Lee Heeseung
Acordo de uma vez, confuso. Quando foi que dormi? Meus planos eram de permanecer acordado para vigiar Jiwoo, como de costume. Eu estava tão cansado assim? Ou será que inconscientemente internalizei como verdade o momento em que ela disse que não fugiria? Uau, Jay me daria uma bronca se soubesse que baixei a guarda desse tanto com a Moon. Afinal, se fosse intenção dela, não seria difícil de me matar enquanto eu estava adormecido…
Falando em Jiwoo, olho para a direção dela, buscando encontrá-la adormecida, porém tudo que vejo é a sua cama devidamente arrumada. Preocupado, sento-me no colchão rapidamente e procuro por algum sinal da Moon, sem sucesso. “E se ela realmente tiver fugido?”, essa indagação surge no fundo da minha mente, mas tento afastá-la.
Levanto da cama e corro para a porta, abrindo-a com urgência. Apresso-me pelo corredor e chego na sala, encontrando apenas Jake e Mia no cômodo ao lado, a cozinha.
— Bom dia, capitão! — Diz o Shim assim que me vê, sendo seguido pela saudação de Mia.
— Bom dia, vocês viram a Jiwoo? — Pergunto e caminho até a mesa de jantar, após olhar em volta e não encontrar a Moon.
— Ah, ela saiu para- — A Choi começa a responder, mas é interrompida pela porta do chalé sendo aberta.
— As meninas tinham alguns ovos! — Exclama Jiwoo, exibindo uma cesta de ovos como um troféu, até que me vê e, em uma mudança rápida de expressão, fica tímida. — Ah, Lee, você acordou! Bom dia…
— Bom dia, meu bem. Algum problema? — Pergunto ao notar como ela estava acanhada quando se aproximou da mesa para deixar a cesta.
— Não, não, eu só queria pedir desculpas pelo meu comportamento ontem à noite… — Ah, então é isso. — Devo ter te dado trabalho, obrigada por cuidar de mim.
— Hum… é verdade, você deu trabalho, sim. — Posso provocar Jiwoo um pouco depois de tudo que fiz por ela ontem, não é? — Aceito suas desculpas, desde que você prometa se referir a mim por Heeseung a partir de hoje.
— O quê?! Sem chances! — Ela exclama incrédula, como se eu tivesse falado uma atrocidade.
— Por quê? Você não pareceu ter problema em me chamar de Heeseung ontem- — Fui interrompido pela Moon tapando minha boca, com uma mão por cima da outra.
— Lee! Por que você diria isso?! — Pela proximidade que Jiwoo está de mim, tenho uma visão clara de seu rosto, especialmente suas sobrancelhas franzidas de raiva e suas bochechas avermelhadas.
Fazê-la corar é um dos meus passatempos preferidos, ela fica adorável. Acho que a senhorita percebeu que eu não estou levando-a tão a sério, pois sua expressão fechou ainda mais. Em seguida, surpreendendo-me, a Moon deu dois passos na minha direção, diminuindo a distância entre nós dois.
Badump. Badump. Badump.
Será que ela consegue ouvir meu coração acelerado?
— Não é legal sair citando momentos constrangedores dos outros! — Bem feito, Lee Heeseung, quem é que está corado agora? — Nunca mais toque nesse assunto, principalmente na frente de mais pessoas. Estamos entendidos?
Moon Jiwoo
O moreno apenas acena positivamente com a cabeça sem fitar-me diretamente, tão dócil quanto um cachorrinho. Enfim, afasto-me e retiro as mãos de seu rosto após perceber que exagerei na reação, mas a culpa foi dele! Resolveu mencionar logo a memória de ontem à noite que mais estou tentando esquecer, além de como deitei e dormi em seu ombro, de como demos as mãos e ele deixou um carinho suave na minha, de como dançamos juntos e de como eu gostei de tudo isso…
— Jiji! Seungie!
