Quando Kagami abriu a porta do apartamento não foi surpresa encontrar Momoi Satsuki com Aomine, que o avisara da visita dupla com antecedência. Tinha, inclusive, deixado um surippa para a menina, que ficaram parecendo pranchas de surf em seus pés pequeninos, diga-se de passagem.
Mas sua expressão não era das mais animadas. Nem podia disfarçar.
— Olá — ela foi dizendo animada enquanto entrava na casa.
— Olá — Kagami respondeu fechando a porta.
— Que cara é essa, Bakagami? Não se recuperou da derrota pra Shutoku até agora? — e lá ia Daiki em direção ao seu trono, digo, ao sofá, abandonando a mochila no meio do caminho — Fico uma semana fora e meu escravo não esqueceu suas obrigações. Muito bem.
Referiu-se ao travesseiro que estava sobre o sofá e a televisão ligada, com a tela do jogo preferido de Aomine pausado. Kagami apenas girou os olhos. Então voltou-se para Momoi.
— Vou começar a preparar o curry — eles tinham vindo um pouco mais tarde do que o costume — Fique a vontade...
— Posso assistir como você faz? — ela perguntou animada.
A questão surpreendeu um pouco Kagami, sua expressão ficou mais séria. Ele pensava o que poderia ser pior: deixar a menina sozinha com Aomine ou tê-la por perto na cozinha... mas qualquer que fosse a resposta não mudava o fato de que os dois era terrivelmente próximos.
— Tudo bem — cedeu. Satsuki sorriu.
Assim que foram para a cozinha Kagami começou a separar os ingredientes que usaria. Momoi sentou-se à mesa, apenas observando. Dois minutos depois o silêncio foi quebrado.
— KAGAMI!
O chamado para aumentar o volume da televisão. Taiga conhecia a rotina. Não teria paz enquanto Aomine não fizesse todas as suas exigências que terminariam com uma garrafinha de água gelada.
Só depois de todo o ritual poderia começar a cozinhar o jantar. E foi exatamente dessa maneira.
— Que saco — resmungou quando voltou para a cozinha — Ele não dá um minuto de sossego.
— Dai-chan está adorando isso tudo — Momoi afirmou o óbvio.
Taiga não disse nada. Sentiu aquela pontadinha chata de ciumes bicando sua nuca como se fosse um pássaro Cuco desde que soubera que Aomine levaria a amiga (insira aqui o gesto de dedos que simula aspas e uma careta) em sua casa. Parecia quase uma violação daquela brincadeira que pertencia apenas aos dois.
E ela o chamava de Dai-chan! DAI-CHAN! Que ridículo!
— Tem uma bela casa — a garota insistiu em sustentar uma conversa.
— Obrigado.
— Dai-chan disse que mora sozinho e cuida de tudo. E que é um ótimo cozinheiro.
— Sim e sim. Moro sozinho, cuido de tudo. E meu curry é bom, mas nos outros pratos eu fico na média — falou sem se virar. Podia sentir o ciumes nascendo como bolhas em sua pele, exatamente como o jogo que Aomine gostava tanto de jogar; e explodindo em gosmas de um rancorzinho chato contra aquela pobre garota. No momento pouco bem vinda a sua casa.
— Dai-chan tem falado muito de você esses últimos dias — ela revelou como quem não quer nada, indiferente aos pensamentos negativos de Kagami.
O ruivo sentiu sua orelha crescer e triplicar de tamanho para prestar atenção, apesar de não se virar ou parar de picar os legumes.
— É? — soou desinteressado. Toda sua postura corporal dizia o contrário.
Satsuki segurou uma risadinha. Ela era especialista em estudar os dados dos jogadores e dizer suas prováveis formas de evolução. E isso não era apenas no basquete. Quando se tem informações o bastante e conhece a natureza de um ser humano não é difícil entender sua forma de agir e definir as futuras decisões dentro de um limitado leque de opções. Mas não precisava de tanto... qualquer um podia olhar para aquele rapaz e ver que estava morrendo de ciumes dela. Característica mais útil do que a visão de águia.
Sua intenção era o melhor para Daiki, o precioso amigo de infância. Queria checar e conhecer Kagami kun, para ver se era uma adição positiva a vida de Aomine. Até agora estava gostando muito dele. Aquele lance de simpatia a primeira vista, talvez?
Resolveu deixar muito claro porque estava ali, um dos seus objetivos iniciais, junto com a possibilidade de conhecer melhor a pessoa capaz de causar tantas reações em Aomine!
