Capítulo 4 Consulta médica e recomeço
Amélie acordou com o corpo de Lena em seus braços. Ela não tinha nem ideia de que horas seriam. Nunca havia dormido tão bem como naquele dia. Enquanto pensava nisso, ela se aproveitava do momento para fazer um carinho nos cabelos de Lena. A britânica ainda não havia acordado, e ela parecia bem cansada. Ainda assim, ela era linda. Amélie, lentamente, colocou sua mão na gola da camisa de Lena, e começou a puxar um pouco, revelando o ombro direito de Lena. Tocou a pele macia com sua mão direita, e começou a beijá-la gentilmente. Alternava os beijos com carinhos suaves naquela área.
A menor parecia estar gostando, mesmo que ainda estivesse inconsciente. Amélie podia sentir o quão relaxada a britânica estava. A tensão de ontem já não existia mais, e o que ela via era uma linda britânica dormindo um sono leve nos seus braços. Bem devagar, ela retirou os seus braços, que estavam em volta do corpo de Lena. A garota pareceu não se importar muito com a situação, e permaneceu em seu sono. Amélie aproveitou o momento para se levantar e ir até a cozinha, para beber um copo d’água. Ao chegar lá, percebeu que já havia amanhecido, e naquele dia, o Sol cobria a cidade de Londres.
“É como dizem: depois da tempestade, sempre vem o Sol” pensou Amélie. Ela ainda estava de calcinha e sutiã, mas ela não se importava. Na verdade, normalmente ela gostava de ficar desse jeito. Se sentia mais leve assim. Enquanto enchia um copo com água, olhou de relance para o seu celular, que havia ficado na cozinha quando ela foi para o quarto com Lena. Ele marcava 10h27min. “Wow... nós dormimos tanto assim?” se perguntou Amélie, em seus pensamentos. “Já que é tarde assim, vou tirar o dia de folga. Depois eu mando um aviso para quem quer que se importe com isso na empresa.” pensou Amélie, embora não fosse necessário. Todos da empresa sabiam que se Amélie Lacroix não chegasse até às 9h da manhã, é porque ela não iria mais.
Enquanto pensava em saborear o seu dia de folga, Amélie percebeu também que havia algumas ligações perdidas no seu telefone, assim como mensagens de WhatsApp. Pegou em seu celular, e percebeu que tanto as ligações como as mensagens eram todas de uma velha amiga. Rapidamente retornou a ligação, e esperou enquanto o telefone chamava.
—Alô? —disse uma voz suave, de um tom angelical.
—Oi Angela, acabei de ver que você me ligou algumas vezes. Aconteceu algo de urgente? —perguntou Amélie, em um tom mais baixo, tentando evitar que Lena acordasse.
—Sim. Eu acabei de chegar em Londres, e preciso urgentemente de tomar um café com a minha amiga. Passei hoje mais cedo na sua empresa, mas você não estava lá. —disse Angela.
—Sinto muito. Aconteceu que eu acordei meio tarde hoje e bem, decidi tirar o resto do dia de folga. Acho que vai me fazer bem, sabe? —disse Amélie, indo em direção ao quarto para ver se ela não havia acordado a britânica. Felizmente, isso não havia acontecido, e Lena ainda dormia um sono tranquilo enroscada em um dos cobertores. Amélie aproveitou para fechar a porta e se dirigir a sala, onde sentou em um dos sofás para continuar sua conversa com Angela.
—Fez muito bem. Você realmente estava precisando de um dia de folga. Sei muito bem que ultimamente você está trabalhando mais do que deveria. Já era hora de parar um pouco. —disse Angela. —Enfim, você está livre agora?
—Bem... eu estou na minha casa... —começou Amélie, mas antes que conseguisse escolher as palavras certas para explicar a real situação em que se encontrava, Angela a interrompeu:
—Muito bem, vou passar aí então. —disse Angela.
—NÃO! —gritou Amélie, aflita com a situação.
—Não? Como assim não? —estranhou Angela. —Por que eu não poderia... Amélie, tem alguém aí? —perguntou Angela, mas Amélie não respondeu, o que acabou por entregar a resposta. —Caramba, e pensar que eu não acreditei quando você disse que iria para a Inglaterra atrás de “novas experiências”.
—Não é nada disso que você está pensando. É só uma amiga. Nós tivemos de dormir juntas aqui por causa da tempestade de ontem e... —disse Amélie, tentando se explicar.
—Vocês dormiram juntas?! Uau, você é mais rápida do que eu imaginava! —disse Angela, o que fez Amélie ficar levemente irritada. A suíça adorava brincar com ela.
—Ora, sua... —começou Amélie, mas antes que pudesse dizer umas palavras nada amigáveis pelo telefone, ela foi interrompida novamente por Angela:
—Estou brincando, Sra. Lacroix. —disse Angela. —Mas já que eu não posso ir ai, onde podemos nos encontrar então?
—Hmmmm... —Amélie começava a pensar no que iria fazer. Não poderia ir encontrar Angela e deixar Lena sozinha no apartamento. Certamente ela teria problemas para sair do residencial. Foi então que uma ideia surgiu na sua cabeça.
—Ei Angela! —chamou Amélie pelo telefone. —Será que você não teria como me fazer um favor? —questionou a francesa.
—Um favor? Que tipo de favor? —perguntou Angela do outro lado da linha.
—Na verdade, não é bem para mim... é mais para a minha amiga. —respondeu Amélie, um pouco constrangida com a situação.
—A amiga que dormiu junto com você? —questionou Angela, e Amélie percebeu que ela parecia um tanto quanto interessada com a situação, mas resolveu ignorar isso.
—Sim, ela mesma. Acontece que, há pouco tempo, ela teve um probleminha com a mão, sabe? Ela meio que quebrou o punho ao me ajudar a sair de uma enrascada. —contou Amélie, da maneira mais resumida possível. —Então, eu pensei que talvez você pudesse dar uma olhada nela, só pra ter certeza de que está tudo bem e que não há nada de mais grave, entende?
—Acho que sim. Então, meio que você quer que eu a receba em uma consulta no meu consultório, como forma de agradecimento por ela ter te ajudado. É isso? —perguntou Angela. Por algum motivo, Amélie sentiu que havia algo de errado com o comportamento da sua amiga.
—Sim, é isso. Você acha que pode me dar essa força? —perguntou Amélie, ainda intrigada com o comportamento de Angela.
—Claro. É só trazer ela aqui que eu faço um check-up médico. Se ela quiser, é claro. —disse Angela, o que fez Amélie se lembrar de que ainda teria que convencer Lena a ir nessa consulta.
—Obrigada, Angela. Vou tentar convencer a minha amiga a ir na consulta, mas fora isso... também tem outra coisa que eu gostaria de lhe pedir, mas acho que vai ser melhor eu dizer isso quando chegarmos aí. —disse Amélie, agora ansiosa para chegar logo até o consultório de Angela.
—Muito bem, estarei esperando por vocês aqui no consultório. E, Amélie, me permite dizer uma coisa? Apenas uma dica de doutora? —perguntou Angela, e Amélie estranhou a pergunta, mas concordou mesmo assim:
—Pode sim, doutora Angela Ziegler. —respondeu Amélie.
—Eu acho que você não deveria encarar esta consulta como uma forma de agradecimento a essa garota. Afinal, o melhor agradecimento que ela poderia receber de você já lhe foi dado, pois vocês passaram a noite juntas, não foi? Tenho certeza de que você soube dar prazer a ela. —brincou Angela, e Amélie simplesmente desligou o telefone, sem dizer tchau ou qualquer outra coisa. “Como foi que eu caí nessa? Dica da doutora Ziegler? Conta outra.” pensou Amélie.
Agora que havia desligado o telefone, restava-lhe a árdua tarefa de convencer aquela britânica baixinha a ir na consulta. Amélie tinha certeza de que isso não seria uma tarefa fácil, principalmente porque ela ainda precisava conversar sobre algumas coisas com Lena. Caminhou em direção ao quarto, abrindo lentamente a porta. Lena ainda permanecia na mesma posição, respirando suavemente. O cobertor agora estava jogado ao lado do seu corpo, e Amélie concluiu que ela provavelmente deveria estar sentindo um pouco de calor.
