‘Então isso é que é uma escola?’ me perguntei, olhando pela janela do carro quando nossa mãe estacionava na frente do prédio. A Goode High School era um prédio grande de uma estranha pedra marrom-rosada que cintilava no sol, com vista para o chamado Rio East na rua 81 Leste. Uma série de carros com aparência chique estavam estacionados na frente. Em Asgard o ensino era feito pelos pais e cada um em sua casa, por isso eu nunca tinha visto uma escola antes, mas pela descrição que eu tinha recebido de Percy eu tinha imaginado algo muito menos... monumental. Fiquei me perguntando se Hogwarts era desse jeito.
— Relaxe — ouvi Sally dizer para Percy, que estava no banco da frente olhando os arcos de pedra da fachada com uma cara de apreensão. Por algum motivo, a voz dela não estava nem um pouco relaxada — É só uma visita de orientação. E lembre, querido: essa é a escola de Paul. Então tente não... Você sabe.
— Destruir tudo? — respondeu Percy, como se aquilo fosse comum.
— É.
Eu e Harry nos entreolhamos, confusos. Ok, Percy tinha dito que ele tinha tido problemas com as outras escolas, mas aparentemente esses problemas eram um pouco mais explosivos do que imaginávamos. Olhando de volta para a escola eu conseguia ver Paul Blofis parado na frente da entrada principal, cumprimentando todos os que entravam. Eu acho que nunca encontrei na vida um homem tão estranho como Paul Blofis.
— Você não contou pra ele a verdade sobre nós, contou? — Perguntou Percy, ainda parecendo apreensivo.
— Pensei que seria melhor nós esperarmos — admitiu ela.
— Pra ele não se apavorar — concordou Percy com voz séria
— Bom, ele não surtou quando eu e Loki aparecemos — lembrou Harry — eu não acho que ele vai se apavorar, tem muito trouxa que aceita a existência de magia, você só precisa saber como contar. Não deve ser muito diferente com esse negócio de mitologia.
— Honestamente, ele me confunde — comentei — é normal em Midgard uma pessoa ser tão...
— Tranquila? — sugeriu Harry
— Simpática? — sugeriu Percy
— Gente boa? — sugeriu minha mãe
— Todas as anteriores? — respondi.
Eu ainda me lembrava da primeira vez que conheci Paul. Foi chocante. Eu sabia que ele iria nos tratar com respeito, lógico, já que ele claramente amava a nossa mãe, mas esperava uma atitude mais fria e reservada em relação a nós, como eu via todas as pessoas de Asgard tratar os filhos que seus maridos ou esposas tiveram em um casamento passado. Mas daí ele nos ofereceu donuts. E não qualquer donuts, donuts azuis. E depois ele conversou com a gente quase o mesmo tanto que conversou com Sally, e perguntou sobre mim e Harry e realmente parecia interessado no que a gente dizia. E quando eu achei que não poderia ficar mais estranho depois que Paul soltou alguns elogios, ele passou o resto da tarde jogando Mario Kart com a gente e realmente parecia estar se divertindo. Foi... Qual a palavra? Ah é, bizarro. Mamãe deve ter percebido que tinha alguma coisa errada, porquê logo antes de dormir ela bateu na minha porta querendo conversar.
— Loki, querido? Posso entrar? — perguntou ela, e ao invés de responder eu simplesmente me levantei e abri a porta do quarto, gesticulando com a cabeça que ela entrasse. Se tinha uma das coisas que eu gostava em Sally é que ela respeitava a nossa privacidade. Eu não conseguia contar a quantidade de vezes que alguém entrou nos meus aposentos em Valhalla sem sequer bater na porta, como se fosse o dono do lugar. Sally se sentou na minha cama e deu tapinhas no colchão, me convidando para sentar ao lado dela.
— Eu queria conversar rapidinho porquê você teve uma criação bem diferente em Asgard, e algumas coisas que são claras para mim podem não ser tão claras para você — disse ela, logo depois franzindo a testa — apesar de que eu acho que o Harry também precisa ouvir isso, então eu vou falar com ele depois.
Ela fez uma pequena pausa para segurar as minhas duas mãos e depois continuou, olhando firmemente nos meus olhos.
