhasse bem para ele.

— Não interessa? — Riu alto. Ele estava visivelmente alterado, pois, apesar da firmeza que segurava suas bochechas, sentiu que as mãos dele estavam tremendo. — Seu merdinha, quem você acha que é para sair assim? Você quer morrer, é isso? Quer tentar se matar de novo?

— Eu prefiro morrer do que continuar aqui. — Respondeu com dificuldade, sentindo as lágrimas subirem. — E se você me odeia tanto, por que não me mata logo? Você não pode, né? Você precisa de mim.

Talvez fossem as cervejas que havia tomado mais cedo, porém Taehyun sentiu aquela coragem perigosa queimar por toda sua corrente sanguínea.

— Você que precisa de mim! — Damian gritou, chegando a cuspir em seu rosto. — Você não é ninguém sem mim!

Mas Taehyun nunca havia acreditado em qualquer uma daquelas palavras. Ele sabia que Damian morria de medo de perdê-lo.

— Então vá em frente, me mate! — Gritou de volta.

— Eu vou te matar por dentro. — Ele respondeu, agora mais baixo e ameaçador. — Eu vou fazer você perder o resto de esperança na humanidade. E você sabe que eu consigo.

— Eu já perdi, não tem absolutamente nada dentro de mim por sua causa. — Respondeu, tentando desviar no toque, mas Damian levou a outra mão até o seu cabelo e o apertou com força.

— Continue assim. — Disse, aproximando ainda mais o rosto de Taehyun. — Continue quieto, e não saia da sua gaiola. Se eu te prendi aqui, é porque não quero que você saia. Vou deixar isso passar hoje, mas não ache que eu vou deixar barato na próxima vez, entendeu?

Taehyun quis retrucar, porém sabia que não valeria a pena. Ele preferiu ficar calado e fechar os olhos, apenas assentindo com a cabeça, imaginando as dores que sentiria depois. Em seguida, Damian o soltou com força, e Taehyun caiu de vez no chão como se estivesse quebrando assim como os cacos de vidro atrás dele.

— Tome um banho e vá para o meu quarto, vou ter que redobrar minha atenção em você. — Damian disse por fim, e deixou Taehyun sozinho na sala, vendo tudo ao seu redor na cor vermelha novamente.

Até quando?, pensou, mas sentiu, pela primeira vez, que sua liberdade não estava tão longe assim. Alguma coisa, no fundo do seu coração, estava gritando para que enxergasse a resposta bem na sua frente, e ele faria tudo para que a conseguisse de vez.

Afinal, Damian também tinha medo dele. Tudo que precisava era acreditar nisso de verdade.

 

 

 

 

Três dias depois, Damian entrou em contato com a Dawn Kiss para que marcassem uma reunião, assim poderiam conversar melhor sobre o contrato. Esse foi o tempo que Soobin levou para falar com a irmã, que era advogada, para que preparassem um contrato próprio em tempo recorde. Ela já tinha alguns modelos prontos, e só precisaram de uma reunião para que ajustassem os termos e condições.

Quando tudo ficou pronto, esperaram o dia certo para que fossem até a gravadora. Nenhum deles estava esperançoso sobre isso, mas não tinham absolutamente nada a perder, então apenas confirmaram a data e se prepararam para a reunião. Soobin estava mais tranquilo agora que todos haviam entrado em um consenso sobre Damian, então não havia muito com o que se preocupar. Eles combinaram que Yeonjun tomaria à frente na conversa por ter a melhor lábia, e partiram em direção à empresa.

E, dessa vez, quem admirou melhor o local foi Yeonjun e Soobin por ser a primeira vez dos dois ali, e por estarem acostumados com a gravadora pequena que estavam alocados.

— Se aquele lá não tivesse o caráter duvidoso, eu assinava o contrato de olhos fechados. — Yeonjun disse quando entraram. — Por falar em contrato, eu acabei esquecendo o nosso no carro.

— Não acredito nisso. — Kai balançou a cabeça, rindo. — Volte pra pegar.

— Que merda. — Yeonjun riu também, enfiando a mão no bolso de Soobin para pegar a chave do carro.

Ele costumava fazer isso com frequência, e Soobin amava aquela intimidade.

