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História That's Life - "Obrigada por me escolher" - História escrita por JoaninhaMalefica - Spirit Fanfics e Histórias
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História That's Life - "Obrigada por me escolher"


Escrita por: JoaninhaMalefica

Notas do Autor


O título era pra ser "A", mas o Spirit não deixou 😡😡😡

Capítulo 18 - "Obrigada por me escolher"


Fanfic / Fanfiction That's Life - "Obrigada por me escolher"

— E você, Beyond? – Indagou Watari, tentando melhorar o clima do ambiente ao mudar de assunto.

— Legal. – Respondeu simples, um tanto surpreso com a própria conclusão a respeito de tudo.

— Porque? – Fora a vez de Matt perguntar, deixando-o momentaneamente em dúvida pois, assim como ele, também estava confuso e aquilo lhe fazia pensar concernente ao conteúdo daquele pequeno guardanapo. Até então, não havia conseguido se desfazer dele...

.

Não gostava de muitas coisas. Não gostava de pessoas no geral, nem mesmo de animais, de coisas muito coloridas ou barulhentas, muito calmas e tranquilas ou agitadas e alegres. Todavia, se havia algo de que gostava, era de cozinhar. Sequer se lembrava de quando aprendera a preparar seu próprio alimento, no entanto bem sabia que já o fazia, tanto para si quanto para L, desde muito pequeno. A adversidade é a melhor escola da vida, disto tenham certeza. Atualmente, podia fazer qualquer tipo de prato fosse quente ou gelado; doce, salgado ou agridoce; tivesse a receita ou não, era perfeitamente capaz. E não era somente isto. Não se restringia apenas a realizar, a fazer; não era um homem exigente, porém relativo a gastronomia, ansiava e obrigava-se a perfeição. Não aceitava menos do que primor. A culinária para si, assim como a literatura, a arte e a pintura, não somente eram meios de expressão, era liberdade em sua forma singela e legal. Sentia-se livre com a violência, era uma maneira não saudável e igualmente efetiva que havia encontrado para extravasar a raiva. Gostava de machucar e assustar as pessoas, gostava de sangue, seu cheiro, aspecto, gosto e cor, gostava do controle e do poder que tinha ao agredir um homem (porque não se satisfazia ao violentar mulheres) e gostava dos gritos e dos olhares amedrontados a ele dedicados ao feri-los. Era excitante, de fato se sentia sexualmente incitado. Entretanto, sabia que era ruim. Aquilo fazia mal a sua alma, chateava Watari e seus irmãos. Era errado e tinha ciência disto, portanto tentava evitar ao máximo perder o controle, por mais que gostasse. Porque Beyond não enxergava a moral como era, a ética como deveria ser interpretada, Beyond as via como limitações e restrições enfadonhas, abusivas e cruéis, completamente frustrantes. E era exatamente por isto que gostava de culinária. Desde que se recordava, sempre seguira Lawliet. Abdicava de suas vontades para satisfazer as suas, abandonara seus sonhos para se certificar que os dele se consumariam. Não tinha interesses fora os de L, não tinha querer fora dos de seus irmãos e Watari, não havia nada para si depois disto. Exceto a gastronomia. Pois Lawliet não sabia e nunca aprenderia a cozinhar, bem como pintar e não se interessava por literatura. Era um espaço somente seu. Quando cozinhava podia ser quem era e aquilo não machucava ou decepcionava ninguém. Era sua liberdade legalizada, tão prazerosa quanto a putrefata e imoral. Não tinha de resolver problemas fora os seus, não tinha de cuidar de ninguém fora ele mesmo. Era o único momento em que gostava de estar só, em que gostava de si e sua companhia. Quando pintava, quando lia, quando escrevia e cozinhava, tudo se calava. Não se lembrava de sua mãe, de seu pai, podia esquecer-se de L e suas responsabilidades para com ele. Não haviam traumas ou restrições, amarras ou pesadelos. Era apenas uma calmaria, uma paz constante e aprazível.