— Loki, eu sei que eu só te conheço por alguns dias, mas eu te amo desde que eu vi você, Percy e Harry naquela tarde na cozinha. Você é meu filho, meu bebê, e eu te amo tanto quando Percy ou Harry, e faria qualquer coisa nesse mundo para ver vocês três felizes. Eu não sei como é em Asgard e não sei como os pais tratam seus filhos, mas vocês três são a coisa mais importante pra mim. Entendeu?
Eu fiz que sim com a cabeça, tentando ignorar a sensação de queimação das minhas bochechas. Eu imaginava que Sally já considerava eu e Harry como filhos, já que ela nos olhava do mesmo modo que Frigga me olhava, mas não dava pra negar que eu gostei de ouvir a confirmação em alto e bom som. Apesar de que eu meio que entendia a situação dela: eu mesmo mal conheço os meus filhos, já que nunca consegui ficar muito tempo com eles, mas eu amava cada um deles com toda a minha alma.
— Certo, é importante você saber disso — disse ela, abrindo um sorriso, mas depois voltou a ficar séria — É só que eu estou preocupada. Eu já li vários livros sobre psicologia, tanto quando para ter um guia quando Percy era pequeno quanto para ajudar a fazer meus personagens, e você e Harry falaram algumas coisas sobre o passado de vocês que realmente me deixou preocupada. Quer dizer, por tudo o que eu sei, Odin é um canalha imbecil e egocêntrico, bastardo e bundão psicopata! — gritou ela, o rosto vermelho de fúria.
Eu não consegui segurar a gargalhada com a descrição dada pela minha mãe, apesar de que, na minha opinião, estava mais do que completamente acurada.
— É sério! — exclamou ela, me fazendo rir ainda mais — toda vez que eu penso o que você deve ter passado com aquele cretino eu fico com dor de estômago! Eu só não arrastei você e Harry para um hospital ainda por que vocês têm icor no sangue e alguns exames podem sair alterados, mas eu tenho certeza que você e o Harry tem pelo menos Estresse Pós-Traumático, e vai saber o que mais vocês têm por causa daqueles porcos!
— Estresse Pós-Traumático? — perguntei, sem entender.
— É uma reação psicológica que ocorre depois de um acontecimento traumático — explicou minha mãe — tem gente que desenvolve imediatamente, tem pessoas que desenvolvem a síndrome anos depois do trauma ter acontecido e tem pessoas que desenvolvem quando o mesmo acontecimento ruim ocorre com muita frequência. Cada pessoa tem um sintoma e um modo de lidar, já que cada pessoa é diferente, mas como todos os problemas, você só consegue resolver quando sabe que ele existe. Eu quero que você prometa que quando você for para o Acampamento junto com os seus irmãos, você vai pedir para um dos curandeiros fazerem um exame completo para ver se está tudo bem. Quíron me garantiu que os curandeiros do acampamento não só têm talento, mas também excelente conhecimento médico.
— Mãe, Frigga tem poderes curativos — respondi — ela sempre cuidou de mim, então eu sei que eu estou bem.
— Ah, Loki — disse ela, olhando para mim com olhos tristes — Não é porquê não dá para ver suas feridas que elas não existem.
Meu sangue gelou quando percebi a verdade daquela frase. Realmente, Frigga sempre usou sua magia para me curar todas as vezes que eu recebia algum tipo de dano físico, mas a mágoa, raiva e a lembrança dos ocorridos não podiam ser tão facilmente concertadas.
— Está bem, eu vou falar com os curandeiros quando formos ao Acampamento — concordei, e mamãe sorriu.
— Ótimo. Agora, eu não pude deixar de perceber a sua reação hoje com o Paul. Tem alguma coisa errada?
— Não, Paul é ótimo! — respondi
— Tem certeza? — falou ela com expressão preocupada — não precisa ter medo de me contar, se tiver qualquer problema eu converso com o Paul.
— Não, não é isso — disse — é só que.... Paul realmente parece se importar com a gente.
— Ele se importa — disse minha mãe, confusa — Mas como isso é ruim?
— Não é! — exclamei — mas... Eu meio que... Não sabia que isso era possível? — A expressão confusa da minha mãe continuou, então achei melhor explicar — Em Asgard, se você for casado com alguém que já tem filhos, você os respeita mas ao mesmo tempo ignora porquê eles não são problema seu.