Amélie se aproximou da cama, deitando-se e ficando por cima de Lena. Em seguida, começou a beijar sua bochecha direita, abaixo da região onde havia sido feito o corte durante o assalto. O corte ainda não havia desaparecido, e Amélie tinha a leve desconfiança de que uma cicatriz iria se formar naquele belo rosto. Amélie continuou a beijar aquele local. A cada vez que Amélie tocava a face de Lena com seus lábios, era possível sentir leves arrepios da britânica.
—Ei, mon amour (meu amor, em francês). Já é hora de acordar. —disse Amélie, continuando a beijar a bochecha de Lena. Como não houve nenhuma resposta, ela começou a subir lentamente até a sua orelha, e depositou um beijo nela. Dessa vez, Amélie sentiu um arrepio maior por parte da britânica. Incentivada por aquela reação, a francesa começou a beijar com mais intensidade aquela região, fazendo com que os arrepios no corpo de Lena fossem cada vez mais frequentes. Amélie pode sentir quando as pernas de Lena começaram a se mexer. Parou um pouco os movimentos para erguer o rosto, tentando ver se a britânica já não estaria acordada, mas o que viu acabou deixando-a extremamente excitada: Lena segurava com força o colchão da cama, enquanto mordia os lábios de uma forma extremamente sensual e provocante. Amélie tinha certeza de que a menor estava tentando reprimir um gemido.
A francesa então partiu para o ataque, beijando de forma cada vez mais intensa a orelha de Lena, que se arrepiava ao sentir o toque dos lábios quentes de Amélie. Vez ou outra a francesa depositava um beijo no ombro ou na bochecha de Lena, tentando variar um pouco seus toques. Foi então que, por mero capricho do destino através de uma ação ousada de Amélie, algo inesperado aconteceu.
Amélie mordeu, de forma suave e provocante, a parte superior da orelha de Lena, o que arrancou um gemido da menor:
—Ahnn. —gemeu Lena, que em seguida voltou a morder os lábios. O gemido havia sido apenas uma reação involuntária do corpo aos constantes toques de Amélie, mas a francesa jamais iria esquecer aquele lindo som, simples e doce.
—Ei, vamos, eu preciso que você acorde, Lena. —Amélie mexeu nos ombros de Lena com suas mãos, tentando acordá-la. Nenhuma reação novamente. Amélie começou a beijar a orelha da britânica novamente, até que Lena a chamou:
—Hmmmmm, Amé. —disse Lena. Ela ainda parecia bem cansada. Talvez não tivesse dormido tão bem como Amélie.
—Sim, chérie (querida). —disse Amélie. —Você quer que eu pare com isso? —perguntou Amélie, se afastando antes de ouvir a resposta.
—Não. —respondeu Lena. Amélie pareceu não entender direito.
—Como? —questionou Amélie. —Desculpe, eu acho que não entendi bem. Você não quer que eu pare?
—Não. Eu quero que você continue. —respondeu Lena, ainda de olhos fechados. —Só mais cinco minutos...
—T-tudo bem. Vou continuar. —disse Amélie, nervosa com a situação. Ela novamente se aproximou de Lena, e voltou a beijar e morder a orelha da britânica. Enquanto isso, a britânica mordia os lábios, tentando reprimir seus gemidos.
—Mmmmmmm... —gemia Lena, mordendo os lábios. Mesmo daquele jeito, Amélie ainda conseguia ouvir os sons abafados dos gemidos de Lena. A francesa começou a se sentir cada vez mais incentivada com a situação, e começou a colocar mais intensidade nos seus movimentos, ao mesmo tempo em que colocava a sua mão esquerda novamente no ombro de Lena. A tensão havia voltado ao corpo dela, mas parecia que dessa vez a britânica estava disposta a continuar a brincadeira. Pelo menos pelos próximos cinco minutos.
—Mmmmmmm... mmmmmm... —gemia Lena. Ela colocou a mão esquerda na frente da boca, e a fechou, numa tentativa de evitar que seus sons continuassem saindo. Amélie começou a massagear o ombro de Lena, enquanto mordia a parte superior de sua orelha. Os toques foram se tornando cada vez mais intensos, até que Lena não aguentou:
—Ahnnn! —gemeu Lena. Dessa vez, ela não tentou se segurar. Retirou a mão esquerda da frente de sua boca, e deixou Amélie continuar com aquela brincadeira apenas por mais algum tempo, quando finalmente disse:
—OK, a-acho que já brincamos o suficiente... —disse Lena, com a voz falhando. Amélie parou com os movimentos, e se levantou, saindo de cima da britânica. Lena se levantou lentamente, e esfregou um pouco os olhos, tentando focar sua visão.
—E então, dorminhoca? —brincou Amélie.
—Hummmmm, minha cabeça está doendo. Acho que foi aquele vinho. —disse Lena, colocando ambas as mãos na cabeça. Amélie ergueu sua mão esquerda, levando-a ao rosto da britânica, onde fez um leve carinho em sua bochecha esquerda.
—Não se preocupe. Daqui a pouco isso passa. —tranquilizou-a Amélie. —Acontece nas primeiras vezes.
—Espero que esteja certa. —disse Lena.
—Pode confiar, eu estou. —respondeu Amélie. —Sabe, Lena... e-eu... e-eu acho que precisamos conversar sobre algumas coisas. —começou Amélie. A francesa tinha uma boa ideia de como as coisas poderiam sair do controle se tocasse nesse assunto, mas ela precisava arriscar, para o bem de Lena e das pessoas que a amavam.
—Claro. Por que não? —disse Lena. Amélie podia perceber que ela estava um pouco nervosa, e que tentava esconder isso. A britânica sabia exatamente o que a francesa iria dizer.
—Bom... —começou Amélie, sem jeito. —... é sobre a sua carreira no boxe, Lena. Como eu te disse ontem à noite, eu acho que você não deveria desistir...
—Eu não vejo motivos para continuar lutando. É pura perda de tempo. —disse Lena, cabisbaixa. —Além do mais, eu acho que eu deveria tentar outras coisas. Não sei, quem sabe uma faculdade ou algo assim...
—Não diga isso. Você não pode desistir assim de algo. Você investiu tanto tempo, esforço... —disse Amélie, tentando animar Lena. —... além do mais, você me disse na academia que se sentia viva quando estava lutando. Se você desistir do boxe, vai estar desistindo de viver, então? —questionou Amélie, e Lena pareceu não ter gostado muito desse argumento. Talvez porque fosse verdade.
—Acha que eu não sei disso?! —disse Lena, colocando o rosto entre os joelhos. Ela estava se segurando para não derramar lágrimas. —O problema, Amé, é que eu já não aguento mais conviver com a derrota. Tantos sonhos, e tantas frustrações... e o pior de tudo é ver as pessoas que eu amo decepcionadas por isso. Elas dizem que não, mas eu posso ver que, no fundo, elas esperavam mais de mim. Todos esperavam mais de mim, e eu não consegui corresponder às expectativas deles... —explicou Lena.
—Talvez você tenha razão. Às vezes, a vida não sai como a gente quer... eu mesma sei bem sobre isso. Eu tinha tantos planos... tantos sonhos... mas mesmo quando os problemas me atingiram, eu continuei tentando. Eu não deixei de lutar pelo meu sonho de ser uma bailarina. —disse Amélie, relembrando os melhores anos de sua vida, quando ela era feliz estando em cima dos palcos.
—Mas você desistiu. —disse Lena, e essas palavras foram como um balde d’água fria caindo sobre Amélie. —Você desistiu do seu sonho no fim. Não porque você quisesse, mas sim porque foi obrigada.
—É verdade. Eu desisti, sim, do meu sonho. Mas existe uma grande diferença entre eu e você, no que diz respeito a isso. Sabe qual é? —perguntou Amélie, e Lena ergueu a cabeça para encará-la.
