Camila’s POV
Se eu me arrependi de algumas coisas que tinha dito para Lauren? Com certeza.
Eu ainda achava que uma viagem para Nashville não iria resolver os nossos problemas. Pelo contrário. Assistir Lauren trabalhar não iria melhorar em nada o meu humor com a minha esposa. E me irritava que ela tivesse, em algum momento, pensado que isso era uma boa solução para a distância que crescia entre nós.
Mas eu admito que passei dos limites ao falar do trabalho dela. Justo eu que reclamava tanto do modo como ela tratava o meu próprio trabalho. Eu não fazia ideia de que o novo projeto no qual ela estava trabalhando tão intensamente era uma filial em Londres.
Desde que a Luxury começou a se expandir pelos Estados Unidos, meu avô e o avô de Lauren sonhavam em construir um hotel em outro país e até mesmo levá-lo para a Europa. Meu pai e tio Mike deram um passo enorme para que isso acontecesse quando abriram o hotel em Ottawa, já perto da aposentadoria dos dois. E agora, com apenas dois anos no comando da empresa, Lauren estava conseguindo realizar o sonho da nossa família.
Isso só provava o quanto ela era competente e dedicada ao seu trabalho. Isso não era novidade para mim, mas eu sabia o quanto ela era cobrada por um monte de homens babacas que acreditavam que apenas por ser mulher ela era menos competente do que eles.
Dentro de mim o meu coração apertou ao perceber que eu não havia estado lá para apoiá-la quando ela fez o anuncio. Que eu nem sabia sobre o que se tratava o jantar. Como mulher dela, Lauren deveria ter se sentido confiante para me contar sobre esse projeto muito antes. E tenho certeza que se estivéssemos em um momento melhor ela teria me contado. Mas não era o que acontecia. Ela já não me contava as coisas. E eu também já não me importava em compartilhar detalhes do meu dia com ela. Essa era a verdade.
Eu saí do banheiro com a intenção de me desculpar com ela pelo que havia dito, mas quando entrei no quarto ela já estava dormindo então apenas apaguei a luz e me deitei ao lado dela. Eu queria abraçá-la, mas não sabia se ela acordaria ou se rejeitaria o meu toque, então eu apenas me virei para o lado oposto e dormi.
No domingo nós todos nos reunimos para almoçar na casa de Ally. Seria a nossa última oportunidade de nos reunir antes dos meninos voltarem para casa, no fim da tarde. Will e Mani eram os únicos que não estavam presentes, já que haviam viajado ontem para um compromisso de trabalho.
Após o almoço eu e Dinah nos voluntariamos para lavar a louça. O resto do pessoal saiu para o jardim para conversar e aparentemente haviam arranjado algum jogo de tabuleiro para jogar. Lauren estava afastada deles, brincando com Samuel e Harriet. Eu a admirava através da janela da cozinha, e foi impossível não sorrir ao vê-la gargalhar de algo que os pequenos haviam feito.
- Você e a Lauren ainda não se acertaram? – Dinah perguntou enquanto lavava a louça. Eu desviei o meu olhar da janela para olhá-la. – Vocês mal se falaram hoje.
- Ela me convidou para viajar. – Eu contei.
- Chan, isso é ótimo. – Dinah falou. – Passar um tempo fora pode ajudar vocês a se reconectarem.
Eu ri de forma sarcástica.
- Ela me convidou para viajar com ela, com a Ally e com a Keana. Elas vão para Nashville essa semana, vistoriar o terreno para a construção do hotel e sei lá mais o que. Basicamente ela me chamou para uma viagem de trabalho.
- Pelo menos ela te convidou para ir, não é? Significa que ela realmente quer que você vá. Se ela achasse que não teria tempo para você, ou que você só iria atrapalhar indo junto ela não teria convidado. Foi o jeito que ela encontrou de passar mais tempo com você.
- Você está dizendo que concorda com ela? – Perguntei, indignada. Como Dinah poderia achar que aquela é uma boa ideia. – Dinah, eu basicamente vou lá para ver ela trabalhar.
- Sim, eu concordo com a Lauren. – Minha amiga respondeu. – Eu já estive onde vocês estão, Mila. Lembra? Antes da Harriet nascer, quando a Mani começou a viajar demais e nós duas vivíamos brigando porque não tínhamos mais tempo uma para a outra? Era mais ou menos a mesma situação que você e a Lauren estão vivendo agora. Eu só queria passar um tempo com a minha mulher, não importava se era aqui ou onde ela precisava estar trabalhando. Então eu acho sim que você deveria ir nessa viagem com a Lauren. Respirar um ar diferente. Mesmo que ela tenha mil problemas para resolver no trabalho. Pelo menos vocês vão estar juntas.
Eu parei um pouco para pensar pelo ponto de vista da Dinah e percebi que ela tinha razão. Lauren não teria me convidado se não quisesse que eu fosse. E, mesmo que ela estivesse trabalhando, nós estaríamos juntas. Algo que não acontecia com muita frequência ultimamente.
- Eu tenho três ensaios para fazer essa semana. – Eu comentei.
- Eu e a Lucy nos ajeitamos. – Dinah sentenciou. – Pense no seu casamento agora.
- Obrigada, Dinah.
- Sem essa. Eu me importo com você e com a Lauren e sei que vocês duas estão sofrendo com essa situação, mas são cabeças-duras demais para admitir. – Dinah falou. – E seca essa louça de uma vez que ela não vai secar sozinha e nem entrar magicamente nos armários da Ally.
- Cavala. – Eu reclamei, mas nós duas acabamos rindo.
Depois que terminamos de arrumar as coisas nós saímos para o jardim junto com os nossos amigos. Dinah sentou ao lado de Lucy e começou a ajudar ela no jogo, o que rendeu reclamações dos demais. Eu, por outro lado, segui para onde Lauren brincava com as crianças.
- Tia Mila, voxê vai binca com a gente? – Sam perguntou animado.
- Claro que vou, meu amorzinho. – Eu falei.
- Vamo binca de esconde-esconde. – Harriet falou.
- Claro, princesa. – Lauren disse. – Porque nós não brincamos em equipes? Você e o Sam se escondem e eu e a tia Mila procuramos vocês.
- Tá bom. – Harriet concordou. – Vamos Sam, vamos esconder lá dento.
Ela saiu, puxando o primo, e correndo o mais rápido que suas perninhas conseguiam. Eu e Lauren nos olhamos.
- Quando vocês viajam? – Eu perguntei meio sem jeito, baixando a cabeça e arrumando uma mecha do meu cabelo atrás da olheira.
- Na quarta de manhã. – Ela respondeu. – Nós voltamos no sábado.
- Eu vou com vocês. – Eu falei e olhei para minha esposa, que parecia surpresa, o que me deixou nervosa. – Se... se o convite ainda estiver de pé... é claro.
