A última aula mal havia terminado e Wade já tinha seus materiais embaixo do braço, praticamente correndo para conseguir chegar ao seu armário primeiro do que todo mundo.
Não havia conseguido se concentrar em nenhuma aula depois do intervalo, sabia que Vanessa e Ellie tentariam falar com Peter e não ter nenhuma novidade o estava matando por dentro. E se tudo tivesse dado errado ao ouvir o nome “Wade” saindo dos lábios de Vanessa?
O demônio se sentia apreensivo como se estivesse esperando para fazer uma visita ao inferno como acontecia no jardim de infância.
Visitar o inferno pela primeira vez era um evento e tanto na vida de qualquer demônio, por isso sua primeira viagem, ainda no jardim de infância, era um dos eventos mais esperados por qualquer demônio que se prezasse.
Wade ainda conseguia se lembrar de em tão pouca idade, ter ficado tão ansioso que não dormiu pela noite anterior inteira. As viagens eram pela manhã, já que era quando o inferno ainda estava em seu horário programado para ser amigável com os visitantes.
O loiro havia levantado super cedo para esperar o ônibus escarlate junto de sua turma. Seu pai andava com a fotografia retirada no início daquele dia dobrada na carteira em demonstração do grande amor e orgulho que tinha pelo filho que estava tão ansioso para visitar o inferno pela primeira vez. E agora, toda aquela ansiedade havia voltado ao seu corpo na espera de uma única resposta.
Quando Vanessa saiu de sua aula, Wade precisou se controlar para não derrubar todos os alunos que estavam em sua frente.
— E então? – Ele perguntou assim que estava perto o suficiente.
— Olá para você também, muito bom te ver. – Vanessa ironizou.
Os chifres do demônio oscilaram de cor, demonstrando que o loiro não estava feliz com a resposta.
— Não adianta mudar as cores do seu chifre, querido. – Vanessa debochou. – Também tenho e sei fazer.
A garota imitou o ato do amigo, enquanto Ellie se juntava a eles.
— Porquê da raiva, Ness? Achei que o Wade ia estar super feliz com você agora. – A garota questionou sem emoção.
— Seu amigo é um grosso.
— Feliz? Isso é um bom sinal então? – Wade questionou a amiga menor.
— Ela não te contou? – Ellie olhou para Wade completamente estática no lugar enquanto ele segurava seus braços.
— Pelo Santo Luar, quanta ansiedade vocês estão extravasando. – Dopinder reclamou cobrindo o nariz ao chegar perto de Wade. – Não, é só o Wade, o que rolou?
— Da para todo mundo calar a boca e só me responder o que ele falou logo?! – O loiro pediu impaciente, sentindo que ia explodir.
— Opa, opa, opa, cheguei. – Colossus se apressou para entrar na roda dos amigos. – O meu sensor de perigo está apitando igual louco. Quem está a ponto de explodir de raiva dentro do colégio com esse tanto de Pacificadores nos corredores?
Wade sentiu seus olhos vibrando dentro do crânio, como aquilo era demonicamente possível? Seu coração batia tão rápido em antecipação que ele achava que podia morrer ali mesmo, qual era a dessa gente para enrolar tanto com algo tão importante? O peito de Wade inflou como se estivesse prestes a soltar fogo pela boca como um dragão, entretanto, só bastou um toque de Colossus em seu dorso que toda a ansiedade pareceu ser drenada de seu corpo.
E a única forma de tudo isso sair dali, era da forma mais cómica que o Pacificador havia pensado.
Uma nuvem quente de vapor explodiu pelas orelhas de Wade. Todos do corredor começaram a rir, o demônio parecia ter sido convertido em uma panela de pressão ambulante, com os chifres vibrando enquanto vapor zunia de seus ouvidos.
— Ha ha ha, tão engraçado. – Wade revirou os olhos, mas se sentia bem mais calmo.
Aquela era uma das muitas medidas paliativas que Pacificadores precisavam aprender para controlar explosões de emoções como essas. Se era fácil que um humano conseguisse explodir de raiva e partir para a violência, tudo era 10x mais intenso no meio sobrenatural.