Sua primeira aula de economia doméstica seria na sexta-feira, após as demais. Em sua turma, somente haviam mulheres de pequeno porte, todas quase que iguais. Não diferia pratricinhas e Barbies com muita exatidão. Na verdade, todas as garotas daquela escola lhe pareciam cópias de uma original, esta cujo ainda não encontrara qual. Até mesmo sua professora também se camuflava bem entre as estudantes.

A jovem e atraente mulher pôs-se a frente da sala, se apresentando e revelando seu nome que não tentara decorar e boa parte de sua vida profissional que, mesmo se fosse relevante ao momento, não se importara o suficiente para prestar atenção. Seus olhos preferiram analisar o local, as bancadas e os caros utensílios que ali estavam dispostos. No início se negara a escrever uma carta de apresentação e recusara veementemente prestar o exame admissional para ingressar naquela escola, afirmando que deveria realizar um supletivo de uma vez e começar logo a trabalhar. Não podia ser um estorvo para sempre. No entanto, não apenas sabia o quão desvalorizado seria no mercado de trabalho se assim fizesse, como fora convencido pela grade curricular de literatura, pelo enorme estúdio de artes e a gigantesca verba destinada a sala de cozinha. Ao observar a aparente qualidade dos fogões, das panelas e do frigorífico do ambiente, teve quase certeza que fizera a escolha correta. Provavelmente, pensou ao contar a quantidade de pessoas e comparando-a com o número de bancadas, trabalhariam em duplas.

Quando o maldito monólogo finalmente se findou, tivera de se apresentar a turma e ouvir doze nomes femininos e irritantes, todos familiares e genéricos, e suportar olhares surpresos e desdenhosos ao ser notado, pois nitidamente seu fenótipo destoava consideravelmente dos demais. De todo modo, não, não contabilizara equivocadamente a quantidade de mulheres que se denominaram, ao menos em voz alta. Uma das jovens, relativamente mais divergente do que as outras, nunca proferira uma palavra sequer. Seus cabelos eram escuros e um tanto longos, pele branca, não muito pálida e seu porte físico era magro; os seios não eram muito fartos, conquanto era uma garota bonita, embora o que lhe chamasse a atenção não fosse sua aparência. Ela carregava um aparelho, possivelmente um tablet, e quando sua vez de se apresentar chegara tudo o que fizera fora sorrir, não com timidez ou constrangimento, mas com confiança e gentileza, mostrando a tela do objeto. Tudo que havia nela eram simples palavras escritas a mão pela caneta apropriada que residia em sua mão. “Meu nome é Naomi”. Deslizara o dedo sobre a tela, mostrando a página branca seguinte, com letras de cor preta desenhadas. “Sou surda, então teremos de nos- Outra página. “comunicar através deste aparelho”. Seguira novamente. “Espero que não se importem...” B achou aquilo levemente ultrajante. Aquela mulher era surda, possuía uma deficiência física, porém instintivamente pensava em L que, de maneira completamente diferente, possuía um transtorno, seja lá qual fosse. Não era justo que seu irmão tivesse de se adaptar, as pessoas deveriam estar prontas para lidar com ele. O mesmo pensava a respeito de Naomi. “É um prazer conhecê-los.”

Não tinham o direito de se incomodarem.

Quando tudo aquilo acabou, tudo no que conseguira pensar era que não queria ser sua dupla. A menor parcela de seus motivos eram relacionados a seu egoísmo. Uma das razões para gostar daquela aula, como já explicitado, era que não precisava se preocupar com Lawliet. Não queria ser babá de ninguém, já possuía quatro filhos em casa que sequer tivera o prazer de fazer, não queria um quinto. Bom, talvez aquele fosse o pretexto que utilizava para se justificar a si mesmo, pois a maior parte de suas motivações eram empáticas. Mesmo que já tivesse contato com alguém com deficiência (ainda que, novamente, totalmente divergente da dela) e de certa forma fosse familiarizado com as necessidades específicas que estas pessoas podem ter (claro, baseado nas necessidades de um autista) não era uma pessoa boa. L e Naomi possuíam dificuldades discrepantes por serem indivíduos diferentes e, simultaneamente, arduidades que se assemelhavam em alguns aspectos, como por exemplo a comunicação com as demais pessoas e, restrito a este contexto, B de fato poderia ser mais qualificado para ser sua dupla. No entanto, não era gentil ou paciente. Definitivamente era a pior pessoa naquele ambiente para ser sua dupla. As vezes tinha vontade de esganar Lawliet, principalmente por sua teimosia e ego. O que faria com Naomi quando ela o desagradasse? Não seria sua dupla, pelo bem dela. Todavia, sinceramente, duvidava seriamente que alguma daquelas vadias fosse a tratar de melhor forma.