— Yuyu! — Exclamo com um sorriso de orelha a orelha quando vejo Daiyu se soltar da mão de Sunoo e entrar no chalé, salvando-me de uma crise mental. — Como você está? Se divertiu ontem? Só nos vimos uma vez…
— Foi muito legal, eu fiz quatro amigos! — Agacho-me enquanto a pequena fala enquanto mostra, da forma mais adorável possível, o número quatro com seus dedinhos.
— Tudo isso?! Que bom, anjinho! — Exagero na reação de surpresa e Daiyu sorri também. Conforta-me saber que ela já parece feliz em seu primeiro dia aqui.
— Conta pro Seungie o que eu te falei, Jiji! — A menina pede e vira, com sua mãozinha, meu rosto na direção do pirata que nos assistia, ainda em pé.
— O que foi, Yuyu? — O Lee pergunta em mandarim, uma das cinco frases que ele aprendeu a falar, e agacha ao nosso lado.
— Fala pra ele, Jiji! — Daiyu insiste, sabendo que Heeseung não iria entendê-la de verdade.
— Ela disse que a festa de ontem foi muito divertida e que fez quatro amigos lá! — Conto imitando o gesto da pequena, que faz o mesmo quando me vê.
— Sério?! Que legal, Yuyu! — O moreno exclama (essa é outra das cinco expressões em mandarim que ele sabe) e pega Daiyu no colo para girá-la no ar.
Ela abre os braços como se fossem asas e ri, os dois apresentando um sorriso largo no rosto. Fico de pé e, diante dessa vista, não consigo evitar de sorrir também.
— Hum… interessante. — Sunoo comenta e para ao meu lado, lançando-me um olhar afiado com a mão no queixo, como se me analisasse.
— O que foi? — Pergunto ao Kim, ainda observando Heeseung e Daiyu brincando juntos.
— Não sei dizer para qual deles é esse olhar…
— O quê? — Confusa, viro-me na direção dele, mas o garoto já saiu de perto de mim e, antes que eu pudesse questioná-lo sobre sua fala, Jake e Mia nos chamam para tomar café.
Logo, sentamo-nos à mesa com o casal e Sunoo, que já comeu, fica cuidando de Daiyu. Enquanto comemos, lembro-me de que ficaríamos só por uma noite e pergunto a Heeseung:
— Lee, quando vamos embora?
— Logo após o almoço-
— Embora? — Repete Daiyu em coreano, correndo até a minha direção. Quando ela aprendeu essa palavra?! — Jiji, vocês vão embora?! — Pergunta a pequena, dessa vez em mandarim e com uma face chorosa.
— Nós temos que ir, Yuyu. — Resolvo ser sincera e me sento na direção da menina, que agora coloca um biquinho nos lábios e me fita como um cachorrinho abandonado.
— Não, Jiji! Seungie! Fiquem aqui comigo! — Os olhinhos de Daiyu se enchem de lágrimas e ela se joga no meu colo, abraçando-me de forma desengonçada.
— Yuyu… — Segurando o choro, desço da cadeira e agacho-me para ficar da altura da garotinha, que automaticamente gruda no meu pescoço.
— Não, vocês não podem ir embora também! — Fala Daiyu com urgência na voz, aos sussurros, porém não entendo o que ela quis dizer com isso.
— Também? — Pergunto e separo-me da pequena, a fim de ver seu rostinho, mas ela permanece cabisbaixa.
— Minha mamãe e meu papai… vocês vão embora que nem eles foram, não é? — Sua fala atinge-me como um tiro certeiro, para o qual eu não estava preparada.
Desnorteada pelo que essa garotinha de apenas seis anos disse, viro para Heeseung e a preocupação cresce em seu rosto quando ele vê a minha expressão atônita. Então, tento me recompor e, de canto de olho, noto Sunoo parando ao lado do Lee, provavelmente para traduzir nossa conversa. Assim, volto o foco à Daiyu e pergunto:
— Yuyu, você sabe o que aconteceu com seus pais?
