Acordou com o toque do despertador de seu celular que ficava ao lado de seu colchão, carregando em uma tomada próxima a sua cabeça. Sentou-se no grande coxim basteado e desplugou o aparelho telefônico, se espreguiçando antes de levantar preguiçosamente e dobrar seus cobertores. Percorreu o corredor levemente empoeirado e desorganizado com inúmeras camisas, calças e sapatos espalhados pelo chão em conjunto com algumas embalagens de salgadinhos, doces e outros alimentos nada saudáveis até o banheiro, passando pelo aro sem porta com a cabeça um pouco inclinada para não bate-la na madeira, retirando as correntes finas de prata cujo quase nunca tirava e as colocando na pia, não precisando se despir já que estás eram a única coisa que usava. Se colocou em baixo do pequeno e já velho chuveiro tomando uma rápida ducha, lavando apenas as partes cujo achava extremamente necessárias. Secou o corpo já muito marcado seja de cicatrizes seja de tatuagens, saindo novamente nu do pequeno banheiro apesar do frio que fazia naquele outono, voltando a adentrar seu quarto para se vestir. Entrajou a primeira cueca que encontrou em seu armário cujo duas de três gavetas e uma de duas portas estavam quebradas, assim como a camisa mais limpa, embora amassada, que achara. Localizar e posteriormente vestir sua calça jeans negra fora mais fácil já que a usara e a colocara ao lado de seu colchão no dia anterior, assim como suas botas largadas em um canto estratégico do cômodo. Juntou seu celular e seus indispensáveis fones de ouvido à seus materiais em sua mochila, obviamente negra, repleta de vários bottons de diversas bandas de rock, por fim vestindo sua jaqueta de couro também negra (na realidade, a única peça de roupa de coloração diferente em seu corpo era a box vermelha). Voltou rapidamente ao banheiro para recolocar as correntes que ganhara de seus irmãos aproveitando para trocar seus alargadores e saiu de sua casa, despedindo-se de Diana, seu pastor alemão, e andando cerca de vinte minutos até o ponto de ônibus.
Chegou à residência do japonês às 7:30 como de costume, já o avistando fechar a porta atrás de si e se aproximar dele com duas maçãs. Ficava extremamente feliz quando Yagami lhe trazia comida, fosse sua fruta favorita ou não, afinal não tomava café da manhã. Já acordava às quatro por ter de pegar dois ônibus até a sua casa e não gostaria de levantar ainda mais cedo para comer, fora o custo que isto traria. Normalmente, só se alimentava na escola para não ter de gastar dinheiro com comida. — Eae, Light! – Cumprimentou ao contornar o ombro do menor com o braço. – Essa maçã é pra mim?
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— Espera, espera, espera. Deixa eu ver se entendi. – Disse enquanto gesticulava com as mãos, segurando-se para não rir. – Ele te chamou de burro? – Light havia dito o que acontecera quando ambos tentaram terminar o trabalho de ciências sociais na biblioteca e bom... Ele deveria ter ido consigo comer aquele cachorro-quente. Lawliet disse que “superestimava a capacidade” do japonês e ainda o destruira no xadrez. Talvez ele fosse mesmo um gênio tão genial quanto ele, talvez até melhor.
— Praticamente. – Respondeu ríspido e impaciente. Até ele concordava, não havia outra maneira de se interpretar, Yagami finalmente havia encontrado alguém que o odiava e aquilo parecia lhe enfurecer tremendamente.
— Mas... O que “você desistiu” significa? – Indagou antes de abocanhar sua maçã pela última vez, engolindo seus restos por completo, com semente e caule, sem se importar. – E “e muito mais cedo do que eu esperava”? – Lawliet era muito mais esquisitão que Beyond...
— Provavelmente é só um pensamento que ele disse alto demais para expressar a decepção por eu não conseguir exceder o limite que ele impôs, cujo é humanamente inalcançável, – Salientou. – para permanecer na companhia dele e a culpa é toda de sua própria ignorância a respeito de sua insuportabilidade. – Não, Light estava irritado por ter perdido, por ter encontrado alguém tão psicologicamente capaz quanto ele.
— Nooossa... Impressionante como eu não entendi nada do que você falou. – Comentou inicialmente sério até que acabou rendendo-se à risada já entalada em sua garganta.
— Muito obrigada, Ryuk, você está ajudando muito, sabia? – Esbravejou sarcasticamente, jogando os restos de sua maçã que até então segurava a espera de uma lata de lixo.
— Ah, qual é, Light... – Cessou seus passos para espera-lo, observando o amigo fechar a lixeira de metal e voltar a caminhar ao seu lado. – Eu só tô brincando... Você não precisa ficar bolado. Quando foi a última vez que você jogou xadrez? – Sabia que o japonês costumava praticar com muita frequência, principalmente com Mikami, quando era mais novo até que subitamente parara, deixando de jogar por puro tédio.
— Uns dois anos. – Deu de ombros um tanto incerto sobre o momento em específico explicitamente desanimado.
— Então, faz mó cota. – Na verdade, sabia com certa precisão sobre tal época, afinal, fora quando começara a suspeitar de seu quadro depressivo. – O panda anêmico deve ser viciado. – Comparou tentando anima-lo assim como sempre fazia todos os dias. – Você só tava fora de forma. – Todavia, também bem sabia que ele nunca, desde que o pai o ensinara a como movimentar as peças no tabuleiro, havia perdido uma partida...
Light se limitou a concordar com um quase inaudível murmúrio, dando o assunto como encerrado. Não era como se discordasse da lógica de Ryuk, inclusive, passara quase que literalmente a noite inteira traçando estratégias e revendo as dele para derrota-lo naquele dia. Porque, admitisse para si mesmo ou não, era obsessivo, competitivo, orgulhoso e talvez até mesmo infantil e não aceitaria aquela derrota. Disse a ele que queria uma revanche e a teria a todo custo, aliás, era apenas nisto que pensava. Todavia, Lawliet não pareceu se importar. Aquele maldito anoréxico insistia em trata-lo com desdém e descaso até quando não estava presente. Ele apenas tinha de vir pra escola e aceitar a droga da revanche de um desafio que praticamente o obrigara a participar, mas ele simplesmente não apareceu. Ele não compareceu seja à primeira, à segunda ou à terceira aula e ao seu ver assim permaneceria até a última, mesmo que seu irmão tivesse apresentado-se para as duas últimas antes do intervalo. Talvez, até mesmo fosse proposital, exagerou conscientemente.