Esquecendo-se de si mesmo, observou Naomi ter a iniciativa de se aproximar primeiramente de uma garota, escrevendo rapidamente algo em sua tela antes de mostrar a ela. Do ângulo em que estava não pôde ler, porém deveria ser algo como “vamos formar uma dupla?” ou algum derivado. A menina de cabelos castanhos claros sorriu um tanto constrangida e negou com a cabeça, indicando outra garota ao seu lado, alta de cabelos mais escuros e cacheados que sorriu igualmente sem jeito, demonstrando que já eram parceiras. Naomi assentiu sem vacilar, dirigindo-se até outra garota em uma parte mais afastada da sala, rapidamente retornando ao centro quando esta - mulher pequena de cabelos castanho escuros - negara com a cabeça sem sequer ler o conteúdo de seu aparelho, permanecendo serena, provavelmente por experiência a situações como aquela. Ainda tentou duas outras vezes com uma garota que não se dignou a lhe responder e somente se afastou e outra  mais próxima de si que lhe permitiu mostrar o mesmo conteúdo que escrevera em sua tela a ela. No aparelho residia a pergunta: “Olá! Quer ser minha dupla?” com uma carinha feliz em seu canto inferior direito que acompanhava seu sempre amigável semblante, diferentemente da mulher a sua frente. Loira, branca, não muito alta, cabelos não tão compridos, magra, seios enormes e um sorriso desdenhoso. Uma vadia, pensou, mesmo que não pudesse ouvir daquela distância sabia que ela não havia correspondido a gentileza da outra. Independentemente do que dissera a Naomi, tinha ciência de que fora rude pela arrogância e descaso que seus gestos e seu rosto transmitiam e aquilo lhe impelia a pensar em L. Era assim que ele era tratado? Com escárnio e descaso!? Levantou-se com certa zanga, indignado com o fato da morena permanecer sorrindo mesmo depois de ser destratada tantas e tantas vezes, dando duros e largos passos até ambas as garotas antes que ela se buscasse por outra humilhação, por fim se colocando entre elas.

Como não sabia se comunicar em língua de sinais a morena teria de se virar para fazer leitura labial. O que podia fazer era falar calmamente e repetir frases algumas vezes se necessário, concluiu ao se dar o trabalho de proferir não muito lentamente palavras que, embora fossem de certa forma amigáveis, foram ditas de maneira excessivamente autoritária e até mesmo agressiva. Foda-se se Naomi poderia ter encontrado a amizade perfeita em meio aquelas vagabundas. Agora ela era sua. — Vamos formar uma dupla.

.

E se arrependera tão rápido quanto tomara aquela decisão...

Naquele mesmo dia, após todos estarem devidamente apresentados, Beyond escolheu uma bancada, tanto para si quanto para Naomi que aceitou sem objeções, sendo esta a mais afastada possível das sete demais que estavam espalhadas pela cozinha. Iriam realizar uma tarefa e obtinham cerca de 15 minutos para decidirem qual prato das nove opções apresentariam e para conversarem e se conhecerem com a finalidade de entender as especialidades e dificuldades de cada um e outras idiotices do gênero.

Não, não se lamentava de ter se unido a morena pela iminente dificuldade que teriam na conversão de absolutamente tudo. Naomi era muito esperta e prestativa e normalmente tomava a iniciativa. Ela o tocara no braço para chamar sua atenção, afinal aparentemente não sabia ou não queria falar com quem quer que fosse, mostrando o conteúdo que provavelmente escrevera em seu aparelho quando estava ocupado demais pensando no tamanho dos seios daquela loira. “o que gosta de cozinhar?”. Ela era proativa e muito ativa, sem jamais ser agressiva ou rude.