Colossus sabia que seria difícil que Wade, mesmo em um ataque de cólera, machucasse os amigos de forma física, porém o esperado de um pacificador era lidar com qualquer inconveniência antes que se tornasse um problema.
Ter uma imagem de Wade segurando um anjo de escalão tão importante quanto Ellie, enquanto tinha um ataque de raiva não ajudaria em nada na vida do loiro, então o melhor era sempre evitar.
— Foi sim muito engraçado, você parece um cachorrinho esperando pelo dono sempre que falamos do anjinho. – Vanessa comentou e interrompeu antes que Wade perguntasse. – E sim, a gente falou com ele.
— Ele falou que te ensina. – Ellie revelou.
Wade abriu um sorriso no mesmo momento balançando Ellie nos braços por ainda a estar segurando, sem conseguir se conter, mas logo fechou a expressão de novo.
— Espera, o que ele disse exatamente? Vocês não estão me enrolando, não é? – Ele questionou com os olhos semicerrados.
— Não, bobo. – Vanessa rolou os olhos. – Ele disse “Não tenho problema em ensinar qualquer pessoa, é meu trabalho como tutor, mas acho que nesse caso Wade deveria falar comigo”.
— Uau! Você decorou o que ele falou. – Dopinder elogiou. – Então problema resolvido, o Wade aprender e ainda passa tempo com o tutor.
— Mas ele ainda precisa falar com o Peter, era uma das regras da Ellie também. – Colossus lembrou.
Diferentemente do imaginado, Wade não pulo de alegria. Ele soltou Ellie e analisou o que tinha ouvido.
— Ele não parece feliz, nem mesmo triste. – Wade comentou. – Ele estava com raiva quando disse isso?
— Não. Ele foi bem profissional. – Ellie avaliou. – Quase frio como uma mesa de mármore.
O grupo todo suspirou.
— Desse jeito você acaba com o Wade, Ellie. – Dopinder consolou o amigo.
— Só estou dizendo a verdade, Wade está procurando por um tutor, não é como se Peter fosse lhe dar tratamento diferenciado e também, ele é um anjo, sabe que não pode passar dos limites. Uma das proibições demoníacas, temos um trabalho sobre isso para a próxima semana. – Ellie não queria acabar com as esperanças de Wade, porém precisava ser realista, eles iam estudar juntos, talvez conversar, mas nada mais.
Wade só ia sofrer ao se colocar em uma nuvem de expectativa tão alta. Slap! O som alto de um tapa faz o grupo se sobressaltar. Wade havia batido em si mesmo.
— O que foi isso? – Colossus inqueriu confuso.
— Ellie está certa, eu tenho que ser direto. Não existe motivo para pensar que essa aula vai ser mais do que realmente é, Peter deve estar sendo educado como seria com qualquer pessoa. – Wade tenta se convencer das palavras enquanto fala, era muito difícil engolir que suas chances eram nulas simplesmente por ele ser um anjo.
A raça e a cor de suas asas importavam tanto assim?
— Desculpa amigo, ela está certa, mas isso ainda te dá a chance de ficar perto dele, é melhor do que nada, certo? – Vanessa tentou levantar a moral do amigo.
Wade sorri dando um selinho rápido na amiga como sinal de agradecimento.
— Agora você devia falar com ele. – Dopinder aconselhou. – Eu estou sentindo o cheiro de ansiedade vindo dele agora.
No mesmo momento, Wade captou o olhar de Peter sobre si. O menino rapidamente se atrapalhou e tentou esconder o rosto dentro do armário. Wade não pode deixar de sorrir, achando o ato atrapalhado um tanto quanto fofo.
Tudo o que Peter fazia o encantava.
— Ah, não sei se isso ajuda, mas ele fez uma cara engraçada quando falamos de você. – Ellie tentou ajudar da sua forma.
— Engraçada? – Wade arqueou a sobrancelha.
— É, como se ele tivesse chupado limão. – A anjo levou a maior encarada de Vanessa. – O que? Você não achou engraçado?