Recolheu seus materiais quando o sinal tocara indicando o início do intervalo, colocando sua mochila nas costas já que achava mais prático do que ter de carregar cadernos e livros para guarda-los ou retirá-los de seu armário, saindo da sala e sendo seguido enquanto caminhava pelos corredores pelos mesmos idiotas de sempre: Takada, Mikami e Misa. Todos eram irritantes a sua maneira, e normalmente a loira era a mais enfadonha, todavia isto mudava quando ela estava acompanhada de Kiyomi. Até mesmo Teru, aquele cachorrinho que sempre fazia de tudo para estar o mais próximo de si, não as suportava, acabando por ficar o mais afastado que seus ouvidos lhe permitiam somente para ouvi-lo e nada mais. No presente momento, ambas discutiam sobre o Grêmio Estudantil e qual papel cada uma teria dentro deste, ou melhor, qual papel cada uma era digna de exercer.
— Acho que você está confusa, querida. – Respondeu a morena com desdém, cruzando os braços enquanto a encarava com superioridade. "Mulherzinha orgulhosa...".
— M-Mas, eu...
— Líderes de torcida não fazem o perfil de um membro do Grêmio. – A interrompeu elevando levemente a voz com autoridade, não que Takada fosse intimidadora ou impositiva, entretanto subjugar a loira era uma das coisas mais fáceis de se fazer.
— O Ryuk disse que eu posso ajudar! – Exclamou escandalosamente como de costume, fazendo-a rir com deboche.
— E por que isso tem relevância? – Indagou agora Teru enquanto ajeitava seus óculos que caiam para a fina cana de seu nariz. Assim como Kiyomi odiava Misa, Mikami o detestava.
— Ele disse que eu daria uma boa Diretora de Comunicação! – Não havia respondido a pergunta do maior, contudo, havia lógica em sua fala. Um Diretor de Comunicação é responsável pelo diálogo e entrosamento da diretoria com os estudantes e principalmente deve manter os membros do Grêmio informados e a par dos interesses dos demais alunos. A garota podia não ser inteligente, porém indubitavelmente ela era popular e este era um fator crucial para o desempenho desta função. Na verdade, só conseguia imaginar uma pessoa mais capacitada que ela para tal tarefa e esta era o próprio Ryuk.
— É muita responsabilidade para alguém como você, meu bem. Porque não se empenha em ser bonita? É a única coisa que você sabe fazer. – Muito embora seu sorriso fosse terno, sua voz zombeteira e cruel lhe entregava. Não podia julga-la, afinal já havia dito coisas muito piores à ela.
— Não, Ryuk tem razão. – Anunciou ao fechar seu armário, voltando-se a elas. – Você daria uma ótima Diretora de Comunicação. – Concordou sorrindo gentilmente. Não obtinha preferências entre as duas, elas somente o irritavam de maneiras diferentes. Takada era inteligente e bonita e normalmente gostava de falar com ela, enquanto simplesmente odiava a voz de Misa, todavia, por mais idiota que fosse a loira, ela era obediente e submissa à proporção que a morena era mandona e orgulhosa. Não estava defendendo, escolhendo ou apoiando qualquer uma delas, mas sim as incitando. Somente estava entediado...
— Light, não está falando sério... – Disse Kiyomi incrédula. Não apenas ela como Amane pareceu surpresa, até mesmo Mikami voltou a dar atenção àquela discussão.
— Na verdade, estou. – Admitiu simples já que, de fato, pensava assim. – Eu vou a coordenação para tratar dos assuntos do Grêmio, vocês deveriam ir ao refeitório guardar nossa mesa. – Pronunciou-se pela última vez antes de se afastar de seus “amigos”. Por mais gentil que aquela sugestão pudesse ter soado, todos os três jovens ali presentes compreenderam que se tratava de uma ordem e não um pedido. Já estavam juntos desde o nono ano e bem sabiam como aquela relação funcionava. – Tenho certeza que podem chegar a um acordo sem mim...
Tomara rumo ao seu destino pelo caminho mais longo que pudera pensar com o intuito de demorar o máximo possível apenas para se livrar daquela maldita e enfadonha situação. Definitivamente, a pior parte de se ter um Grêmio era forma-lo... Não suportava mais as discussões, os desentendimentos e, acima de tudo, ter de segurar para não matar alguém, contudo, no final, valeria a pena. Logo estaria longe daquela cidadezinha em uma das melhores faculdades do país, ou menos, assim pensava enquanto caminhava tranquila e serenamente pelos corredores que já conhecia como a palma de sua mão. Até que, em algum momento, começara a ouvir certos ruídos e risadas nada agradáveis, obrigando-o a cessar seus devaneios sobre o que mais amava no mundo: ele mesmo. Estava naquele colégio tempo o suficiente para saber que aquilo não era um bom sinal, todavia não era como se pudesse apenas ignorar alguém que necessitasse de seu auxílio, pensou ao seguir tal som a passos calmos, receosos e principalmente silenciosos, averiguando sobre o que tais sonidos se tratavam. Era uma cena desconcertante, lhe remexia e embrulhava-lhe o estômago lhe causando desde náuseas e asco até pena e compadecimento, talvez até mesmo raiva. Não conseguia compreender o que estava acontecendo, entretanto entendia o quando errado era apenas ao observa-la. Tad, a principal razão por aquele colégio ser um verdadeiro inferno estava fazendo mais uma vítima desta vez de uma maneira tão condenável, cruel e perversa que o assustara. Não sabia ao certo qual era o objetivo dos quatro veteranos ali presentes, claro, se sequer havia um por detrás daquilo, mas dois deles seguravam um garoto cujo não pôde reconhecer, chamando-o de retardado inúmeras vezes enquanto o loiro o amedrontava. Um deles até mesmo zombara de sua maneira aparentemente peculiar de se sentar e andar, fazendo-o pensar em Lawliet. Na verdade, constatou ao se aproximar para que melhor pudesse averiguar a situação, aquilo lhe fazia recordar de Lawliet pois, mesmo que não compreendesse como, sabia que aquela negra e desgrenhada cabeleira pertencia a ele. Eles puxavam-lhe a blusa e o moletom para tentar retirá-los, revelando algumas cicatrizes e deformidades em seu abdômen, mas a gota d'água fora quando Tad começara a tirar suas calças. — Ei! O que estão fazendo!?