- É claro que está. – Ela respondeu, sorrindo de lado. – Eu vou pedir para a Mary comprar a sua passagem. Não vai ter problemas no seu trabalho?
Quem via de fora podia pensar que ela estava apenas jogando na cara o que eu havia dito na noite anterior, mas eu sabia pelo seu tom de voz que ela estava mesmo preocupada.
- As meninas conseguem se ajeitar. E eu vou conversar com os clientes amanhã.
- Ótimo. – Ela falou. – Acho melhor nós irmos procurar os pequenos. – Enquanto caminhávamos para dentro da casa Lauren disse: - Camila! Eu estou feliz que você tenha decidido ir.
Na quarta-feira eu e Lauren acordamos cedo. Nosso voo para Nashville duraria duas horas e meia e nós chegaríamos no hotel quase na hora do almoço.
Liz passou o café da manhã inteiro dando recomendações e pedindo para que nós não deixássemos de comer “comida saudável” e só nos enchêssemos de porcaria. Eu falo que para ela nós ainda somos adolescentes que não sabem se cuidar. Mas eu confesso que adoro o carinho que ela tem com a gente. Eu e Lauren não sabemos o que fazer quando ela se aposentar, apesar de sabermos que esse momento está perto de acontecer.
Nós optamos por ir de táxi para o aeroporto e encontramos com Ally e Keana no local.
- Eu espero que a Dinah dê conta das crianças sozinha. – Ally falou quando nós nos sentamos no avião. – A Mani só volta sexta e o Will vai emendar a semana na estrada.
- Ela dá conta sim, baixinha. – Eu avisei. – E caso ela se apure o Sam e a Harriet tem mais um monte de tios, tias e avós que podem cuidar deles. Você não precisa se preocupar com isso.
O voo foi tranquilo e, como esperado, era quase hora do almoço quando nós chegamos no Luxury Nashville.
O efeito Lauren dentro de um Luxury era percebido imediatamente. Quando nós botamos os pés no hall de entrada do hotel os funcionários pareceram prender a respiração e tomar cuidado com cada gesto. Afinal, não era sempre que a presidente da rede aparecia em pessoa. Acho que eles viam Lauren como uma criatura distante e inalcançável, sentada em um escritório enorme e ditando regras através de um telefone. Quase como se existisse apenas no imaginário dos funcionários. Vê-la de perto devia causar essa sensação de: “Ela é mesmo real” em cada um ali. Eu sentia esse mesmo olhar para o meu pai quando ele e tio Mike estavam no comando da empresa.
Uma mulher alta e elegante se aproximou de nós. Seus cabelos pretos presos em um coque apertado lhe davam um ar sério, porém ela não aparentava ser muito mais velha do que eu, Lauren e Ally.
- Senhora Jauregui, é um prazer recebê-la no Luxury Nashville. – Ela cumprimentou Lauren com um aperto de mão. – Espero que a viagem tenha sido tranquila.
- Obrigada, Senhorita Morelli. A viagem não poderia ter sido feita em melhores condições. – Ela então se virou. – Você já deve conhecer a Senhora Issartel. – Keana se aproximou e também apertou a mão da mulher. Obviamente elas se conheciam já que a mulher aparentemente era a gerente do hotel e, sendo assim, Keana era sua chefe, ocupando o cargo imediatamente superior ao dela. – Allyson Brooke, presidente da Brooke’s Architecture. – Ally também apertou a mão da mulher. – E minha esposa, Camila Cabello-Jauregui. – Foi a minha vez de apertar a mão da mulher. – Esta é Serena Morelli, gerente do Luxury Nashville.
Isso provava que eu estava certa quanto eu seu cargo.
- Sejam bem-vindas. – A mulher manteve o tom formal ao falar. – Eu quero que saibam que eu estou a inteira disposição de vocês enquanto estiverem hospedadas aqui. Ficarei feliz em ajudá-las em qualquer eventual necessidade que se apresente.
Eu sorri para a mulher, me perguntando se ela oferecia isso a todos os hóspedes ou era uma exclusividade nossa. Eu sabia, é claro, que todos que se hospedavam em um Luxury tinham certo poder aquisitivo. Porém eu também sabia que alguns são mais ricos e influentes do que outros. E eu me perguntei se havia essa diferença de tratamento, apesar da política do hotel prever que todos deveriam ser tratados de igual maneira e de acordo com o que o padrão Luxury recomendava.
- Nós vamos subir para os nossos quartos e descansar um pouco antes do almoço. – Lauren falou. – Você reservou os quartos como eu pedi?
- Claro, claro. – A mulher respondeu. – No entanto, Senhora Jauregui, se a senhora não se importar, eu gostaria de conversar com a senhora antes. Nada grave, obviamente, mas aproveitando o fato de recebermos sua visita...
Eu não disse? Era Lauren pisar em um Luxury que tiravam problemas até do buraco do ouvido para ela resolver.
- Claro. – Minha esposa respondeu. – Vamos resolver tudo isso agora, porque depois eu estarei ocupada. – Ela se virou para nós. – Vocês podem subir. Eu encontro com vocês no restaurante em meia hora para podermos almoçar.
- Eu vou pedir que um funcionário às acompanhe. Suas bagagens já foram levadas para os respectivos quartos. – A tal Serena sentenciou e nós seguimos para o elevador, acompanhadas por um rapaz bem jovem, que parecia estar tremendo.
Sempre que nos hospedávamos em um Luxury nós ocupávamos, se possível, a cobertura do hotel, que sempre consistia em um apartamento com três ou quatro quartos e nossos convidados ficavam conosco. Dessa vez, porém, eu me surpreendi quando o elevador parou um andar antes da cobertura. Quando eu estava saindo do elevador, entendendo que a cobertura já estava ocupada por outros hospedes, Ally me parou:
- Eu e a Keana ficamos aqui. Você sobe.
- Porque vocês não vão subir também? – Perguntei.
- Nós vamos ficar em quartos aqui em baixo dessa vez. – Ela sussurrou para que o rapaz não ouvisse. – Foi a Lauren quem pediu. Acredito que para vocês duas ficarem mais à vontade. – Ela se afastou e sorriu para mim, completando em voz alta: - Se precisar estamos logo aqui em baixo.
Elas saíram do elevador e o rapaz perguntou:
- Podemos subir?
- Podemos sim. – Eu respondi.
Eu tive tempo apenas de tomar um banho relaxante na cobertura e já era hora de descer para o almoço. Encontrei Keana e Ally no hall do hotel e nós três seguimos juntas para o restaurante. Lauren ainda não tinha dado sinal de vida.