— Qualquer coisa salgada. – Gostava de fazer proteínas, como carne vermelha e principalmente frutos do mar, todavia não estava nem um pouco afim de estender aquela conversa mais do que o necessário. – E você? Sabe fazer o que?

Desta vez não importou-se o suficiente para proferir tais palavras com qualquer calma, se incomodando levemente com o olhar fixo alheio em seus lábios. Obviamente não haviam segundas intenções, porra ela só queria entender o que tinha dito, todavia não era como se pudesse controlar a pequena inquietação que lhe cutucava ao notar a excessiva atenção prestada em sua boca. Era estranho.

Ela assentiu muito brevemente, provavelmente somente para demonstrar que havia compreendido sua fala, voltando-se para sua tela para escrever uma resposta. Neste momento, enquanto aguardava, tomara nota de duas coisas: a primeira era que Naomi deveria ter o tamanho de Lawliet, e a segunda era que seu cabelo tinha um cheiro adocicado muito agradável.

“Biscoitos”.

— Só? – Indagou de maneira descortês e sarcástica.

Para sua surpresa, a morena meneou com a cabeça em afirmativa sem qualquer tipo de embaraço ou vergonha.

— Você escolheu cursar um componente culinário sem saber cozinhar? – Ela não podia ouvir, no entanto sua voz acabou se elevando alguns tons pela incredulidade e indignação bem como seu timbre deixara de ser somente indiferente e levemente desdenhoso para se tornar grosseiro.

Era um pouco irritante ter de espera-la escrever para ler sua réplica, embora soubesse que também não tinha direito de se aborrecer com isto. Se estivesse incomodado que aprendesse língua de sinais para se comunicar com decência com ela... “me inscrevi para aprender”.

Se ela falasse, aquilo indubitavelmente seria proferido com prepotência. Não chegava a ser rude, todavia imaginava que cada letra fora desenhada no intuito de atingir o mesmo nível com o qual estava a tratando.

Aquela fora a primeira vez que tivera de pensar no que diria em muito tempo. Sequer se lembrava do último momento em que ficara sem palavras daquela forma. Não havia outra saída a não ser mudar de assunto ou dar-se por vencido. — Vamos fazer um prato salgado, – Anunciou autoritário, certo de que não haveriam obstruções vindas por sua parte, somente naquele instante lembrando-se de falar devagar. Se bem que ela não parecia estar tendo dificuldades em acompanha-lo, de todo modo. – Não da pra servir biscoitos. – Queria provoca-la, ao menos um pouquinho, somente para ver como ela se portava zangada.

Naomi assentiu novamente sem esboçar qualquer enfado com aquilo, voltando a escrever: “que tipo de prato quer servir na apresentação?” questionou, deixando-o aborrecido com toda aquela educação e tranquilidade.

— Risotto. – Talvez algo de fácil execução fosse mais apropriado, tanto para uma iniciante como para si que teria de suportar seus erros e responder suas dúvidas, concluiu ao encarar as opções marcadas na lousa em frente a todas as bancadas. Claro que teve de repetir pois esquecera-se de que tinha de olhar para ela ao falar. – Risotto.

Mais uma vez, a menor assentiu para demonstrar entendimento, logo revelando outra pergunta: “o que é isso?”.

Entendem agora o motivo de tal arrependimento?

Naomi não sabia cozinhar absolutamente nada e, igualmente, de nada adiantavam as instruções da professora pois ela não podia ouvi-las. Beyond conhecia uma boa receita de Risotto de camarão que definitivamente ganharia se preparado com excelência, entretanto tudo se tornava complicado uma vez que sua dupla era completamente inexperiente. Ela era esperta, rápida e muito organizada, boa em manter a bancada limpa, habilidosa com as mãos e com a faca, no entanto obtinha conhecimento essencialmente zero em relação ao preparo de alimentos. Não sabia limpar camarão, temperar qualquer coisa ou fritar, refogar e cozer, conquanto a maior dificuldade, indubitavelmente, era o fato de ter de parar o que estava fazendo para explicar a ela o que fazer. Era extremamente experiente em fazer uma, duas, três coisas ao mesmo tempo, porém esta destreza se tornava inútil com Naomi uma vez que só podiam se comunicar com contato visual. Pedira a ela para cortar a cenoura e o aipo enquanto cuidava dos camarões, pensando no que fazer com ela enquanto separava as cascas e cabeças para incorporar no caldo. Sinceramente, estava sendo mais difícil do que pensara que seria.