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Lawliet normalmente se levantava próximo das 7:10hs após passar um longo período de tempo encarando o vazio de seu tão desinteressante quarto, reunindo forças o suficiente para encarar mais um dia. Obtinha dias ruins e dias bons assim como todas as outras pessoas, contudo a muito tempo não vivenciava um dia tão dolorosamente catastrófico quanto aquele. Primeiramente, acordaram extremamente atrasados... Não sabia Lawliet se não haviam pago a conta luz, se houve um apagão em seu bairro ou qualquer outra coisa, tudo o que sabia era que não havia energia na sua casa. Beyond somente fora o primeiro a se levantar próximo das 7:30hs pois felizmente dormia com as janelas abertas e alguns raios de Sol bateram em seu rosto, o acordando. Fora acaso... E enfurecido, ele saiu rapidamente de seu quarto, caminhando a passos largos e pesados até o quarto de L, abrindo sua porta de modo bruto, porém sem bate-la na parede branca e já desbotada do cômodo. Watari saía às 5:00hs para trabalhar e, quando o idoso estava ausente, era ele o responsável. — Lawliet. – Chamou-o sério e ríspido sem saber ao certo se ele dormia ou não. Mesmo se estivesse acordado ele poderia estar simplesmente divagando em pensamentos aleatórios como sempre fazia.
Ao ouvi-lo L se virou incerto se alguém realmente o chamara, sentando-se receosamente na cama ao perceber a figura assustadora projetada a sua frente. B não havia acendido a luz de seu quarto e o que o iluminava era a mesma luz que saía do corredor, projetando uma enorme sombra que o cobria por completo. Mesmo sem contato com a claridade, seus olhos vermelhos eram sinistramente nítidos e visíveis na escuridão de seu rosto pouco iluminado. Inconscientemente se obrigou a compara-lo a época em que dormiam juntos quando eram crianças. Ele não era nem de longe assustador naquele tempo, então por que era tão ameaçador e apavorante agora? — Aconteceu alguma coisa? – Perguntou um tanto preocupado ainda desconcertado pelo modo como ele parecia muito mais uma figura maligna de contos macabros do que como uma real e “normal” pessoa assim como ele.
— Vai escovar os dentes! – Esbravejou descortês sem sequer notar o receio, quase seu medo que embora irracional estava atipicamente demonstrando. Não podia negar a si mesmo que pensara na possibilidade de Beyond realmente machuca-lo a ponto de mata-lo. Ele nunca havia chegado perto, mas já o agredira e o ameaçara por puro descontrole, mesmo que depois implorasse por seu perdão. B saiu de seu quarto sem esperar uma resposta que sequer sabia se iria receber, não fechando a porta ou acendendo a luz ao fazê-lo, deixando L no escuro e no vazio completamente sozinho.
Tratou de se colocar de pé e caminhar pelo delicioso carpete felpudo até a cozinha já que não gostava de compartilhar a pia do banheiro com Mello, desistindo de tomar café após vasculhar a geladeira a procura de doces. Tudo que encontrara foram os chocolates do loiro e neles sabia que não deveria tocar... Voltara para o andar de cima a medida que Near e Matt desceram para se alimentar, retornando para seu quarto para pegar suas vestes antes de se locomover até o banheiro, onde trancou a porta e se despiu sem dirigir a atenção ao espelho. Abriu o box e ficou abaixo do chuveiro antes de liga-lo no mais quente possível e deixou que a água lhe lavasse. Estava exausto, mas aquilo também não era uma novidade... Vestira uma de suas blusas brancas surradas de mangas cumpridas, seus típicos jeans azuis escuros também gastos e amassados e seu moletom azul marinho com bolsos frontais sem zíper que por pertencer, na verdade a Beyond, era alguns números acima do seu. Por fim, de modo triste e a contra gosto L se sentou no vaso sanitário para calçar seus incômodos tênis gastos sem amarra-los, colocando seus cadarços para dentro do mesmo com certo esforço. Arrumou seu material e verificou o horário em seu celular para averiguar o quão atrasados estavam. “7:55hs”. Deveriam sair da casa no mais tardar às 8:30hs para conseguirem comparecer à segunda aula já que estavam por conta própria e teriam que andar até a escola...
— Porque a gente só não falta logo? – Questionou Matt que estava de modo esparramado no sofá em uma posição aparentemente desconfortável ao seu lado, esperando Mello e Beyond. Near estava no tapete felpudo da sala montando um de seus quebra-cabeças totalmente brancos.
— Nem fudendo! – Respondeu-o afobadamente ao aparecer subitamente no cômodo ao descer as escadas de dois em dois degraus, se irritando com a lerdeza com que Mail se levantava, bufando e recolhendo sua bolsa do chão preguiçosamente. – Vamos! – Ordenou caminhando apressado até Nate que ainda estava sentado no chão. – Depois você termina. – Agarrou o garoto contornando sua fina cintura somente com o braço direito, o levantando com quase a mesma facilidade com que ergueu sua bolsa estranhamente preta do chão, a enganchando em seu antebraço esquerdo. Definitivamente iriam para escola! B introduziu a chave na fechadura da porta e a abriu, colocando o albino com cuidado, quase com carinho, nos ladrilhos de cimento acinzentado do lado de fora da residência e esperou impaciente seus irmãos saírem da casa. Fechou com força a porta, logo em seguida voltando a introduzir a chave na fechadura para tranca-la novamente, entretanto, antes que assim o fizesse um dos pirralhos que sequer pode distinguir lhe interrompeu:
— Espera, e o Mello? – Havia ouvido, mas não fora capaz de compreender o conteúdo da oração.
— Quem? – Perguntou confuso virando seu rosto para a face preocupada e ao mesmo tempo indignada de Mail.
— O Mihael! – Explicou desacreditado. Sabia que B era maluco, mas esquecer de um deles?
