Existem esses momentos que temos em nossas vidas, você de repente está passando por um momento terrível, algo surreal e do nada acorda em sua cama. O coração acelerado, respiração irregular e uma sensação incrivelmente chata de um pós-pesadelo. Mas existem esses outros que são exatamente iguais o descritos acima, coma pequena diferença de que: você não acorda.
Você fecha os olhos e respira fundo e quando os abre, ainda está lá. E não existe alternativa a não ser enfrentar a situação, ou fugir dela. O que é bom quando está na realidade, porque se você corre... Você corre. Mas quando está sonhando, você flutua de uma forma nada legal como se tivesse toneladas em cima de você. Pelo menos nisso, a realidade era bem melhor.
Não que Soo Yun estivesse pensando em toneladas ou corridas encarando o espelho, mas sair correndo dali era a única opção da sua lista. Nunca fora covarde e se orgulhava disso, então não teria problema em ser uma vez ou outra. Certo?
- Errado! – Nari entrou parecendo ler seus pensamentos.
- O quê?
- Está encarando o espelho e pensando em sair da boate correndo. E está achando que essa é a melhor opção. Mas não é!
- Não é Nari? Não é? O que quer que eu faça? Vá até o meio da pista de dança onde provavelmente ele está agarrado com uma qualquer e o faça ir para casa comigo?
- E não é isso o que você quer?
- É claro que é isso o que quero, mas as coisas não são tão simples assim. Minha vida não é uma novela Nari e minha paciência tampouco. O ser humano cultiva ódio e direciona-o para alguma direção. Sou a direção do Jin.
- Mas foi sempre assim, se gosta dele não seja covarde, tente mais uma vez. Explique mais uma vez, fale mais uma vez.
- Não Nari, nosso relacionamento se tornou toxico para os dois. Não tenho que fazer mais nada, tentei explicar e ele tinha a opção de me ouvir ou não. Ele fez a escolha dele. Não estou sendo covarde, só gosto demais dele para continuar aqui.
- Isso está errado Soo, não é certo.
- Não é, mas eu vou fazer o que? Ninguém morre de amor, vou passar por isso.
Nari apenas encarava a amiga. Sabia que ela não queria dizer exatamente aquilo, como também sabia que seria apenas isso. Soo Yun crescera dessa forma, tentava e dava o seu melhor em tudo, se as coisas dessem certo, muito bem. Se não dessem, pra quê perder tempo?
Obvio que a jovem tenente não concordava. Era maluca e inconsequente, mas também entendia que as pessoas eram diferentes uma das outras e ela não poderia enfiar sua forma de pensar goela abaixo em Soo Yun. Isso era ser amiga: alertar, incentivar e desistir junto. Abraçar, amparar e deixar que a pessoa tome suas próprias decisões.
- Vai. – Nari disse a contragosto. – Te dou cobertura.
Soo Yun a encarou por um momento, respirou fundo, a vontade de chorar aumentava gradativamente. Saiu sem nada dizer. Passou pela porta num vulto invisível e cruzou a multidão como se fosse um campo minado. Não olhou para lado nenhum, tampouco para frente. Encarou os pés até conseguir alcançar a saída – mal posicionada – pensou por um momento.
Uma temporada de chuva tinha estacionado em Seul e não parecia ir embora tão cedo. Não que Soo Yun estivesse reclamando, amava a chuva. Amava tudo o que se relacionava a chuva. Adorava o clima úmido, adorava ver as gotas escorrendo pelas vidraças. Encantava-se com o simples vapor saindo de uma xícara de café quente.
Soo Yun parou diante do semáforo e esperou até que ele se fechasse para os carros. Tirou o salto e com um em cada uma das mãos colocou-se a correr. Respirava calmamente e controlava seu ritmo. Quando se viu distante o suficiente da boate, deixou que as lágrimas se misturassem com a chuva que caía. Soo Yun estava tão desesperada que sabia que aquilo não terminaria bem. Sabia onde ia parar, sabia o que ia fazer com os minutos de impulsividade que surgiam vez ou outra.