Nós nos sentamos em uma mesa mais afastada do ponto movimentado do salão. Percebi vários funcionários se entreolharem para decidir quem iria atender a nossa mesa, até que um homem mais velho tomou a frente e veio até nós nos entregando o cardápio.
Quando terminamos de escolher os nossos pratos ele se aproximou:
- O que as senhoras gostariam de pedir?
Nós fizemos os nossos pedidos e antes que o homem deixasse nossa mesa o gerente do restaurante se aproximou:
- As senhoras estão satisfeitas com o atendimento? Precisam de mais alguma coisa? Mais algum acompanhamento?
Eu reuni todas as minhas forças para não revirar os olhos para o homem e respondi com toda a educação que eu tinha:
- Não obrigada, nós estamos satisfeitas com os nossos pedidos.
- Nem mesmo uma garrafa de vinho? – O homem insistiu.
- Não, senhor. Nós temos uma reunião de trabalho logo após o almoço. Seria bom se não ingeríssemos nada alcoólico. – Ally respondeu.
Os dois homens se afastaram e eu falei:
- Eu odeio isso. Por que as pessoas não podem nos tratar como hóspedes normais?
- Porque você é a primeira-dama. – Keana, que estava sentada à minha frente, respondeu simplesmente. – Eles sempre vão querer te agradar para deixar a chefe feliz.
Ainda era estranho para mim quando as pessoas me lembravam que eu agora era a esposa da presidente da empresa. Acho que eu nunca me acostumaria com isso.
- Não é verdade. – Eu disse. – Desde pequena me tratam como se eu fosse de porcelana dentro de um Luxury.
- Porque queriam deixar o tio Ale feliz. – Dessa vez foi Ally, acomodada ao lado de Keana, quem respondeu. – E também porque não querem ser demitidos por justa causa se a filha do chefe, ou no caso agora a esposa da chefe, não sair daqui satisfeita.
- Quem vê pensa que eu sou mimada assim. Eu já fui um dia. Agora não sou mais. – Eu devolvi. – E mesmo quando adolescente sempre achei essa atenção excessiva desnecessária.
Nesse momento Lauren entrou no salão e, novamente, os funcionários pareciam prender a respiração. Ela se sentou ao meu lado e depois de fazer o seu pedido para o mesmo garçom que havia nos atendido, perguntou:
- Por que raios quando eu apareço em um hotel problemas dois quais eu nunca ouvi falar são tirados da cartola?
A pergunta foi retórica, claro, mas Keana respondeu:
- Porque todo mundo tem medo de passar por cima de você ao resolver alguma coisa com você tão perto para descobrir. E também porque eles querem ter alguma coisa para contar sobre você no jantar anual de gerentes.
Até nossos pedidos chegarem a conversa se dispersou. Quando Keana e Ally engataram uma conversa sobre terrenos e lugares estratégicos para construções, Lauren se aproximou de mim e sussurrou:
- Logo após o almoço nós vamos ver o terreno, junto com o engenheiro responsável pela obra que a Ally mandou para cá na semana passada. Depois disso eu estou livre pelo resto do dia. Nós podemos sair para conhecer a cidade, ou, pelo menos, alguns lugares próximos daqui.
- Eu fiz algumas pesquisas durante os últimos dias. – Eu fiz a minha parte e também demonstrei interesse pela nossa viagem. Afinal, esse exercício de reaproximação deveria ser feito por nós duas. – Eu sei que country não é o bem a sua praia, mas existem vários espaços musicais por aqui, museus e galerias. E alguns parques se você preferir andar ao ar livre.
- Nós podemos conhecer alguns dos lugares que você pesquisou. Tem um parque muito bonito que não fica muito longe daqui. Nós podemos voltar caminhando e passar por lá no final do passeio. O que você acha?
- Seria perfeito. – Eu respondi.
- Hey, casal. – Keana chamou nossa atenção. – O almoço chegou.
De fato, o garçom havia retornado com os nossos pedidos e esperava para colocar os pratos à nossa frente, o que ele não tinha conseguido fazer porque Lauren estava inclinada para conversar comigo sem que as meninas escutassem.
- Desculpa. – Lauren pediu para o homem e se afastou de mim, deixando que o homem fizesse seu trabalho.
- N... não precisa se desculpar. – O homem disse um tanto desajeitadamente. – Tenham um bom almoço.
- Um dia eu quero me hospedar num Luxury sem você e sem o meu pai. – Falei para Lauren, mas dessa vez em voz alta, para que as meninas também participassem da conversa. – Deve ser legal se hospedar aqui sem ninguém babando ovo o tempo todo.
- Esquece, Camilinha, todos os funcionários da rede já te conhecem. Mesmo que você não conheça todo mundo. – Keana falou. – E como a Ally disse com grande sabedoria, ninguém vai te tratar nada menos do que com excelência. Ninguém quer ser demitido.
- A Lauren não demitiria alguém apenas por não fazer as minhas vontades. – Eu afirmei.
- Demitiria sim. – Minha esposa respondeu com tranquilidade, enquanto cortava a carne do seu prato. Eu olhei feio para ela que, quando percebeu o olhar se justificou: - Eu estou brincando, Camila. Eu não faria uma coisa dessas. Você me conhece. Eu só demitiria alguém pessoalmente se visse essa pessoa destratando alguém, seja você ou qualquer pessoa. Sabe que não tolero esse tipo de coisa. E, além do mais, ninguém é louco de te destratar. Você precisa começar a aceitar melhor o fato de ser uma Cabello-Jauregui. As pessoas dentro de um Luxury vão te mimar.
- Puxar o saco, você quis dizer. – Eu devolvi.
- Também. Mas com o tempo você aprende a diferenciar quem faz isso por inocência, na ânsia de agradar, e quem quer apenas levar vantagem. – Lauren disse.
Nós almoçamos de forma tranquila e as meninas, depois de uma passada rápida nos quartos, saíram para a tal vistoria de terreno. Lauren prometeu que estaria de volta antes das três da tarde e que me avisaria para que eu a encontrasse no hall de entrada do salão.
Enquanto esperava eu fiquei na cobertura, trabalhando em algumas fotos. Se Lauren estava trabalhando eu podia trabalhar também, não é? Aproveitei também para ligar para Dinah e avisar que estava tudo bem. Não importa quantos anos eu tivesse, e nem o fato de, teoricamente, eu ser mais velha do que ela, minha amiga sempre seria superprotetora.
- Olha só, alguém resolveu dar sinal de vida. – Ela disse irônica quando me atendeu.
- Quem vê pensa que eu sumi durante dias. – Eu revirei os olhos.
- Como foi a viagem? – A loira perguntou.
- Tranquila. Não tivemos nenhum problema. E aí no estúdio, como estão as coisas?
- Tudo inteiro. – Dinah riu. – Camila, você não precisa se preocupar com o estúdio. Eu já falei isso para você. A prioridade é o seu casamento. Como você e a filhote de Drácula estão?