Beyond ainda confuso virou-se completa e subitamente para trás, contando mentalmente quantos garotos haviam. Um com ele, o mais velho; dois com Lawliet, o segundo mais velho; três com Matt, o do meio; e por fim... Cinco, com Near que era o caçula. Não, um, dois, três, quatro e cinco. Faltava o número quatro.
— Porra! – Gritou repentinamente assustando os demais.
Surpreendentemente, chegaram no colégio às 8:30hs. Não podiam entrar no meio das aulas então deveriam esperar até o término da primeira e consequentemente o início da segunda. Beyond, como o de costume, desapareceu entre esta meia hora enquanto Near, Mello e Matt foram até suas salas e Lawliet, em contrapartida, fora a biblioteca. Não iria comparecer à duas aulas seguidas de educação física, seu professor havia dito que iriam jogar queimado e ele não suportaria ser agredido física e verbalmente por literalmente duas horas.
Se sentou novamente nas mesas de estudos desta vez na mais afastada que encontrara, anotando em sua mão o caminho que fizera para não se esquecer e posteriormente se perder e retirando seu livro de sua bolsa, deixando-se entreter pelas especulações de Scarpetta sobre o Sr. Ninguém e suas preferências étnicas para estupro e assassinato. Ficara lendo até cerca de dez minutos para o início do intervalo quando guardara seu livro e se levantara colocando sua mochila em suas costas, saindo da biblioteca e caminhando pelos corredores a procura da sala de Near, de Matt e Mello ou do refeitório, no caso, o que encontrasse primeiro, até que começara a se preocupar levemente, arrependendo-se de não ter aguardado e os esperado. Maldito fosse seu praticamente nulo senso de direção! Todas as paredes e armários eram iguais, não conseguia se localizar por meio das placas e avisos nas portas e murais e muito menos seguir suas instruções, já confuso sobre qual das setas se referia a esquerda e qual era concernente a direita. Tudo que pudera fazer fora ficar zanzando aleatória e confusamente tão frustrado e nervoso que sequer ouvira o sinal tocar indicando o término da terceira aula. Não sabia ele se estava concentrado demais ou carecendo de atenção, contudo em algum momento, no clímax de um dos dois, esbarrara em alguém tão violentamente que pendera para o chão, mordendo seu dedo que já estava em sua boca com força o suficiente para machuca-lo verdadeiramente com o impacto de seu corpo com o piso de madeira.
— Porra, olha pra onde anda! – Esbravejou o loiro ao passar a mão por sua blusa como se a limpasse por L ser tão desasseado que o enodaria somente com o encontrão. Ele era alto e grande o suficiente para permanecer em pé mesmo com o choque entre seus corpos, onde a diferença de peso e estatura fizera toda a diferença. – Espera. – Disseram antes que L pudesse se levantar e se desculpar, afinal por mais grosseiro que ele pudesse ter sido aquele desentendimento fora culpa sua. – Você não é aquele cara que senta em cima dos pés? – Como um rebate aquela sirene voltou a ecoar em sua cabeça agora muito mais intensa e penetrante, como se não somente o alertasse do perigo iminente como também o impelisse a compará-lo a última vez que ficara em risco. Não era nenhum pouco parecido... – Sabe, eu tava te procurando faz um tempo... – Um arrepio percorreu por sua espinha ao encarar o sorriso que paulatinamente em seu rosto se formava, fazendo seu estômago embrulhar. Tinha de sair dali o mais rápido possível... Apoiou-se em seus joelhos para se levantar pronto para dar meia volta e se afastar daquela figura ameaçadora, contudo, assim que ficara de pé, seus braços foram agarrados por algo atrás dele, obrigando-o a imaginar não apenas que o loiro não estava sozinho como que, definitivamente, não poderia dialogar para se desvencilhar daquela situação... Virou seu rosto para trás leve e temerosamente, constatando aquilo que já obtinha ciência: havia um garoto, maior do que aquele que esbarrara, de cabelos castanhos e poucas sardas na face, e ao menos mais dois atrás dele que não pode ver de relance.
— Tá com pressa? – Questionou o moreno ao segurar sua mochila o fazendo pender para trás, a retirando a força enquanto arrancava risadas nada amigáveis dos outros dois.
— É... – Concordou o loiro lenta e maliciosamente, agarrando a gola do moletom que não era verdadeiramente seu e o arrastando para os armários ao lado fazendo-o tropeçar em seus próprios pés ao obriga-lo a andar de costas. Suas costas se chocaram violentamente contra o aço das portas compelindo-o a morder nervosamente seu lábio inferior para não grunhir com a dor. – Vamos conversar direito. Qual seu nome, esquisitão?
— Porra ele é muito esquisito. – Comentou rindo o menor de todos eles também de cabelos castanhos agora a alguns metros a sua frente, atrás do loiro que o prensava contra os armários.
— Responde, caralho! – Socou sua bochecha esquerda somente não o derrubando pois ainda o segurava pela gola do casaco. Lawliet permaneceu covardemente com seu rosto abaixado sem coragem o suficiente para encara-lo, focando sua atenção em seus pés. Queria estar descalço... Em resposta ele agarrou seu pescoço para lhe forçar a olha-lo o asfixiando levemente, batendo novamente com sua cabeça nos armários ao levanta-lo, o impelindo a permanecer nas pontas dos pés. L levou suas mãos ao seu pulso instintivamente sem tentar se livrar realmente do aperto, observando dois dos garotos a sua frente - o maior e o menor, ambos de cabelos castanhos - mexerem e vasculharem sua mochila retirando seus materiais de dentro dela, jogando-os no chão apenas para chuta-los e pisoteá-los ou os rasgando e os quebrando enquanto riam como se aquilo fosse a coisa mais divertida e engraçada do mundo. – Olha pra mim! – Gritou em voz de sussurro agravando o aperto em seu pescoço e inclinando-se para baixo em virtude da grande diferença de altura, ficando perigosamente perto apenas a centímetros de distância. Embora tivesse compreendido o conteúdo de sua oração, Lawliet teimou a abaixar seu rosto aplicando todo seu medo e nervosismo em seu lábio inferior enquanto voltava a encarar covardemente seus pés. – Puta que pariu, você é retardado? – Gritou furiosamente voltando a asfixia-lo agora muito fortemente, como espécie de aviso para parar de desobedece-lo, arrancando mais risadas dos garotos atrás dele. – Como era mesmo o nome do maluco que tá andando com o Ryuk agora? – Questionou o loiro para um de seus amigos, voltando-se parcialmente para trás, afrouxando mesmo que acidental e levemente o aperto em seu pescoço. – Vocês são irmãos, não são? – Retornou a direcionar sua atenção a ele. – São iguaizinhos... Dois esquisitões.