— Naomi? – Ouviu uma voz até então desconhecida, embora um tanto familiar, estando tão concentrado que não raciocinara que deveria alerta-la que estavam a chamando ou ainda, pensado no quão estúpida a garota que a chamara era por faze-lo.

De todo modo, fora arrancado de seus devaneios por um pedaço de cenoura que caíra, ou melhor, fora jogado em sua bancada, mais especificamente próximo de Naomi, se chocando com os pequenos pedaços de cebola que eram cortados por ela e os esparramando por consequência. Ela se assustou o suficiente para errar o corte, por pouco não arrancando boa parte do dedo junto a planta.

— Ei! – Berrou, não importando-se pelo sobressalto que causara em duas outras bancadas próximas. – Que porra é essa!?

— Desculpa, – Disse a mesma loira de antes, evidentemente simulando a emoção que a palavra deveria conter. Fosse lá quem fosse, além de vadia era cínica. – eu só queria chamar a atenção dela.

Naomi se deu o trabalho de limpar suas mãos rapidamente e pegar seu aparelho para que pudesse conversar com a loira, esperando que ela dissesse o que queria de uma vez. B aproveitou-se do momento para começar a temperar os pequenos frutos do mar. Gostava de usar além do sal, limão e alho, muita pimenta, contudo deveria regular a quantidade daquela planta já que nem todos gostavam de seu uso excessivo.

— Eu só queria saber o que estão preparando. – Explicou encenando gentileza e cordialidade. Beyond não gostava de sua voz.

Da posição em que estava não podia ver e, mesmo que assim pudesse, estava ocupado demais para olhar, no entanto sua dupla provavelmente escrevera algo como “Risoto de camarão” como resposta.

No primeiro momento sequer imaginara o porquê, todavia pode ouvir a loira rir de forma desdenhosa e suspirar quase que de maneira cansada, como se fingir-se de amigável fosse demasiadamente exaustivo. — Querida, – Iniciou desta vez com muito mais desprezo do que em todas as suas outras falas. – você já não fala, melhor aprender a escrever direito. – Aquilo fora o suficiente para desconcentra-lo, fazendo-o largar os camarões para olhar aquela maldita boca carnuda e vermelha sorrir com escárnio. – “Risotto” tem dois T’s. – Explanou não mais dando-se o trabalho de ocultar seu descaso e deboche.

Estava pronto para intrometer-se naquela conversa e dizer aquela vadia que ambas as formas de se escrever aquela palavra podiam ser aceitas e, ainda que não fossem, aquilo havia sido completamente desnecessário e escroto. Infelizmente, conquanto, Naomi voltou a escrever em seu tablet e escolheu aguardar saber o que ela diria. Como estava atrás dela, não conseguia enxergar o que ela mostrava a loira, mas podia ler o que escrevia antes dela virar o aparelho. Em letras menores para que coubessem em somente uma página, estavam as palavras: “Desculpe, não entendi. Poderia repetir, por favor?”.

O ódio lhe queimava o estômago. Por que caralhos Naomi estava sendo educada com aquela vadia!? E pior, ela sequer havia entendido o que ela havia dito. Como ela fazia leitura labial, boa parte de sua compreensão vinha de sua interpretação, assim se não soubesse reconhecer o que determinado movimento significava podia supor baseado no contexto em que as demais palavras entendidas estavam, e o restante era somente a própria diferenciação dos conjuntos de letras. Provavelmente, ela não conseguira identificar o que “tes” ou “des” (pois ambos possuíam pronúncia muito semelhante) era. Não conseguia imaginar o quão angustiante e cansativo deveria ser conversar daquela forma...

Novamente a loira a menosprezou rindo, por fim voltando-se para sua própria bancada. Pode ouvir um último murmúrio antes de ela retornar a suas atividades em silêncio, este que sequer tivera a decência de proferir olhando para Naomi para que ela pudesse entender e se defender. — Espero que cozinhe melhor do que escreve...