Não entendia como Nari conseguia lidar com a própria personalidade, visto que eram raros os momentos em que não era impulsiva. Quase sorriu da amiga, mas não deu tempo. Logo avistou o portão baixo. Ganhou velocidade, bateu a mão em cima do pequeno muro e saltou para o lado de dentro da casa.
Tocou a campainha antiga e esperou.
- O que faz aqui? – O homem perguntou sonolento.
- Coronel... – Soo Yun respirou fundo. – Pai, por favor... Eu estou te implorando, não leve adiante essa história de casamento.
- Eu tenho um documento assinado por você Lee Soo Yun, está fraquejando como sempre fez? – Disse baixo e Soo Yun suspeitou que ele não quisesse chamar a atenção da mãe de Taehyung.
- Pai tudo o que eu fiz a minha vida toda, foi para te agradar! Eu assinei esse documento quando era uma adolescente. Não pode me fazer pagar por isso!
- Querida. – Soo Yun deu um passo para trás como se tivesse tomado um soco no estômago. – Você ama esse rapaz, não ama?
A garota ficou perdida entre um transe e outro. Já não entendia o que estava acontecendo. Querida? Querida? Amar Jin? Como ele sabia?
- Sim. – Respondeu firme. – E é por isso que não posso casar com ele. Sei que isso é muito importante pra você, mas eu juro compensar. Juro, pai, eu juro que faço o que você quiser pelo resto da minha vida. Mas não me obrigue a fazer isso, por favor.
O homem riu debochado.
- Você quase me convenceu Lee Soo Yun, se eu estivesse bêbado talvez caísse nessa sua conversinha. Mas como estou plenamente sóbrio minha resposta é não. Você vai se casar com SeokJin querendo ou não. Não me interessa se você o ama ou o odeia, se bem que acho que ele te odeia. – Gargalhou. – Mas tudo bem, tudo bem. Não vou estragar minhas relações de negócio por sua causa garota. Agora saia daqui, não acredito que me fez acordar para ouvir essa sua ladainha. E mais, não acredito que realmente achou que haveria uma chance de eu mudar de ideia.
Soo Yun sentiu as pernas bambearem, queria cair de joelhos, mas seria muita humilhação diante do tirano do pai. Quer dizer, mais humilhação do que já estava passando. Onde estava com a cabeça? Por que chegou a conclusão de que haveria uma possibilidade de que o homem cedesse.
Assustou-se com a porta batendo e o único som que ouvia, era o das gotas batendo no chão. Virou-se lentamente com os olhos pregados nos pés e quando encarou o muro deu de cara com Taehyung parado encarando-a inexpressivo. Sentiu o rosto ferver de vergonha.
Continuou caminhando e ao ver o portão trancado pulou o muro sem dificuldade. Soo Yun sabia que Taehyung estava com o olhar cravado nela. E no momento não tinha disposição para discutir ou tentar se explicar para ele. Queria apenas ir para casa, da onde sequer queria ter saído e dormir.
- Você gosta de sofrer não é? Gosta de ser humilhada, não é? – O irmão falou de repente.
Soo Yun apenas o ignorou e continuou andando. Logo sentiu o aperto firme em seu braço e foi virada contra sua vontade até encará-lo.
- Agora não Taehyung.
- Agora sim Lee Soo Yun, agora sim. Eu sou mais velho que você então você me deve respeito, não faça essa cara para mim. Não sou seu pai e não sou o Jin, aja com maturidade e encare os seus problemas de frente.
- Acha que não estou agindo com maturidade? Acha mesmo? – Falou trincando os dentes. Ele estava certo.
- Eu acho sim. Está agindo feito uma garota mimada, coisa que você não é! Seu pai a trata como lixo desde que era criança, e eu sempre fiquei do seu lado. Eu tento te proteger e te dar o apoio que você precisa, mas no primeiro problema você decide se trancar numa bolha? Você deveria confiar em mim e falar comigo, mas ao invés disso decide correr na chuva até a casa dele e implorar para que ele a ajude? Isso é baixo demais Soo Yun.
-Tae, para com isso. – Soo Yun ouviu a voz de Hoseok.
Desde quando ele estava ali?