- Tudo parece estar normal. – Eu respondi. – Nashville não tem uma atmosfera mágica que concerta casamentos em apenas duas horas, Che. Infelizmente. Mas nós vamos sair quando ela voltar da tal vistoria de terreno. Acho que é a primeira vez em alguns meses que nós duas saímos sozinhas. Deve ser algum tipo de avanço.
- E é. Acredite em mim. –Minha amiga concordou. – Mila, eu vou ter que desligar. Tenho uma sessão de fotos daqui a meia hora. Preciso ajeitar o estúdio.
- Ok. – Eu devolvi. – Eu vou te enviar por e-mail as fotos do casamento dos Turner. Depois você dá uma checada.
- Tudo bem. – Dinah respondeu. – E Camila...
- O quê?
- Pare de trabalhar. Aproveite suas curtas férias ao lado da sua esposa.
- Eu não posso prometer nada. – Fui sincera. – Enquanto ela estiver trabalhando eu também vou estar.
Mesmo sem ver Dinah eu sabia que ela estava revirando os olhos, mas nada do que ela me dissesse poderia me convencer que eu não deveria trabalhar enquanto Lauren fazia o mesmo.
Nós desligamos o telefone e eu fui me arrumar para o passeio da tarde. Optei por uma calça jeans clara e uma camisa de botões branca um pouco mais folgada e não tão executiva. Pequei também uma jaqueta preta para levar, já que estávamos em pleno outono e, como não tínhamos horário para voltar, poderíamos passar um pouco de frio à noite.
Pouco antes das três da tarde meu celular avisou a chegada de uma mensagem de Lauren:
Já estou aqui em baixo. Te espero no hall de entrada.
Eu terminei de finalizar a minha maquiagem e saí do apartamento. Chegando ao hall de entrada, percebi Lauren parada no balcão de informações conversando com a Senhorita Morelli. Quando viu que eu me aproximava ela disse:
- Nós podemos resolver isso amanhã, Serena. Eu tenho um compromisso importante agora. – Ela me olhou e depois se voltou para a mulher. – Eu vou estar ocupada pelo resto do dia. Se precisar de alguma coisa a Senhora Issartel pode resolver.
A mulher acenou afirmativamente e Lauren venho ao meu encontro. Ela ainda usava roupas de trabalho, mas essas eram um pouco mais informais do que as que ela estava acostumada a usar no escritório. Calça social branca e camisa de botões azul clara, com um corte um pouco mais formal do que a que eu usava.
Quando ela se aproximou, sussurrou no meu ouvido:
- Você está linda.
Eu quase caí para trás. Se fazia meses que eu e Lauren não saíamos sozinhas, fazia ainda mais tempo que eu não ouvia um elogio assim vindo dela. Ela pareceu perceber a minha surpresa, porque logo emendou:
- Eu sei que eu não falo muito isso. Mas você é linda, Camila. Não importa se você está vestida para uma festa de gala, ou se está no seu estúdio de moletom e calça de pijama. Eu sempre te acho linda.
Eu estava sem palavras com isso. Com certeza havia sido pega de surpresa com essa declaração.
- O... obrigada, Lauren.
Ela sorriu para mim e juntou nossas mãos, nos guiando para fora do hotel. Ela seguiu até um carro do hotel que estava parado próximo a entrada e um motorista abriu a porta para que nós entrássemos. Quando estávamos acomodadas no banco de trás do carro e enquanto o homem dava a volta para assumir a direção, eu perguntei:
- Motorista?
- Eu sei que você não gosta dessas coisas. – Lauren respondeu. – Mas eu pensei pelo lado prático. Se depois nós quisermos voltar andando alguém vai ter que trazer o carro de volta para o hotel, não vai?
- Faz sentido. – Eu admiti, apesar de não me sentir tão confortável com a presença de outra pessoa junto com a gente.
- Para onde? – O homem perguntou quando entrou no carro. Ele olhava para Lauren, mas ela respondeu:
- Hoje quem faz o roteiro é a minha esposa.
O homem de traços asiáticos olhou para mim e eu me manifestei:
- Historic RCA Studio B.
- Espera esse aí é o estúdio... – Lauren começou.
- Onde o Elvis gravava. – Eu completei. Lauren sorriu e eu disse: - Eu sabia que você iria gostar.
O motorista então seguiu para o local indicado enquanto eu e Lauren conversávamos.
- Você trouxe mesmo uma jaqueta preta? – Lauren perguntou, olhando para a peça de roupa no meu colo.
- Aham. – Eu respondi.
- Acho que todos esses anos de convivência te deixaram muito parecida comigo. – Ela disse e nós duas rimos.
- Eu não tenho dúvidas. – Eu respondi. – Você é que não muito com uma dessas ultimamente.
- Acho que eu abandonei as jaquetas pelos terninhos. De forma definitiva.
- Você podia tentar ir trabalhar de jaqueta uma vez. – Eu disse de forma divertida. – Eu pago para ver a cara dos acionistas se isso acontecer.
- Eles ligam para o meu pai na hora dizendo que eu endoidei de vez e que querem outra pessoa na presidência no mesmo dia. – Lauren falou.
- Eles não teriam essa coragem. – Eu afirmei.
- Nunca subestime homens machistas que precisam aceitar ordens de uma mulher.
- Babacas. – Eu sussurrei. O que fez Lauren rir novamente.
Nosso passeio seguiu de forma tranquila, com algumas conversas tímidas surgindo entre nós. Porém era notável que nós duas nos esforçávamos para não deixar o silêncio se prolongar.
Nós visitamos o antigo estúdio de gravação de Elvis, que deixou Lauren muito animada e, confesso, a mim também. Conhecemos também a calçada da fama da música country, o museu Johnny Cash, a réplica do Pantenon grego e, vendo que a noite já tinha caído na cidade, jantamos no Hard Rock Cafe.
Na volta para o hotel, Lauren pediu que o motorista nos deixasse caminhar um pouco e que voltasse para o hotel com as compras que nós havíamos feito. Nós não estávamos tão longe assim do hotel e a noite estava agradável para caminhar.
No caminho nós paramos no parque que Lauren havia falado e sentamos para conversar em um banco do local.
- Eu gostei de hoje. – Lauren comentou.
- Eu também gostei. – Admiti.
- Camila, eu sei que as coisas não têm sido fáceis. Que nosso casamento está passando por uma turbulência que nós nunca enfrentamos antes. Mas... eu quero que você saiba que eu estou disposta a concertar as coisas. Eu não quero perder você.
- Eu também não quero te perder. – Afirmei, pegando na mão dela. – Você não está tentando sozinha, Lauren. Por mais que às vezes pareça que eu estou distante e que eu não ligo, eu me importo sim. E se eu me distancio é para evitar brigas maiores.
