— Consegui dezesseis nomes com as iniciais P.E. — Kim esperava a resposta como se fosse uma criança esperando algo acontecer no formigueiro.
Estávamos passando pelo corredor dos armários a caminho da cantina. Kim insiste em me acompanhar. E isso é bom e ruim. Bom, pela sua companhia; mas o fato dela continuar com a ideia fixa de achar que o P.E. das cartas estranhas vai ser o meu Perfeito Cavalheiro me deixava incomodada. E Kim também tem estado a todo minuto tentando puxar conversa, e eu tento prestar atenção nas suas histórias, mais por ser muito reservada com assuntos que só dizem respeito a mim, a única coisa que consigo fazer é sorrir e balançar a cabeça (como uma lagartixa).
— O que vai comer hoje, Izza? — Kim perguntou entrando na fila.
Olho meu relógio de pulso para ver se ainda tenho tempo suficiente para comer algo. Depois olho para as opções a minha frente e pego uma maçã.
— Só isso? — Ela me olhou desconfiada. Sua bandeja já tinha um pequeno montinho de comida se formando. — Aqui, fica com minha bandeja. Eu pego outra pra mim.
Sorrio agradecida e sento em uma mesa vazia no fundo da cantina. Não estou com fome, graças ao cachorro quente gigante (com queijo e bacon) extremamente agradável que Kim me forçou a comer no caminho para a escola. Então eu só belisco algumas bolachas e tomo o suco de uva da caixinha em grandes goles.
Levanto a cabeça quando Kim puxa a cadeira e senta-se de frente para mim.
— E então, como conseguiu? — Perguntei me referindo a lista com os P.E. da escola. Kim me entregou um pequeno bloco de papel.
— Leia primeiro. Depois faça as perguntas. — Kim deu uma mordida na barrinha de cereal e com uma careta a largou de lado na bandeja. — Eu não paguei quatro mil no dentista pra essa barrinha dos infernos entortar meus dentes de novo.
Olho para o bloquinho em minhas mãos e observo a caligrafia de Kim. Cadê o botão pra mim roubar a letra dela e colar minha mão?
Seu possível P. E.
Paul A. Egerton.
Eric Pada.
Philip M. Edward.
Ewerton Prescott.
Peter Egerton.
Elena Peterson.
Erick Parker.
Ethan Prendergast.
Eddy Polishchuk.
Estevan C. Philips.
Ellison Presley.
Patrick Evans.
Elliot Prendergast.
Edmundo Perez.
Edgar Price.
Enrique Petrovic. (Ex-namorado)
— E então, conseguiu tudo isso durante o intervalo? — Perguntei.
— Não. — Kim me tomou o bloquinho. — Consegui tudo no segundo tempo. Alguns eu já conhecia, os outros eu peguei na ficha de Educação Física. O Sr. Mc Garvey esqueceu a ficha de presença e me pediu para buscar. E como eu sempre ando prevenida, voilà.
— Por quê Elena Peterson está na lista? — Questionei. Caso Kim não saiba, Elena Peterson é uma garota.
— Ela joga nos dois times, bobinha. — Kim alisou o cabelo já liso.
— E Enrique Petrovic?
— Pode ser qualquer um deles. É só mais uma opção. Não olha agora, Izza. As E-más e o cachorrinho de estimação delas a noventa graus, vindo pra cá.
Caroline Funck's e Alice Miller são as que batizamos por E-más. Nós a chamamos assim porque elas são Egoístas e Más. Com 13 anos eu achava esse nome o máximo, com 17 anos eu passarei a detesta-lo, mas é difícil criar um nome inteligente. E o cachorrinho de estimação delas é Enrique Petrovic. Ele ainda namora com Caroline.
Caroline parou na nossa mesa, ela era toda chapinha e jeans colado. Desde a sexta série que não vejo mais Caroline Funck's de cabelos cacheados (quando enfim ela descobriu o poder da escova e da chapinha).
Ela sorriu pra mim, eu a cumprimentei com uma careta. Caroline e eu éramos amigas até a terceira série quando escrevi um texto sobre uma lagartinha gulosa para a aula de inglês e o Sr. Thomas, nosso professor, resolveu premiar os alunos que foram mais criativos. Ela (Caroline), aluna inteligente que desperdiçava seu Q.I bagunçando na classe com a galera do fundão não ganhou nada. A aluna exemplar (eu) ganhou uma medalha de honra ao mérito pela melhor redação.
Passei o resto da aula todinha com essa medalha pendurada no meu pescoço. Caroline pegou o exemplar de Moby Dick da mesa do Sr. Thomas e bateu na minha cabeça com ele. Eu chorei e disse a Caroline que ia contar tudo para o professor é que tinha doido pra cacete.
E falei, mas eu disse isso chorando, soluçando e me engasgando por ter esquecido de respirar.
— Professor a Caroline bateu na minha cabeça com um livro.
— Está doendo, Isabella? — O Sr. Thomas me perguntou.
Caroline me olhava feio do outro lado da sala. Loira malvada, muito malvada. Sua loira malvada e sardenta. Caroline mostrou a língua pra mim.
— Não Sr. Thomas. — Foi tudo o que eu disse.
— Volte para o seu lugar. — O Sr. Thomas colocou a mão no meu ombro e apertou, um simpático aperto. — Tenho certeza que Caroline fez isso brincando.