—Você não podia mais continuar. O seu trauma devido a sua lesão a impediu. Já eu... bem, estou desistindo devido às frustrações que sinto. —disse Lena, observando os belos olhos de âmbar da francesa (famosos olhos cor de mel).
—Errado. Eu desisti porque a minha guerra tinha acabado. —corrigiu Amélie, o que deixou Lena confusa. — Durante os dois anos que antecederam a minha aposentadoria dos palcos, eu fiz tudo o que era possível para tentar voltar a ser quem eu era, ser quem as pessoas amavam. Eu lutei até o fim... mas não consegui vencer a minha guerra. No fim, eu desisti, não porque a lesão me impedia de voltar aos palcos, e tão pouco porque eu tinha medo de me chutarem da companhia de ballet... eu desisti porque eu já havia feito tudo o que podia... e não havia mais esperanças para o meu sonho... e você? Já fez tudo o que podia para tentar realizar o seu sonho? Tem certeza de que lutou a sua guerra até o fim? —questionou Amélie, mas Lena não respondeu. A britânica estava em choque com aquelas palavras. Mas Amélie ainda não havia terminado:
—Lena, eu quero que me escute com atenção. —disse a francesa, colocando as mãos nos ombros da britânica. —As únicas pessoas que merecem ser chamadas de fracassadas... são aquelas que desistem sem lutar pelos seus sonhos. Alguém que fez todo o possível, e lutou até o final pelo seu objetivo, mesmo que não o conquiste, jamais será um fracassado... —disse Amélie, encarando Lena nos olhos. —Prometa-me uma coisa: prometa-me que não vai desistir sem lutar até o fim pelo seu sonho... acha que consegue fazer isso? —questionou Amélie.
—E-eu não quero desistir, Amélie, mas... —começou Lena, envergonhada. Ela sabia que não havia nenhuma desculpa que pudesse dar. Além do mais, Amélie realmente tinha razão: se ela desistisse agora, ela seria uma fracassada para sempre, pois ainda haviam muitas coisas que ela não havia tentado. Pressionada pelo olhar firme de Amélie, a britânica finalmente decidiu:
—Certo. Eu prometo. Mas com uma condição! —disse Lena, e foi Amélie quem ficou confusa dessa vez.
—E qual seria? —perguntou Amélie, intrigada.
—A minha condição é que você volte a se apresentar. Que você volte a dançar ballet. Se você fizer isso... então eu volto a lutar. —disse Lena, o que surpreendeu Amélie, ao mesmo tempo em que a entristeceu.
—Oh, Lena... —começou Amélie, acariciando a bochecha direita de Lena com sua mão esquerda. —... você sabe que eu não posso mais dançar. Além do mais, eu já estou um pouco velha para me apresentar nos palcos... —explicou Amélie, e Lena colocou uma mão no queixo. A britânica parecia estar pensando em algo.
—Bom... e se você se apresentasse só pra mim? —perguntou Lena, um pouco corada. —Quer dizer, se você se apresentasse para mim, nem que fosse apenas com a mais simples coreografia do ballet... então eu entenderia que você estaria lutando por mim. —disse Lena, um pouco sem jeito, e suas palavras fizeram Amélie corar. “Lena... ela... e-ela está dizendo que...” pensou Amélie, mas antes que pudesse concluir seu pensamento, Lena a interrompeu, nervosa.
—Ah... não é isso que eu quero dizer. Não me entenda mal! —disse a britânica, nervosa. Ela estava completamente corada. — Não é nesse sentido que eu quero que você entenda. —continuou, e Amélie não pode deixar de achar graça daquela situação. Até quando estava envergonhada Lena conseguia ser fofa.
—Eu acho que entendi o que você quer dizer. —disse Amélie, e Lena pareceu ainda mais nervosa ao ouvir as palavras da francesa.
—E-entendeu? —perguntou a britânica, com a voz trêmula.
—Sim, entendi. —disse Amélie. —Se eu lutar por você... então você lutará por mim. Nos ringues, é claro. Não é isso que você quis dizer? —perguntou Amélie, e Lena assentiu prontamente. —Certo. Aceito sua condição. Mas há algo que eu quero perguntar, e quero que você responda com sinceridade. —disse Amélie.
—C-claro. Pode perguntar que eu irei lhe responder. —disse Lena, um pouco mais calma.
—Até onde você lutaria por mim? —questionou Amélie. Ela não deu explicações sobre a pergunta, simplesmente porque não tinha coragem para fazer isso. Havia muito mais nessa pergunta do que as palavras poderiam dizer, mas a francesa entendeu que seria melhor deixar que Lena interpretasse a pergunta do seu próprio modo.
Os segundos foram passando, e Lena parecia estar considerando a questão. Cada segundo era como uma eternidade para Amélie. Será que a britânica havia entendido o real significado de suas palavras?
—Acho que já tenho uma resposta. —disse Lena, encarando Amélie com um olhar firme. Tal olhar a deixou extremamente nervosa, principalmente porque a britânica tinha olhos incrivelmente lindos, cor de âmbar, assim como os de Amélie, porém os de Lena eram ainda mais claros, de um tom de cor mais suave e belo.
—E então? —perguntou Amélie, porém Lena não respondeu, então a francesa resolveu repetir a pergunta. —Até onde você lutaria por mim? —perguntou Amélie.
—Por você, eu posso lutar para sempre, Amé. —disse Lena, e ambas ficaram coradas. Um silêncio terrível se instalou entre as duas, e Lena começou a pensar que talvez não devesse ter dito aquelas palavras. “Talvez ela entenda isso de uma maneira totalmente errada. Acho melhor eu tentar explicar antes que um mal entendido aconteça.” pensou a britânica. —Sabe, hã... desde o dia em que nos conhecemos, você só tem me ajudado. Você vive me agradecendo por eu ter te salvado, mas acho que sou eu quem deveria agradecer por ter te conhecido. Faz muito tempo desde que eu conheci alguém tão legal como você, que se preocupa de verdade comigo. E agora, você está até mesmo me incentivando a continuar com a minha carreira no boxe. Sabe... por uma pessoa como você, eu poderia sim, lutar para sempre... —disse Lena, escolhendo bem cada palavra, porém, assim que as dizia, não tinha certeza se estava explicando o que realmente queria dizer, ou se estava contribuindo ainda mais para um mal entendido.
Amélie percebeu essa dúvida em Lena. No entanto, ela decidiu ignorá-la, pois, embora a britânica lhe dissesse aquelas palavras como uma amiga, Amélie sabia, bem no fundo, que havia outro sentimento além da aparente amizade. A francesa podia entender, apenas pela voz e pelas palavras de Lena, que a britânica sentia algo muito mais forte por ela, porém ainda não sabia disso, ou talvez tivesse medo de descobrir ou de admitir tal sentimento. Amélie entendia Lena, e estava muito feliz por saber disso.
—Eu entendi. Não se preocupe. Por você, eu também posso lutar para sempre. —disse Amélie, finalmente quebrando aquele clima tenso. Lena pareceu se acalmar. —Acho que temos um acordo, então? Você volta a lutar boxe, e eu irei me preparar para lhe dar uma apresentação digna dos anos dourados da grande bailarina Amélie Lacroix. —disse Amélie, com os olhos brilhando. As duas apertaram as mãos, em comum acordo com os termos da promessa.
—Você é bem modesta. —debochou Lena, com um sorriso. As duas riram um pouco da frase.
—E eu sou modesta, mas eu também sou sincera! —disse Amélie, e as duas sorriram uma para a outra de novo. —Bom, já está tudo certo, então. Venha, vamos tomar um café agora. Ainda tem uma coisa que eu preciso lhe dizer. —disse Amélie, se lembrando de que tinha que levar a britânica para uma consulta com sua amiga, Angela Ziegler.