Naomi regressou sua atenção a si com uma expressão de dúvida e um pedido mudo (literalmente) para que explicasse o que havia ocorrido. Não sabia ao certo o que dizer e por onde começar, se explicava desde a desnecessária retificação ou pulava para a derradeira provocação que ela provavelmente não pudera compreender. Optando pela primeira opção, somente para poupar tempo e saliva em outros esclarecimentos necessários em virtude de um primeiro insuficiente, iniciou, desta vez lembrando-se de não falar de forma apressada:— Ela disse que escreveu Risotto errado. – Com dois dedos puxou levemente seu aparelho de suas mãos, o inclinando para si o bastante para que a morena entendesse que queria lhe mostrar a forma correta, deixando-o de forma visível para ambos. – Tem dois T’s. – Repetiu o que a loira disse, não fazendo questão de explanar que ambas as grafias podiam ser aceitas, escrevendo a palavra em sua tela com o indicador, tendo ciência de que sua fala seria lida primeiramente. – E disse que espera que cozinhe melhor do que escreve. – Retornou o olhar para ela, acostumando-se consideravelmente com toda a atenção visual que recebia.

Naomi suspirou nitidamente cansada e um tanto aborrecida, ao menos parecia estar, tomando o aparelho de volta para si para transcrever sua resposta em grandes e raivosas letras, como se gritasse. “VAMOS GANHAR DESSA VACA”.

Beyond sorriu satisfeito, realmente realizado em poder observa-la daquela forma, finalmente livre.

Agora sim estavam se comunicando com eficiência...

— Vamos.

.

Haviam quatro opções de prato naquela competição, dois doces e dois salgados, e dentre eles haviam pouca variedade relativo a mudanças, como o Risotto, onde sua diversidade era limitada as proteínas disponíveis. Não era uma disputa muito séria ou acirrada. Na verdade, mal podia ser assim considerada. Era como um teste, como todos os outros componentes estavam fazendo, para analisar e se possível mensurar o quanto sabiam. Tanto que o “premio” se podia ser desta forma chamado, eram um conjunto de facas de qualidade mediana (ainda que fossem consideravelmente melhores do que as que tinha em casa, por exemplo). Todavia, independentemente da relevância (ou falta dela) daquela competição, Beyond iria ganhar, tinha de ganhar, e Naomi, no momento, parecia igualmente determinada. Como Lawliet, ela já deveria estar cansada de ter de provar seu valor... Ela podia não saber cozinhar, contudo era muito obediente e habilidosa. Claro que teve de fazer boa parte sozinho, entretanto acredite ou não, ela teve um desempenho relativamente significante e era muito boa no empratamento. No final, poderia dizer que ficara satisfeito, tanto com sua participação como no resultado do prato. Se perdesse (o que não iria acontecer) não ficaria (tão) aborrecido.

A jovem professora caminhara calmamente passando por cada uma das bancadas para a averiguação e degustação, onde desde o sabor à apresentação eram avaliados. Além do seu, haviam dois bolos, uma torta, a porra de um tartar desqualificado por não constar nas opções de prato predeterminados, um quiche e outro Risotto, este que por coincidência pertencia àquela vadia loira e se configurava como a única ameaça.

Enquanto aguardavam o pronunciamento do vencedor e as demais qualificações de cada dupla, Naomi conversava com a bancada ao lado, trocando experimentações. Não era como se estivesse interessado, no entanto estava levemente entediado e vez ou outra observava suas respostas serem escritas.

— Amiga, seu risotto ficou muito bom! – Disse a garota ao seu lado enquanto ainda mastigava, tampando sua boca com a mão para que ninguém visse a pasta de alimentos triturados e saliva que ali estavam. Obviamente a mulher poucos centímetros mais alta franziu o cenho em dúvida, fazendo com que ela engolisse rapidamente para acrescentar:– Desculpa, eu esqueci. – Referiu-se ao fato de ter impedido sua compreensão ao esconder seus lábios, impossibilitando a leitura labial. – Eu disse que seu risotto tá muito bom. – Repetiu agora mais lentamente.

“Muito obrigada!” transcreveu no primeiro momento, retornando a caneta no aparelho para complementar: “Mas Beyond fez quase tudo”. “Ele é um cozinheiro excelente!”