— Birthday. – Respondeu o mais baixo enquanto o outro loiro, apenas um pouco maior, buscava algo em seu celular.
— Que porra de nome é esse!? – Indagou em meio a uma gargalhada, afrouxando novamente o aperto no pescoço alheio, permitindo a L respirar mais decentemente.
— É L. Lawliet. – Anunciou aquele que procurava por algo no aparelho telefônico, talvez uma foto da “lista negra”, imaginou Lawliet, guardando o objeto em seu bolso direito.
O loiro riu de seu nome fazendo com que seus amigos rissem também, embora achasse L que, na realidade, não vissem humor naquilo. — L. Lawliet? Porra é pior ainda! – Zombou soltando-o com brutalidade, deixando-o respirar e tossir, levando suas mãos ao próprio pescoço ainda sentindo os dedos alheios em sua pele. – L é abreviação do quê? – Perguntou gentil e sereno demais para alguém que, segundos depois, o socou novamente desta vez o derrubando. Tudo que ouvia eram mais e mais risadas até que levara um chute no estômago, transformando estas em escandalosas gargalhadas. – Você não vai falar mesmo? – Indagou como se estivesse realmente chateado e decepcionado, o chutando de novo e de novo até que L perdeu a conta, fazendo-o cuspir sangue. Não estava fazendo de propósito... Não conseguiria falar nem mesmo se quisesse, seu cérebro só conseguia se concentrar na quantidade de dor e no medo que estava sentindo. Como se desistisse, o loiro suspirou derrotado, abaixando-se para agarrar seu moletom novamente e o levantar. Ainda não havia terminado? Voltou a segurar seus pulsos desta vez apenas em busca de sustento, tentando permanecer em pé embora suas pernas já não suportassem seu peso. – Você é retardado, não é? – Questionou novamente, voltando a aproximar seus rostos. – Fala vai, Lawliet. – Virou seu rosto para o lado oposto, temendo o próximo contato. Estavam muito, mas muito próximos. – Você é retardado. – Não gostava daquela palavra. – Em, Lawliet? – Cada vez mais perto, inclinando-se para ficar justamente onde L pendia seu rosto. – Quem senta desse jeito? – As risadas ensurdecedoras ecoavam em sua mente já fadigada e sobrecarregada. – Não é, Lawliet? – Perguntou agora elevando seu tom, não chegando a parecer zangado enquanto lhe dava um tapa. – Você é retardado. – Fechou fortemente seus olhos, recebendo outro golpe tão fraco quanto o anterior, todavia ainda assim dolorido o suficiente. Seu intuito provavelmente não era lhe machucar verdadeiramente, todavia apenas provoca-lo. – Você é o que? Autista?
— Puta que pariu, olha a barriga dele! – Arregalou os olhos desesperado, apenas agora notando que parte de seu abdômen estava a mostra já que o loiro o segurava pelo moletom e consequentemente puxava suas roupas para cima para mantê-lo em pé.
— Caralho! – Exclamou surpreso e maldoso em meio a risos, soltando seu casaco azul parcialmente e levando sua mão direita até sua blusa branca por baixo deste a levantando, revelando em partes as cicatrizes e hematomas gravados em seu corpo à quase uma década atrás.
— N-Não! – Proferiu patética e mediocremente, apenas não mais vergonhoso e desonroso do que suas tentativas falhas de fazê-lo parar, levando ambas as mãos fracas e trepidas até seu pulso para abaixa-lo e voltar a se esconder de seu passado como um covarde.
— Ah, então você fala? – Questionou sarcástica e cruelmente em seu ouvido, levando agora ambas as mãos para expô-lo de maneira humilhante.
— N-Não, e-eu... – Não conseguia proferir qualquer coisa sem gaguejar, sentindo suas pernas bambearem e se enfraquecerem ao ponto de quebrarem, seu coração disparar e bater desabaladamente exacerbando as bombeadas de sangue em um ritmo que sequer acreditava ser possível e seus pulmões insuficientes desistirem de lhe proporcionar a quantidade devida de oxigênio, passando a hiperventilar.
— A gente só quer ver. – Sussurrou novamente próximo ao seu rosto voltando a rir com perversidade, puxando sua blusa até seu peito mesmo com Lawliet tentando abaixa-la.
— Espera aí, Tad, acho que já chega...
— Agora que tá ficando interessante? – Com a mão esquerda que ainda o segurava pelo casaco “Tad” lhe puxou, praticamente jogou, para frente o fazendo tropeçar em seus próprios pés a ponto de quase cair, somente permanecendo em pé pois o maior garoto, aquele de cabelos castanhos e sardas no rosto, o agarrara pela cintura. – Eu quero ver se tem nas pernas também. – Ele puxou seu moletom para cima tentando tira-lo a força enquanto o outro o auxiliava, segurando seus braços e impedindo-o de se debater.
— Tad, ele tá tremendo muito, e se ele for mesmo autista? – O outro loiro, aquele que revelara seu nome sendo o único que não o tocara até então, era quem tentava impor limites àquilo, parecendo se preocupar com o rumo que a situação estava tomando.
— Cala a boca, Michael. – Ordenou o menor.
— Calma, – Voltou a se pronunciar Tad, ao se aproximar novamente dele, levando suas mãos até sua um tanto larga calça. – A gente só tá brincando... – Abaixou seu rosto para aproxima-lo do de L sussurrando à centímetros de sua face para apavora-lo, descendo o cós de seus jeans velhos e surrados enquanto se deleitava com os vários e quase inaudíveis “não’s” que ele choramingava. – Não é Lawliet?
Devia agradecer a ele, afinal, não se lembrava da última vez que ficara tão desesperado e impotente, somente sentindo inúmeros toques, puxões e apertos em seu corpo, ouvindo incessantemente risadas cruéis e perversas assim como uma das palavras que mais detestava e repudiava enquanto era despido com violência. Seus olhos já lacrimejavam e Lawliet não suportava mais conter suas lágrimas, deixando-as transbordar por seus olhos ao observa-lo retirar suas calças. Todavia, antes que pudesse abaixa-las significativamente, o loiro cessou seus movimentos assim como os demais garotos, encarando algo ao lado. Curioso, L voltou sua atenção ao que encaravam também, demorando alguns instantes a reconhece-lo, se surpreendo seriamente.