— Eu não lembro direito, mas sei que o tio e a tia não são meus pais! — Afirma com convicção a pequena, agora fitando-me nos olhos. — A tia chorava muito pela mamãe e pelo papai quando estávamos no barco dos homens maus. Ela tinha pesadelos e perguntava por que eles nos abandonaram…
— Por que você não falou com eles, Yuyu? Seus tios acham que você não se lembra dos seus pais. — Indago e engulo o choro, pois sei que preciso ser forte por ela neste momento.
— Eu fiquei com medo da tia chorar de novo, Jiji. Eu não quero que a tia chore!
— Daiyu… — Sem palavras, puxo a pequena para um abraço, pensando em como o mundo não merece essa garotinha exalando bondade e pureza.
Tento pensar em algo para dizer a ela, em como explicar que seus pais morreram nas mãos de traficantes cruéis e inumanos. Após alguns segundos, respiro fundo e afasto a criança delicadamente, então sento-me de pernas cruzadas no chão e ela faz o mesmo.
— Olha, Yuyu, seu papai e sua mamãe não te abandonaram, não foi isso que sua tia quis dizer. Sabe… os homens maus? — Começo e a pequena assente com a cabeça, sem desgrudar seus olhos curiosos de mim. — Esses homens maus atacaram a cidade em que você morava. Para te salvar, seus pais começaram a brilhar. Eles conseguiram te proteger, mas brilharam tanto que precisaram ir para o céu, onde teriam espaço suficiente para isso. Então, seus pais viraram duas estrelinhas e mostraram a mim e aos meninos como chegar até o barco que você e seus tios estavam.
— Vocês… só nos acharam, porque meus pais te ajudaram, Jiji? — Pergunta Daiyu, tão entretida com a história que não estava mais tristonha. Ela não parece ter memórias claras dos pais, nem da invasão à sua vila, apenas lembra que seus tios são… seus tios.
— Isso mesmo! Agora, escute a Jiji com atenção, tá bem? — Digo e seguro as mãozinhas dela. — Eu e os meninos vamos embora hoje, mas não para sempre. Sabe o que faremos para te encontrar de novo, Yuyu? — A pequena parece confusa inicialmente, então seu olhar se ilumina de repente.
— Já sei! — Empolgada, ela exclama e fica de pé em um pulo. — Meu papai e minha mamãe vão te mostrar onde eu estou?
— Que menina esperta! — Elogio-a e fico feliz por minha narrativa ter a convencido. — Exato! Eles têm que brilhar no céu para nos mostrar onde você está, então conseguiremos te ver de novo. O que você acha disso?
— Muito legal, Jiji! Espero que eles te ajudem a me achar sempre! — Meu coração pesa diante do sorriso resplandecente de Daiyu e um nó cresce em minha garganta ao pensar que não sei se voltarei a vê-la.
— Eu também espero, Yuyu.
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No fim das contas, ficou decidido que deixaríamos a Ilha da Esperança após o almoço. Logo, saímos para comer na vila e conhecer um pouco do comércio local, também. É claro que Daiyu e seus tios participaram do passeio conosco, ela estava bem empolgada com a cidade e tagarelava sem parar. Contudo, a pequena havia reclamado por Heeseung não estar junto, mas ele foi requisitado pela Sra. Kim, então combinamos de nos encontrar apenas no navio. Assim, algumas das meninas de ontem se juntaram a nós, além de Jake e Mia que aproveitavam o tempo que ainda tinham juntos.
De qualquer forma, nos divertimos bastante e, em certo momento, pedi para que Mia cuidasse de Daiyu, ignorando a pontada de ciúmes que surgiu em meu peito. Ela respondeu que eu poderia confiar nela e agradeci, o que acabou deixando-me mais aliviada. Ao longo do passeio, acabei comprando para a garotinha um colar com uma concha de pingente, o qual Daiyu já colocou e prometeu-me que nunca mais tiraria.