Ah... Bom, aquilo era... Aquilo era novo, por assim dizer... Quer dizer, Beyond não era exatamente elogiado o tempo todo. Na verdade, não se lembrava da última vez em que lhe disseram algo amigável ou gentil daquela forma. Não entenda errado, não era culpa das pessoas ao seu redor, não estava se vitimizando, a culpa era sua, era sempre sua. Não era bom de qualquer maneira, alguém como ele não merecia elogios ou agradecimentos, não era digno de palavras amáveis. Tinha ciência disto, tinha ciência desde que se recordava de existir, sua própria mãe lhe dissera e jamais esqueceria: “Você é um monstro, é uma criança amaldiçoada por Deus e meu castigo na terra é ser sua mãe”. Conquanto, não era como se pudesse controlar o pequeno tumulto em suas estranhas, a quase imperceptível inquietação e dessossego em seu âmago que tivera ao ler tais palavras. Sentia-se envergonhado, constrangido, arrependido como quando fazia algo que enfurecia sua mãe ou entristecia L, sentia-se confuso porque, ao menos desta vez, sabia não ter feito algo errado e, simultaneamente, sentia-se feliz. Felicidade esta que, como de costume, fora demasiadamente breve e momentânea. Tão rapidamente quanto tudo aquilo veio, se esvaiu, deixando nada além de dor. Acabara de perceber, Naomi era parecida com ela...

— Nossa! Que diferente! Não é muito comum um garoto bom de cozinha... Que legal... Boa sorte pra vocês!

Desta vez não fez questão de ler sua resposta. De repente, se viu em uma apatia tão espessa e profunda, em uma tristeza tão intensa que sequer se situara no ambiente. Por um momento esquecera-se de onde estava, quem eram as mulheres a sua volta e o que fazia lá. Os cantos de sua visão travada em qualquer ponto aleatório começaram a escurecer, as vozes se tornaram cada vez mais distantes, fora tudo tão rápido que não notara, mas estava em meio a outro surto. Não podia ser considerado habitual e, igualmente, não era algo incomum. As vezes aquele tipo de coisa acontecia. Tudo ficava escuro, quase como se ficasse inconsciente, todavia estava acordado e acabava fazendo coisas das quais não parecia ter controle. Em alguns momentos era como um filme, como se saísse de seu corpo e pudesse assistir o que fazia pela visão de um telespectador, da mesma forma que, em outras ocasiões, sequer era capaz de se lembrar de suas ações. De todo modo, possuía gatilhos muito explícitos e aquele instante não se configurava como um deles. Quando surtava, tornava-se ainda mais violento, porém encarava aquilo como uma resposta de seu subconsciente. Saía de si quando estava ameaçado, incitado ou furioso, não melancólico.

Mãos gentis tocaram-lhe o braço, assustando-o levemente, ainda que não o suficiente para faze-lo sobressaltar. Suas orbes carmim agora tão atipicamente tristes e apáticas se dirigiram até a garota ao lado, observando seu semblante nitidamente preocupado e nervoso. Naomi segurava seu braço com a mão direita enquanto a esquerda tocara-lhe o pulso, obrigando-o a encaminhar parte de sua atenção à ele, somente assim notando que esmagava metade de uma cebola com os dedos. Bom, ao menos isto permanecera o mesmo, seus impulsos ainda eram violentos... Quase que de forma receosa, soltara a planta já deformada, também percebendo o quão alterada estava sua respiração, por fim dizendo tudo aquilo que fora capaz no momento em questão:— Vou lavar a mão. – Suas pernas moveram-se automaticamente ao conjunto de pias que se organizavam-se uma ao lado da outra nos fundos da cozinha, bem como suas mãos que ligaram a torneira com sensor de movimento ao se colocarem embaixo desta, esfregando-se conforme a água recaía sobre elas. Depois de ensaboa-las e retira-las debaixo da corrente constante de água, pôs-se a pensar novamente. Aquele cheiro era como o tão familiar e indesejado sentimento que até então fingira não existir, independentemente do quanto tentasse, estava impregnado em sua pele e não conseguia se livrar dele...