- Não Hoseok, ela tem que ouvir. – Voltou a encará-la. – Se precisa de ajuda, peça ajuda. Mas peça para as pessoas certas. Não fique agindo feito uma garota adolescente apaixonada, trancada em casa, depressiva e colocando-se em situações como essa!
Taehyung estava irritado, ela sabia.
- Não se preocupe comigo Taehyung, sou adulta o suficiente para tomar minhas próprias decisões.
- Ótimo! Faça isso então, mas não conte mais comigo. – Deu as costas à irmã. – Vê se a princesa ali deixa você levá-la pra casa. E se ela disser não, deixe que vá a pé. Não perca seu tempo Hobie. – Disse a Hoseok antes de sair caminhando para uma direção qualquer.
Soo Yun ficou encarando o irmão sair rapidamente. Os passos largos mostravam que ele não estava dando tempo para arrependimentos. Logo sumiu de sua visão. Soo Yun viu Nari tentar segui-lo e Namjoon a segurou.
Desde quando estavam ali?
- Não vou te deixar ir a pé. – Hoseok disse calmo. – E se não se importa, estou congelando.
A garota respirou fundo e o seguiu. Não queria ser a garota ‘mimada’ que Taehyung insinuou. Nunca fora e na verdade o irmão nunca tinha falado com ela daquela maneira. Sempre fora doce e gentil, normalmente era animado e brincalhão, mas Soo Yun sentia que ele estava diferente. E suspeitava o motivo.
- Tudo bem Hobie, me desculpe por isso.
- Não precisa se desculpar você deve ter seus motivos. – Encarou Nari e Namjoon. – Vou levá-la, falo com vocês depois.
- Vamos atrás do Taehyung. – Namjoon falou pela primeira vez.
- Acho melhor não. – Hoseok concluiu. – Deixem – no sozinho um pouco. Ele precisa pensar e espairecer. Amanhã falamos com ele.
Vendo que ninguém discordava, Hoseok puxou Soo Yun pela mão até seu carro e seguiu pela avenida encharcada.
...
Taehyung caminhava com facilidade, a chuva tinha encharcado a areia e a deixava firme. Ao contrario disso, era assustador encarar o mar. Naquela madrugada fria as ondas iam e vinham raivosas e cinzentas. Mesmo com o tom negro do horizonte, Taehyung conseguia seguir o trajeto com os olhos perfeitamente. Estava com frio, mas seu sangue fervia.
Queria muito entender Soo Yun, queria muito entender tudo o que estava acontecendo. Não só com ela, mas também com ele. A raiva de alguma coisa crescia e era alimentada como se fosse um pequeno monstro de criação. Talvez um demônio interno em busca de liberdade.
Encarou o rochedo e viu nele uma frase gravada em cinza metálico: O amor é o estado no qual os homens têm mais probabilidades de ver as coisas tal como elas não são. – Nietzsche.
Aproximou-se um pouco mais e encostou-se em uma das pedras maiores. Iria dar um tempo ali e voltar para casa. Encarou o mar uma vez mais e viu um ponto colorido flutuando. Levantou rapidamente e olhou com mais atenção, ouviu os gritos e sem pensar em nada, correu.
Mergulhou contra as ondas raivosas e nadou freneticamente até chegar no ponto rosa, enroscou a mão no corpo que já perdia as forças e nadou de volta a praia. Era uma garota, estava pálida feito papel. Usava um vestido rosa que estava amontoado, junto com o cabelo embaraçado.
Taehyung fez respiração boca-a-boca seguido de uma leve massagem cardíaca. Segundos depois a garota disparou a tossir toda água que tinha engolido. Taehyung ajoelhou ofegante e passou a mão pelo cabelo. O que era aquilo? Suicídio?
- Você está bem? – Perguntou preocupado ajudando a garota sentar.
- E-estou. Obrigada.
- Você é maluca garota? O que estava fazendo, tentando se matar?
- Não, claro que não! – Tentou arrumar o cabelo sem sucesso. – Andei sem rumo e acabei aqui. Quis molhar os pés.