— O que estão fazendo!? – Proferiu Light completamente indignado ao se aproximar dele fazendo, consequente e felizmente, Tad se afastar assim como o moreno que o segurava o soltar, deixando-o cair com a mesma formosura e delicadeza com a qual um ovo despenca após fracassar em uma luta contra a gravidade, se estrafegando ao se chocar contra o chão.
Seu corpo doía tanto que acabara por ceder, não conseguindo limitar-se a morder seus lábios para extravasar tal aflição, grunhindo baixo, contudo ainda audível o suficiente para seus agressores e até mesmo para Light. Sua visão embaçara e ficara um tanto turva enquanto ouvia murmúrios altos e quase ensurdecedores, todavia ainda assim ininteligíveis. Sabia que havia movimento a sua volta, mas não conseguia focar sua atenção para nada além de seus pés encobertos por seus incômodos tênis desamarrados, só podendo pensar em como queria tira-los, permanecendo assim por inúmeros instantes até que, em algum momento, como se voltasse a realidade, piscou lenta e calmamente demais para alguém naquela situação, virando seu rosto para o lado para se situar. Tudo parecia exageradamente lento a proporção que, em contrapartida, também parecia-lhe rápido demais para seus olhos acompanharem, mudando significativamente a cada intervalo em que piscava, no momento muito mais do que o normal em virtude das lágrimas. Enxugou-as com as mangas compridas de seu moletom, voltando a observar a briga entre o japonês e o loiro. Yagami estava passageiramente ganhando, estando em cima do loiro o socando uma, duas, três vezes, sendo obstruído de lhe golpear pela quarta por Tad que lhe esmurrou de volta, mudando o cenário quase que completamente ao derruba-lo. O garoto de sardas no rosto o levantou o segurando para que o loiro acertasse seu abdômen, fazendo com que Lawliet voltasse sua atenção a seus pés, não querendo mais observar tamanha covardia e violência. Somente agora havia percebido o quanto suas pernas tremiam, totalmente cansadas e fadigadas não somente pela sova que levara como por sua baixa tonicidade muscular. Tinha se esforçado tanto... E agora Light estava se machucando por sua causa... As lágrimas teimaram em transbordar novamente, impelindo Lawliet a lutar árdua e exauridamente contra elas, não deixando-as escorrer por sua face outra vez. E, assim como outrora, não sabia L se concentrava-se fielmente em não chorar ou se carecia demais em atenção concernente a situação a sua volta, contudo em algum instante cujo já não podia mais especificar, não ouviu os passos da figura que se aproximava no clímax de um dos dois, somente notando os pés a sua frente quando piscara novamente, levantando seu rosto a medida que o dono dos tênis a sua frente se abaixara para lhe indagar gentil e empaticamente com a voz mais aveludada e harmoniosa que já escutara:— Você está bem?
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Não percebera Light o quanto seu coração havia acelerado ou quantas batidas ele havia falhado, sequer notando que não havia cessado seus passos e que consequentemente ainda andava em sua direção, assim como não ponderou a respeito das consequências, controlou suas emoções ou receou sua resposta ao socar o Quarterback do time de futebol americano, caso contrário, nunca teria tomado tal atitude por mais heroica, honrada e estúpida esta tivesse sido. O esmurrara cerca de cinco vezes seguidas, lhe golpeando forte o suficiente para derruba-lo somente movido a base da mais pura e singela raiva, até que fora obrigado a voltar a entendiantemente imperfeita realidade quando Wilkins lhe devolvera a percussão com juros. Era exatamente por isto que, quando sua adrenalina reduzisse e sua ira se esvaísse dando espaço a sua sensatez e discernimento, se arrependeria de tê-lo desafiado daquela maneira. Obtinha um físico invejável, de fato: possuía quase 1,80m de altura e pesava pouco mais de 70kg, sempre praticando inúmeros esportes e, deve-se salientar, sendo muito bom na maioria deles, todavia, estamos falando do capitão do time de futebol americano. Ele era apenas cinco, seis centímetros mais alto, contudo pesava quase 10kg a mais. Se já seria difícil ganhar em uma luta justa contra Tad, imagine em uma onde estivesse com tamanha desvantagem, afinal eram quatro contra um. Felizmente, aquele maldito bastardo esmurrara-lhe a barriga somente uma vez enquanto Bryce o imobilizara. Saber de tudo implicava o poder de estar em qualquer lugar a qualquer hora e, era exatamente por isto que Ryuk sempre estava onde queria e quando queria e estes locais, normalmente, eram repletos de agitação desordenada. Ele não somente impediu o loiro de lhe dar outro soco no estômago agarrando-o pela gola de sua camisa e o jogando violentamente contra os armários, como o levantou quase dez centímetros retirando seus pés do chão enquanto o prensava contra as placas de metal para que ficassem da mesma altura.
— Que porra eu falei pra você!? – Ryuk estava sempre animado, sorrindo, rindo e agindo como um completo e feliz idiota sendo, na maioria das vezes, inofensivo apenas com brincadeirinhas e piadinhas de mal gosto. Ele não rico, aliás muito pelo contrário, tudo relativamente oneroso que possuía fora conquistado com muito tempo e esforço. Então, porque todos os riquinhos e mimados daquele colégio o respeitavam? Ele morava na periferia, pegava até dois ônibus para chegar na escola, era só um favelado imundo cujo não valia nada, certo? Bom, talvez ele realmente fosse. Todavia, ele não era um favelado qualquer. Ryuk, quando queria, podia ser muito assustador e intimidante. Não era só o cara que sabia tudo sobre todos. Fora Light, ele não tinha amigos naquele colégio, todavia, todos conheciam seus amigos fora dele. Eram todos traficantes, assassinos, contrabandistas, assaltantes, viciados, presidiários ou recém soltos, dentro outros. Ele era o cara que conhecia todo mundo, mas principalmente, as pessoas certas. – Pode fazer o que quiser nessa merda de escola. – Soltou o loiro o arremessando no chão com desprezo. – Mas se mexer com o Light eu e meus irmãos vamos até a sua casa pra gente se resolver. – Ameaçou friamente enquanto o encarava.