Não sabia quanto tempo havia perdido encarando seus dedos, no entanto impelira-se a parar e voltar a sua bancada quando a vontade e ao mesmo tempo necessidade de chorar emergira em seu peito. Quando chegara, Naomi estava lá, sorrindo e conversando com aquela loira enquanto o conjunto de facas estava disposto em cima de seu balcão. No aparelho que mostrava a garota, estavam as palavras: “gostou do nosso risoTo, Katherine?” desta forma, em cor preta e letras minúsculas com somente o “T” maiúsculo e em vermelho.

— É fácil ganhar por pena, querida. – Respondeu, brincando com uma colher de silicone ao gesticular.

Quase sorriu com o semblante raivoso e ainda elegante que Naomi estampava em seu rosto, bufando de maneira quase adorável ao voltar a escrever com mais força do que o necessário para tal. “Ganhamos porque nosso prato foi o melhor”.

— Querida, nós duas fizemos Risotto. O que é mais provável? – Questionou de forma retórica, rodopiando o talher no ar. Sua fala era desdenhosa e cruel, bem como o torcer de seus lábios ao proferir aquelas palavras. – Que justo eu, a vencedora de todos os três concursos de culinária que houveram na escola perder em uma competiçãozinha como essa, ou a surdinha ganhar por pena?

Seu pé direito deu um passo para frente, pronto para acabar com aquilo ali, todavia seu cérebro parecia se negar a se intrometer. Naomi se voltou novamente para seu tablet, transcrevendo nele tão rapidamente que chegava a ser surpreendente. Ela não irava-se como ele, era calma até mesmo com raiva, tão elegante e cortês e ao mesmo tempo tão confiante e gentil. Era bonito vê-la discutindo. “Porquê não aceita a derrota e cala a boca antes que a surdinha enfie essa colher no seu cú?”

Porra, estava apaixonado.

— Você não tem coragem!

“quer valer?”

Porra, porra, porra.

Katherine bufou colérica e derrotada, talvez um pouco intimidada com a ameaça, pousando a colher em sua bancada e voltando-se para sua dupla que, como ele, assistia a discussão em silêncio. Assim como ela, achou melhor retornar ao seu lugar, por fim colocando-se ao lado de Naomi atrás de seu balcão. Iria ignorar aquela confusão na esperança de que ela desconsiderasse o recente momento com a cebola. Não era como se pudesse explicar o que havia acontecido e, mesmo se assim conseguisse, não gostaria de faze-lo. Felizmente, ela não lhe questionou sobre isso, escrevendo em seu aparelho: “Pode levar as facas”. E em seguida acrescentou: “nós dois sabemos que você fez praticamente tudo sozinho”.

B preferiu assentir com um simples menear de cabeça, observando Naomi começar a juntar seus pertences para ir, afinal aquela era a última aula do dia. Fazendo o mesmo, agarrou a pequena maleta contendo três facas médias, guardando-a em sua surrada e não muito asseada mochila, podendo ver de relance a garota depositar algo em sua parte da bancada ao colocar a bolsa no ombro. Quando virou-se para ver, Naomi se despedia brevemente da mulher com quem conversara enquanto aguardavam o resultado da competição com um simples acenar, logo saindo por vez do ambiente ao cruzar o aro da porta. Preferiu observa-la caminhar calmamente pelo corredor até que sua visão já não fosse mais capaz de distingui-la entre todos os estudantes que também percorriam aquele espaço eufóricos para regressar para suas respectivas casas. Somente voltara a si quando o último sinal finalmente ecoara por toda a escola, alertando sobre o término daquele componente. Ajeitando sua mochila, dirigiu seus olhos, agora um tanto mais vividos do que outrora, para o mármore do balcão a sua frente, notando o pequeno guardanapo perfeitamente dobrado que ali residia. Em letras bonitas e redondas estavam as quatro palavras dispostas no centro, bem ao meio, com um rostinho sorridente desenhado ao seu final.

 

 

“Obrigada por me escolher”

 

:)

.

.

.

— Achei o meu A.


Notas Finais


Sinto muito pra quem shippava o Beyond e o Ryuk ou achava que o Ryuk era o A KKKKKKKKKKKKKKKKKKK 😬


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