P.O.V. Sakurai Harumi
Clareira do bosque - 23h49
Já havia se passado mais de meia hora desde o incidente, mas as lágrimas ainda corriam silenciosas sobre minhas bochechas, eu havia desistido de suprimi-las.
Eu sentia como se uma manada houvesse me pisoteado. Havia escoriações nos meus braços e pernas, até no rosto havia um corte que ardia, e minha perna esquerda latejava em uma dor aguda insuportável, um osso quebrado, quem sabe. Mas o que realmente mais doía era meu coração, estraçalhado pela culpa e angústia de não ter sido capaz de salvar a pessoa que eu amava.
Alguma trilha do bosque - 22h58
— Haru, não faz isso comigo — escutei uma voz masculina dizer próximo ao meu rosto. Tentei abrir os olhos, mas era quase impossível, por mais que eu ordenasse eu não conseguia. Prestei atenção aos sons à minha volta, havia uma respiração ofegante e pesada próximo ao meu rosto. Uma mão gelada apoiava minha nuca e quando inspirei fundo senti um cheiro familiar de fumaça e tecido queimado.
— Todo… — sussurrei, ainda sem conseguir abrir os olhos, mas tentando mover uma das mãos para tocá-lo. O escutei suspirando aliviado e ele segurou minha mão firme.
— Não se esforce, você estava perdendo o pulso Haru… Por um momento eu pensei… — Todoroki disse com a voz embargada. — Ela vai ficar bem, vamos nos apressar até a clareira — ele disse desta vez para outra direção, falando com alguém que também devia estar ali. Senti meu corpo ser erguido gentilmente por alguém.
— O Katsuki… — consegui falar com dificuldade. — A garota disse que… vão levar ele… — minha voz estava tão fraca que soava como um sussurro.
— Nós estamos escoltando o Kacchan até o acampamento — Deku respondeu, então ele também estava ali.
— Vocês estão protegendo o Bakugou? — Ochaco-chan perguntou, ouvir a voz dela me tranquilizava em saber que ela estava bem, eu queria conseguir abrir os olhos para me assegurar de que todos estavam bem de verdade. — Então onde ele está agora? — ela perguntou.
— Hã? Como assim? — Deku questionou rapidamente. — Ele está aqui a… — o garoto parou a frase na metade e o silêncio tomou conta do grupo por alguns instantes.
— Eu não estaria tão certo disso — uma voz masculina desconhecida soou de algum lugar sob nossas cabeças. — O garoto de quem vocês estão falando… Bem, o capturei com minha mágica. — O homem disse com uma risadinha, nesse momento, mesmo estando debilitada e fraca, senti meu coração começar a bater cada vez mais forte. — Ele possui um talento esplêndido, seria um desperdício deixá-lo seguir o caminho dos heróis. Vamos levá-lo para um palco onde ele possa brilhar mais… — ele disse e então foi a última gota que bastava para eu explodir.
De repente, senti todo o meu vigor correndo novamente por minhas veias, saltei dos braços de Todoroki e consegui abrir os olhos imediatamente. Eu diria que me sentia como acordar após uma boa noite de sono, mas era melhor do que isso, eu não estava sonolenta, sentia a energia tomando meu corpo e as pontas dos meus dedos formigavam de excitação.
A aura verde da minha individualidade explodia em uma luz irradiante que iluminava o grupo e as árvores ao nosso redor. Na copa de uma das árvores avistei o vilão que estava conversando com nós até então. Ele usava uma máscara e um casaco longo, nas mãos havia duas pequenas bolinhas maciças e brilhosas brincando entre seus dedos.
— Devolva! Devolva o Katsuki! — gritei à toda força.
— Devolver? — ele disse debochado exibindo uma das bolinhas, era isso, Katsuki estava confinado ali dentro. — Que coisa estranha de se falar, Bakugou não é de ninguém para precisar devolvê-lo… Ele é a própria pessoa dele, sua egoísta — ele respondeu rindo cínico.