—Claro, mas antes... —disse Lena, se levantando. —... eu preciso colocar as minhas calças. Você se lembra de onde as deixou? —perguntou a britânica, e Amélie gelou. Na noite anterior, a francesa havia atirado a calça de Lena para longe, e não tinha a menor ideia de onde ela poderia estar. Nem se lembrava em que direção havia jogado.
—Hã... —começou Amélie, e Lena imediatamente a interrompeu.
—Você não se lembra de onde as colocou? —perguntou Lena, de novo.
—Bom... eu não as “coloquei”. Na verdade... —disse Amélie, completamente envergonhada. —... eu as joguei longe, e nem me recordo a direção. —completou.
—Bom, então me ajude a procura-las então. —disse Lena, que se colocou a vasculhar o quarto de Amélie. A francesa fez o mesmo. As duas procuraram durante um longo tempo, até que Amélie finalmente encontrou o jeans de Lena em cima do seu armário.
—Aqui! Finalmente encontrei! —anunciou Amélie, pegando as calças de Lena e as entregando-a para a britânica.
—Thanks, luv (“obrigada, amor” em inglês). —disse Lena, colocando o jeans. Amélie aproveitou para observá-la. A calcinha roxa lhe caía extremamente bem. Uma pena saber que aquela visão logo acabaria. —Hey, luv. Você não vai se vestir também? —questionou Lena, e Amélie percebeu que ela estava um pouco corada.
—Hmmmm, não sei. Você não gosta do que vê? —perguntou Amélie, colocando as mãos na cintura. A francesa queria ver como a britânica iria se sentir diante daquela provocação.
—N-não é isso... eu te disse ontem, você é muito bonita e sexy... —disse Lena, completamente corada. —... mas é um pouco constrangedor eu estar totalmente vestida e você apenas de calcinha e sutiã. —completou Lena.
—Tudo bem, eu irei trocar de roupa. Mas antes, vou tomar um banho refrescante. Sabe, o box do meu banheiro é bem espaçoso... tenho certeza que há espaço suficiente para nós duas lá. O que você acha? —perguntou Amélie, ainda provocando Lena. A britânica estava visivelmente chocada com a pergunta, e completamente corada. Como ela não aparentava dar nenhum sinal de resposta, Amélie resolveu por um “fim” no seu jogo. —É só uma brincadeira, chérie (querida, em francês). Não leve as coisas tão a sério. —mentiu Amélie. O convite realmente tinha sido real, embora a francesa já soubesse que Lena não iria concordar. “Mas sempre existe uma possibilidade... e se há uma possibilidade, então existe esperança.” pensou Amélie.
Enquanto Amélie se dirigia ao banheiro, Lena foi em direção à sala, onde se sentou e ficou observando a cidade de Londres pela vidraça do apartamento. Enquanto esperava, a britânica pôde ouvir o som do chuveiro sendo aberto, assim como o da água caindo. Lena ficou curiosa. “O som está alto... será que ela deixou a porta do banheiro aberta?” pensou Lena. “Talvez seja uma provocação... mas acho que uma espiadinha não faria mal...” pensou, e então se repreendeu:
—Lena, o que você está pensando? —suspirou, colocando as mãos na cabeça. A britânica não sabia de onde aqueles pensamentos tinham vindo.
Enquanto isso, Amélie se deliciava em seu banho. A água fria correndo pelo seu corpo nu lhe trazia sensações maravilhosas. Ela adorava a água fria, mesmo nos dias frios de Londres. Era algo simplesmente incrível. Revigorava todos os seus sentidos, e fazia a francesa pensar melhor e com mais calma. Depois de alguns minutos, finalmente Amélie saiu do chuveiro, se enrolando em uma toalha. Seu sutiã e sua calcinha ficaram jogados em um canto do banheiro. “Depois eu arrumo isso.” pensou Amélie. Ela se retirou do banheiro, caminhando em direção ao seu quarto apenas com a toalha em volta do seu corpo. Lena ainda estava sentada em um dos sofás da sala, com os braços em cima da cabeça. No quarto, Amélie escolheu rápido as suas roupas. Uma camisa de cetim azul marinho, de mangas longas e de abotoar. Colocou uma calça clochard de bolsos, da cor cinza. Já os sapatos escolhidos foram os do modelo scarpin, com bico e salto fino, da cor de pêssego. Como acessório, colocou apenas uma corrente de prata bem fina em seu pescoço.
Logo após, retornou para a sala, e chamou Lena:
—Ei, Lena! Quer tomar café da manhã? —perguntou Amélie.
—Se não for incomodar muito, eu gostaria apenas de uma xícara de café. —disse Lena.
—Tem certeza? Não quer comer alguma coisa? Eu acho que você deveria comer ao menos um pouco, Lena. Não quero que você chegue ao consultório passando fome. —disse Amélie, e só então percebeu o erro que havia cometido.
—Consultório? —perguntou Lena, confusa. Agora era tarde demais. Amélie tinha pensado em começar aos poucos, até finalmente encontrar o momento certo para falar sobre a consulta. —Como assim? Do que você está falando?
—Eu não queria dizer isso agora... não desse jeito... mas parece que agora não tem mais volta. Vai ser impossível esconder isso de você. —disse Amélie, nervosa. Lena estava apreensiva com cada palavra da francesa. —Minha amiga me ligou hoje cedo. Ela acabou de chegar em Londres. Bem, ela é médica, sabe? Então eu pensei que talvez... ela pudesse dar uma olhada em você. Eu contei a ela sobre a situação da sua mão, e ela concordou em dar uma olhada. Ela está nos esperando no consultório dela. —explicou Amélie. Lena parecia calma, porém não disse nenhuma palavra por alguns minutos. As duas ficaram se encarando durante um tempo, o que acabou deixando a francesa ainda mais nervosa com aquela situação.
—Então... o que você acha? —perguntou Amélie.
—Há mais alguma coisa que você esteja me escondendo? —perguntou Lena. As palavras saíram um pouco frias de sua boca, mas Amélie podia compreender.
—Não, era só isso mesmo. —respondeu Amélie, envergonhada. —Olhe, Lena, me desculpe, eu sei que eu deveria ter te perguntado antes, e você não precisa ir também se não quiser. Eu só queria ajudar. —disse Amélie, tentando se explicar.
—Tudo bem. Não se preocupe. —disse Lena, colocando a mão esquerda no ombro de Amélie. —Como eu disse antes, você é uma pessoa legal, e se preocupa comigo. Foi apenas uma reação natural, não foi? Você viu uma oportunidade e a aproveitou. —disse Lena, de maneira calma. —Na verdade, eu é que peço desculpas. Acho que minhas palavras saíram um pouco duras... —disse a britânica.
—Ah, não se preocupe. —disse Amélie, segurando a mão esquerda de Lena, que estava em seu ombro. —Agora, vamos ao café? Temos que sair logo, ou o trânsito de Londres vai complicar as nossas vidas.
—Claro. —disse Lena.
As duas tomaram um café rápido, e logo saíram. Desceram de elevador até a garagem, e dessa vez, não houve nenhuma “brincadeira” de Amélie, já que o elevador estava vazio e cada uma ficou em um canto do mesmo. As duas logo entraram no carro, e após alguns minutos, já estavam na estrada, indo em direção ao consultório da doutora Angela Ziegler.
30 MINUTOS DEPOIS
—Finalmente chegamos! —suspirou Amélie, parando o carro em uma vaga disponível na rua.
—Nem me fale. Eu já estava cansada de ficar sentada aqui. —disse Lena. —Meus quadris estão me matando. —disse a britânica, e Amélie não pôde deixar de dar risada daquilo.
—Bem, então vamos. A doutora deve estar nos esperando. —disse Amélie, e ambas saíram do carro. Caminharam em direção a uma enorme instalação, que parecia ser uma clínica particular. Na frente dela, uma mulher bela, de cabelos loiros e jaleco, esperava pacientemente.
—Angela! —gritou Amélie, acenando para a mulher, que caminhou na direção das duas. Ao se aproximarem, Amélie e Angela se abraçaram, e Lena apenas as observou.