O grupo balançou a cabeça negativamente, o conceito de engraçado de Ellie era muito diferente da maioria. Ellie revirou os olhos enquanto o amigo se preparava para ir até Peter.
Um pouco de tudo repassava pela mente de Wade. Ansiedade, preocupação, felicidade e até mesmo uma pontada de medo.
Qual seria a reação de Peter a ver seu rosto de novo?
Os olhos das pessoas remanescentes no corredor se concentraram a caminhada solitária de Wade até o armário do representante de turma e anjo mais especial do colégio.
“Será que devíamos chamar alguém para supervisionar?” Wade podia ouvir outros anjos sussurrarem. “Nessas horas meu celular faz falta e se ele bater no Peter? Como eu vou mostrar pro restante da turma?” Os demônios brincavam.
O loiro tentou não focar no que todos pensavam, ele precisava ajeitar suas palavras antes de chegar até Peter. Como ia começar? Com um olá? Não, parecia muito sério. Talvez um “E ai?”...Soava ridículo. Wade quis desistir no meio do caminho, mas já era tarde demais, estava na porta do armário.
Antes que qualquer som saísse de sua boca aberta, a porta foi fechada e Peter podia jurar que foi do céu ao inferno com o susto que levou. Um gritinho escapou de sua garganta, fazendo que todos que olhassem para os dois acabassem soltando risos abafados.
— Te assustei? – Wade pergunta com um tom preocupado, o que falha.
Todo tom de preocupação vindo de um demônio, parecia algo parecido com uma repreensão. O que só contribuiu para que o pequeno anjo encolhesse ainda mais, Wade estava fazendo bullying consigo? Peter pensava. Era como se estivesse brincando com a sua cara.
— Hum...não. – Peter negou, mas a expressão de Wade não mudou, então ele correu para se corrigir. – Quer dizer, sim, foi repentino ver você atrás da minha porta, nunca imaginei você aparecendo assim tão do nada na minha porta sabe? Não que eu já tenha imaginado você fazendo outra coisa, porque eu não imagino. Nada, não imagino nada. Sou um anjo sem imaginação.
Peter ri de nervoso. Onde tinha ido parar o seu autocontrole? Ele olha hesitante para Wade, só para encontrar o mesmo com um meio sorriso quebrando o rosto sério do demônio.
O castanho quase cora de vergonha e surpresa, nunca havia visto Wade sorrindo para si. Mesmo que fosse um meio sorriso, parecia a coisa mais bonita e iluminada do seu dia.
— Será que ele está pensando em matar o Parker aqui e agora? – Ambos puderam ouvir um dos comentários de quem passava prestando atenção na cena.
Peter sentiu sua conexão com Wade desaparecer tão rápido quanto tinha surgido. Os sorrisos de seus rostos sumiram, fazendo o castanho voltar a uma postura mais calma e profissional.
— Álgebra elevada a tortura. – Wade se voltou a ele tão de repente que Peter precisou de um segundo para entender do que ele falava e não pensar que aquilo era uma ameaça.
— A aula que você precisa de ajuda, certo?
— Sim, acho que a Vanessa te contou.
Peter engoliu em seco ao ouvir o nome da garota. Havia achado ela tão legal a menos de uma hora atrás, até mesmo havia corado com seu elogio, mas tudo havia sido enterrado com a imagem que ficava repassando em sua mente: Wade se aproximando dos lábios dela para beija-la.
Agora fazia sentido para Peter do porquê Vanessa havia se dado ao trabalho de explicar que só queria que Peter ensinasse Wade porque ela estava ocupada. Eles deviam ter algum caso, com certeza. Wade era conhecido no colégio sobrenatural por um motivo bem específico: seu rosto, seu corpo e apesar de suas poucas palavras com desconhecidos, sua voz incrível.
Os boatos diziam que se ele sussurrasse alguma besteira em sua orelha, era o suficiente para você até mesmo engravidar de um filho. Peter sempre ria quando ouvia esse tipo de baboseira, mas lhe fazia questionar de onde uma coisa mentirosa como essa devia ter saído.
Um motivo devia existir, certo?
