Jack
Era nove e meia quando minha mãe me acordou.
_ Bom dia! Pronta para a missa _ sua voz era alegre enquanto ela abriu as cortinas revelando muita claridade vinda do exterior _ Olha só que dia lindo!
Consegui abrir os olhos ao focalizar o rosto dela sobre mim.
Sorri _ Eu não perderia a missa por nada neste mundo.
Claro que a cama era mais convidativa do que um ladainha interminável de um padre, por mais que ele fosse articulado. Mas eu inseri a minha família na sociedade local, e tinha essa responsabilidade.
Além disto, eu estava acostumada a largar o meu conforto pela aventura, fosse pular de paraquedas ou participar de uma degustação de chocolates.
_ Essa é a minha garota _ sorriu orgulhosa.
Me deixou, para eu me arrumar. Tomei um banho breve. Vesti um jeans e uma blusa bonita. Será que o Asrael vai na missa? Não, eu acho que não. Ele deve dormir até a hora do almoço hoje. Não posso culpa-lo.
Havia muita gente na igreja. Dois casais me chamaram a atenção. Eles eram tão belos que não pareciam reais. Percebi que o meu pai também não tirava o olhar deles. Mas eles saíram antes do fim.
O Asrael não foi. Isso me deixou um pouco decepcionada.
_ Não pode cobrar que todos tenham a sua boa disposição, querida _ meu pai falou ao notar.
_ Eu só queria vê-lo.
_ Vá visitá-lo mais tarde.
Examinei o seu rosto, para ter certeza de que aquilo era um consentimento.
_ Posso mesmo?
_ Claro _ tocou no pingente de lobo no meu pescoço _ Acho que você pode ficar até mais tarde desta vez.
Pareceu que ele sabia o que o pingente fazia.
_ Obrigada _ me limitei em dizer.
Depois do almoço, peguei a moto, desta vez, e fui a casa do Asrael.
Laura
_ Quem é vivo sempre aparece, não é mesmo? _ a voz do Kauã me surpreendeu.
Virei para vê-lo _ Fale por você. Foi você quem sumiu.
_ É que não é nada agradável ver você cercada por má companhia.
_ Eu? Pensei que fosse a minha mãe.
_ Acho que deixei bem claro que a sua mãe é passado para mim.
_ Uh! Para. Você está se complicando.
_ Não tem nada a ver, Laura. Ela mudou, você não. Você não tem a mesma essência que outros mortos vivos. Aliás, onde estão eles?
Desviei o olhar a sem saber se podia confiar.
_ Os bombeiros apagaram uma fogueira feita com a sua casa mais cedo. Mas você já sabe disso. Foi você?
_ Tem um caçador na cidade, ele pegou a Luana enquanto fugíamos. Tem armadilhas na floresta.
A falta de reação dele me deu a dica.
_ Você sabia.
_ Os caçadores nunca caçaram por aqui. As armadilhas, ficam na floresta, dentro das terras deles. Vocês não tinham que andar por lá.
Se deu conta do meu estado e respirou em alto censura _ Vem comigo.
Entrei no seu carro e seguimos para o meio da estrada que dava para a fazenda da sua família. Ele pegou o celular e pareceu falar com o caçador. Se referiu a Luana como amiga. Não demorou até desligar.
_ Ele nega conhece-la.
_ Certo. Me leva de volta.
_ O que você vai fazer? _ algo o alertou sobre mim.
_ Vou trocar a filha dele pela Luana. Simples assim.
_ Você está louca? Não é "simples assim". Se mexer com a família de um caçador, está declarando guerra.
_ Ele começou.
Kauã levou as mãos a cabeça e pensou até ter uma ideia.
_ Tem razão. Ele começou. Vá em frente. Mas não diga nada para a garota, ela não deve saber sobre nada disso ainda. Não tem idade para ter sido iniciada. Toma _ me entregou o seu celular _ Usa isso para falar com o Dante. Vou dizer que perdi. Mas você está sozinha _ negou, assegurando _ Boa sorte _ indicou o retorno com a mão, para que eu voltasse à pé.
Voltei para a frente da casa do namorado e esperei até ambos saírem para dar uma volta. Chegaram no castelo onde fui transformada pelo Jean Pierre. Brincavam de pega esconde quando capturei a garota. O lobisomem nos achou.
_ O que você está fazendo? _ o rapaz perguntou levantando os braços.
_ Eu preciso levá-la.
_ Me leva junto _ se ofereceu.
_ Não preciso de um herói, lobo. Só quero a minha mãe de volta.
Um barulho o distraiu e eu fugi, com a garota o mais rápido que pude.
Eu não sabia o que estava fazendo. Onde colocar a garota? Como negociar? O que dizer é como dizer? Eu não sou uma sequestradora, sou uma adiministradora...
Andava de um lado para outro, diante do olhar da garota presa por algemas e correntes que sobreviveram ao incêndio.
Estou ferrada, pensei alto.
_ Por que está fazendo isso?
_ Por que quero a minha mãe de volta.
_ O que aconteceu com a sua mãe?
_ O seu pai a pegou e prendeu na fazenda de vocês. Eu ouvi ela gritar hoje mais cedo.
_ O que você e a sua mãe são? Digo, porque nunca vi ninguém correr tão rápido. E você é... tão bonita.