— Vamos falar com a recepcionista. — Kai apontou para o balcão, onde uma funcionária diferente estava sentada.

— Dessa vez não teremos problemas. — Beomgyu disse, rindo.

E, de fato, foram liberados para subir sem dificuldades. Eles caminharam até o elevador e o esperaram chegar no térreo, porém, antes de entrarem, Kai chamou atenção deles.

— Vão na frente, acho que eu vi Taehyun ali. — Disse, já se afastando.

— Ei, espera… — Soobin tentou impedi-lo, mas Kai apenas andou em direção a parte interna sem olhar para trás, acenando para Taehyun.

— Ele vai terminar se apaixonando de verdade, e isso vai ser péssimo. — Beomgyu disse, negando com a cabeça.

— Acho que ele se apaixonou quando Taehyun gritou com ele naquele dia do uísque. — Soobin riu. — O coração de Kai sempre foi meio esquisito.

— Pior que é.

Eles ainda olharam para ver se Yeonjun voltaria logo, mas como o elevador estava prestes a subir de novo, decidiram entrar para procurar a sala primeiro. Soobin apertou no botão do sétimo andar e se olhou no espelho para ver como estava a própria aparência. Em seguida, inconscientemente olhou para Beomgyu, que parecia preso no próprio mundinho como de costume.

Não era comum que ficassem no mesmo lugar assim, por isso o silêncio pairou entre eles. Soobin ainda achava estranho o fato de não serem tão próximos um do outro, mesmo que fizessem parte da mesma banda há anos, porém não tinha como evitar. Ele não conseguiria se aproximar muito, mesmo que quisesse.

Afinal, só de olhar para Beomgyu, Soobin se lembrava de Yeonjun e de tudo que nunca conseguiria ser para ele, o que tornava ainda mais difícil engolir o gosto amargo que constantemente o assombrava.

— Soobin, acho que a gente tá preso. — Beomgyu disse com a voz tranquila de sempre.

— O quê? — Perguntou, pensando ter ouvido errado.

— Ali, o número parou no sexto andar. — Respondeu, apontando para a tela em cima da porta. — Já passou mais tempo do que o normal.

Soobin olhou para a tela e depois para Beomgyu por mais alguns segundos, só então entendendo o que estava acontecendo.

— Aperta no botão de emergência. — Soobin pediu, respirando fundo. — Vou mandar mensagem pra alguém.

No entanto, antes mesmo que Beomgyu conseguisse apertar no botão, as luzes apagaram de repente.

— Que merda… — Soobin bufou, pegando o celular. Por sorte, assim que o desbloqueou, viu a foto de Kai na tela. — Kai tá me ligando. Alô?

— Soobin, faltou luz no prédio. — Kai disse. — Estão tentando ajeitar isso aqui.

— Tem alguma previsão pra voltar ao normal?

— Não, mas eu vou avisando. Tá tudo bem aí?

— Sim, eu acho. Só tá escuro pra caralho e provavelmente vai começar a fazer calor. — Soobin suspirou.

— Aguentem firme, talvez não demore tanto.

— Beleza.

A ligação foi encerrada, e Soobin acendeu a lanterna para que não ficassem mergulhados no escuro do elevador. Beomgyu continuava do mesmo jeito de sempre, como se nada demais estivesse acontecendo, apenas olhando para os pés e balançando a cabeça levemente ao som de absolutamente nada.

Soobin decidiu sentar no piso por não saber quanto tempo ficariam ali, e Beomgyu também o fez, dobrando as pernas e respirando fundo. Eles não tinham nada para falar, mas depois de alguns minutos, o silêncio entre eles se tornou desconfortável, como se o pouco ar ali dentro gritasse para que alguém falasse qualquer coisa que quebrasse o gelo incômodo.

Nesse momento, Soobin pensou que Yeonjun faria loucuras para estar no seu lugar. Seria o sonho dele ficar preso no mesmo lugar que Beomgyu sem que ele pudesse fugir, como normalmente acontecia.

Mas era Soobin ali, e não Yeonjun.

E quem estava com vontade de sair correndo era ele.

— Você não tem problema com lugares fechados, né? — Beomgyu perguntou, o surpreendendo.

