Era estranho está ali, havia sido apenas alguns dias, mas ela sentia como se tivesse sido toda uma vida antes. Ela passou os dedos de leve pela pequena mesa de madeira, por anos ela comeu ali, sozinha, alimentando mentiras e esperanças fugazes, até que em certo momento, ela não pode mais, sequer, ver quem era ou já havia sido.
Aquela pequena casinha de madeira, era para ter sido seu lar, um lugar que a simples menção, teria esquentado o peito. Ali, ela teria amado e sido amada. Ali, ela teria tido desejos estranhos e se tornado mais exaltada, quando os hormônios da gravidez a tomasse. Ali, ela teria tido seu primeiro filho, ela estaria tão cansada e tão feliz. Ali, ela veria seu bebê crescer, as primeiras palavras, os primeiros passos. Ali, ela estava pronta para ter tido todo uma vida, ao lado de quem ela se devotou tão completamente. Nada disso aconteceu, entretanto, aquela casa não era a sua casa, ela não se sentia como um lar, era penas um lugar, este que apenas a fez se sentir estranhamente fria, distante.
Ela andou sem pressa pela habitação, estava evidente nos pequenos detalhes, que alguém havia estado ali depois que ela se foi. O caldo de peixe não havia apodrecido na panela, não havia poeira que se acumularia depois de dias sem faxina, o ar não estava estagnado, e os lençóis do leito, estavam bagunçados. Ela não olhou muito mais, ao invés disso, ela puxou a mochila amarela, agora mais velha e esfarrapada. Quando a miko a abriu e começou um lento processo de dobrar e guardar, ela chorou. Não havia palavras que pudessem expressar exatamente o que se desenrolava nela, as lágrimas foram tudo que restava. Não era tristeza, nem arrependimento ou saudade. Era quase que como uma despedida de um sonho, amargava a boca e ainda sim, trazia risadas nostálgicas com cada bugiganga e lembrança que se punha na mochila, já bastante cheia.
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Ela o esperou sentada na entrada, a mochila abarrotada repousando no chão ao lado. Ele parecia nervoso, ela sabia que ele podia se mover veloz, mas naquele momento, seus passos eram arrastados e os olhos dele, em nenhum momento acharam os dela.
Só agora ela notava, tudo era diferente, mesmo ele. O hanyo já havia sido mais impetuoso, de personalidade difícil, mesmo nos momentos em que se via errado, ele se mostrava irritado e suas desculpas muitas vezes mais o prejudicava que o ajudava, há muito tempo ela perdeu a contagem de quantas crateras em formato de um garoto com orelhas de cachorro, havia criado.
Kagome foi paciente, mesmo quando seu estômago embrulhou e suas emoções se confundiram. Ela esperou que ele parece a sua frente, olhos baixos, mãos em punhos apertados.
- Você voltou.- Foi ele o primeiro a falar.
Ela não disse nada, mas seu peito apertou, ela sentia que quando fosse sua vez, ela não poderia parar, não até que tudo se fosse. Então, ela o permitiu continuar.
- Quando voltei e não a achei... Quando o monje disse o jeito que você sumiu, imediatamente fui buscá-la, mas não havia rastros, não importava o quanto eu buscasse, eu nunca a achava, pensei...- Sua voz quebrou um pouco, ele se sacudiu, como se estivesse espantando algo para longe.- pensei que você tivesse sido pega, devorada ou pior. Você foi imprudente, esse não é seu tempo, há muitos perigos por aí...
Ele se calou quando ela se ergueu em um salto, ele sentiu o poder queimante, oposto ao seu, pinicar sua pele. InuYasha engoliu em seco e deu alguns passos para trás, fazia um tempo que ele não a sentia assim, tão brava, ele havia esquecido como era e imediatamente se sentiu grato por não portar mais o rosário.
A primeira emoção que explodiu nela foi raiva, ela se sentiu furiosa com a ousadia dele. Em algum lugar muito fundo, ela sabia que ele só estava preocupado, porém, um parte bem maior gritava pelo tom dele, o modo com que ele falou, com repreensão, como se fosse ela a errada.
- Não ouse terminar essa frase, ou realmente o farei se arrepender. Esse é meu tempo! É aqui que escolhi ficar, eu não sou uma tola, eu conheço os perigos, o que você parece esquecer, entretanto, é que eu não sou fraca, eu posso me proteger!- Ela avançou, ele retrocedeu.- Não me culpe por partir, não me culpe por sumir! Não quando o primeiro a fazê-lo foi você, não pela primeira vez e sinceramente, não seria a última. Agora você entende como eu me sentia quando não o achava, sem saber seu paradeiro ou se iria voltar. A incerteza, a preocupação, o medo... pensando bem, para mim foi pior, pois eu o amava, e isso me machucava, eu chorava todas as noites, eu forçava sorrisos para não preocupar os outros, eu fingia acreditar que você voltaria logo, quando não tenha certeza nenhuma, quando estava apenas perdida.
- Kagome, eu...
- Tudo bem!- Ela o interrompeu e suspirou, a raiva se esfriando, a tristeza inundando.- De certa forma eu errei também, aceitei e mascarei verdades que sempre estiveram lá para qualquer idiota ver. Você nunca me amou, seu coração nunca deixou de ser dela, eu só demorei demais pra aceitar isso.
- Não, Kagome, não é assim.
- Por favor, chega de mentiras, não tente negar isso, eu via como você ficava todas as noites, a tristeza, o arrependimento. Você deveria ter sido sincero comigo, sua tentativa de não me machucar, foi o que mais me destruiu.- Ela afastou uma lágrima com força, arrastando as mãos pela face e respirando fundo.