_ Somos um tipo de criatura rara que pessoas como o seu pai usam para prolongar a vida e curar suas doenças.
_ Se você sabe que pode ajudar as pessoas dessa maneira, por que não ajuda?
_ Porque ninguém nunca me pediu. O que eles fazem é tirar à força e nos matar no processo. É o que ele está fazendo com a minha mãe, neste momento. E talvez até com os meus amigos que voltaram para salva-la.
_ Se o meu pai é assim, como você diz, ele é um monstro. Não foi esse homem que eu conheci a minha vida toda.
_ Você é a filha dele e não a sua caça.
Ouvi um barulho atrás das árvores e olhei para lá, vendo o namorado da garota. Ele levantou as mãos de novo.
_ Acredito em você _ falou dando um passo para frente e parou _ Sei que aquele cara tem o perfil de um caçador. Posso te ajudar.
_ Por que vai me ajudar?
_ Por ela, e porque é o certo a ser feito. Você pode confiar em mim?
_ Não sei.
_ O meu nome é Asrael.
_ Laura.
_ O nome dela é Jack, Laura. Qual é o nome da sua mãe e dos seus amigos?
_ Luana, Jean Pierre e Andrew.
_ Certo. Onde você acha que eles estão?
_ Em baixo da fazenda. A voz da minha mãe veio do sub-solo.
_ Minha casa não tem porão _ a Jack informou.
_ Não foi, exatamente, abaixo da casa que a voz da minha mãe surgiu. Foi embaixo do solo gramado.
_ Complicado, Laura. Como posso procurar, se não sei aonde?
Peguei o telefone do Kauã do bolso e o segurei na mão, quase perdendo as esperanças.
_ Conheço esse telefone. Você conhece o Kauã?
_ Sim, ele sabe. Mas não vai ajudar.
_ Mas ele te deu isso?
_ Sim.
_ Então ele já está te ajudando. Acho que ele pensou no mesmo que eu acabei de pensar.
_ Em que?
_ Só espera, e cuida bem da Jack para mim. Volto já com a sua família.
Kauã
Deixei a Laura se ocupar com o seu plano torto. Assim eu poderia trabalhar para resolver o problema com mais eficácia. Claro que ter uma vampira a tiracolo quando você pede a ajuda de lobisomens não é uma boa ideia.
Juntei todos os lobisomens da comunidade e juntos, invadimos a fazenda do Dante. Ocupamos toda a área livre ao redor do casarão. Éramos muitos, o Dante não teve como nos ignorar.
Saiu pela porta da frente, e parou diante dos lobisomens transformados e prontos para a guerra. Apenas eu estava em forma humana, para negociar.
_ O que significa isso? _ pediu explicação.
_ Você caçou nesta cidade.
_ Entraram nas nossas terras.
_ Essa cidade e tudo dentro dela é nosso, até as suas terras.
_ Não cacei um de vocês.
_ Caçou sim. Todos dentro desta cidade são um de nós. Devolva agora ou vamos tomar de vocês _ usei o plural, quando a sua esposa se colocou ao seu lado, tentando entender o que acontecia.
Finalmente, ele entendeu. Soltou uma salva de palavrões em tom baixo, e falou para a esposa liberta-los.
_ Todos eles? _ ela pediu confirmação e o Dante assentiu.
Minutos de suspense e apreensão seguiram até que avistamos os três vampiros da cidade, cruzando o arco da porta da frente da casa.
A Luana tinha seu vestido totalmente coberto por sangue seco. O Dante estivera trabalhando nela o dia todo, com certeza. Tirei minha jaqueta e coloquei sobre os seus ombros, rapidamente. Alguma coisa quebrou dentro de mim ao vê-la assim. Um ódio súbito pela figura daquele humano nasceu em mim.
_ Nunca mais faça isso, ou eu juro que vou fazer suco do seu corpo e beber.
Asrael, um jovem, se aproximou de nós quando saímos da floresta e voltamos a forma humana.
_ A Laura mandou te devolver _ me entregou o meu celular.
_ Quero falar com ela.
_ Ela está nas ruínas da fazenda.
A felicidade da Laura ao ver seus amigos e sua mãe, bem, me comoveu e me deixou orgulhoso ao mesmo tempo. Abraçou cada um deles e depois, veio até mim. Fui abraçado e agradávelmente beijado, antes de qualquer reação minha. Dentro do seu beijo, senti que era alí que eu queria estar há muito tempo e por todo tempo que me restava.
Quando ela se afastou, lembrei que aquilo foi somente gratidão. Lembrei que nada apagaria da sua mente que eu fui da sua mãe e que, por isso, não poderia ser seu.
_ Podem ficar lá em casa, por um tempo. Vamos reconstruir a casa de vocês _ afirmei _ Não se preocupem com o caçador. Ele foi devidamente avisado. Enquanto ficarem nesta cidade, ele não tocará em vocês.
A fazenda da minha família era imensa e os perdi de vista assim que foram alojados. Fiquei solitário mesmo tendo a Laura a metros de distância. Acho uma droga essa lealdade que os lobisomens desenvolvem pela pessoa por quem se apaixonam. É terrível conviver com isso quando não se é correspondido.
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