- Molhar os pés? É sério isso? Não sei se você percebeu mas está uma chuva desgraçada, você poderia simplesmente ter tirado os sapatos.
- Aishh...queria molhar os pés no mar. Mas aí uma onda gigante me derrubou e eu me desesperei. Não sei nadar então não soube o que fazer e quanto mais eu me debatia, mais ia para o fundo.
- Você é louca mesmo. Olha esse mar irritado, e você ainda quer molhar o pé? – Taehyung perguntou e ela riu.
- Sou Naomi.
- Taehyung.
- Muito prazer Taehyung, obrigada mais uma vez. – Naomi se colocou em pé. – Preciso encontrar um lugar pra ficar. Pode me indicar algum?
- Não é daqui? – Perguntou curioso.
- Sou sim, mas tive uma discussão séria com minha família. Saí de casa para esfriar a cabeça e olha só o que me aconteceu.
Taehyung riu minimamente.
- Tem um hotel logo ali. Talvez uns 500 metros. Você está bem mesmo? – Levantou vendo a garota assentir. – Boa sorte com sua família.
- Obrigada. – A garota acenou e saiu caminhando para o lado oposto.
Taehyung já alcançava a avenida quando a ouviu gritar seu nome. Parou e virou, a garota corria ainda descalço em sua direção.
- Taehyung, me desculpa, por favor... Mas você pode me emprestar algum dinheiro?
- Perdão?
- Minha bolsa deve ter caído na água. Perdi tudo, minha carteira, meu celular, meu batom preferido. Prometo te pagar. – Passou a mão pelo rosto e Taehyung suspirou.
- Tudo bem se formos para minha casa? Pego o dinheiro lá e te chamo um taxi. Estou sem nada aqui.
A garota o mediu de cima á baixo e pareceu pensar.
- Tudo bem, você não me parece nenhum psicopata.
Quase meia hora depois o rapaz entregava uma toalha á moça. A garota encarava o lugar distraída. Andava de um lado para o outro encarando as fotos e Taehyung preparava um chá para os dois.
- Você é militar?
- Sim, sou capitão.
- Quem é essa moça bonita? – Continuou perguntando.
- Minha irmã, que também é capitã.
- Vocês parecem um casal, que estranho.
- Qual parte do ‘minha irmã’ você não entendeu? – Falou seco e ela riu.
- Brigou com ela?
- Sim. – Soltou a respiração. – Discutimos pouco antes de eu chegar á praia.
- Parece que não sou a única a fugir para lá quando algum problema acontece. – Encarou séria.
- Tem umas roupas da minha irmã aqui, você é um pouco mais alta, mas ela gosta de coisas grandes. Deve servir. Se quiser tomar um banho...
A garota apenas assentiu, e enquanto ela se lavava, Taehyung abriu um pacote de biscoitos e começou a bebericar o chá. Pouco tempo depois Naomi voltou para a cozinha com o moletom de Soo Yun. O cabelo claro penteado ia até a cintura. Era muito bonita.
- Chá?
- Por favor, ainda estou congelando. – Ela respondeu se acomodando sob o banquinho no balcão da cozinha.
- E então Naomi, qual é sua história? Você é japonesa?
- Não, mas minha mãe gosta desse nome. Eu odeio! – Riu soprando o chá quente. Segurava a xícara com as duas mãos, assim como Soo Yun fazia, Taehyung observou. – Nós discutimos porque eu disse que ia embora da Coréia. Não sou muito fã desse lugar, e quero ir de vez.
- Mas isso não é problema, pode voltar para visitá-los.
- Sim, esse de fato não é o problema. Quero ir para a Itália, e para ficar lá preciso ter cidadania. Eu tenho um amigo que precisa de dinheiro, e ele topou se casar comigo se eu pagar uma quantia em dinheiro pra ele. Só preciso ficar casada por dois anos para conseguir a cidadania, depois disso nos divorciamos.
- E obviamente sua família é tradicional e não aceitaram. Apesar de que também acho isso loucura.
- Não é loucura, eu ganho bem com o que faço. Não vou usar o dinheiro dos meus pais para nada! É mais cultura do que qualquer outra coisa. Acho ridículo, não precisa de tudo isso.