- Eu sei. – Ela disse. – Eu acabo fazendo a mesma coisa.
- Vamos prometer uma coisa, ok? – Eu tomei a iniciativa. – A partir de agora nós vamos conversar. Nós precisamos conversar, Lauren. Sobre tudo. Sobre a gente, sobre o nosso casamento, sobre o porquê de nós estarmos brigando, sobre os nossos trabalhos, sobre as coisas da casa, sobre a nossa família, sobre o casamento das nossas irmãs, sobre os nossos sobrinhos, sobre a senhorinha que vende flores na esquina do estúdio, sobre o tempo. Sobre o que você quiser me contar. Eu não quero que aconteça como no jantar, Lauren. Eu não quero não saber quais são os seus planos. Você promete?
- Prometo. – Ela disse. – Nós vamos conversar. Esse é o primeiro passo para concertar as coisas. Nós precisamos estar na mesma página.
- E falar a mesma língua. – Eu completei.
Eu acordei na quinta-feira sentindo o espaço vazio ao meu lado. Será possível que a Lauren nunca está na cama? Mas pelo menos dessa vez ela se deu ao trabalho de me deixar um bilhete, que eu encontrei na escrivaninha do quarto.
Tive que sair cedo para uma reunião e não quis te acordar.
Nos vemos no almoço.
Tenha uma boa manhã.
Lauren
OBS: A Ally não vai participar dessa reunião, se você quiser alguma companhia.
Ela estava mesmo levando a sério esse lance da comunicação. Foi inevitável sorrir com isso.
Olhei a hora e vendo que não estava tão cedo assim liguei para a Ally.
- Bom dia, Mila. – Ela atendeu. Pelo menos ela não estava dormindo.
- Bom dia, baixinha. Já tomou café da manhã? – Perguntei.
- Ainda não. Iria pedir agora. Estava no telefone com o Will.
O casamento desses dois é tão fofo. Mesmo que eles não possam passar tanto tempo juntos fisicamente eles estavam sempre em contato um com o outro. Eram o nosso exemplo de casal e nós vivíamos falando isso para eles.
- Ótimo. Eu também vou pedir agora. Você pode subir aqui e nós tomamos café juntas.
- Combinado. Em 10 minutos eu estou aí. – Ela respondeu e desligou.
Pedi um café da manhã para nós duas e terminei de me trocar.
Ally e o café chegaram quase ao mesmo tempo e nós duas nos sentamos na mesa que havia ali para comer.
- E aí, como foi ontem com a Lauren? – Ela perguntou, enquanto colocava café na sua xícara.
- Foi bom. – Eu disse. – Nós conversamos, sobre coisas sérias e coisas nem tão sérias assim. Conhecemos alguns lugares, ela quase quis comprar uma loja inteira de artigos de decoração musicais e eu tive que impedir, apenas o normal da Lauren. – Eu e Ally rimos. – Mas no final o saldo foi positivo. Nós conseguimos ficar na presença uma da outra por mais de quatro horas e não brigar nenhuma vez. Nós discutimos por causa de um boneco em tamanho real do Elvis, mas nada perto das brigas que nós costumamos ter. E, afinal, o que nós iríamos fazer com um boneco gigante do Elvis? Eu estava completamente certa em fazer a Lauren desistir de comprar aquilo.
- Você tem razão. – Ally concordou comigo. E também, seria impossível alguém não concordar. – Mas eu fico feliz que vocês tenham conseguido conversar. É um primeiro passo para resolver a situação de vocês.
Eu e Ally passamos o resto da manhã conversando até que ela se despediu, dizendo que precisava se arrumar para uma reunião que teriam logo depois do almoço. Assim, eu desci sozinha para o restaurante, onde deveria encontrar com as meninas.
Contudo encontrei com Lauren já no hall de entrada do hotel. Ela conversava com um rapaz alto e loiro, que tinha cara de poucos amigos. Quando me viu ela pediu que eu me aproximasse.
- Camila, deixe eu te apresentar, Alexander Gilbert, gerente da Nashville Touring And Recreation. – Eu apertei a mão do rapaz. – Alex, essa é minha esposa, Camila.
- A famosa Camila Cabello-Jauregui. – Ele disse. – É um prazer finalmente conhecê-la.
- O prazer é meu. – Eu respondi, mas, confusa, olhei dele para Lauren. – Famosa?
- A Lauren me falou muito sobre você. Eu fiquei supercurioso para te conhecer.
A Lauren falando muito sobre mim? Essa me pegou de surpresa. O que ela poderia ter dito sobre mim.
- Você andou falando sobre mim? – Perguntei para ela.
- É claro que sim. Eu sempre falo sobre você, Camila. – Ela respondeu.
- E apenas coisas boas, posso assegurar. – O rapaz falou. – É verdade que você tem o melhor gaydar de Miami?
Eu ri para ele. Então era isso que ela andava falando de mim. Só podia ser.
- É melhor do que o dela, com certeza. Mas não o melhor de Miami... eu acho. – Eu entrei na brincadeira, porque, afinal, o rapaz não tinha culpa dos meus problemas conjugais.
- Então qual o seu veredito sobre mim? – Ele perguntou.
Eu o analisei por alguns instantes apenas para fazer suspense.
- Gay, com certeza. – Ele me olhou espantado e Lauren riu. – Ninguém hétero introduz o tema gaydar na conversa sem mais nem menos. Nem sei se héteros conhecem esse termo, na real.
- Droga. Eu me entreguei. – Ele disse, rindo.
- Agora que eu ganhei a aposta – Lauren falou – vamos almoçar?
Nós seguimos para o restaurante e enquanto Lauren atualizava Ally, que nos encontrou no caminho, sobre a reunião da manhã, eu conversava com Alexander e, apesar da pose séria o rapaz se mostrou extremamente agradável.
- A Lauren me falou sobre os estúdios. – Ele disse. – É bom conhecer alguém no ramo, para fotografar os eventos da empresa. Ela disse que você e suas sócias são do mais alto nível profissional e que os estúdios estão crescendo. – Eu me surpreendi com o que ele disse. Não imaginava que Lauren poderia falar algo assim, não do meu trabalho. – Foi por isso que você não foi no jantar, não é, um compromisso de trabalho.
- Exato. Era um compromisso importante. Eu não pude desmarcar.
Nós encontramos Keana no restaurante e almoçamos tranquilamente. Enquanto comíamos Alexander perguntou:
- Vocês têm compromisso para hoje à noite?
- Não. – Lauren respondeu. – Ainda não temos nada planejado.
- Ótimo. Nós podemos jantar juntos, que tal? – Alexander sugeriu. – Meu noivo está curioso para conhecer vocês.
- Por mim está combinado. – Keana falou.