— Porra... – Grunhiu Wilkins ao se apoiar com as mãos no chão em busca de sustento, fazendo com que Bryce soltasse Light e se aproximasse deles assim como Michael e Justin, prontos para avançar no maior. – Esperem. – Anunciou ao se levantar sem nunca cessar o olhar colérico que dirigia a Ryuk.
— M-Mas Tad! – Exclamou Justin indignado. Nunca voltavam atrás, ainda mais se tratando de uma briga.
— Vamos. – Pronunciou por fim a contragosto ao se virar deixando o ambiente ainda mais tenso até que sumira entre os corredores seguido de seus amigos, aliviando imensamente o japonês. Não era como se quisesse que o loiro e suas ovelhas saíssem impunes daquela maneira, todavia fora o desfecho mais pacífico que pudera imaginar. Sequer pensava que sairia somente com aqueles hematomas...
— Puta que pariu, Light! Que porra deu em você? – Questionou com seu tom exagerado e brincalhão de sempre, voltando-se a ele ao averiguar se Wilkins realmente havia ido.
Não obteve tempo, paciência ou até mesmo consideração o suficiente para pensar em uma resposta e assim dá-la a ele, tudo em que pensava era em Lawliet e se ele estava bem. Andara rapidamente até ele a passos largos e ligeiros, sentindo seu coração bater desabaladamente como se fosse a qualquer minuto pular de seu peito, se colocando a sua frente. Ele estava em choque? Por que observava seus pés como se fossem a coisa mais importante do mundo? Por que não correra enquanto ele o defendia? Será... Que ele sequer conseguia andar? Abaixou-se para entrar em seu campo de visão na esperança de que ele percebesse sua presença e lhe ouvisse, sorrindo compadecida e empaticamente da maneira mais genuína e verdadeira que já havia feito ao lhe indagar:— Você está bem? – Lawliet permaneceu em silêncio agravando sua preocupação, somente o encarando com aquelas orbes absurdamente negras e chorosas, não sabendo Light se elas sempre foram tão melancólicas e deprimidas e nunca havia notado, se estavam atipicamente demonstrando qualquer coisa além da opacidade e frieza costumeiras ou se era ele quem estava enxergando sensibilidade onde ela não existia. – Lawliet? – Insistiu ao não obter resposta, inclinando-se levemente para frente e dirigindo receosamente sua mão para perto dele no intuito de toca-lo nos ombros ou no braço para obter sua atenção. Em reação Lawliet se encolheu levando suas pernas para próximo de seu peito, permanecendo em uma posição parecida com a qual se sentava, não cortando o contato visual.
— Que porra aconteceu aqui? – Questionou Ryuk ao se aproximar deles, fazendo com que L se assustasse e virasse seu rosto para o lado para averiguar quem o havia dito. Então ele sequer havia percebido sua presença?
— Você consegue se levantar? – Voltou-se a Lawliet ignorando o maior. Tinham de levá-lo a enfermaria...
— Light! – Reclamou o grandalhão idiota indignado ao abrir os braços exagerada e escandalosamente ao ainda aguardar uma explicação, sendo novamente desconsiderado da “conversa” (na realidade, o japonês falava sozinho)...
Levemente frustrado e, acima de tudo preocupado, Yagami mordeu seu lábio inferior em uma resposta nervosa e envergonhada concernente aos seus próprios pensamentos. Iria carrega-lo? Lawliet não lhe dizia nada! O que mais faria? E se ele tivesse batido com a cabeça ou algo assim? Talvez estivesse em choque... Todavia, embora inúmeras possibilidades martelassem em sua cabeça, uma das alternativas era, ao menos em sua pessoal perspectiva, mais provável e plausível: L era autista. Não sabia muito sobre o transtorno de desenvolvimento, mas obtinha ciência de que ele não possuía necessariamente uma aparência, ou seja, Lawliet poderia ser embora não aparentasse. E nem mesmo precisava ser especificamente autismo, L poderia ter um milhão de transtornos, contudo era evidente: ele não era “normal”. Se ajoelhou ao seu lado, ficando ainda mais inquieto ao notar o quanto Lawliet se incomodava com a proximidade repentina, se encolhendo e pendendo para o lado oposto. — E-Eu v-vou... Carregar você. – Anunciou com a voz trêmula tão nervosa e acanhadamente que gaguejara, temendo que ele pudesse ouvir as rápidas e desesperadas batidas de seu exasperado coração. Levou sua mão esquerda para próximo de suas pernas, a colocando a baixo de seus joelhos enquanto Lawliet parecia reprovar e desgostar da ideia, apertando seu braço entre suas coxas e suas panturrilhas ao sentido circundar sua um tanto fina cintura com o direito, o puxando para si para poder acomoda-lo devidamente antes de levanta-lo. Nunca havia ficado tão desassossegado e tenso antes, mas ainda sim sua ansiedade somente pareceu aumentar ao ouvi-lo grunhir e choramingar quando o segurara daquela maneira, sentindo seus músculos se enrijecerem. – D-Desculpe... – Lamentou timidamente ao tirá-lo do chão, ouvindo-o gemer dolorido novamente. Ele parecia tão pequeno em seu colo e era tão leve, pensou sentindo-se culpado por chamá-lo de anêmico.
— O que você vai fazer? – Indagou ao observa-lo andar com mini-Beyond no colo, o seguindo intrigado.
— O que você acha? – Questionou retoricamente, ocultando seu nervosismo e acanhamento com ignorância, estes que, como planejado, passaram despercebidos. – Levar ele pra enfermaria. – Esclareceu por fim, dando término a conversa e início a um silêncio completamente constrangedor, ao menos para ele. Light controlava-se veementemente para não olhar para baixo e encontrá-lo o encarando também, enquanto Lawliet, por sua vez, pareceu se acalmar relaxando levemente em seus braços, não soltando qualquer ruído o caminho inteiro.