—Já faz um bom tempo, Amélie. —disse Angela. —Mesmo nos falando através do celular, sinto como se tivéssemos ficado anos sem se ver.
—Sim, também tenho a mesma sensação. —disse Amélie, e então Angela voltou o seu olhar para Lena.
—Então, essa é a amiga da qual você me falou, Amélie? —perguntou Angela, sorrindo. Amélie assentiu em resposta a pergunta. —Prazer, eu sou a doutora Angela Ziegler. —se apresentou.
—Hi, luv. (“Oi, amor”, em inglês). Eu sou Lena Oxton. Prazer em conhecê-la também. —disse Lena, sorrindo. —Posso perguntar algo?
—Claro. —respondeu Angela.
—Notei um sotaque diferente na sua voz. Você não é daqui, certo? —perguntou Lena, curiosa.
—Você acertou. Eu não sou realmente daqui. Nasci na Suíça, por isso o sotaque diferente. —explicou Angela.
—Ahh, faz sentido. —disse Lena, e a suíça apenas limitou-se a sorrir.
—Então, Lena, está preparada para a sua consulta? Amélie me disse que você teve alguns problemas com a sua mão. Por que não me conta mais sobre isso lá dentro? —perguntou Angela.
—É claro, vamos. —respondeu Lena. As três começaram a caminhar para dentro da instalação, porém antes que pudessem entrar, Angela as interrompeu:
—Amélie, eu acho que talvez seja melhor apenas eu e Lena entrarmos. Sabe, eu vou tentar fazer alguns exames, e eles vão demorar um pouco. —disse Angela. Amélie parecia um pouco confusa. Ela havia tirado o dia de folga, então não tinha motivos para se preocupar com tempo. —Tenho certeza de que você deve ter outras coisas a fazer agora, não é? Não queremos tomar o seu tempo. —disse Angela, encarando Amélie nos olhos. “Ah... entendi. Era justamente isso que eu ia pedir a ela” pensou Amélie. Angela queria estar sozinha com Lena, assim as duas poderiam conversar melhor sobre muitas coisas. Além do mais, talvez a doutora conseguisse arrancar alguma informação de Lena que poderia ser importante para Amélie. A francesa não gostava de dizer, mas ninguém conseguia guardar segredo da doutora Ziegler. Não porque ela fosse uma pessoa desconfiada de tudo e todos, mas sim porque ela era o tipo de pessoa que conseguia deixar praticamente qualquer um a vontade. Ela tinha um tipo de aura que fazia as pessoas se sentirem seguras.
—É verdade. —disse Amélie. — Eu tenho algumas coisas a fazer. Bom, acho que nos despedimos aqui, Lena. Espero revê-la logo.
—Claro. Apareça na academia qualquer dia desses. Eu vou estar lá por um bom tempo agora. —disse Lena, lançando uma piscadela para Amélie.
—E você, doutora Ziegler... —disse Amélie. —... cuide bem da minha amiga.
—Pode deixar. Ela está em ótimas mãos. —disse Angela.
—Então, até logo. Tchau, meninas. —despediu-se Amélie, caminhando em direção ao seu carro. No meio do caminho, virou-se para trás, a tempo de ver Angela e Lena entrando na clínica. Agora, ela estava nas mãos da doutora Ziegler. Restava a Amélie esperar e ver o que iria acontecer.
DENTRO DA CLÍNICA
Lena foi levada para a sala da doutora Angela, onde foram realizados alguns exames de rotina, além de uma radiografia da sua mão direita. Lena estava impressionada com a rapidez com que foram feitos tantos exames, o que a fez pensar que aquele local deveria ter os melhores equipamentos do mundo no que diz respeito a área médica. A britânica estava curiosa para perguntar qual era a especialização da clínica, mas antes que pudesse fazer isso, a doutora disse:
—Venha, sente-se aqui. Quero conversar um pouco com você. —disse Angela, pedindo para que ela se sentasse na cadeira que ficava em frente a sua mesa. A doutora se sentou em cima da mesa, esperando que Lena atendesse o seu pedido.
Lena sentou-se calmamente, e antes que conseguisse formular alguma pergunta, Angela disse:
—O seu punho realmente está quebrado, mas a lesão não é tão grave. Você tem sorte, seu punho quebrou em apenas duas partes. No entanto, vou ter que colocar os ossos na posição correta. —explicou Angela. — Me responda uma coisa: você foi em algum médico antes de vir aqui?
—Sim. Logo no dia seguinte em que quebrei o punho, procurei um médico, e ele me disse que estava quebrado. —respondeu Lena.
—E ele não lhe disse nada sobre engessar o punho ou algo assim? —questionou Angela.
—Não. Ele disse que eu apenas deveria colocar uma bandagem, como essas que utilizamos no boxe, e que com o tempo, iria se curar sozinho. —explicou Lena.
—Bom, eu não sei o nome desse médico, mas faça o favor de nunca mais voltar nele. Céus, não se fazem mais médicos como antigamente. —suspirou Angela. —Enfim, vou fazer a “redução”, e depois irei engessar o seu punho, ok?
—Redução? —perguntou Lena, confusa.
—É o nome do processo. Quer dizer que eu vou colocar o osso no lugar sem precisar fazer uma cirurgia. —explicou Angela. —Acha que pode aguentar a dor enquanto eu faço isso?
—Claro. Acredite, já enfrentei coisas bem piores do que um osso quebrado. —respondeu Lena, embora Angela não tenha entendido bem o que a britânica queria dizer com aquilo. “Depois eu pergunto. Agora, vou cuidar desse punho.” pensou Angela, que logo pegou a mão direita de Lena, retirando a bandagem que estava ali. A britânica grunhiu um pouco de dor quando a doutora tocou na parte quebrada, o que fez Angela hesitar um pouco quanto a continuar o processo, porém Lena a encorajou com um olhar firme, e assim Angela continuou o seu trabalho. Logo que os ossos estavam no lugar, a doutora começou a engessar a mão de Lena. Após alguns minutos, a britânica encontrava-se com a mão perfeitamente engessada. Angela ficou pasma com aquela situação. Com exceção do grunhido quando a doutora pegou a mão de Lena, a britânica não demonstrou nenhum sinal de dor.
—Como você consegue? —perguntou Angela, e a britânica não entendeu a pergunta.
—Consigo o que? —disse Lena, confusa.
—O seu punho. Você não demonstrou nenhum sinal de dor. —disse Angela, curiosa com a garota que estava a sua frente.
—Ah, isso? Não foi nada. Boxeadoras enfrentam dores muito maiores dentro de um ringue. —explicou Lena.
—Você é uma boxeadora? —perguntou Angela. A doutora não conseguia acreditar que aquela garota na sua frente era uma lutadora.
—Sim. Amélie não lhe disse isso? —questionou Lena.
—Não, ela não disse. Então, foi assim que você quebrou o seu punho? Em uma luta de boxe? —questionou Angela.
—Bom... foi em uma luta, mas não de boxe. —disse Lena, e então explicou a Angela o que havia acontecido há alguns dias, quando salvou Amélie dos dois assaltantes, e como acabou quebrando o seu punho ao contra-atacar um dos indivíduos.
—Entendo. —disse Angela, indo para trás de Lena e começando a tocar em seu ombro. Ela parecia estar analisando alguma coisa no corpo de Lena.
—Hã... doutora, está tudo bem? —perguntou Lena. Angela não respondeu de imediato, e apenas continuou a tocar o ombro da britânica com as duas mãos, até finalmente parar e voltar para a frente da mesa.
—Seu ombro também sofreu com os danos do golpe. Quando me contou sobre o tipo de técnica que você aplicou, imediatamente imaginei que a lesão poderia ter se estendido um pouco mais, e parece que eu estava certa. Alguns músculos do seu ombro foram prejudicados. Só um imenso poder destrutivo poderia fazer isso. —disse Angela.
—Poder destrutivo? Como assim? —questionou Lena, confusa.
—Me refiro à força. Parece que você é mais forte do que aparenta. —disse Angela, e Lena riu.