- Por mim também. – Ally concordou e logo eu e Lauren fizemos o mesmo.
- Tem um restaurante maravilhoso não muito longe daqui. Não é exatamente o restaurante que meu pai aconselharia para levar alguém com quem queremos fechar negócio, mas é um lugar mais descontraído e nós podemos nos divertir como gente jovem. Acreditem as pessoas ou não, nós ainda somos jovens, apesar de presos em roupas sociais e reuniões intermináveis. – O rapaz disse. – Eu passo o endereço para a Lauren por mensagem e vocês nos encontram lá.
- Fechado. – Eu concluí a conversa.
O restante da tarde passou rápido da mesma forma. Enquanto as meninas estavam em mais uma reunião eu saí pela cidade, conhecendo mais alguns lugares e fazendo o que sabemos fazer quando viajamos: compras.
Eu estava em uma loja de roupas quando uma peça em um manequim me chamou atenção: uma jaqueta de couro preta. Exatamente o estilo que Lauren costumava usar quando nos casamos. Eu não pensei duas vezes antes de levá-la. Junto com outra coisa que eu sabia que ela gostava de usar antes de ser obrigada a usar salto todos os dias.
Eu voltei para o hotel no início da noite, a tempo de tomar um banho e me arrumar para o jantar e encontrei Lauren saindo do chuveiro, ainda enrolada na toalha. Perdi um tempo admirando o corpo dela, mas logo deixei as sacolas com compras na cadeira que tinha ali e falei:
- Cheguei bem em tempo. Você já escolheu sua roupa para o jantar?
- Ainda não. Eu estava indo fazer isso.
- Ótimo. Eu trouxe um presente para você. Para você usar hoje à noite. Está na sacola preta. Eu espero que você goste.
Lauren se aproximou da cadeira, pegou a sacola que eu havia indicado e tirou a jaqueta de dentro dela. Ela sorriu automaticamente.
- É linda. E a minha cara. – Ela disse.
- Eu pensei nisso assim que vi. – Eu devolvi. – Pensei que seria bom para você ter algo mais... descontraído... para vestir no jantar. Eu sei que a maioria das roupas que trouxe são de trabalho. Tem mais uma coisa na caixa.
Ela tirou a caixa de dentro da sacola e a abriu. Seus olhos praticamente brilharam ao ver o coturno preto.
- Obrigada, Camz. Eu adorei.
Meu coração errou uma batida. Fazia tempo que ela não me chamava assim.
- Eu fico feliz em saber. – Eu respondi. – Eu vou tomar um banho agora, senão vamos nos atrasar para o jantar.
- Tudo bem. – Ela respondeu.
Meu banho não foi tão longo, já que tínhamos horário para sair e, quando voltei para o quarto Lauren já estava vestida. E eu praticamente tive um dejà vu naquele instante. Ela parecia a Lauren de 24 anos novamente. A Lauren com quem eu havia me casado. A Lauren pela qual eu havia me apaixonado.
Quando me viu ela deu uma volta no lugar para que eu pudesse analisar o visual.
- Como estou? – Ela perguntou.
- Linda. – Eu respondi. Ela usava uma calça jeans escura e uma camiseta cinza estampada com a imagem de uma mulher segurando uma rosa. Por cima na camiseta estava a jaqueta nova e nos pés o coturno preto. Eu me aproximei dela: - Eu gostei. Você deveria usar mais roupas assim, já que você gosta.
Ela se olhou no espelho.
- Eu passo a maior parte do tempo trabalhando então não resta muito tempo para me vestir como eu gosto e, quando nós saímos com o pessoal, parece mais simples só vestir uma versão menos formal das roupas que eu uso no dia-a-dia. – Ela admitiu. – Mas eu vou procurar seguir o seu conselho.
Quando nós encontramos com as meninas no elevador elas obviamente perceberam a mudança nas roupas de Lauren.
- Hey, chefe, resolveu relembrar os velhos tempos? – Keana provocou.
- Eu gostei, Laur. – Ally apontou. – Sei que você não se sente confortável nas roupas de trabalho.
- Obrigada, baixinha. – Lauren devolveu e virou para Keana. – Eu me vestia muito melhor antes, você não acha?
Todas nós rimos.
- Melhor eu não sei Lauren, mas é ótimo te ver sem usar nada que grite: “Escritório”. Ultimamente até quando te vejo aos finais de semana eu lembro de trabalho.
- Obrigada pela sinceridade, Grilo Falante. Sabe que essa é uma das qualidades que mais aprecio em você.
Nós quatro deixamos o hotel e Lauren entregou para o motorista o endereço que Alexander havia passado para ela e nós seguimos para o local. Era realmente um lugar mais descontraído do que aqueles que nós costumávamos frequentar ultimamente. O local era todo projetado em madeira e podíamos ver uma escada que parecia levar para uma pista de boliche no subsolo.
Não demoramos para identificar o loiro sentado em uma mesa mais afastada, ao lado de um rapaz moreno, de barba cheia e olhos escuros. Ele sorria abertamente e parecia ser o completo oposto de Alexander.
- Boa noite. – Nós os cumprimentamos quando nos aproximamos.
- Boa noite, meninas. – O loiro respondeu. – Esse é meu noivo Calvin Donnelly. – Ele apresentou. – Essas são as meninas de quem eu te falei. – Allyson Brooke, Keana Issartel, Lauren e Camila Cabello-Jauregui.
O rapaz nos cumprimentou de forma simpática e logo nós já estávamos conversando como se nos conhecêssemos a anos. O jantar foi superanimado e logo depois nós emendamos algumas partidas no boliche.
Enquanto esperávamos Lauren e Alex se enfrentarem em uma partida, Calvin se aproximou de mim.
- Aqueles dois ali vão ficar competindo por horas. Já deu para ver que nenhum dos dois aceita perder. – Ele comentou.
- A Lauren não aceita mesmo. – Eu refleti. – Palavra de quem competiu com ela a vida inteira.
- Vocês duas são casadas a muito tempo? – O rapaz questionou.
- Sete anos. – Eu respondi. – Mas nos conhecemos desde que nascemos. Nossos pais são melhores amigos além de sócios, então... fomos criadas juntas. Ou quase isso.
- Como assim? – Calvin perguntou, curioso.
- Quando éramos crianças nós nos odiávamos. – Eu contei e o rapaz me olhou espantado. – Não é força de expressão, não. Nós realmente nos odiávamos. Éramos o completo oposto uma da outra. Não podiam nos deixar na mesma sala por mais de quinze minutos para que nós começássemos a brigar. E a medida que crescíamos as coisas apenas pioravam. A Lauren não perdia a chance de transformar a minha vida num inferno. E eu fazia exatamente a mesma coisa. Está aqui a Ally que não me deixa mentir.