— Hn. No começo ele estava todo misterioso sobre o Curry-chan — cruzou os braços sobre a mesa, percebendo como Kagami tentava não dar a perceber que estava interessado na informação — E eu comecei a me perguntar quem poderia ser essa pessoa misteriosa, capaz de fazer Dai-chan sorrir por motivos bobos. Que mudou sua rotina e o trouxe de volta a vida...
Nesse ponto Taiga olhou por cima do ombro e espiou a garota. Ela passara a fazer desenhos imaginários sobre o tampo da mesa com a ponta do dedo indicador. Parecia distante dali.
— Então consegui descobrir que era o Tai-chan!
— Tai-chan?! Oe... — ficou surpreso por ser chamado pelo apelido carinhoso. Aquela menina não era uma rival, no fim das contas?
— Dai-chan é meu amigo de infância. Mais certo dizer que somos como irmãos. Só quero o melhor para Daiki e Tai-chan tem sido muito bom pra ele.
Kagami sentiu o rosto esquentar. Que garota estranha. Será que todos que fizeram parte da Geração Milagrosa tinham alguma coisa fora do lugar daquele jeito? Pra disfarçar, voltou a concentrar-se nos legumes.
Pelo que entendera ela estava tentando dizer que não era uma ameaça? Por isso a enfase no fato de ser amiga (quase irmã) de Aomine? E por que ela dizia essas coisas? Desconfiava do que Taiga sentia pelo outro? Ou... melhor ainda, teria ela intuído algo em Aomine? Alguma mínima chance do rapaz corresponder? Não... Taiga não seria tolo de alimentar esperanças nesse sentido. Seria o mesmo que pedir para sofrer.
Mas não podia deixar de ser grato ao gesto da garota. Pensou que devia retribuir a altura.
— A maior parte do tempo esse cara é um preguiçoso, folgado e irritante — falou enquanto reunia os ingredientes na panela — Só precisa passar por cima de tudo isso. Ou talvez isso seja parte do charme...
Não disse com todas as palavras que estava a fim de Aomine, pois repetir em voz alta ainda era assustador. Acreditava na tenacidade da garota que estivera com a Geração Milagrosa. Momoi Satsuki já devia ter captado tudo o que acontecia entre eles. Mesmo que fosse unilateral. Taiga era transparente e honesto. Nem de Aomine poderia esconder por muito tempo...
— Não deixe Dai-chan te assustar. Por baixo da camada de durão e preguiçoso tem alguém que se importa de verdade com as pessoas que gosta — garantiu.
Taiga não duvidava disso. Sua maior questão era saber se fazia parte da lista de pessoas com quem Aomine se importava. E, caso não fizesse, se tinha chance de fazer.
— Vou torcer por Tai-chan — ela confidenciou baixinho, sorrindo suspeita.
Aquela frase de incentivo voltou a surpreender Kagami, que não teve tempo de questionar ou rebater. Sequer de agradecer.
— KAGAMI! — o chamado arrastado de preguiça quebrou o clima da cozinha. Kagami sorriu e foi imitado por Satsuki.
— Peste — o ruivo resmungou sorrindo — QUE INFERNO, AOMINE... SAMA! JÁ VOU!
R&B
— Obrigada pela comida! — Satsuki uniu as mãos a frente do rosto, satisfeita — Esse foi o melhor curry que eu já comi na vida!
Kagami sorriu orgulhoso, passando a mão pela nuca. Já não sentia mais o passarinho do ciumes bicando, nem as bolhas de rancor em sua pele. Aomine olhou de um para o outro, franzindo a testa para a inexplicável cumplicidade que nascera entre eles. O que acontecera na cozinha, enquanto estivera jogando?
— Temos que ir — Satsuki ficou em pé — São oito horas da noite. Dai-chan acabou de sair de um castigo, não pode quebrar o toque de recolher de novo.
Aomine ficou em pé, secretamente concordando. Não estava nada a fim de perder outra semana preso em casa, logo agora que estava liberado.
— Muito obrigada — Momoi voltou a agradecer a porta do apartamento, logo depois de calçar os tênis — Pelo jantar e por me receber.
— Seja bem vinda!
— Jaa — Aomine só disse isso em despedida, mas a amiga olhou feio para ele, deixando-o intrigado — O que foi?
— Dai-chan! Faça direito! Não é isso que você tem que dizer quando está saindo de casa — inflou as bochechas fingindo raiva e indignação.
Aomine passou a mão pela nuca, bagunçando os fios de cabelo.
— Aa... ittekimasu — resmungou, evitando olhar para Kagami.
O ruivo sentiu o rosto corar de leve. Não pode negar que ficou feliz em ouvir aquilo, mesmo que viesse com um empurrãozinho de Momoi.
— Itterashai.
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