Mais tarde na cantina, enquanto comia meu pão com alface e queijo cheddar e bebia meu suco de maçã da caixinha, Caroline chegou com uma tesoura rosa sem pontas. Ela queria cortar o meu cabelo que batia na bunda; então eu larguei minha lancheira, corri e me escondi dentro do banheiro. Caroline ficou gritando "ABRE" eu dizia "NÃO" e ficamos nisso até diretor chegar e me tirar do banheiro nos braços. Como se não bastasse a humilhação de ter sido vista pela turma inteira, ainda tive que aguentar servir de chacota por um bom tempo. Até a influência de Kim fazer efeito e Caroline me deixar em paz. Agora, faltando pouco mais de 5 meses para terminar o ano letivo sem brincadeiras de mal gosto, posso dizer que vou concluir o Ensino Médio com maestria.
Caroline estava pendurada no pescoço de Enrique. Enrique depois que começou a namorar com essa vaca líder de torcida se tornou o principal Quaterback da Northwestern com o cérebro do tamanho do meu dedo mindinho. E isso já o levou a três expulsões; Suspensão número 1: Enrique paquerou a nova diretora; Suspensão número 2: Ele quebrou o portão do ginásio; Suspensão número 3: A diretora é casada e Enrique ainda continuou paquerando ela.
Só mais uma suspensão na ficha dele e Enrique Petrovic está fora da minha vida.
— Quando me disseram que as duas mosquinhas mortas tinham entrado na turma de teatro eu não acreditei. — Disse Caroline. — Essas aulas não vão dar destaque algum à quem nasceu para ser poeira, sabiam?
Alice riu enrolando um cacho do cabelo tingido de vermelho no dedo.
— Ah-ah-ah. — Alice debochou. — O que ouve com vocês? O gato comeu suas línguas, queridinhas? Estão com uma cara de dar dó.
Caroline soltou pescoço de Enrique e se inclinou com a mão na mesa, pronta para destilar seu veneno em cima da gente outra vez. Mas Enrique puxou Caroline pelo braço com uma delicadeza absurda, e esfregou as costas dela, meio sem jeito.
— Vamos. — Ele chamou. — Deixe elas, Caroline.
O primeiro sinal tocou lembrando que temos mais 5 minutos antes da próxima aula.
Antes de se virarem para sair Enrique me lançou um olhar diferente, parecia com um pedido de desculpas silencioso. Então eles nos deram as costas.
E Kim pegou minha caixinha de suco de uva que estava esquecida em cima da mesa, tirou o canudo e a espremeu nas costas da blusa cara de Caroline. Caroline encarou a mancha lilás com raiva. Kim murmurou um "desculpe" embora ela não estivesse sentindo nenhuma culpa. Seu sorriso disfarçado de baixo do batom vermelho a denunciava. Caroline fez um gesto muito feio com dedo do meio pra ela.
— Me dê um "bar" me dê um "anga". O que formou? Baranga. — Kim agitou pompons de torcida invisíveis. — O que fiz ainda foi pouco perto do que essa tarântula de saia merece. — Disse ela.
O segundo sinal tocou. Kim levantou e empurrou a cadeira de volta para o lugar dela.
— Argh. Que raiva que eu tenho desse troço. Por mim eu quebrava.
— Deixa de mentir, Kim. Eu sei que você tá doidinha pra assistir a aula do Sr. Haterhouse.
— Não estou, não. — Disse Kim. — São os mesmos rostos de sempre sentados nos mesmos lugares. Os mesmos estilos. As mesmas conversas sem sentido. E a mesma bunda gostosa do Sr. Haterhouse. — Kim apertou os cílios e estalou a língua. — Você tem razão, Izza. Eu estou doidinha pra estudar Geometria.
Kim estava me esperando do lado de fora do Besouro enquanto eu procurava um dos meus brincos que havia caído entre as dobras do estofado no banco do carona. Kim fazia comentários maldosos sobre cada pessoa que passava pelo estacionamento, inclusive sobre a zeladora (uma mulher baixinha e alegre que eu adoro) que estava usando um suéter verde-vômito. Tudo o que ela dizia me entrava por um ouvido e saia pelo outro. Eu não queria ouvir nada do que ela queria que eu ouvisse. Minha atenção estava toda concentrada em encontrar meu brinco fujão.
— Minha Nossa Senhora do Maxilar Divino. — Kim exclamou de repente. — Izza, quando eu digo que algo é bizarro, eu me refiro a coisas do tipo Harry pegando a Alice. Desistir da humanidade parece uma boa ideia agora, não acha?
Eu não precisei ver o que tinha deixado Kim boquiaberta para meu coração dar uma cambalhota e aterrissar no peito, desengonçado.
Harry estava atravessando junto com Alice, em um dos braços ele trazia alguns livros. Eu espero que não sejam dela. Na verdade eu queria que não fosse ela. Poderia ser qualquer uma, menos ela. Quando desci do carro Harry sorriu e acenou pra mim com o braço livre. Ele me notou e eu estou com raiva.
— Odeio você. — Minha voz virou um sussurro e arregalo os olhos surpresa, quase não acreditei no que acabei de dizer.
Eu não entendi porque falei aquilo. Mas as palavras deixaram minha boca sem que eu autorizasse. Eu sentia como se meu coração fosse explodir a qualquer momento.
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