- É verdade. – A baixinha, que estava perto de nós, concordou. – Conviver com essas duas juntas na adolescência era um pesadelo. Eu sofri as consequências de muitas pegadinhas da Lauren. E também ajudei a Mila em muitas das coisas que ela aprontava para se vingar. Ou para iniciar a confusão mesmo, já que essa daqui não era nenhuma santa.
- E como vocês acabaram casadas?
Eu acabei contando, com a ajuda de Ally, a história de como havia me casado com a pessoa que mais odiava no mundo e como Lauren foi me conquistando aos poucos.
- Vocês são a prova viva de que amor e ódio, caminham lado a lado. – O moreno disse quando terminou de ouvir a história. – Vocês têm uma história muito bonita. E improvável. – Nós três rimos. – E formam um casal muito bonito também.
Eu olhei para Lauren, que agora ouvia as instruções de Keana sobre como derrotar Alex de uma vez por todas. Acreditem, eles ainda estavam competindo.
- Você acha? – Eu perguntei, sem tirar os olhos da minha esposa.
- Claro que acho. Só um doido não vê uma coisa dessas. Vocês foram feitas uma para a outra.
- Obrigada. – Eu olhei para o rapaz. – É bom saber que alguém acredita nisso.
Eu acordei tarde na sexta-feira. Havíamos chegado no hotel de madrugada, depois de praticamente arrastarmos Lauren e Alex do boliche. Eles ainda insistiam que precisavam saber quem era o melhor, mas, por fim, acho que cada um saiu de lá achando que tinha ganho do outro. Até eles haviam perdido a conta do placar.
Novamente Lauren não estava na cama, mas eu já esperava que isso aconteceria. Elas teriam a última reunião hoje, já que amanhã cedo nós voltaríamos para Miami.
Eu aproveitei o restinho da manhã para falar com Dinah, que estava em casa hoje, já que o estúdio estaria fechado pois as meninas iriam fotografar um casamento à tarde; e com os meus pequenos, de quem eu já estava morrendo de saudade. Eu prometi para eles que havia comprado um montão de presentes, o que nem era mentira, visto que eu e Lauren adorávamos mimar os pequenos. Mas me fez levar um baita sermão de Normani sobre como eu e Lauren não ajudávamos a dar limites para aquelas crianças que já viviam rodeadas de brinquedos. Obviamente eu não liguei.
- Normani – eu disse para a morena. – A filha é sua. Quem deve dar limites é você. Eu sou madrinha. Fui feita para mimar mesmo, e é isso que continuarei fazendo.
Depois disso eu desliguei, porque acho que se olhar matasse, eu já estaria dura no chão com o olhar fulminante que ela me lançou.
Depois Dinah me mandou uma mensagem:
Não apareça na minha casa pelos próximos dez anos. Minha mulher quer te matar. E ela nem se importou que as crianças estavam perto para te xingar. Isso prova que ela está mesmo brava.
Eu gargalhei alto. Minha relação com Mani era assim mesmo. Nós duas adorávamos nos provocar, mas no fim não vivíamos uma sem a outra. Quem nos via no começo, principalmente depois que a minha traição foi descoberta, não imaginaria que nos tornaríamos tão amigas e nem que ela em pessoa me convidaria para ser madrinha da Harriet.
Eu sabia que no começo ela apenas me tolerava por causa de Lauren e Dinah, e nós nunca fomos tão próximas. Depois que meu caso com Austin foi descoberto ela queria me matar e, mesmo depois de ter me perdoado nossa relação era um pouco distante. Nossa amizade foi sendo construída aos poucos, quando a morena começou a ter certeza que eu não machucaria Lauren novamente. Até hoje continuamos brigando por tudo, mas é apenas o nosso jeito de demonstrar o amor que sentimos uma pela outra.
Eu encontrei com as meninas apenas na hora do almoço, e logo elas voltaram para mais uma reunião interminável. No horário do almoço, porém, Lauren me avisou:
- Eu fiz reserva num restaurante para nós duas. Hoje somos apenas nós no jantar.
- O que eu devo vestir? – Se tratando de Lauren eu devia sempre perguntar isso. Ela podia tirar da cartola o restaurante mais caro da cidade ou um lugar mais simples e descontraído.
- Não é um lugar chique, mas é especial. – Ela respondeu misteriosa.
Eu passei a tarde toda no apartamento, arrumando a minha mala e a de Lauren, deixando apenas as roupas que eu usaria hoje à noite e amanhã para voltar para casa e algumas opções de roupas para ela usar nas duas ocasiões. Nós já nos conhecíamos o suficiente para saber o que a outra gostava de vestir em cada ocasião.
Aproveitei também para dar uma geral no apartamento, antes que o serviço de quarto aparecesse e pensasse que um furacão havia passado por ali. E realmente havia: o furacão Camila, como Lauren e Dinah costumavam me chamar. Havia sido bom que Lauren tivesse pedido para as meninas não ficarem ali. Nos raros momentos em que Lauren ficou no quarto, pelo menos, nós pudemos aproveitar com mais liberdade, mesmo que nossa reaproximação ainda caminhasse a passos lentos. Como eu disse para Dinah, Nashville não era mágica, e nós ainda tínhamos um longo caminho para percorrer até tirarmos o nosso casamento daquela crise.
Eu e Lauren saímos do hotel às seis e meia da noite, já que ela disse que nossa reserva estava marcada para as sete horas. Novamente um motorista nos levou até o local. Eu fiquei espantada ao ver que Lauren havia me levado para o General Jackson, um restaurante famoso em Nashville por ser instalado em um barco a vapor que percorria o rio Cumberland durante o período da refeição.
- Gostou? – Lauren perguntou antes de descermos do carro.
- Eu adorei. – Respondi.
Nós embarcamos no barco e fomos guiados até o último dos três andares que ele possuía, onde estava reservada a nossa mesa. O jantar só começaria a ser servido quando o barco zarpasse, por isso eu e Lauren esperamos enquanto conversávamos sobre o casamento das nossas irmãs, que já estava se aproximando.
- A Tay está me deixando louca com o lance do vestido. – Lauren comentou. Ela, tal como eu, seria madrinha, mas de Taylor e não de Sofia.
- Você já foi ver o vestido, não foi? – Eu perguntei. Sabia como Lauren era enrolada para essas coisas. Quando nos casamos eu tinha que lembrar a ela toda semana que ela precisava tirar um tempo para escolher o vestido. Ela dizia que não tinha paciência para ficar trocando várias vezes de roupa.
- Eu vou ver na semana que vem. Prometo. – Ela disse.
- Lauren, você nem precisa experimentar vários dessa vez. A Tay já escolheu o modelo. Você só precisa tirar as medidas.
- Eu sei. E vou fazer isso essa semana. Promessa de escoteira.