—Acho que você está enganada. Eu não sou forte. Quem me dera ter força. —suspirou Lena. —Provavelmente, isso aconteceu devido à combinação da força do impacto do rosto do assaltante com o meu punho. Acho que a cara dele era mais dura do que eu imaginava, então.
—Talvez. —disse Angela. —Mas acho que seria pouco provável. Você é uma boxeadora, então provavelmente deve ter ossos bem fortes. Duvido que só isso fosse capaz de te machucar. Mas, agora não é hora de suposições. —disse Angela. —Bem, você vai ter que voltar aqui mais ou menos a cada duas ou três semanas para eu trocar esse gesso, ok?
—Ok. —respondeu Lena.
—Além disso, o corte no seu rosto... —disse Angela, passando sua mão esquerda sobre o corte na bochecha direita de Lena. —... sinto muito, mas vai ficar uma cicatriz.
—Shit (merda, em inglês)! —exclamou Lena, o que fez Angela abrir um sorriso.
—Não se preocupe muito com isso. Acredite, esse corte não deixou o seu rosto menos bonito. —observou Angela. —Na verdade, se me permite dizer, quando esse corte cicatrizar, é provável que você fique ainda mais bela. A cicatriz vai te dar um ar de mistério, e te deixar ainda mais sexy. —disse Angela, e essas palavras fizeram a britânica corar um pouco.
—O-obrigado... eu acho. —disse Lena, um pouco constrangida com aquela situação.
—Não fique constrangida. Não falei por mal.—disse Angela, fazendo um carinho nos cabelos de Lena. A doutora usava uma blusa lilás por baixo do jaleco, além de uma saia roxa, de um tom mais escuro. No pescoço, a doutora usava um colar de pérolas.
—Doutora, tem algo que quero lhe perguntar. —começou Lena. —Como já lhe contei, eu sou uma boxeadora, e graças a Amélie, eu pretendo retornar aos ringues quando estiver curada dessa lesão. Porém, não posso ficar parada por todo o tempo de recuperação, se não vou perder completamente a forma. Existe alguma restrição de exercícios físicos que eu não possa fazer? —perguntou Lena.
—Bom, não faça nenhum exercício que exija o uso do seu braço direito. Enquanto não estiver recuperada, não deve fazer nenhum esforço excessivo. De resto, acho que você está liberada para fazer qualquer exercício. —disse Angela. —Sabe, ainda não consigo acreditar que você seja uma lutadora. Me desculpe dizer, mas você é tão magra que não consigo imaginar você lutando boxe. Tenho certeza de que para alguém da sua altura, você está fora do peso. Estou certa, não estou? —questionou Angela, e Lena se admirou com a capacidade da mulher de descobrir tantas coisas sobre ela em tão pouco tempo.
—Sim, você está certa. Eu estou fora do meu peso ideal, mas isso é devido a categoria em que eu luto. Como eu tenho 1,64 de altura, e já tenho 26 anos, meu peso ideal seria entre 50 a 67 kg. — explicou Lena, embora ela tivesse certeza de que Angela já soubesse. —Hoje eu estou com 48 kg, lutando na categoria Mosca Ligeiro. —ao falar o nome, Angela não pode deixar de rir, e Lena a acompanhou.
—Desculpe, mas esse nome é bizarro. —disse Angela, se recuperando do ataque de risos.
—Eu sei. —concordou Lena.
—Mas e então? Por que não está em uma categoria mais de acordo com o seu peso? —questionou Angela, agora mais séria.
—Bom... embora o meu peso ideal seja de 50 a 67 kg, eu considero ideal a marca dos 57 kg. Era onde eu lutava originalmente, na categoria dos pesos Pena, quando comecei no boxe amador. —explicou Lena.
—E por que decidiu mudar de categoria? Você está 9 kg abaixo disso. —disse Angela.
—A história é um pouco longa, melhor deixar para outra hora. —disse Lena, tentando fugir do assunto.
—Bom, de qualquer jeito, imagino que você deva fazer uma daquelas dietas loucas para se manter no peso, não é? Imagino que também já tenha ficado sem beber água para não ganhar peso, além de ficar sem comer por um tempo. —disse Angela.
—Sim... era o sacrifício que eu tinha de fazer para me manter nessa categoria. —disse Lena, cabisbaixa.
—No seu lugar, eu voltaria para a sua categoria original. Isso lhe pouparia o desgaste físico e psicológico da dieta. —disse Angela.
—Eu estive pensando nisso, mas... subir para uma categoria mais alta, significa enfrentar adversárias mais fortes. Tenho medo... —começou Lena, mas sua voz falhou.
—Não se preocupe com o que vai dizer, eu não vou te julgar. —disse Angela, encorajando-a.
—Eu tenho medo de receber muitos socos fortes na minha categoria e... e... —Lena não conseguia continuar. Suas mãos tremiam só de imaginar o que poderia acontecer nas categorias mais altas.
—E você tem medo de ficar com sequelas, não é? Desenvolver problemas como outros boxeadores desenvolveram ao se aposentar. —conclui Angela, para o alívio de Lena. —Bem, é um risco, mas a vida é cheia deles. Quer ver uma coisa? O ar de grande parte das cidades do mundo é extremamente poluído, mas ainda assim todos continuam vivendo suas vidas normalmente, mesmo sabendo que essa poluição pode causar doenças terríveis. —disse Angela. —Lógico, eu não sou muito fã do que o boxe faz com os lutadores no fim de suas carreiras, mas eu entendo que lutar é a vida dessas pessoas... então, acho que tenho que respeitar as escolhas deles, e tentar ajudá-los nos momentos difíceis.
—Você acha que eu não deveria subir de categoria, então? —perguntou Lena. —Nos pesos Pena, eu vou correr mais risco de desenvolver esse tipo de sequela.
—Bem, pode ser. Talvez sim, talvez não. Só Deus sabe o que pode acontecer. —disse Angela, dando de ombros. —Mas saiba de uma coisa: as lutadoras dessa categoria dão socos mais fortes do que as que lutam no peso Mosca Ligeiro, porém, isso não significa que os seus socos, Lena, ficarão mais fracos. Pelo contrário. Você enfrentará adversárias mais fortes, mas você também será mais forte do que já é. Pode ser uma boa opção. —disse Angela.
—É... talvez. —disse Lena.
—De um lado, você tem o risco de lesões e sequelas. Mas, do outro, você tem a vantagem da força e de não ter que fazer mais dietas loucas. Então, o que me diz? —perguntou Angela.
—Acho que ainda tenho que pensar um pouco mais. —disse Lena.
—Claro. Não tenha pressa quanto a sua carreira, Lena. Você ainda é jovem. Não precisa se desesperar para conquistar o seu sonho. —aconselhou-a Angela. —Agora, quero falar com você sobre outra coisa.
—Outra coisa? Mais alguma recomendação médica? —questionou Lena.
—Não, não. É sobre Amélie. Qual é o relacionamento de vocês? —questionou Angela, de forma bem direta.
—Ah... bem, eu e Amélie somos apenas amigas... —disse Lena, com o coração acelerado. A britânica não entendia o motivo de aquela pergunta ter lhe causado essa reação. “Eu e Amélie somos apenas boas amigas... certo?” questionou-se Lena em seus pensamentos.
—Tem certeza? —perguntou Angela.
—Sim. —respondeu Lena. —Mas qual o motivo dessa pergunta? —perguntou Lena.
—Bom, na verdade, eu ainda estou intrigada com você. Sabe... talvez você não tenha reparado. Você viu como os olhos da Amélie estavam brilhando? —perguntou Angela, mas Lena não respondeu. —Imaginei que você não tivesse notado. Bem, na próxima vez que a vir, olhe-a nos olhos, porque esse olhar é um olhar raro.
—C-como assim? —questionou Lena, gaguejando.
