Quando nós começamos a avistar o castelo, eu comecei a entrar em pânico de verdade.
O que eu estava fazendo ali? O que eu estava pensando?! Eu estava voltando para o lugar de onde eu tinha fugido no dia anterior?! Eu estava aterrizando no casamento dele com outra menina! Uma menina que estava carregando o filho dele! O que eu estava esperando? Que ele viesse me dizer que ela tinha morrido? Perdido o bebê? Que ele não ia se casar com ela, mas criaria o filho? Que ele separaria o filho da mãe?
Tudo tão terrível, tão absurdo que eu não deveria nem pensar na possibilidade. E mesmo assim, mesmo que eu quisesse muito negar, era isso que eu esperava. Era por isso que eu rezava. Qualquer razão, qualquer mínima mudança que fosse vantajosa. Era isso que eu tinha virado, uma menina que rezava por acontecimentos tortos só para conseguir a sua própria felicidade egoísta.
Aquilo estava errado. Eu precisava falar para o piloto virar esse helicóptero. Eu precisava que meu pai falasse por mim, porque eu não estava conseguindo pensar direito. Eu não podia me deixar ser assim. O que tinha mudado? E se não tivesse mudado nada? E se o que tivesse mudado fosse terrível? Eu conseguiria viver comigo mesma sabendo que eu tinha causado alguma coisa terrível? Quanto tempo duraria a minha felicidade? Quanto tempo até que a culpa me consumisse?
Eu precisava parar esse helicóptero. Eu precisava colocar meus pés no chão. Eu precisava conseguir pensar direito antes de falar com ele. Só de pensar em falar com ele, eu já sentia meu estômago embrulhando. Não era possível. Não era possível que eu estava ali de novo, naquela mesma posição, me sentindo daquele jeito de novo. Eu esfreguei meu rosto várias vezes, eu me coçava o braço com força, tentando me livrar daquele nervosismo. Mas não dava. Porque o helicóptero não parava. Eu não abri a minha boca e não pedi para ele parar. E quanto mais perto nós chegávamos, mais eu me contorcia.
Até que meus olhos encontraram algo que eu realmente não esperava. Eu buscava pela igreja, mas assim que nós passamos pelo castelo, a primeira coisa que eu vi foi a pista de skate de Sebastian. Mas ela não estava mais cinza. Ela não estava mais sem graça. Eu mal conseguia entender como aquilo era possível.
Era eu. Uma voz gritava na minha cabeça que era eu ali, desenhada e colorido, meus cabelos em ondas e tudo ao meu redor era de circo. Um elefante, tendas, até pipocas e bolas. Eu usava uma coroa de rosas e uma faixa me contornava. Regen & Meer. Eu não conseguia entender como aquilo era possível! Quando ele tinha feito aquilo? Como ele tinha feito aquilo? Eu não sabia se eu deveria mesmo acreditar que era para mim, mas até meu pai olhava para o desenho com os olhos brilhando.
Eu não consegui tirar os olhos de mim, enquanto minha respiração ficava cada vez mais fraca. E a cada segundo eu percebia mais e mais que era eu. Era realmente eu. Era eu que estava ali. Ele tinha me desenhado. E ele estava logo ali, o ponto preto que atrapalhava meus cabelos loiros no desenho. Ele andava de um lado para o outro, mas conforme nós fomos nos aproximando, eu percebi que ele nos olhava. Já me esperava, amassando uma mão na outra.
O piloto não pousou perto. Pelo contrário. Nós passamos por Sebastian e eu fiquei com o coração na mão, só de pensar que ia demorar demais para eu chegar até ele. Minha vontade era sair correndo e me jogar nos braços dele. Já não me importava as linhas tortas que me fizessem ficar ao lado dele. Eu as aceitava. Eu aceitaria todas. Naquela hora, eu venderia o mundo inteiro para quem fosse só para poder ficar com ele.
Assim que meus pés tocaram a grama, eu comecei a correr em direção a Sebastian. Mas assim que cheguei perto de entrar na pista, eu diminui o passo. Não sabia bem porque, mas vê-lo assim de perto, a igreja logo atrás dele, foi como um choque de realidade. De leve, mas um choque mesmo assim. Eu soltei a saia do meu vestido e respirei fundo, sem parar de andar. Foi quando eu percebi que eu estava mesmo voltando para o castelo. Aquele lugar que tinha me visto no mais alto e no mais baixo da minha vida. O lugar que eu mais odiava e amava ao mesmo tempo. Era tanta coisa que eu sentia, tantas coisas pelas quais eu tinha passado ali, eu não sabia se conseguiria suportar realmente estar ali.
Mas minhas pernas andavam, talvez movidas pelo resto de esperança que ainda me deixava respirar. Sem pressa, quase sem vontade, eu andei até ele, que me observava com mais expectativa nos olhos do que eu jamais me deixaria sentir. Eu tive que engolir mil vezes, mil coisas que eu queria perguntar. Mas eu não sabia por onde começar. E eu tinha medo, eu realmente tinha medo de que se eu falasse alguma coisa, talvez eu estragasse tudo. O que mais eu tinha a perder? Tudo. Por mais que eu não tivesse nada, estando na frente dele, eu ainda tinha tudo. Com aquele desenho e cada mini demonstração que ele tinha me oferecido do que ele sentia por mim, eu tinha tudo. E cada vez que ele me olhasse, cada vez que eu o sentisse me roubando o ar, eu sabia que eu ainda podia perder tudo. Tudo que eu não tinha, tudo que eu era.