- Você nunca foi escoteira. – Eu alertei.
- Ninguém precisa saber disso. – Ela sorriu de lado, o que me fez rir. Era bom saber que Lauren ainda guardava esse lado meio bobo que ela só demonstrava para as pessoas mais próximas dela.
Quando o barco zarpou nós escolhemos o nosso jantar e esperamos ali para que ele chegasse. Ficava a cargo dos clientes saber se esperariam para fazer os pedidos e aproveitariam o passeio primeiro, ou se jantariam e só depois se dedicariam a admirar a paisagem. Eu e Lauren nos decidimos pela segunda opção.
Enquanto jantávamos e aproveitávamos a música ao vivo que era ofertada no navio a noite caía ao nosso redor, e nós podíamos ver as luzes de Nashville se acendendo. Era um lindo espetáculo de se ver.
- As senhoras desejam a sobremesa? – O garçom perguntou, quando viu que havíamos finalizado o prato principal.
- Sim. – Eu disse. – Torta de chocolate, por favor.
Percebi que Lauren fez uma careta. Como é possível alguém não gostar de chocolate?
- Torta de morango para mim, por favor. – O homem se afastou e ela me provocou. – Você nunca desiste do chocolate, não é?
- Você nunca admite que não gostar de chocolate é estranho, não é? – Eu devolvi a provocação.
- Eu tenho um paladar muito apurado para que as pessoas compreendam. – Ela respondeu, rindo.
- Seu paladar é estranho, Lauren. Admite. – Eu provoquei.
- Não é não. – Ela ainda tentou se defender. – Devem existir mais pessoas por aí que não gostam de chocolate.
- Alguns poucos doidos como você. – Eu falei.
O garçom interrompeu nossa discussão trazendo nossos pedaços de torta.
Eu dei uma garfada na torta e mastiguei lentamente.
- Deliciosa. – Eu disse. Percebi que Lauren me encarava. – Quer um pedaço?
- Parece mesmo deliciosa. – Ela respondeu. – Mas eu vou declinar ao convite.
- Acho que você tem medo de admitir que é melhor do que a de morango. – Eu provoquei.
- Não tenho não. Eu tenho certeza que a de morango é melhor. – Ela disse, divertida.
- Eu te desafio a provar a torta de chocolate e dizer que é ruim. – Eu falei.
- Eu te desafio a provar a torta de morango e dizer que a de chocolate é melhor. – Ela devolveu o desafio.
- Ótimo. – Eu disse. – Você primeiro.
Peguei uma garfada da minha torta e levantei para colocar na boca dela. Ela experimentou e eu percebi que apesar da careta ela gostou. O gosto do chocolate estava misturado com o de outros ingredientes, como avelã.
- Você me enganou. Tem outras coisas aqui dentro. Isso não é justo. – Ela reclamou.
- Então você admite que gostou? – Perguntei.
Ela revirou os olhos.
- Não é tão ruim. Dá para comer, mas não em exagero, porque aí o chocolate vai começar a aparecer mais. – Ela admitiu. – Sua vez.
Ela repetiu o meu movimento. Deu uma garfada na sua torta e trouxe até a minha boca. A torta era maravilhosa, mas não tão boa quanto a de chocolate. Eu havia ganhado.
- A de chocolate é melhor. – Eu disse quando terminei de mastigar.
- Ahh, qual é, Camila? A de morango é melhor. – Ela tentou me convencer. – Tem os pedacinhos do morango. Você sentiu?
- Senti, Lauren. E mesmo assim a torta de chocolate é melhor. – Eu afirmei. – Acho que eu ganhei essa aposta. Posso escolher meu prêmio?
- O que você quer? – Ela perguntou.
- Você jantar em casa por uma semana.
Eu não queria fazer da nossa reconciliação um jogo. Mas foi a chance que eu encontrei de falar para Lauren que eu queria ela mais tempo em casa.
- Mas e se acontecer...
- Se acontecer um imprevisto outras pessoas podem resolver. – Eu falei. – Uma semana, Lauren. Eu estou te pedindo só uma semana. Por uma semana as pessoas podem se virar um pouquinho sem você. Eu só estou pedindo que você, por uma semana, saia do escritório às cinco e meia da tarde, vá para casa e jante comigo. Eu sei que você pode fazer isso.
Lauren suspirou.
- Eu vou fazer. – Ela disse, por fim. – Você tem razão. Não é complicado. Eu deveria fazer isso todo dia, afinal.
Eu sorri por ela admitir isso. Nós estávamos avançando afinal. A paços lentos, mas estávamos avançando.
Depois que terminamos de comer nós resolvemos passear pelo convés do barco e admirar um pouco a paisagem.
Nós caminhamos até uma das barras de proteção do navio e ficamos dali observando a cidade. Em algum ponto eu consegui enxergar o ponto dourado que era o L da Luxury no horizonte. Mas eu não falei nada para Lauren, nós não precisávamos colocar trabalho na conversa. Não agora.
Nós fomos apontando alguns lugares que havíamos conhecido e que podiam ser vistos dali. Eu senti Lauren me abraçando por trás e encostei minha cabeça no peito dela.
- Eu estou tão feliz que você tenha decidido vir comigo. – Ela falou.
- Eu também estou feliz por ter vindo. – Eu admiti.
Nós ficamos ali por um tempo, naquele abraço, observando a paisagem, até que Lauren quebrou o silêncio:
- Camila, eu posso te beijar?
Eu fui pega de surpresa pela pergunta, afinal, Lauren e eu havíamos nos acostumado a ter pouco contato com a outra, o que incluía beijos e, logicamente, sexo. Por isso eu me surpreendi pelo pedido tão evidente para uma forma de contato que nós não procurávamos mais com tanta frequência, vindo da minha esposa.
Eu saí do abraço de Lauren e me virei para olhá-la.
- Você não deveria precisar pedir, não é?
Lauren pareceu um pouco sem jeito, mas me pegou pela cintura e aproximou nossas bocas. O simples encostar dos lábios logo se tornou um beijo mais intenso e rápido quando ela invadiu minha boca com a sua língua.
Como eu senti falta desse maldito beijo. Da forma possessiva como ela tomava minha boca e como seus braços seguravam minha cintura. Eu a abracei pelo pescoço a trazendo para mais perto de mim, tanto quanto me era permitido.
Cedo demais nós precisamos respirar e fomos encerrando o beijo com selinhos suaves. Quando nossos lábios se separaram, nós colamos nossas testas.
- Eu senti saudades. – Foi o que eu consegui dizer depois que consegui recuperar o fôlego.
- Do que? – Lauren perguntou.
- De você. – Eu respondi, colocando minha cabeça no pescoço dela e inalando seu perfume.
Eu já havia ganhado o meu prêmio naquela noite.
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