Taehyung riu.
- E eu pensava que era maluco.
- Mas e você? Qual seu drama familiar?
- Minha mãe se casou com o pai de Soo Yun, minha irmã. Nós éramos crianças e ele é um tirano! O engraçado é que o homem a odeia e nós não sabemos por que. Eu a protejo desde então.
- É apaixonado por ela então. – A garota disse pensativa.
- Não! Já disse que não. Ela é minha irmã, e eu a amo mais do que a mim. Recentemente ela se envolveu com um médico desgraçado que estragou o noivado dela. Agora o tal médico a está infernizando e detalhe, ela é prometida em casamento a ele.
- Meu Deus! Que horror tadinha.
- O pai dela a trata como lixo! – Taehyung travou por um momento. Estava irritado com Soo Yun, mas nem por isso tinha que sair falando dessa maneira a uma estranha. – Hoje fomos a uma boate e ela saiu correndo do nada, fui atrás e quando eu a vi implorando para o pai para cancelar o casamento... Eu pirei!
- Se ela não quer se casar tem o direito de pedir a ele, afinal, só ele pode anular essas porcarias de contratos que fazem.
- Não é isso Naomi! Se ela precisa de ajuda, é só falar comigo. Nós procuramos um advogado, saímos do país, fazemos qualquer coisa! – Passou a mão pelo cabelo irritado.
- Hey calma aí Taehyung!
- Pode me chamar de Tae...
- Então calma aí Tae! Já parou pra pensar que ela está com medo? Já parou pra pensar que ela pode estar tentando te deixar fora disso?
- Não...
- Já parou pra pensar que ela pode não saber mais o que fazer?
- Ela deveria falar comigo! – Tentou, mas sabia que Naomi estava certa.
- Eu também acho, mas gritar com ela não vai fazer com que ela confie esse assunto a você.
- Como sabe que gritei com ela?
- Suspeitei. – Sorriu e Taehyung sorriu junto. – Sei que parece loucura e pode negar se quiser...
- Quer que eu fique aqui essa noite?
- Como? – Riu. – Sim, ia dizer que se quiser pode ficar por aqui e procurar um hotel amanhã. Ou mesmo voltar para casa.
- Como sabe que não sou uma psicopata? – Ela brincou.
- Bom, você chegou aqui apenas de vestido...
- Não precisa dizer mais nada! – Levantou a mão.
- E você, como sabe que não sou um psicopata? – Taehyung passou os biscoitos para ela.
- Não sei como sei, só sei que sei.
- Muito bem explicado. – Completou sua xícara com chá. – Que tal um filme?
- Prefiro bater papo, desde que isso venha acompanhado por um cobertor.
Naomi viu Taehyung sair para o quarto. Foi para sala onde continuou andando com a xícara nas mãos. Encarava as fotos e de repente ficou curiosa para conhecer Soo Yun. A garota parecia ter vergonha de sorrir, era muito bonita e a farda verde deixava-a com cara de menina. Deveria impor respeito, mas não era o que acontecia. Entendia por que Taehyung sentia-se na obrigação de defendê-la. Queria alguém que a defendesse dessa maneira também.
Acomodou-se no sofá e sorriu em agradecimento quando Taehyung lhe deu uma manta felpuda. O rapaz já havia trocado a roupa encharcada por um moletom confortável e estava lindo. Tinha que admitir, aquilo era uma loucura. Quem em são consciência passaria a noite na casa de um estranho?
- Reconsiderando? – Taehyung perguntou curioso analisando seu olhar perdido.
- Na verdade estava pensando sobre aquele seu quadro com uma frase do Nietzsche.
- ‘Não há nada que deprima mais o ser humano (mais depressa) do que a paixão do ressentimento.’ – O rapaz disse calmamente.
- Essa mesmo! Concorda?
- Talvez.
- Talvez? Nunca se apaixonou capitão?
- Nunca, eu acho. Estou passando por um momento complicado, mas não acredito ser paixão.
- Conte-me.
- Acho melhor não. – Taehyung esticou-se no sofá.