— Não, eu tô de boas. Você também?

— Uhum.

A quietude tomou conta de novo, e Soobin lembrou do porquê era tão difícil tentar decifrá-lo.

Soobin nunca sabia o que se passava dentro da cabeça dele, mesmo que Beomgyu fosse uma pessoa aberta para todos os tipos de assuntos. Ele era calado, mas não tinha problemas em conversar ou falar em público. Ele tinha um olhar perdido, mas suas palavras eram sempre firmes. Ele parecia óbvio, mas sempre surpreendia as pessoas ao seu redor quando se mostrava de verdade.

Beomgyu conseguia ser tudo e nada ao mesmo tempo.

E enquanto Yeonjun, para Soobin, era o presente, Beomgyu era algo muito além de um passado ou futuro. Ele era como um relógio quebrado, que fazia o seu tempo parar completamente, se é que isso fazia algum sentido. No fundo, Soobin se sentia sufocado pela curiosidade de entender o que tinha de tão especial nele que justificasse a obsessão de Yeonjun.

Mas ainda parecia impossível ver através daquela confusão.

— Pode falar, Soobin. — Beomgyu disse, o pegando no flagra. — Dá pra ver que você tá segurando alguma coisa aí dentro.

— Não é nada que você já não saiba. — Foi sua vez de olhar para os próprios pés, tentando agir de forma indiferente.

— Mas parece que é algo que você não sabe. — Rebateu. — E é por causa do Yeonjun.

O jeito que ele afirmou a última parte fez Soobin querer arrancar a pele do próprio rosto. Esse tópico rodeava sua cabeça todos os dias, mas parecia intocável quando precisava verbalizar, como se fosse um segredo profundo. Era tão óbvio assim?

— Independente do que eu não sei, não tem o que fazer. — Respondeu.

— Não seja assim, Soobin. — A voz dele era sincera, e parecia até preocupada. — Ninguém tem culpa nisso.

— Essa é a pior parte, eu não tenho a quem culpar. — Riu da própria desgraça. — Mas é só uma questão de tempo até Yeonjun começar a gostar de outra pessoa, então eu vou conseguir superar.

— Uma questão de tempo? — Beomgyu o olhou como se fosse uma piada. — Já fazem cinco anos.

E, sem dúvidas, o tempo nunca passaria para Soobin, afinal, Beomgyu era o seu relógio quebrado. Enquanto ele estivesse ali, as coisas nunca mudariam.

— E o que eu posso fazer? Eu gosto daquele merda mais do que cabe no meu peito. — Desabafou, já que não tinha motivos para não falar.

— Ele também gosta de você.

— Não do mesmo jeito que ele gosta de você. — Suspirou. — E Yeonjun vive em Marte. Talvez até Júpiter ou em Saturno que são mais distantes. A cabeça dele tá muito longe pra me ver bem na frente dele, ou enxergar que você nunca vai dar uma chance pra ele.

— E se eu der uma chance pra ele?

Soobin arregalou os olhos na mesma hora, como se tivesse acabado de notar um abismo diante de seus pés. Seu corpo congelou como nunca antes, e Beomgyu só continuou com a feição serena de sempre, contrastando com seu choque.

— E se eu beijar ele assim que a gente sair daqui? — Beomgyu voltou a falar, mas, para Soobin, apenas soou como vários garfos sendo arrastados em cima de um prato.

— Você não faria isso… — Disse, rindo de nervoso. — Isso não é uma brincadeira.

— Eu nunca falei tão sério em toda a minha vida. — Rebateu. — Se eu fizer isso, você vai continuar se machucando assim? Ou vai seguir em frente como disse que faria?

Só de pensar na possibilidade de superar Yeonjun, sentia seu estômago se revirar. Ele sabia que não conseguiria, nem em um milhão de anos, não importava o quanto mentisse para si mesmo.

— Por que você tá fazendo isso? — Soobin perguntou, odiando sentir as lágrimas enchendo os seus olhos. — A gente nunca conversou direito, então por que você tá fazendo isso logo hoje?

— Porque dói em mim te ver assim, se arrastando por migalhas. — Respondeu, passando a mão no cabelo. — Do mesmo jeito que doi ver Yeonjun se machucando e disfarçando tudo com piadinhas.

