Gina lidera o caminho, enquanto Élisa seguia logo atrás dela e Sadie atrás, protegendo a retaguarda. Essa era uma formação de combate para locais estreitos, mantendo os melhores combatentes nos locais mais críticos, enquanto protegiam os mais vulneráveis e eles podiam servir como apoio caso algo ocorresse. Apesar de serem jovens, Gina e Sadie possuíam treinamento em combate e sabiam que, mesmo estando expostos nas laterais, ainda poderiam proteger a garota que estava no centro de alguma forma se ficassem daquela forma.
— Está mesmo tudo bem? — pergunta Élisa. — Parece que estamos andando há um longo tempo, mas não chegamos em local algum. Sinto até que estamos andando em círculo.
— Fique em silêncio. — Sadie chama a atenção e para o grupo. — Realmente estamos andando em círculos... — confirma a garota olhando para trás. — Mas é porque o som vinha deste local.
As três olham ao redor, averiguando a área. Agora que haviam feito barulhos, provavelmente, o lobisomem pode ouvi-las, pelo menos era o que o instinto das três pareciam gritar. Ficam de costas para uma grande árvore, dessa forma ficariam menos expostas à um ataque vindo das costas.
— De cima! — grita Gina, empurrando Élisa para lado e se jogando rapidamente para frente. — Cuidado.
Sadie se joga para o lado, embora um pouco tardiamente, pois também havia tentado tirar sua companheira do local, mas não havia sido rápida o bastante, apenas fazendo com que sua mão passasse ao vento, no lugar em que Élisa estava há poucos instantes.
No lugar em que estavam, caiu uma grande figura. Fazendo a poeira do chão ser levantada e causando um impacto abafado. Élisa, por não ter percebido o que estava próximo de acontecer, tem uma reação muito lenta, apenas caindo no chão quando é empurrada, ficando exposta à um ataque. Na frente delas estava um lobo, porém era muito maior do que um, provavelmente tendo quase o dobro de seu tamanho, mas podia ser reconhecido facilmente pelo seu focinho, mais curto do que o de um lobo comum, e seus olhos... Que pareciam humanos.
Ele tenta se jogar em cima da garota que não consegue se recuperar. Sadie tentar lançar seu feitiço, no entanto não é rápida o suficiente.
— Flipendo!
O feitiço de Gina acerta-o em cheio, sem causar muito impacto, mas sendo o suficiente para fazer com que o jogasse um pouco para o lado, acertando o chão poucos centímetros de distância da garota. Élisa aproveita a oportunidade, girando para o lado e se levantando, correndo para o lado e criando alguma distância entre as duas.
— Se protejam de qualquer forma — diz Sadie com a varinha apontada para o centro do semicírculo que formavam. — Tudo que precisamos fazer é passar uma mensagem para ele, essa parte deixe comigo. — Tira a poção de suas vestes, colocando no chão, perto de si, mas ainda um pouco distante para não quebrá-la.
As duas balançam a cabeça em afirmativo, também com suas varinhas apontadas para o lobisomem que as observava, como se esperasse uma abertura para atacar. Élisa sabia o plano dela e, mesmo achando que era uma grande loucura, ainda pensava que poderia ser a melhor forma e a que tinha maior chance de dar certo, enquanto Gina não tinha a menor ideia, sabia apenas algumas poucas coisas que foram faladas a ela, mas tinha algum conhecimento do potencial da garota, principalmente depois de vê-la duelar com outro primeiranista, acreditava que poderia até mesmo derrotar alunos de anos superiores.
— O que será que essa garota passou antes de vir para Hogwarts? — comenta Gina baixo, olhando para Sadie, que estava frente a ela naquele momento.
Neste momento o lobisomem avança novamente, em direção a Élisa novamente. Os instintos da "besta" pareciam estar focado naquela que tinha pouco conhecimento de duelos e estava com sua guarda aberta demais. O grande lobo parte para cima da garota. Sadie se volta ao mesmo tempo, correndo para cima e, fazendo com que o alvo fosse mudado. Com uma agilidade permitida apenas a seres não humanos ele vira a direção em que corria, indo para a esquerda e abrindo sua boca para atingir Sadie.
Mesmo acreditando nela, naquele momento Gina perde a calma. Não importa o quão bom alguém fosse compara a sua idade, ainda assim uma mordida de lobisomem poderia mudar sua vida para sempre. Ela levantou sua varinha.
— Expul... — Antes de terminar a conjuração sua visão se foca nos olhos de Sadie.