- Sou uma estranha que provavelmente você nunca mais verá. E mais, não faço a menor ideia sobre quem são as pessoas da sua vida. Vou embora em pouco tempo, que mal há?
- Oh Nari, na verdade tenente Oh Nari.
- Está apaixonado por ela? – Naomi perguntou curiosa.
- Na verdade não. Nossos pais têm intenções, mas nos tornamos amigos. Muito amigos mesmo! Ficamos juntos uma vez, acabou acontecendo. Acho que ela se apaixonou e depois se tornou conveniente para nós dois. Não acho isso correto, obviamente então achei melhor parar com isso.
- Então qual é o problema?
- Tem outro cara, um capitão da base dela que está apaixonado por ela e veio me pedir permissão para chama-la para sair. Antes que me pergunte, não fiquei com ciúmes. Parece mais um sentimento de posse, algo como... ‘Vou perder minha melhor amiga pra um babaca’. Não que ele seja um babaca, o cara é gente boa. Mas não quero perdê-la, no entanto não quero ter que brincar com os sentimentos dela para tê-la por perto.
- Entendo e acho nobre da sua parte.
- Mas e você, não gosta de ninguém?
- Na verdade sim. – Naomi respirou fundo. – Eu fui apaixonada por um rapaz desde que era criança. Nunca o esqueci, embora nem saiba como ele está nos dias de hoje. Não sei o que faz, não sei onde mora, onde trabalha e também não quero procurar.
- Medo da decepção?
- Sim. Sou prática, não tenho muita frescura e hoje nem acredito mais no amor. Mas não quero sofrer de maneira nenhuma.
- Pode me dizer o nome, se eu conhecer te dou um ‘spoiler’.
- Não, não quero informações de maneira nenhuma Tae...
- Tudo bem. Você manda!
- Eu vivo o hoje, vivo o presente. Não perco tempo com o passado e acho que se for para ser, vai ser. Seja com quem for. Então não me preocupo. – Naomi bocejou.
- Concordo com você. – O rapaz levantou pegando as duas xícaras. – Pode ficar com o meu quarto se quiser.
Naomi riu.
- Não, jamais. Vou ficar com o seu sofá, pode descansar. Se levantar e eu ainda estiver babando no seu sofá, é culpa do fuso horário.
- Sei, sei. Boa noite então senhorita Naomi.
- Boa noite capitão Taehyung.
...
Soo Yun mantinha os braços cruzados diante da vidraça.
- Pensei que você morasse em apartamento.
- Não, aconteceu o contrário. Meus pais quiseram ir para um apartamento e eu acabei ficando com essa casa gigante. – Hoseok voltava com um conjunto de pijama para Soo Yun. – Vista isso, aproveite e tome um banho para ir dormir.
- Não tem problema mesmo eu ficar aqui Hobie?
- Claro que não Soo Yun. Acho até melhor, voltar para casa só vai te deixar mais chateada.
- Acha que ele ainda está muito bravo? Acha que devo ligar para ele? – Soo Yun pegou o pijama.
- Deixe-o pensar um pouco. Na verdade acho que você deveria se abrir com ele. Se não quer casar, podemos encontrar uma saída.
Soo Yun ficou meditando sobre as palavras de Hoseok por um bom tempo. Tomou um banho rápido e voltou para sala. Os dois bebiam descontraidamente e os pensamentos da jovem capitã vagavam. Haveria mesmo uma saída? Conseguiria sair daquela situação sem precisar da ajuda do pai?
Hoseok por outro lado não conseguia tirar os olhos da jovem capitã. Presenciara algumas cenas dela com o pai, mas o viu mais cedo o chocara. O homem era cruel e a odiava. Mas por quê? Como seria possível alguém odiar Soo Yun. Encarou a garota que já estava mole em seu sofá, as bochechas vermelhas. Haviam bebido vários drinks suspeitos na boate e ela não parava de beber vinho. Uma taça atrás da outra.
Obviamente ela quer esquecer, mas Hoseok já estava preocupado. Encarou a janela de vidro que dava uma visão perfeita da rua. A casa ficava em um condomínio nobre, então não havia perigo. Mas era chato de fato. Queria ver as luzes da cidade, queria ver pessoas transitando, carros. Mas não, era sempre a mesma paisagem chata.