—A última vez que eu vi Amélie com aquele olhar, foi quando ela ainda era uma bailarina. —revelou Angela. —Quando ela estava se apresentando... era daquele jeito que os olhos dela brilhavam. Você trouxe isso de volta, Lena. E por isso tenho que lhe agradecer. Muito obrigada por trazer a Amélie que eu conheci de volta. —disse Angela, e Lena ficou sem palavras. —Não fique envergonhada. Anda, diga alguma coisa! —disse Angela, sorrindo.
—Eu... —começou Lena, mas a britânica ainda não conseguia formar nenhuma frase. —E-eu... não sei o que dizer. —admitiu Lena.
—Então me diga algo sobre Amélie. —disse Angela. —Vamos, diga o que você acha da minha amiga?
—Como assim? —questionou Lena.
—Apenas diga. Não se preocupe com a resposta. —disse Angela, e Lena se pôs a pensar em Amélie.
—B-bem... a Amélie é uma pessoa muito legal. —disse Lena.
—Isso é tudo o que você acha da minha amiga? —perguntou Angela.
—É claro que não! —disse Lena, de forma apressada. —A Amélie é uma pessoa maravilhosa, além de uma mulher linda e elegante. Ela parece ser tão vívida, mas tem tão pouca idade... e ela era uma bailarina... ela devia ser tão incrível que acho que não consigo imaginá-la dançando. —disse Lena, com admiração.
—Isso é verdade. Eu tive a oportunidade de assistir duas ou três apresentações dela na França. Acredite, não creio que exista alguém no mundo que possa dançar tão bem do mesmo modo que Amélie dançava. —disse Angela.
—Então ela realmente era incrível! —disse Lena, com um sorriso. —Acho que sinto um pouco de inveja de você. Eu também gostaria de ter visto a Amélie nos palcos. —revelou Lena, o que fez Angela sorrir.
—Há mais alguma coisa que você queira dizer sobre Amélie? —perguntou Angela.
—Acho que não. —respondeu Lena.
—Tem certeza? Até agora você só listou qualidades. Não há nenhum defeito que você tenha visto nela? —perguntou Angela, e Lena colocou-se a pensar novamente. Ela não conseguia se lembrar de nenhum defeito da francesa. Na visão de Lena, ela parecia uma ótima pessoa. A francesa havia se preocupado com o estado de Lena quando descobriu que seu punho estava quebrado, e até a convidou para um jantar como forma de agradecimento. Amélie realmente era uma pessoa maravilhosa.
“Espera. Jantar?” pensou Lena, e só então se recordou do que havia acontecido no elevador, antes de chegarem ao apartamento de Amélie, e também após terminarem o jantar. Fora isso, também houve a brincadeira da francesa na academia, quando todas as pessoas estavam olhando para elas duas. Uma lembrança foi puxando a outra, e de repente, Lena acabou por encontrar um defeito de Amélie.
—E então? Pela sua cara, imagino que tenha se lembrado de algo. Acertei? —perguntou Angela, e Lena não conseguiu guardar segredo.
—Bem... às vezes a Amélie faz algumas brincadeiras que eu não gosto muito. —admitiu Lena, constrangida.
—Que tipo de brincadeiras? —perguntou Angela, e ao ouvir tal pergunta, Lena ficou completamente corada. —Já entendi. Realmente, às vezes a Amélie é um pouco intensa demais... —disse, suspirando.
Lena se sentia envergonhada por tal revelação, mas ela não conseguiria esconder a verdade da doutora mesmo. Pelo menos não foi preciso nenhuma palavra para Angela entender a situação.
—Antes de encerrarmos a consulta, tenho mais uma coisa a te perguntar, Lena, mas dessa vez a pergunta diz respeito apenas a você. —disse Angela.
—Como assim? —perguntou Lena, confusa.
—Por que você tem medo de ser quem você é? —perguntou Angela, o que deixou Lena ainda mais confusa.
—Não entendi a sua pergunta. —disse Lena.
—Você entendeu. —disse Angela, encarando-a. —Você ainda acha que consegue esconder alguma coisa de mim? —questionou Angela, e Lena se viu sem saída. Derrotada, decidiu dizer a verdade.
—Tenho medo da reação das pessoas. Nem todo mundo me aceitaria se descobrissem que sou lésbica. Embora o Reino Unido seja um lugar mais tolerante com pessoas como nós, eu sei que ainda existem pessoas que não aceitam um relacionamento entre duas pessoas do mesmo sexo. —revelou Lena.
—Então você gosta de mulheres? —perguntou Angela.
—Sim. —respondeu Lena, meio sem entender a pergunta. E só então, Lena percebeu que talvez tivesse dito mais do que devia. —Espera! Eu achei que você sabia. Não foi por isso que você me fez aquela pergunta? —questionou Lena, nervosa.
—Eu tinha uma suspeita, mas não tinha certeza. Lancei aquela pergunta só pra ver o que você respondia. Não imaginei que eu estivesse certa dessa vez. —disse Angela, o que deixou Lena irritada. —Está tudo bem, Lena. Não se preocupe. Eu não tenho preconceitos quanto a isso. Além do mais, não tem problema se você ainda não estiver pronta para revelar isso para as outras pessoas. Cada um tem o seu tempo, e eu, como médica, aprendi a respeitar isso. Eu não contarei nada a ninguém, até que você esteja pronta para falar. —disse Angela, e Lena se sentiu aliviada.
—Thanks (obrigada). —disse Lena. —Sabe, às vezes, essa sua habilidade de compreender as pessoas sem precisar trocar palavras é um pouco irritante... mas no resto do tempo, é algo fantástico, além de ser mais uma coisa que eu invejo em você. —revelou Lena, o que apenas tirou um sorriso de Angela.
—Já me disseram isso. —disse Angela, ainda sorrindo. —Bom, acho que isso finaliza a nossa consulta. Não se esqueça de voltar aqui para eu trocar o seu gesso, e lembre-se das outras recomendações. Todas elas, entendeu? —disse Angela.
—Pode deixar. Quanto lhe devo pela consulta? —perguntou Lena.
—Nada. —respondeu Angela.
—Ora, vamos. Depois de tanta atenção, não posso sair daqui sem lhe pagar. —disse Lena.
—Encare apenas como um agradecimento. Um agradecimento por ter salvado a vida da minha amiga. —disse Angela, e Lena apenas assentiu. —Bom, espero você nas próximas semanas.
—Não se preocupe, não irei furar a consulta. —brincou Lena, e em seguida, ambas se despediram. Enquanto a britânica se dirigia para a saída, a doutora Ziegler ficou pensando em sua amiga Amélie. “Será que ela finalmente encontrou alguém que a fizesse se sentir viva novamente?” pensou Angela.
FORA DA CLÍNICA
Amélie estava estacionada em uma esquina, que dava vista para a entrada da clínica. Desde que Lena e Angela entraram, Amélie apenas limitou-se a mudar o carro de lugar e se esconder, esperando para ver o que aconteceria. Horas se passaram, e Amélie começou a ficar preocupada. “Será que a lesão de Lena é mais grave do que aparenta?” se perguntou Amélie, em seus pensamentos. No entanto, quando estava para ir até lá, viu Lena sair da clínica sozinha, e caminhar normalmente na direção oposta em que a francesa estava. Amélie sentiu vontade de ir até a britânica, dar uma carona, perguntar como havia sido a consulta, mas antes que pudesse fazer isso, recebeu uma mensagem em seu celular:
Angela: Me agradeça depois.
Amélie, intrigada com aquelas palavras, perguntou:
Amélie: Está se referindo ao favor?
Angela: Não. Digamos apenas que eu contribui indiretamente para tornar o que era bom em algo melhor. Com o tempo, talvez você entenda o que quero dizer. Se não entender, eu lhe conto depois.
Amélie: Você está muito misteriosa, doutora Ziegler.
Angela: Sempre fui. Ah, vou lhe dar uma dica: Não tenha pressa quanto a Lena. Seja um pouco menos intensa, e pare com as suas “brincadeiras”. A britânica não gostou muito disso.