Quando chegaram no local, Yagami fora obrigado pela enfermeira a se sentar e aguardar no lado de fora, nas cadeiras da “ala de espera”, após tentar entrar com L. Com Ryuk ao seu lado, explicou a ele não somente a situação, desde como fora parar ali à o quanto era nojento e degradante o jeito como o trataram, como o que pensava a respeito do menor e suas evidências de que, de fato, Lawliet possuía algum tipo de transtorno.
— Isso não prova nada.
— Você está de brincadeira? – Proferiu indignado. Ele estava pisoteando em suas esperanças e especulações desde de manhã...
— Só porque os cara tavam chamando ele de retardado? Vai ver nem era nesse sentido. – Explicou gesticulando com as mãos.
— É claro que estavam! Eles zombavam da maneira estranha que ele se senta. – Como Ryuk não enxergava!? Estava tão nítido!
— E só por isso ele é retardado? Porque se senta que nem um?
— Não o chame assim. – Light entendia que ele não estava fazendo para soar ofensivo. A criação que ambos obtinham era muito diferente e Ryuk nem sempre notava o quão lesivo ele poderia ser. Todavia, sequer era pessoal, por se tratar de Lawliet. Aquele termo era incorreto e prejudicial e não deveria ser dito.
— Pensei que odiasse ele. – Bom, por esta não esperava...
— Odiar é uma palavra muito forte. – Disse rapidamente temendo que sua surpresa fosse notada, acrescentando:– E não mude de assunto.
— Ele nem parecesse autista.
— Ele não precisa se parecer com um.
— Que nem o médico... – Ele pareceu compreender seu ponto de vista, referenciando a série “The Good Doctor”. Por mais confuso e insano que Ryuk podia ser, definitivamente ele não era ignorante.
— Mais ou menos. – Concordava em partes com tal afirmação, embora ainda não estivesse certo. O personagem cujo se referia tem síndrome de Asperger, um transtorno de desenvolvimento que afeta a capacidade de se socializar e de se comunicar eficientemente e L poderia possui-lo. – Ele pode ter um estado de espectro autista.
— Que nem o cara da série! – Insistiu.
— É, Ryuk, que nem o cara da série. – Esquecera momentaneamente que, se tratando dele, era mais fácil concordar de primeira do que se estressar com suas analogias ilógicas, suposições idiotas e alternativas nada plausíveis.
— Bom, então eu vou indo. – Anunciou contente com a rendição do japonês, batendo suas mãos nos joelhos para se apoiar ao levantar, fazendo exagerada e desnecessariamente barulho ao choca-las com sua calça jeans negra. – Não vou gastar o resto do meu intervalo esperando um muleque que eu não conheço. – Disse já de pé. – Você vem?
— Eu... – Na verdade, ainda ponderava sobre o que faria. – Só quero saber se ele está bem...
— Então tá... – Não sabia exatamente sobre o que, mas aquilo lhe soara como se insinuasse algo. – Espera seu amiguinho... – Ciúmes, concluiu óbvio.
— Ryuk!? – Compreendia quando se tratava de Mikami, mas de Lawliet? Sequer o suportava, não havia qualquer motivo ou razão para que ele se chateasse com sua relação com ele.
— Tchau, Yagami! – Despediu-se grosseira e dramaticamente, muito provavelmente fingindo estar ofendido.
— Tchau, Ryuk... – Já havia desistido de entende-lo...
...
Lawliet se sentara em uma das cadeiras na “ala de espera” da secretaria com as pernas próximas ao peito as abraçando enquanto apoiava seu rosto em cima de seus joelhos. Light estava ao seu lado, a uma cadeira de distância já que não eram próximos, aguardando que seus pais viessem buscá-lo. Ele estava tão acanhado, parecendo extremamente infeliz aos seus olhos. Em certo momento, jurou vê-lo chorando em silêncio, todavia, sequer podia assim averiguar já que seus absurdamente negros fios lhe cobriam parcialmente a face. Mordeu novamente seu lábio inquieto com o silêncio acompanhado da tensão que pairava no ambiente. Talvez devesse dizer algo... Contudo, enquanto ainda ponderava sobre o que diria, muito provavelmente se ele estava bem, Lawliet se moveu calma e lentamente, o fazendo ceder por completo sua atenção. Ele levou suas mãos ao pé direito puxando seu tênis para tirá-lo, fazendo o mesmo com o esquerdo e eventualmente com suas incômodas meias cujo eram de pares diferentes, as colocando dentro do calçado antes de deixá-los no chão, voltando a sua posição inicial e remexendo seus dedos, os estralando no processo. Ele estava... Nervoso, certo? Então Light não era o único... Antes que pudesse lhe indagar o porquê tirara seus tênis, pôde ouvi-lo murmurar algo, todavia baixo demais para ser audível. — O que? – Talvez estivesse tão desesperado para acabar com aquele maldito e agoniante silêncio que começara a escutar coisas, pensou levemente preocupado com sua sanidade ao não obter resposta.
Entretanto, L voltou a repetir tão baixo que se qualquer outro som estivesse ecoando no ambiente não teria ouvido sua voz trêmula. — Obrigado... – Permaneceu encarando os próprios pés sem nunca lhe dirigir a atenção.
— Não foi nada... – Disse quase que automaticamente, não podendo conter um sorriso de satisfação. Não queria ser cruel, não era sua intenção, todavia a curva que se formava em seus lábios era tudo menos gentil.
— Você se machucou. – Proferiu agora mais calma e audivelmente, obrigando-o a se esforçar para soar mais terno e amigável. Lawliet conseguia lhe deixar culpado mesmo sem que tivesse qualquer responsabilidade sobre o ocorrido. Talvez fossem seus pensamentos a respeito de qual “retardo” ele poderia ter segundo Tad.
— Não se preocupe. – Amenizou o desdém em seu sorriso, sendo o mais delicado e cortês possível. – Amanhã, quando a adrenalina abaixar é que eu vou sentir dor de verdade. – Acrescentou sincero. Não queria deixá-lo preocupado, todavia, nem sempre acertava.
— Desculpe. – Lamentou agora ainda mais baixo, abaixando seu rosto e o cobrindo por completo com seus um tanto compridos cabelos negros.
Ao contrário do que dizia, como se seu corpo o castigasse por mentir, Light pôde sentir um aperto em seu peito enquanto lhe encarava com pesar. Porque nada estava bem, fosse para ele fosse para Lawliet. — Tudo bem.
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