Um longo silêncio se estabeleceu entre eles, ela notou as mãos dele se balançarem para alcança-la, entretanto, ele se deteve e ela foi grata por isso. Kagome o assistiu, deslizar para fora da manga uma pequena pérola azulada e seus olhos se abriram mais com a surpresa, ela sentiu um poder estranho, não ruim, mas ainda sim, parecia não pertencer ali.
- O que é isso?- A discussão emocional foi posta de lado, essa nova peça era bastante eloquente para se ignorar.
InuYasha apertou a pérola, ela o estudou, observando os ombros caídos, as orelhas achatadas, ele aprecia triste, arrependido. Quando ela ergueu seu olhar, pela primeira vez, ele a encarou de volta e o que ela viu lá a calou, de fato, não apenas ela havia mudado, o estourado hanyo também o fez. InuYasha quase parecia chorar.
- Eu ouvi sua discussão com Sango.- Uma pausa, ele esperou que ela dissesse algo, mas nenhum palavra lhe escapou e ele continuou.- Não foi a primeira vez que ouvi algo do tipo e sabe, eles estavam certos. Esse amor estava lhe matando. Eu tentei amá-la, eu realmente tentei, mas Kagome, eu não consegui, não pude, me desculpe, por favor, me desculpe...- Ele estava chorando e ela estava em choque.- Sabe o que dizem sobre lobos? Eles escolhem um único parceiro por toda a vida, os youkais cães não são tão diferentes, quando amamos, o fazemos para sempre. Eu já tinha entrego meu coração, não restava nada mais a dar e mesmo assim, eu continuei, mesmo que a estivesse a machucando e eu fui tão estúpido, me desculpe por isso também.
"Depois disso, eu queria falar, contá-la a verdade, mas... Você deixou tudo por mim, sua família, seu lar, seu tempo. Não parecia justo terminar com aquilo que você tinha sacrificado tanto para ter, então, eu ouvi sobre o sacerdote e seu poder."
- O que você fez InuYasha?- Um estranho temor passou por ela. Kagome estivera tão certa de que ele desejaria sua amada de volta, mas agora, ela já não estava tão segura e essa constatação, a encheu de ansiedade.
- Eu pensei em desejar aquilo que você queria, o futuro que você sonhou.
- Por favor, me diga que você não fez.- Sua voz era um fiapo.
Ele não podia ter feito aquilo. Não depois de tudo. Não quando ela estava tão perto de estar curada.
- Não.- Quando ele respondeu, ela soltou o ar que não notou estar prendendo.- Eu sempre fui um pouco idiota, - Ela zombou com isso, mas não o impediu de continuar.- se eu tivesse feito aquele pedido, teria sido apenas mais um erro, quando o que eu busca era concertar um montão deles.
"Eu nunca a contei a verdade, porque supus que era melhor, eu continuei, porquê pensei que era o que você queria. E aí foi quando tudo desandou, eu não tenho sua mente, eu não sou você, ninguém poderia saber o que desejar para lhe fazer feliz, que não a própria, Kagome."
Ele veio até ela, Kagome não se moveu, ela o assistiu tomar sua mão, seu toque não lhe trouxe nenhuma emoção. Então, InuYasha colocou a pérola em sua mão, ele fechou os dedos dela ao redor da esfera azul e a deixou ir.
- Eu estraguei tudo, não há nada que eu possa fazer agora que cure todo o mal que eu lhe trouxe. Isso é tudo que tenho, meu último pedido de desculpas, um pedido que só você pode fazer, ela não é como a joia de quatro almas, ela não manipulara o que você desejar.
Kagome fitou InuYasha, sob o escrutínio dela, ele subitamente se viu mais nervoso, escondendo as mãos nas mangás e fitando qualquer outro ponto que não os olhos da mulher. Quando seus pensamentos entenderam seus sentimentos, e se tornaram mais certos e não tão tumultuados, o entendimento se abateu sobre ela. Kagome soltou uma leve risada, aquela era uma verdade, ele não havia sido o único a fazer papel de bobo, ela tinha sua parte disso.
Como uma adolescente, os hormônios falaram mais alto do que deveriam. Muitas das emoções que ela sentiu naquele tempo, ela tomou como verdades absolutas. Havia sido imaturidade da sua parte. A vida muitas vezes, era feita de paixões fugazes e tudo parece ser extremo, absoluto e quando ela sentiu por InuYasha, ela não viu isso, ela viu um amor épico, destinado e emocionante. E de certa forma havia sido, ela uma garota capaz de viajar no tempo, ele um meio youkai, somando-se a todas as aventuras que compartilharam, foi dificil não se deixar levar. Ela tinha apenas 16 anos, afinal, jovem e verde demais para entender a verdade, não que ela fosse muito mais velha agora, mas o que realmente ditava a maturidade era os acontecimentos vividos, depois de ir tão fundo, ela começava a se dar conta.
Jovens, era isso que eles eram. Ela amou da forma errada, ela pensou que o fim daquele romance seria o seu próprio, mas aquela ainda era apenas o início de sua história. Sua mãe sempre havia sido uma mulher forte e ela garantiu que a filha também o fosse, quando Kagome caiu no seu primeiro passo, a mãe a ajudou a se erguer, então, de novo e de novo, até que ela pode seguir sozinha.
Havia doido, ela sofreu, ela chorou e gritou, ela odiou e feriu. Ela aprendeu. Ela entendeu. Ela aos poucos se ergueu. Tropessou, mas não parou.
Kagome andou até ele, ela o imitou, puxando sua mão e pousando a esfera lá e então, ela o deixou ir.
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