— Devolva agora! — repeti mais uma vez, eu estava prestes a subir lá para combatê-lo, mas eu não saberia como tirar Katsuki da pérola.
— Mexa-se! — foi a vez de Todoroki se pronunciar, lançando uma parede pontiaguda de gelo na direção do vilão. Mas o vilão desviou agilmente com um salto muito longo, era quase como se ele pudesse voar para se desvencilhar do ataque.
— Só queremos mostrar a ele que com os valores fantásticos que ele possui pode se tornar muito mais do que um heroizinho — o homem disse ainda no ar, pousando na copa de outra árvore próxima.
— Ele não pegou só o Bakugou, levou o Tokoyami também — Shoji disse, olhei para trás, para ele, e naquele momento notei que ele estava carregando Deku em suas costas, ambos pareciam péssimos, cheios de escoriações.
— Ele capturou os dois sem fazer barulho algum… — Todoroki murmurou perplexo.
— Desgraçado, não vai levar ninguém! — Deku bradou com raiva, notei que o garoto estava imóvel, com os braços de Shoji o envolvendo, haviam machucados e roxos por todo seu corpo, mas mesmo assim aquele brilho heróico ainda atravessava seu olhar.. Conhecendo a capacidade autodestrutiva de Deku me perguntei o que havia acontecido e como ele ainda conseguia estar acordado.
— Midoriya, fique calmo — Todoroki pediu e em seguida deu três passos à frente criando uma imensa parede de gelo na direção do vilão novamente. Por um segundo acreditamos que havíamos o acertado, mas então, da mesma forma que momentos antes, o vimos saltando no ar para desviar.
— Foi mal, truques e fugas são minhas únicas habilidades interessantes, não vão me pegar tão fácil — o vilão disse no ar, fugindo para longe. Ele era muito rápido, não conseguiríamos alcançá-lo, mas isso não nos impediria de tentar, começamos a correr em sua direção sem pensar duas vezes.
A todo momento estávamos sempre poucos metros longe do vilão, mas por mais que Todoroki tentasse acertá-lo com seu gelo, ele sempre conseguia desviar do ataque.
— Que inferno, esse cara é rápido — Todoroki reclamou enquanto corríamos e tentava acertar outro ataque sem sucesso.
— Se pelo menos Iida-kun estivesse aqui… — Ochaco ponderou ofegante enquanto corria.
Eu não havia conseguido dizer sequer uma palavra até o momento. Estava completamente focada, estava escuro, haviam galhos, raízes e pedras, mas eu sentia que não precisava nem olhar para o chão para correr, meus olhos estavam fixos no vilão e a cada mudança de direção no ar que ele fazia eu o seguia com o olhar. Eu faria de tudo para recuperar o Katsuki.
— Droga… não podemos desistir — Deku disse das costas de Shoji, ele parecia arrasado por não conseguir ajudar no combate.
— Nesse ritmo ele ganha cada vez mais distância… — Todoroki observou.
— Uraraka-chan, nos faça flutuar — eu finalmente ordenei algo e a garota olhou para mim confusa. — Shoji vai nos jogar no ar com a maior força que conseguir e aí você libera sua individualidade quando achar que for o tempo certo… — expliquei enquanto todos ouviam atentamente ainda correndo.
— Entendi, uma bala humana — Shoji disse assentindo.
— Mas Haru… Você vai esgotar o limite da sua cura… — Ochaco disse vacilante.
— Haru, você fica aqui — Todoroki me repreendeu. — Com o que aconteceu agora a pouco não tem como..
— Não sinto nenhuma dor! — o interrompi, decidida — Enquanto eu puder ficar de pé… Eu vou fazer tudo o que puder... Rápido, Ochaco! — a chamei enquanto abraçava as costas de Todoroki. Uraraka nos tocou, nos deixando leves, e Shoji nos ergueu como dois bonequinhos de papel.
No instante seguinte Todoroki e eu estávamos sendo arremessados a toda velocidade até o vilão mascarado.