Talvez vendesse aquela casa e comprasse um apartamento no prédio de Soo Yun. A ideia lhe parecia divertida. Viu a garota levantar do sofá cambaleante e ficou atento caso ela caísse. Prendeu a respiração ao ver a garota habilmente encavalar em seu colo. Sentia perfeitamente o calor do pequeno corpo pelo pijama fino e o halito de vinho tinto.
Por um momento travou, sabia que aquilo não era certo e mais, não era real. Levantou de uma vez colocando a amiga de pé em sua frente. As mãos da garota foram para o seu peito e ele por um breve momento perdeu o controle. Segurou Soo Yun pela cintura e a afastou até que ela encostasse em sua mesa que ficava rente á vidraça. Colou seu corpo no dela e segurou seu rosto queria muito sentir o gosto daquele vinho. Selou seus lábios brevemente, mas um choque de realidade caiu feito milhares de toneladas sobre sua consciência.
- Pare Lee Soo Yun!
- Hobie... – Ela disse baixo sem muita certeza sobre nada.
- Você está extremamente bêbada. Eu quero muito isso, você não faz ideia de como eu quero. Sou seu amigo, mas sou homem e meu caráter não me permite.
- Qual é o problema?
- O problema é que isso não é real, você não quer fazer isso... Mas eu quero. No entanto amanhã você vai acordar arrependida e isso vai abalar nossa amizade. Quero que goste de mim do jeito certo. Quero que as coisas aconteçam da maneira certa, no momento certo. E se não for pra ser, prefiro que nada aconteça então.
- Está me rejeitando então? – Soo Yun levou uma das mãos aos olhos. – Eu sou realmente uma vergonha.
- Você está bêbada Soo Yun. E eu vou te colocar na cama antes que eu seja uma vergonha.
Pegou a amiga pela mão e saiu arrastando-a pelos corredores. Poderia muito bem pegá-la no colo, mas queria o máximo de distância possível. Não queria se aproveitar da situação em hipótese alguma.
- Obrigada. – Soo Yun sussurrou enquanto Hoseok a cobria com sua manta roxa preferida. Queria muito que o cheiro dela ficasse por ali um tempo.
Hoseok ficou em dúvida, se a garota o estava agradecendo por negar o que poderia ser o maior erro de sua vida, ou o simples fato de cobri-la com a manta. De qualquer forma não queria saber de fato. Sentou na ponta da cama e ficou encarando a amiga dormir profundamente.
A noite tinha sido cheia e todo mundo estava de cabeça quente. Haviam muitas coisas as quais não entendia e muitas outra que queria esquecer. De qualquer forma, estava onde queria estar e com quem queria estar. Torcia para que um dia fosse da mesma forma para ela.
...
‘A música oferece às paixões o meio de obter prazer delas. ’
Dizia Friedrich.
Talvez ele soubesse o que realmente isso queria dizer. Pelo menos era o que pensava a garota loira ao levantar do sofá no meio da noite. A chuva caía ruidosa e o chão parecia um grande lago congelado sob seus pés.
Caminhou lentamente até o quarto e entrou sem se preocupar se iria acordar ou não o rapaz estirado na grande cama cinza. Para sua surpresa, o jovem encarava uma parede de vidro com tons de azul. Iluminada simulava a chuva que por outro lado, batia contra a janela. Quase como se estivesse com raiva por sua imitação colorida e cara.
- Sem sono? – Ela perguntou trancando a porta, mesmo sem a certeza de que alguém poderia entrar em algum momento.
- Parece que você também.
- Sim... Eu tive uma ideia. – Puxou a blusa do pijama pelo pescoço e atirou para longe.
- Vejo que sim... – Foi o que respondeu antes de sorrir.
‘A sensualidade ultrapassa muitas vezes o crescimento do amor, de forma que a raiz permanece fraca e arranca-se facilmente. ’
Muito sábio esse Sr. Friedrich Nietzsche. Muito sábio.
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