Eu respirei uma última vez quando finalmente cheguei até ele. Me mantive longe o suficiente para conseguir continuar de pé nas minhas pernas bambas. Até abri a boca para falar alguma coisa, mas não saiu nada. E quando eu engoli de novo para tentar trazer forças à minha voz, foi ele que começou a falar.
"Sabe que eu te odiava?" Ele me perguntou, mas aquilo só ajudou a me tirar toda a possibilidade de conseguir falar alguma coisa de volta. "Mas sabe que se eu não tivesse te odiado tanto, talvez agora eu não te amasse com todo o meu ser." Ele falava tão naturalmente, enquanto eu sentia as batidas do meu coração subindo até a minha garganta. "Mas eu te odiava, sim. E eu te odiava muito, porque tinha alguma coisa em você. Alguma coisa que me atraía, me fraquejava, que me deixava perdido e me assustava," ele deu um passo na minha direção e eu segurei a saia do meu vestido com toda a minha força. "E isso foi tomando conta de mim," ele continuou com uma mão na barriga por cima de seu blazer azul escuro. "Esse ódio, essa raiva de mim mesmo por me importar, por não conseguir me controlar. Eu me odiava muito mais do que eu te odiava. Porque eu era que era o fraco, eu que estava me perdendo. Mas não tinha o que eu podia fazer. Eu neguei desde o começo com todas as forças que eu nem tinha - só porque eu sabia desde o começo que você tinha o que era preciso para acabar comigo."
Eu tive que olhar para baixo e soltar do meu vestido para conseguir enxugar as lágrimas que insistiam em ficar entre nós. Mas ele não me esperou voltar a mirá-lo para continuar falando. Ele deu mais um passo em minha direção.
"Quanto eu mais queria te odiar, mais eu te amava," ele disse com uma risada fraca, que me fez perder o ar de novo. "E quando eu achei que você não me queria do mesmo jeito, eu fiz a única coisa que eu sabia fazer." A sua voz ficou séria e eu não consegui evitar de olhá-lo nos olhos. "Eu não entendia naquela hora que eu estava arriscando tudo que eu mais queria. porque eu sentia em meu peito que eu nunca a teria comigo. E isso me matava. Eu errei de verdade, mas foi de desespero, de fraqueza, de loucura. Se eu soubesse, se eu ao menos entendesse o que eu sentia, o meu medo, esse amor que me consumia, eu nunca teria feito aquilo. Eu nunca teria arriscado assim.
"Mas eu arrisquei. E foi só isso, um risco. Um erro de momento. Porque isso daqui," ele abriu os braços, "todo esse dia, esse casamento está vazio agora. Não tem nada que me prenda ao erro do passado, não tem filho que me junte a ela. Foi um mal-entendido, foi um falso positivo." Eu soltei um grio sem querer, na mesma hora em que soltava todo o ar que eu tinha dentro de mim.
Levei minha mão à boca para tentar abafar meus gritos, mas tava difícil. Era como se eu tivesse guardado aquilo durante todos os dias em que eu tivesse ficado ali. E finalmente estava saindo, todo o desespero, toda a agonia, tudo de uma vez. Eu segurava à minha barriga como se tudo estivesse prestes a sair de uma vez, ao mesmo tempo que minha outra mão cobria minha boca inteira. E minhas pernas não aguentaram me manter de pé por mais nem um segundo. Eu me agachei, sentindo a minha respiração tomar a velocidade do meu coração.
"Nina, eu estou livre agora," Sebastian continuou e eu podia ouvir o seu sorriso em sua voz. "Mas eu realmente quero estar preso a você. Eu sei que depois de tudo que aconteceu, eu não mereço te pedir uma coisa como essas." Ele se agachou na minha frente e eu tive que olhar para ele, ainda sentindo meu coração pulsando na minha garganta, nas minhas mãos, em cada pedaço do meu corpo. "Esse casamento está vazio, mas ele não precisa estar. E eu não conseguiria ficar mais nem um segundo sem você."
Eu tive que enterrar minha cara nas minhas duas mãos. Ele estava mesmo me pedindo aquilo? Ele realmente estava sugerindo o que eu estava pensando?
Eu mal conseguia entender tudo que estava acontecendo até ali. Então não era verdade, ela não estava grávida. Ele não teria que se casar com ela. Ele podia ser meu. Ele podia ser meu!
E por que eu estava pensando? Por que eu sentia minhas pernas moles só de imaginar o tamanho do salto que eu daria de dizer sim? Por que aquele medo me arrepiava o corpo inteiro? Ele seria meu. Não tinha escolhas a se fazer, não tinha nada para decidir. Não era como se eu tivesse uma opção. Porque ou eu escolhia viver, ou eu o deixava. E por mais que pular parecesse completamente louco, por mais que me deixasse com muito, mas muito medo mesmo de não conseguir sobreviver àquilo, eu tinha certeza absoluta de que se eu não pulasse, eu não conseguiria sobreviver. Era a certeza contra a possibilidade. E todo o meu corpo já se preparava para pular. Até minhas pernas bambas já ganhavam força o suficiente para me colocarem nas pontas dos pés, mesmo agachada.
"Nina, eu te imploro," a voz de Sebastian, me fez tirar as mãos do rosto e voltar a mirá-lo, "me dá uma chance de tentar te provar que eu consigo te fazer a pessoa mais feliz do mundo."
Ele não percebia que só me pedir isso já me fazia ser a pessoa mais feliz do mundo.
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