Uraraka Ochaco não poderia ter sido mais precisa, no exato momento em que iríamos passar pelo vilão no ar, ela liberou sua individualidade e nossos corpos voltaram a pesar, caindo em queda livre e se chocando contra o homem até chegarmos ao chão como uma imensa bala humana.
— Devolva o Katsuki — bradei, colocando toda minha força sobre as costas do mascarado que estava quase esmagado. Havíamos levantado muita poeira com a queda e eu só conseguia enxergar dois palmos à minha frente.
— Eu conheço esses garotos! — escutei alguém desconhecido dizer atrás de nós.
— É a minha amiga! — reconheci a voz irritante de Himiko Toga animada. Quando a poeira baixou olhei em volta e lá estava ela com dois outros vilões.
Estávamos em uma pequena clareira, pela minha raza noção de direção eu sabia que era próxima à clareira do acampamento, mas não próxima o suficiente para o reforço chegar à tempo.
Os dois vilões que estavam com Toga nos encaravam levemente confusos. O primeiro, que mais tarde descobri que se chamava Dabi, tinha olhos azuis que pareciam perfurar sua alma e seu corpo era coberto de cicatrizes negras e misteriosas. O outro, chamado Twice, vestia um uniforme preto e branco que lhe cobria até a cabeça, me impedindo de analisar sua expressão. Parecia que para nosso azar havíamos caído bem no ponto de encontro dos vilões.
— Mister, saia da frente — Dabi disse para o vilão que eu estava imobilizando. Para minha supresa, Mister não tentou se desvencilhar de mim e de Todoroki, mas comprimiu seu próprio corpo em uma daquelas pequenas bolinhas. Em uma batalha real você percebe que não tem muito tempo para reagir ou ficar surpreso, pois no mesmo instante Dabi ergueu o braço e lançou uma rajada de chamas azuis em nossa direção.
Rapidamente ativei meu escudo de cura e empurrei Todoroki com força para não sermos atingidos pelas chamas. Novamente, não houve tempo de reação e avistei Twice pulando em minha direção.
— Um rosto da lista do Shigaraki, essa é a garota que devemos matar! — ele declarou e puxou uma espécie de gancho com uma corda de seu uniforme, lançando-o para me acertar. Rolei meu corpo para o lado para desviar e Twice não teve tempo de impedir sua queda brusca sobre o chão. Ele parecia um vilão meio atrapalhado.
Por um instante as palavras do vilão ressoaram na minha mente… “lista do Shigaraki”... E alguma coisa sobre terem de me matar. Se o que eles estavam dizendo era verdade, essa luta seria mais intensa do que eu esperava, eles não me atacariam apenas para me parar.
— Sentiu saudade? — Himiko Toga perguntou interrompendo meus pensamentos. A garota pulou sobre mim com sua faca empunhada e no mesmo instante que a cravaria no meu peito, Todoroki lançou uma parede de gelo sobre nós, fazendo a garota ser jogada longe sobre uma árvore..
— Haru, você tá bem? — ele perguntou se colocando à minha frente enquanto eu me levantava cambaleante.
— Então vai ser assim? Você vai roubar a minha amiga? — Toga disse com um olhar sinistro para nós mancando até próximo à Dabi.
— Essa aí é louca de pedra… — murmurei para Todoroki, ficando de pé ao seu lado em posição de defesa.
Mister expandiu sua pérola e surgiu no chão onde estava segundos antes, como se não estivesse em uma batalha caminhou calmamente até Dabi.
— Mister! Onde está o garoto? — Dabi perguntou e o vilão enfiou as mãos no bolso, mas quando tirou as mãos de lá estavam vazias.
— Haru… — Todoroki cochichou e de canto de olho pude ver as pequenas bolinhas em sua mão. Meu coração ficou mais leve.
— Como…? — Sussurrei de volta surpresa.
— Quando acertamos ele no ar… Eu vi que ele havia deixado no bolso esquerdo. Vamos logo antes que percebam — ele sussurrou de volta, deu um passo para trás e criou uma enorme parede de gelo para bloquear o caminho dos vilões quando viessem atrás de nós.