A garota estava completamente séria, como se estivesse com tudo sobre controle, mesmo com a grande figura se aproximando dela daquela forma. Um único erro poderia mudar sua vida completamente, ou até mesmo algo pior, poderia causar sua morte. Porém a expressão de surpresa ou de medo não surge em seu rosto, muito parecido com aquela que via no rosto de seus companheiros no ano passado. Alguém que iria batalhar com todas suas forças. Mesmo pensando que estava cometendo um grande erro, sua varinha é abaixada.
Sadie ficou cara a cara com o grande lobo. Foram apenas alguns instantes, não chegando direito há dois segundos, mas parecia que o tempo estava sendo alongado, como se aqueles míseros segundos se transformasse em minutos. Quando seu olhar sério aparece é justamente no momento em que cruza olhares com o lobo. Uma das formas de se diferenciar um lobisomem dos lobos comuns é justamente seus olhos, mesmo com o corpo de um lobo, seus olhos ainda eram humanos. Raiva podia ser sentida sendo dirigida a ela, mas ao mesmo tempo dor. Como se alguém estivesse sendo obrigada a atacar alguém, porém sentisse grande tristeza em fazer aquilo. Um olhar... Parecido com o que viu, diversas e diversas vezes em pessoas quando estava do outro lado.
— Homorphus Charm. — Suas palavras saem baixo, como se sussurrando a pessoa que estava em sua frente.
Exatamente, pessoa. Besta? Ouvir essas palavras fazia com que sentisse ânsia de vômito. Todos os momentos que passou com aquelas pessoas quando morava no Brasil e até mesmo aqueles que conheceu antes da guerra de poucos meses atrás. Eram apenas pessoas! Pessoas que estavam doentes e que poderiam se controlar, basta serem ajudadas. Simplesmente não poderia suportar o preconceito sem sentido a essas pessoas mesmo depois de tantos estudos e quantas pessoas foram feridas nesses confrontos sem sentido. Greyback era apenas um efeito colateral dessa doença espalhada pelo mundo bruxo.
Uma pata sobe, abaixando-se rapidamente em direção a garota — uma lágrima pode ser vista escorrendo pelos olhos do lobo —, seus dentes pareciam próximos a destroçar a pessoa em sua frente. Ao mesmo tempo Sadie move rapidamente sua varinha, como se fosse uma espada e estivesse em um combate de esgrima. Ela pula para trás enquanto faz o movimento, deixando seu corpo cair enquanto acerta a ponta da varinha no pescoço do lobo. Um movimento aparentemente perfeito, irregular, mas límpido e muito bonito. Como se fosse uma grande espadachim batalhando em uma competição, porém com sua única platéia sendo as plantas e árvores ao redor.
— Sadie! — grita Élisa tentando correr em socorro, mas é segurada pelo ombro por Gina.
Como em um efeito de uma transfiguração, o corpo do lobo se transforma. Caído em cima da garota, com sua mão grudada em seu ombro, estava um garoto. Parecia pequeno demais para sua idade, mesmo sendo um primeiranista, seu corpo era um pouco magro, como se não estivesse se alimentando direito. Cabelos e olhos negros, mas que pareciam pálidos, aparentemente desgastados pelo cansaço e tenso que estava sentindo. Havia se transformado, ou seja, estava sem roupas, fazendo com que vários machucados pudessem ser vistos pelo seu corpo, causados provavelmente por ele mesmo, pois em sua forma lupina, lobisomens acabam se ferindo quando não há humanos ou animais por perto. Porém, todos pareciam ser antigos, ou seja, desde que veio para Hogwarts não se feriu mais, aparentemente pois existiam diversos animais na floresta.
— Por quê? — pergunta olhando-a nos olhos.
As outras duas suspiram de alívio. Gina se aproxima um pouco, ainda segurando o braço de Élisa por causa do nervosismo, mas soltando-a assim que percebe que arrastava-a. Enquanto a primeira apenas observava com interesse a reação dos dois que estavam caídos no chão, Élisa tampava o rosto, envergonhada com a nudez do garoto.
Aparentemente Sadie não se importava com aquela situação constrangedora que estava. Apenas começa a mexer sua mão, por instinto usando a direito, sua mão dominante que segurava a varinha, fazendo com que o garoto pensasse que fosse um ataque e usando suas mãos para defender seu rosto. Percebendo isso a garota solta a varinha.
— Desculpe... — Levanta sua mão em direção a ele, tirando suas mãos com facilidade da frente do seu rosto, pois não possuía resistência. — Não irei fazer mal a você.
Sua mão abaixa, apontando para um local perto de seus pés. A poção estava intacta, mas seu pé havia triscado nela, um único movimento errado poderia tê-la despedaçado.
— Essa é uma poção wolfsbane — diz.
O garoto se assusta, se virando e olhando naquela direção.