Amélie estava um pouco confusa com tantas informações, principalmente porque ela não sabia se estava conseguindo entender realmente o que elas significavam. Mas antes que pudesse pedir alguma explicação a Angela, outra mensagem chegou, e Amélie sentiu um misto de emoções ao lê-la:
Angela: P.S: Lena gosta de mulheres.
Amélie: Obrigada. Era tudo o que eu precisava ouvir.
Após essa última mensagem, Amélie arrancou com o carro, e ficou dando voltas e voltas, procurando por Lena. Não teve sorte, e acabou não encontrando a britânica. Por fim, decidiu voltar para a sua casa e seguir o conselho de Angela. “Não tenha pressa, Amélie. Lena vai ser sua... no tempo certo.” pensou Amélie.
ALGUMAS HORAS DEPOIS, NA ACADEMIA WILD FIST
Lena entrou apressada na academia, procurando por Gabriel. Encontrou-o sentado na beirada de um ringue, com manoplas de boxe nas mãos. Parecia estar esperando alguém para treinar.
—Ei, Gabe! —chamou Lena, e imediatamente o homem virou o rosto na sua direção.
—Lena. Demorou a aparecer eim? —brincou Gabriel, e só então percebeu o gesso na mão de Lena. —O que aconteceu com a sua mão, garota? —perguntou.
—Punho quebrado, mas não se preocupe, a Amélie me levou em uma médica maravilhosa, e ela já está cuidando de mim. —disse Lena.
—A noite foi tão boa assim? —brincou Gabriel, o que acabou deixando a britânica um pouco irritada. —Desculpe, não consegui resistir a piada. Então, como foi que você quebrou esse punho? —perguntou, e Lena lhe contou a história, de como salvou Amélie dos dois assaltantes e do golpe que acabou quebrando o seu punho.
—Espera. Então ontem, quando você veio na academia, você já estava com o punho quebrado? —perguntou Gabriel, e Lena apenas assentiu. —Meu Deus! Como foi que eu não percebi isso. Você ficou tanto tempo na minha frente e eu não notei isso. Desculpe por não ter te ajudado, Lena. —disse Gabriel.
—Relaxa. Não se preocupe com isso. —disse Lena. —Convenhamos, seria bem difícil você reparar no meu punho enquanto eu chorava em cima da sua mesa. —disse Lena, brincando com a situação pela qual havia passado no dia anterior. Gabriel apenas deu uma risada, mas a britânica sabia que ele estava um pouco nervoso com aquilo.
—Então... você vai mesmo se aposentar do boxe, garota? —perguntou Gabriel. Lena demorou um pouco a responder, até que finalmente disse:
—Não há mais como eu continuar lutando na categoria Mosca Ligeiro... —disse Lena, e a britânica percebeu que uma expressão triste se formava no rosto de Gabriel. —... na verdade, duas pessoas me convenceram a voar mais alto, por isso, decidi que vou voltar para os pesos Pena.
—Então você não vai se aposentar? —perguntou Gabriel, com um sorriso no rosto.
—Não, Gabriel. Decidi lutar pelo meu sonho. Nosso sonho. —disse Lena, sorrindo ao ver a animação de Gabriel.
—Vou preparar a papelada para você subir de categoria. —disse Gabriel. —Quanto ao seu punho... alguma recomendação médica em especial? —perguntou.
—A doutora disse apenas que eu devo evitar exercícios que exijam o uso do braço direito em si. De resto, ela me liberou. —respondeu Lena.
—Entendo. Bom, acho que, por enquanto, você deve descansar. Ainda não se recuperou totalmente da luta. Volte aqui em uma semana, e eu vou lhe dar mais algumas instruções. —disse Gabriel.
—Ok. Bom, acho que vou indo então. Vou aproveitar essa folga que você está me dando. —brincou Lena, e antes que saísse, Gabriel a chamou. A britânica se virou.
—Obrigado por não ter desistido. Acredite, dessa vez, conseguiremos realizar o nosso sonho. —disse Gabriel, com voz firme.
—Eu acredito. E outras pessoas também. —disse Lena, também com a voz firme, e logo após se despediu, e saiu da academia.
UMA SEMANA DEPOIS
Lena retornou a academia, e Gabriel lhe deu novas instruções, como havia dito. Para começar, Lena iria fazer apenas o seu roadwork (espécie de corrida que os boxeadores fazem, e chamam esse método de treinamento de roadwork.), e depois iria treinar apenas golpes de esquerda, enquanto não pudesse utilizar o braço direito.
As semanas foram passando, e Lena ia a clínica de Angela nas datas certas para trocar o gesso do seu punho.
—Você está se recuperando bem. —disse Angela, olhando a nova radiografia que havia feito do punho de Lena. —Se continuar desse jeito, vai estar curada daqui a mais ou menos três semanas. Depois disso, acho que vou lhe recomendar uma fisioterapia, para lhe ajudar a melhorar os movimentos do seu punho.
—Hmmmm, ainda tem fisioterapia? —perguntou Lena, fazendo biquinho. —Não posso pular essa parte?
—Não. —respondeu Angela. —Por hoje, acho que é só. Lembre-se de não realizar exercícios que exijam o uso do punho e do braço direito. E volte aqui novamente em três semanas, para eu saber se precisarei trocar o gesso novamente ou se já poderemos iniciar a fisioterapia, entendeu? —perguntou Angela.
—Yes, ma’am (“Sim, senhora” em inglês). —respondeu Lena, batendo continência, o que arrancou boas risadas das duas.
Após sair da clínica, Lena retornou a academia. Já fazia um bom tempo que não via Amélie, e como a britânica não tinha o número da francesa, a única maneira de se encontrar seria se, por força do acaso ou destino, ambas fossem na academia no mesmo dia ao mesmo tempo. Claro, Lena poderia ir até o residencial onde Amélie morava, mas não tinha certeza de que conseguiria entrar, tão pouco de que Amélie estaria lá, já que a francesa era uma pessoa muito ocupada.
Chegou à academia, e infelizmente, Amélie não estava lá. Por outro lado, Gabriel parecia estar lhe esperando há algum tempo.
—Finalmente chegou. —disse Gabriel, com um sorriso. Novamente, ele estava ao lado de um ringue.
—Não consegue desgrudar do ringue, Gabe? —perguntou Lena. —Acho que está precisando de uma namorada. —brincou.
—Muito engraçado. —disse Gabriel. —Enfim, como foi a consulta? —perguntou.
—Bem, a doutora disse que estou me recuperando bem. Voltarei em três semanas para ela examinar meu punho novamente. —disse Lena. —Acho que até lá, vamos ter que continuar com o mesmo treinamento.
—Imagino que sim. —disse Gabriel. —Lena, tenho que lhe contar algo. —disse, sério.
—O que foi? —perguntou Lena.
—Bem... eu decidi que não irei mais te treinar. —respondeu Gabriel, e Lena ficou em choque com aquela revelação. Porém, ao perceber a reação da britânica, o homem logo tratou de se explicar. —Calma, não é isso que você está pensando. Eu não desisti de você. Eu jamais faria isso. O que quero dizer é que, na verdade, acho que talvez esteja na hora de mudar. Sabe, você está “buscando novos rumos na sua carreira”, e acho que você já esteve tempo demais vivendo sobre a minha perspectiva de boxe. —explicou Gabriel.
—Então... como vai ser a partir de agora? —perguntou Lena, cabisbaixa.
—Eu irei trazer um novo técnico e um novo auxiliar para treinar você. Eu tenho certeza de que uma nova visão do boxe vai lhe ajudar muito na sua carreira. —disse Gabriel. —Mas não se preocupe. Eu não irei lhe treinar, mas sempre estarei aqui para te apoiar, tirar dúvidas, e lhe aconselhar.
—Acho que me sinto melhor agora. —disse Lena, mais aliviada. —Então... estou curiosa. Esse técnico e esse auxiliar... quem eles são? —perguntou Lena. Gabriel deu um sorriso, antes de responder:
—Digamos que eles são antigos conhecidos. —disse Gabriel, de forma misteriosa.
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