— Não tão rápido… — uma voz grave disse das sombras e dois olhos amarelos cintilaram ameaçadores quando estávamos indo em direção às árvores. Todorki e eu demos três passos para trás e o dono da voz nos seguiu, revelando um espectro negro e volátil, um fantasma de fumaça com dois metros de altura. Senti um calafrio com a visão daquele vilão.
— Esse cara… estava no ataque na USJ aquele dia — Todoroki disse atônito.
Eu me recordava dele, era o responsável por ter separado os alunos naquele dia usando sua individualidade. Olhei para trás e vi que havia um portal aberto próximo aos vilões. Toga e Twice entraram pelo portal sem pestanejar, deixando-nos à sós com Dabi, Mister e o fantasma sinistro.
— Já se passaram mais de 5 minutos. Dabi, ele está ordenando que retornemos — o grande fantasma roxo disse.
— Ainda não completamos nosso objetivo… — Dabi respondeu paciente.
— Não se preocupe — Mister o interrompeu com uma risadinha. — As duas crianças estavam tão afobadas que resolvi dar a eles um presentinho… — o vilão disse, puxou a máscara que lhe cobria o rosto e colocou a língua para fora, mostrando que estava guardando duas pérolas em sua boca. Então, com um estalar de dedos, fez as pérolas que Todoroki segurava serem liberadas, revelando que nelas estavam confinadas apenas duas pedras de gelo.
— Seu maldito! — bradei com raiva e minhas pernas se moveram instintivamente até o vilão. Eu já não ligava para quantos vilões havia ali, se minha individualidade estava se esgotando.
Mister estava prestes a atravessar o portal por completo, eu não chegaria a tempo. Mas às vezes há coisas na vida que acontecem por acaso e são um sinal do destino de que você ganhou uma segunda chance. E naquele momento foi uma dessas vezes.
Um feixe de luz vindo de trás das árvores atravessou nosso campo de batalha, acertando Mister e surpreendendo a todos. De canto de olho segui a origem do feixe e avistei uma cabeleira loura entre os arbustos. Yuuga Aoyama, nosso colega que lançava laser pelo umbigo, estava no lugar errado na hora certa. Eu com certeza lembraria de agradecê-lo mais tarde.
A distração criada por Aoyama me permitiu alcançar o vilão a tempo. Concentrei a cura em meu braço e o acertei com o soco mais forte que conseguia. Com o impacto o vilão cuspiu as duas pérolas que voaram pelo ar. Rapidamente Todoroki se moveu para capturá-las.
Todoroki conseguiu agarrar a primeira, que confinava Tokoyami, mas no momento em que iria agarrar a segunda o garoto foi interrompido Dabi, que se lançou em sua frente, agarrando a pequena pérola.
— Que pena… Não é mesmo? Todoroki Shoto… — Dabi disse de forma sinistra sorrindo sádico. — Confirmado, pode liberar. — Ele declarou e Mister estalou os dedos liberando o confinamento. A pérola que Todoroki segurava se expandiu e Tokoyami caiu ao chão sem entender o que estava acontecendo. Dabi já estava com a metade do corpo para dentro do portal e quando sua pérola se expandiu revelou Katsuki.
Eu senti uma onda de choque percorrer meu corpo. Novamente minhas pernas se moveram sem que eu as ordenasse.
2 segundos. Mesmo em um tempo tão curto eu senti que seus olhos carmesim me davam mais energia para continuar tentando.
— Katsuki! — gritei em desespero, mas era inútil. Estendi minha mão em sua direção, mais um segundo e eu o teria tocado, mas Dabi o puxou para dentro do portal antes que eu pudesse tentar só mais uma vez.
— Não venha, Haru… — foi a última coisa que escutei Bakugo Katsuki dizer antes de sumir completamente e o portal fechar.
2 segundos.
Em 2 segundos eu o perdi.
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