— Como... — Sua voz sai baixa. Era difícil acreditar que algo tão caro pudesse aparecer dessa forma.
— A professora Penny me ajudou a fazê-la. — Sadie começa a se levantar, assustando-o, mas o tranquiliza logo em seguida. — Estou trabalhando com ela e fazendo várias como um trabalho extracurricular, pelo menos é o que podemos falar oficialmente... — Eles ficam sentados, frente a frente.
Élisa pode ser ouvida comentando algo como "O que você quer dizer com oficialmente? Você disse que me explicaria tudo Sadie". Porém foi contida por Gina.
— Além disso... — Ele olha para suas mãos. — Como voltei a ser humano.
Sadie sorri e olha para cima.
— Desculpa por isso, temos pouco tempo então tentarei explicar tudo o mais rápido possível... — Aponta novamente para a poção. — Há cerca de um mês conversei com a professora Penny, pedindo que me ensinasse na produção de uma poção wofsbane. Mesmo sendo contra de início ela aceitou minha proposta, o motivo disso... — Olho o garoto nos olhos, demonstrando confiança. — Embora não possamos falar oficialmente ainda, é porque a escola provavelmente planeja produzir a poção para o aluno que estava causando um alvoroço na floresta.
— Mas... — Tenta argumentar, porém é interrompido por Sadie.
— Não precisa se preocupar, a professora está me transmitindo essa mensagem há algum tempo... — Pega a poção mostrando-a para ele. — Essa será a primeira dose, me encontre amanhã, antes da primeira aula, em frente ao refeitório e irei lhe entregá-la. Este feitiço que utilizei foi o Homorphus Charm, com ele posso desfazer a transformação por algum tempo.
Ele começa a ficar agitado novamente.
— Isso quer dizer que posso acabar as machucando certo? — Se levanta. — Vocês precisam sair, rápido!
Mesmo com essas palavras a reação da garota é se aproximar, segurando com a mão esquerda, enquanto a outra segurava a poção.
— Está combinado? Em frente ao salão principal? — pergunta.
Um aperto é sentido no coração do garoto. Era a primeira vez que alguém agia assim com ele. Seus pais sabiam de suas condições, mas não tinham dinheiro o suficiente para comprar os ingredientes das poções. Sempre se mudando, sempre se escondendo.
— Por quê? Não entendo porque está fazendo isso tudo por mim... — diz baixo, cortando o olhar da garota.
— É simples, tive alguns amigos que também sofriam de licantropia, além de ser filha de uma comensal da morte... — Todos olham em sua direção, era a primeira vez que falava de sua mãe tão abertamente assim na frente de alguém. — Sei muito bem o que é sofrer preconceito, assim como tive muitos amigos que me ensinaram sobre a licantropia.
Ela começa a abrir sua manta e puxa a gola de sua camisa. Podia-se ver no local um grande machucado cicatrizado, pareciam ser três garras e os cortes eram profundos. Assim que ver esse machucado o garoto vira seu rosto novamente, aquele era seu maior medo, machucar alguém. Porém uma mão toca seu rosto, era quente e parecia ter total controle sobre ele. Levantando-o rapidamente seus olhos focam nos de Sadie novamente.
— Isso foi causado quando um amigo perdeu o controle... — Ela solta a gola, escondendo o machudo. Então ela pega o cordão que mantém no bolso e o mostra. — Ele não me machucou por ser um lobisomem, fui ferida porque ele não teve a chance de ter um tratamento decente, por isso decidi ajudá-lo. Para que não passe pelas mesmas coisas que lobisomens que já conheci passaram.
Uma lágrima escorre pelo seu rosto, passando por suas bochechas e molhando as costas da mão de Sadie.
— Obrigado... — responde fraco.
— Ainda não fiz nada, me agradeça amanhã — responde abaixando as mãos. — Eu me chamo Sadie. — Estende a mão vazia para ele. — É um prazer conhecê-lo — diz com um sorriso.
— Me chamo Mirno... — Finalmente conseguindo forças para abrir um sorriso ele estende sua mão. — Estou feliz em conhecê-la, Sadie.
Os dois apertam suas mãos. A lágrima de Mirno escorre lentamente pela mão de Sadie, tocando o chão e sendo absorvida rapidamente pelo solo. Pela primeira vez a luz do luar parecia menos dolorosa para o garoto, o pouco que passava pelas folhas das árvores parecia iluminá-los, como se estivesse no centro de um palco em que os dois eram os atores. Também foi a primeira vez... Ou melhor, a segunda vez que Sadie ficou realmente feliz de ter conhecido outra pessoa desde os acontecimentos do ano passado. Parece que Hogwarts havia sido uma ótima escolha, para ambos.
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