Enfim, depois de almoçarmos em um restaurante coreano, havia chegado a hora de embarcar no navio. Daiyu e seus tios acompanharam-nos de volta para a caverna e, à medida que nos aproximávamos do destino, a garotinha ficava mais e mais quieta, como uma flor murchando. Quando chegamos, alguns meninos estavam terminando de carregar mantimentos para o Lua Sombria, mas a maioria deles já havia embarcado.
— Seungie! — Exclama Daiyu quando vê o Lee alguns metros à nossa frente e sai correndo na direção dele.
— Yuyu! — Heeseung pega a pequena no colo e ela gruda em seu pescoço, escondendo seu rostinho.
Quando aproximo-me dos dois, o Lee diz algo que, por leitura labial, entendo ser “Ela está chorando”. Preocupada, faço um carinho no cabelo de Daiyu e ela desenterra a face do pescoço de Heeseung, virando para ficar de frente para mim. Nesse momento, consigo ver as lágrimas descendo silenciosamente por seu rostinho, junto ao grande bico formado em seus lábios. Sinto um aperto em meu coração e meus olhos também ficam marejados, pensando no quanto Daiyu fará falta. Então, a pequena estica um dos bracinhos, mantendo o outro no pirata, e puxa-me para um abraço.
Timidamente, passo meus braços em volta de Daiyu e do tronco de Heeseung, sendo que ele também deposita seu braço livre um pouco acima da minha cintura.
— Eu amo vocês, Jiji e Seungie! — A menina de repente confessa em coreano, embora eu não saiba quando ela aprendeu essa frase, e nos aperta ainda mais no abraço.
— Yuyu… Nós também amamos você! — Respondo em mandarim e deixo um beijinho no topo da cabeça de Daiyu, separando-me para fitá-la nos olhos. — Lembra o que te falei mais cedo? Vamos voltar para você com a ajuda de duas estrelinhas especiais no céu. Enquanto estivermos longe, quero que você coma bem, faça muitos amigos, obedeça seus tios e converse sobre tudo com eles, tá bem?
— Tá bem, Jiji. — Daiyu diz em meio a fungadas e seco seu rostinho molhado por lágrimas.
— Capitão, o navio está pronto para zarpar. — Jay comenta ao aproximar-se de nós.
— Certo, já vamos subir a bordo. — Responde Heeseung e volta-se para dar mais um abraço em Daiyu. — Diga à Yuyu que voltaremos logo e que deixei um presente surpresa para ela em sua casa nova. — Ele pede e a expressão da pequena, felizmente, se ilumina quando traduzo essa fala.
— Obrigada, Seungie! — Daiyu exclama e seus tios aproximam-se de nós, então o Lee entrega-a para eles.
— Jiwoo e Heeseung, não conseguimos colocar em palavras o quão gratos somos por tudo que fizeram por nós e, especialmente, pela Daiyu. — A tia dela fala com um sorriso sincero nos lábios, apertando nossas mãos.
— Esperamos vê-los de novo em breve! Podem contar conosco para o que precisarem. — Complementa o tio em seguida, então agradecemos as palavras deles.
— Bom, vamos indo agora. Até mais! — Heeseung diz para os tios e depois deixa um afago na bochecha redonda de Daiyu. — Tchauzinho, Yuyu.
— Tchau, Seungie! — A pequena acena para o capitão e, para o meu alívio, sorri.
— Até logo, espero que gostem da vila! — Despeço-me dos tios de Daiyu e dou mais um abraço apertado na pequena depois que o Lee se afasta. — Fica bem, Yuyu! Vou sentir saudade de você.
— Boa viagem, Jiji! Também vou ficar com saudade. — Responde a menininha e, com um beijinho no topo de seus cabelos e meu coração na mão, afasto-me dela.
Ao lado do Lee, caminho até o Lua Sombria e aceno uma última vez para Daiyu, que conquistou-me assim que ela puxou a barra do meu vestido com seus olhinhos brilhantes. Embarco no navio pirata e observo o porto da Ilha da Esperança ficar cada vez mais distante, incerta do que será do meu futuro a partir de hoje e somente desejando poder retornar a esse lugar mais uma vez.
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