Metade da escola desejava subir em cima de Wade se possível, mas somente poucos haviam realmente conseguido provar desse tipo de experiência. A outra metade, composta dos “imaculados” anjos, ninguém comentava sobre muita coisa além do tamanho de suas asas. Entretanto, Wade Wilson não era o tipo de coisa que se precisava ser comentada, somente um olhar de desejo bastava para saber que aquele demônio conseguia corromper até mesmo o mais inocente dos anjos.
E nesse caso, ninguém poderia ser punido por um olhar.
Peter suspirou, era o que lhe restava. Enquanto Vanessa podia tê-lo da forma que desejasse, Peter precisava se contentar com um olhar.
— Então? – Wade quis saber depois do silêncio de Peter.
— Ah, hum, claro, as aulas vão ser na Mansão, certo? – Ele tentou se recompor o mais depressa possível.
— É. – Wade concordou, Vanessa não tinha lhe deixado muita coisa para perguntar pelo jeito. – Sei que anjos não gostam de ir para lá, mas eu não tenho permissão para ficar no colégio depois do horário de aula.
Peter franziu a testa, morrendo de curiosidade. O que ele havia feito para não ter permissão? Peter havia perdido a conta de quantas vezes passou noites e madrugadas dentro daquele colégio.
Ele esperou mais alguns segundos, porém Wade não parecia nem um pouco interessado em lhe contar o porquê de não poder estar ali.
— Okay, então na Mansão será, mas tem um problema. – Peter mordeu o lábio, constrangido.
— O que? – O tom preocupado se assemelhou novamente a uma bronca.
— Eu...fui... – A voz de Peter sumiu em um sussurro mínimo até mesmo para os ouvidos de Wade.
— Que? – Wade franziu a sobrancelha.
O ato tão natural para o demônio, lhe transformava em uma imagem cada vez mais temerosa para o anjinho.
— eununcafuiparaláentãonãoseiocaminho. – Peter falou rápido demais.
O castanho imaginou ter ouvido errado quando o som abafado atravessou os lábios de Wade. Aquilo era um riso?
— “Eu nunca...”, será que você pode repetir a fita, eu ainda não sou tão fluente nessa língua.
Peter não pode controlar sentir as bochechas esquentarem. Wade claramente estava brincando consigo, mas aquilo não o havia constrangido, muito menos o deixado com medo, ele estava extasiado e louco para ouvir Wade rindo abafado mais uma vez.
Seu coração batia tão rápido no peito que aquele devia ser considerado seu novo som favorito.
— ...fui para lá, então eu não sei o caminho. – Peter confidenciou não querendo olhar Wade nos olhos e demonstrar o avermelhado em suas bochechas.
— Não tem problema. – Wade tranquilizou. – Aqui.
Peter o encarou quando o mesmo estendeu seu telefone.
— Seu número. – Wade pediu com o telefone ainda estendido. – Assim a gente combina o dia e então você me liga, eu te busco.
Peter esticou a mão hesitante, aquilo estava mesmo acontecendo? Ele pensou enquanto engolia em seco. Agora que parava para pensar, aquela também era a conversa mais longa que tivera com Wade desde...sempre.
Com o número anotado, Wade o verificou e então se despediu.
Peter se enfiou uma última vez no armário para ficar o quão rosa e vermelho escarlate precisasse, antes de pegar suas coisas e sair apressado, estava atrasado para outro compromisso.
Conforme se afastava, Wade voltava a sentir as pernas funcionarem.
Por um segundo, tudo pareceu um painel branco em sua mente, porém aos poucos ia se preenchendo com as reações de Peter. Logo podia ouvir sua voz doce e melódica sobressaindo os comentários surpresos ao verem que nada de mal havia acontecido ao mesmo. Wade deixou um sorriso bobo ser expresso em seu rosto, ele havia conseguido. Havia falado mesmo com Peter.
Agarrando o celular no bolso da calça, verificou mais uma que o número e o nome de Peter realmente estavam ali.
Wade saiu do colégio, de cabeça erguida.
A brisa daquela tarde parecia muito mais fresca por algum motivo.
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