— E o que você sente? — Soobin perguntou, incrédulo. — Você realmente gosta do Yeonjun e só rejeitou ele por cinco anos?

Mas Beomgyu sorriu pequeno, olhando bem no fundo de seus olhos.

— Descubra.

Logo depois, o celular de Soobin tocou, o assustando como se tivesse acabado de acordar de um pesadelo. Porém Beomgyu continuava bem ali na sua frente e tudo havia sido muito real. Ele nem ao menos soube como conseguiu atender a ligação, mas se forçou a fazê-lo, porque só assim teria uma desculpa para não encarar Beomgyu.

— Alô? — Disse depois de engolir um bolo de saliva.

— Soobin, tem um cara subindo aí pra tirar vocês, ok? Damian disse que, na verdade, faltou luz no quarteirão inteiro e que vamos fazer a reunião em um restaurante aqui perto. — Explicou.

— Ah, certo. Vamos esperar.

— Ok, até.

Soobin desligou o celular, mas ainda não sabia se tinha forças para se levantar. Ele até desligou a lanterna, preferindo a escuridão do que ter que encarar Beomgyu de novo.

Os dois esperaram em silêncio por pouco tempo até que o elevador fosse aberto manualmente por um técnico. Soobin havia ficado tão tenso que nem percebeu que o calor tinha feito com que os dois suassem, sentindo o vento da área externa aliviar seu corpo. Mesmo assim, seu psicológico ainda estava abalado.

E enquanto descia as escadas, olhou para Beomgyu, não entendendo como ele continuava tão tranquilo mesmo depois de ter mexido tanto com seu cérebro. Soobin não fazia ideia de como reagir, ou de como se portar depois daquela conversa. Seu sistema nervoso estava em pane, e seu corpo com certeza iria permanecer rígido pelo resto do dia.

Mas ele tentou colocar a cabeça no lugar e fingir, pelo menos durante a reunião, que estava tudo bem. Soobin poderia enlouquecer de vez quando estivesse sozinho depois.

E ele com certeza iria.

 

 

 

 

Kai ficou triste ao saber que Taehyun não participaria da reunião sobre o contrato, mas, pelo menos, conseguiu conversar um pouco com ele enquanto todo o transtorno da falta de luz acontecia.

Os dois estavam trocando mensagens desde o último show em que se viram, e a única parte ruim disso era que precisavam manter segredo. Claro, Kai entendia toda a situação, até porque Damian era quase um psicopata, e mexer com ele não era uma boa opção naquele momento. Por isso, tentou não parecer tão próximo dele ao conversarem quando Damian se aproximou, apenas seguindo um roteiro silencioso.

Assim que Soobin e Beomgyu voltaram, Kai teve uma leve impressão de que havia algo estranho entre eles pela forma que Soobin estava respirando fundo, mas preferiu ignorar por hora, e apenas seguiram até o restaurante em que combinaram.

O local era próximo e também era sofisticado. Eles sentiram que não estavam arrumados o suficiente para estarem ali, mas isso foi só mais um motivo para que rissem e procurassem a mesa reservada para eles no segundo andar. Ela ficava em um ambiente mais privado, para que pudessem conversar sem interrupções.

— Damian deve chegar em pouco tempo. — Kai disse, se acomodando. — Ele disse que vai pagar, então escolham o que tiver de mais caro no cardápio, ok?

— Nem precisa dizer duas vezes. — Yeonjun respondeu, abrindo o menu.

Eles ficaram escolhendo os pedidos até o momento em que Damian apareceu, se desculpando pela demora. Nenhum deles estava nervoso, mas ainda assim tentaram se portar com seriedade na frente dele.

E tudo que podiam fazer era esperar que Yeonjun conseguisse convencê-lo da proposta que tinham, por mais difícil que parecesse. De qualquer forma, compartilhavam do mesmo pensamento de que pelo menos poderiam comer comida boa, independente do que acontecesse.

Mas, secretamente, Kai quis que aquilo desse certo. Ele queria ter a chance de estar dentro daquela gravadora e ver o que acontecia com os próprios olhos.

Ou pelo menos poder passar mais tempo perto de Taehyun.


 



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