DUAS SEMANAS ATRÁS
Recebo o telefonema numa quarta-feira à noite, antes do jantar, assim que chego em casa do trabalho.
Ao longo de toda a conversa me mantenho incrivelmente controlado: demonstro surpresa nos momentos certos; faço perguntas pertinentes e importantes; lembro-me até de agradecer ao interlocutor por compartilhar a notícia comigo. Mas, depois que desligamos, perco totalmente a compostura.
Não ligo para Taehyung. Não mando mensagens de texto para Jin na esperança de que ele tenha sinal dentro da barriga de uma baleia nórdica qualquer em que esteja morando agora. Subo as escadas correndo, quase tropeçando em tapetes e móveis que fazem parte da família Jeon há cinco gerações, e, quando chego na frente do escritório de Jungkook, abro a porta sem bater.
Olhando em retrospecto, não foi mesmo minha atitude mais educada. E nem a seguinte, quando corro na direção de Jungkook (que está falando ao telefone perto da janela), atiro os braços em volta da sua cintura em absoluto desrespeito pelo que ele está fazendo e grito:
— Consegui! Jungkook… Eu consegui a vaga!
Ele não perde um segundo.
— A vaga de chefia?
— Sim.
Seu sorriso é ofuscante. Então ele diz “Te ligo depois” para quem está do outro lado da linha, ignora completamente o fato de que a resposta é “Senhor, esse assunto é urgente…” e arremessa o celular na cadeira mais próxima.
Então ele me abraça. E me levanta como se estivesse feliz demais para se conter, como se esse telefonema que acabei de receber e que mudou minha vida mudasse a dele também, como se estivesse querendo isso tanto e tão intensamente quanto eu. E é quando ele me gira no meio do escritório, num único e perfeito rodopio de pura felicidade, que eu me dou conta.
De como eu estou incrivelmente, absolutamente apaixonado por este homem.
Venho sentindo isso há semanas. Meses. Sussurrando no meu ouvido, entrando furtivamente, me atingindo na cara como o vagão de um trem. Acabou crescendo de um jeito poderoso e luminoso demais para eu ignorar, mas tudo bem.
Porque eu não quero ignorar.
Jungkook me coloca de volta no chão. Suas mãos se demoram em mim até que ele dá um passo para trás – com uma mão descendo pelo meu braço, a outra afastando uma mecha de cabelo da minha têmpora, colocando-a atrás da minha orelha. Quando ele me solta, quero implorar para que não faça isso.
— Jimin, você é maravilhoso. Brilhante.
Eu me sinto maravilhoso. Eu me sinto brilhante quando estou com você. E quero que você sinta o mesmo.
— Eu obviamente mereço escolher o que vamos assistir na TV hoje à noite.
— Você escolhe o que vamos assistir todas as noites.
— Mas hoje eu realmente mereço.
Ele ri, balançando a cabeça, me olhando nos olhos. O tempo se estende. Uma tensão pesada e doce cresce entre nós. Eu quero beijá-lo. Quero muito, muito beijá-lo. Será que pergunto a ele? Será que ele me afastaria? Será que me agarraria, me jogaria na mesa, me viraria e me seguraria com uma mão espalmada entre minhas escápulas e sussurraria para mim: “Finalmente”, “Fique parado”, “Vamos comemorar”, …
Não. Pare com isso.
Eu quase me engasgo.
— Caramba, o que você acha que Sean está fazendo agora?
— Chorando no banheiro, espero — diz ele.
— Espero que ele esteja postando tuítes desesperados e ouvindo uma playlist do My Chemical Romance no Spotify. Eu preciso stalkear ele nas redes sociais. Já volto.
Faço menção de sair do escritório de Jungkook tão rápido quanto entrei. Ele me impede, porém, com uma mão no meu pulso.
— Jimin?
— Oi?
Eu me viro. Seu rosto feliz e estranhamente aberto se transformou em outra coisa. Em algo mais contido. Obscuro.
— Você falou que… Umas semanas atrás, você falou que, se conseguisse o emprego, iria se mudar daqui.
Ah. Ah.
O lembrete me apunhalou como uma faca entre as costelas. Eu realmente disse isso. Eu disse. Mas faz semanas. Semanas roubando comida do prato um do outro, mandando mensagens no meio do dia para debater sobre a vida amorosa de Eileen e a vez que ele me fez rir tanto que fiquei por dez minutos sem conseguir respirar direito.
As coisas… As coisas não mudaram para nós? Entre nós dois?
Por um momento, não consigo falar. Não sei o que dizer sobre o fato de que seu primeiro pensamento foi que eu me mudaria de lá… Não, seria insensível da parte dele. Ele estava feliz por mim. Genuinamente feliz. Seu segundo pensamento foi que finalmente voltaria a viver sozinho.
Tento fazer uma piada.
— Por quê? Está me expulsando?
— Não. Não, Jimin, não é isso que eu…
O celular dele toca, interrompendo-o. Jungkook dirige um olhar frustrado para o aparelho, mas, quando seus olhos pousam em mim outra vez, eu já me recompus. Se Jungkook quiser morar sozinho, tudo bem. Ele gosta de mim. Ele se importa comigo. Ele é um cara legal – eu sei de tudo isso. Mas ser amigo de alguém não significa querer passar cada segundo da vida com a pessoa e… Pois é.
Acho que isso é um problema meu. Algo com que vou precisar lidar depois que me mudar daqui e essa fase da minha vida chegar ao fim.
— É claro que eu vou procurar um lugar para morar. — Tento soar alegre. Embora não me saia muito bem. — Mal posso esperar pra andar pelado pela casa e me empanturrar de creme para café e celebrar as excelentes decisões da Eileen e… — Não consigo continuar, minha voz some.
Os olhos de Jungkook permanecem retraídos. Ausentes, quase. Mas, depois de um tempo, ele diz em um tom delicado e gentil:
— O que você achar melhor, Jimin.
Consigo dar um último sorriso e sair do escritório no instante em que a primeira lágrima cai bem na minha clavícula.
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