— Então eles nunca ouviram falar de Co parentagem — respondeu ela, dando de ombros — talvez seja uma coisa de Midgard. Eu deixei claro para Paul desde o começo que eu e Percy somos um pacote: ou ele tem os dois ou ele não tem nenhum. E como meus filhos, você e Harry também fazem parte do pacote agora. Paul quer uma família, então eu sei que ele vai tratar vocês como família. Mas ainda assim, se tiver algum problema pode falar comigo porquê, apesar de eu amar muito Paul, vocês são meus filhos e estão sempre em primeiro lugar. Ok?
Uma onda de calor irradiou do meu peito quando ouvi aquilo. Eu amava minha mãe Frigga, sem dúvidas, e eu nunca conseguiria odiar ou ficar bravo com ela, mas se eu fosse honesto comigo mesmo, uma das minhas maiores mágoas era que ela era casada e amava Odin. Quando nós dois brigávamos, ela não tomava partido, e apesar dela sempre fazer questão de estar lá para me curar e cuidar de mim quando eu precisava, ela quase sempre deixava Odin fazer o que quisesse comigo. Parece que, pelo menos com Sally, eu nunca teria esse problema.
— Ok — respondi sorrindo — mas eu até que gostei do Paul.
— Que bom — respondeu a minha mãe — mas quero ressaltar que você pode falar comigo sobre qualquer coisa, qualquer coisa mesmo. Você e o Harry passaram por algo que nenhuma criança deveria passar: ao invés de deixarem vocês crescerem e se desenvolverem, vocês foram obrigados a cumprir um papel, que não era o que vocês são, e eram punidos todas as vezes que não agiam de acordo com esse papel. Você tentou tirar o melhor da situação, mas isso não muda o fato de que seus sonhos e escolhas foram tirados, e eu não aceito isso. Porquê, para mim, você não é o deus da mentira ou o general do Ragnarok ou seja lá o que mais te chamam, você é Loki Potter-Jackson, meu filho, trigêmeo de Harry e Percy e filho do mar. Você pode ser o que e quem você quiser, e eu vou estar aqui para te apoiar no que você escolher e destruir qualquer um que insista que você deve ser algo que não queira. Entendido?
Por algum motivo, minha garganta tinha fechado, então tudo o que eu pude fazer foi acenar com a cabeça.
— Ótimo — disse minha mãe com um sorriso carinhoso — eu vou agora falar com o Harry, acho que ele precisa dessa conversa também — ela se levantou e beijou o topo da minha cabeça — Boa noite, querido.
Aquela conversa mudou a minha vida. Eu sabia que eu já estava relaxando e me sentindo mais a vontade com os meus irmãos, mas eu ainda prestava atenção em tudo o que eu fazia e pensava duas vezes antes de dizer qualquer coisa, com medo de que se eu falasse alguma coisa errada, eles iriam se voltar contra mim como quase todos os meus irmãos em Asgard. Foi só depois daquela noite que eu realmente me senti verdadeiramente em casa, e mais a vontade no apartamento de Sally do que eu jamais estive nos meus aposentos em Valhalla.
— Bom, tenho certeza de que vai dar tudo certo, meninos — disse nossa mãe, me tirando do devaneio — É só uma manhã, não tem o que se preocupar — apesar das palavras tranquilizantes, dava pra ver que ela estava nervosa, já que não parava de tamborilar os dedos no volante. Ela iria para mais uma entrevista de emprego, então estava de novo com aquele vestido azul e o sapato de salto alto.
— Ótimo — resmungou Percy — posso ser expulso antes mesmo de começar o ano letivo.
— Não é tão ruim assim, é? — perguntou Harry — você disse que a maioria dos problemas era por causa dos monstros, e agora temos os colares para nos proteger.
— É, pensa pelo lado positivo! Quando acabar a orientação podemos passar a tarde no Centro Bruxo — comentei. Eu estava estranhando um pouco o nervosismo do Percy. Não era a primeira vez que a gente ia pra algum lugar em Nova York, e até agora nunca tivemos nenhum problema com monstros. Certo, era a primeira vez que iríamos ficar só nos três, mas por mais que eu adore Sally eu não acho que era ela exatamente o que manteve os monstros longe de nós até agora.
— Vocês não iam se encontrar com a Annabeth hoje mais tarde? — perguntou nossa mãe confusa
— Ela disse que não sabia se ia estar livre no horário — respondeu Percy dando de ombros — então temos um plano B pra caso ela não venha.
— Eu realmente duvido que ela perderia a oportunidade — respondeu Sally sorrindo — Bom, é melhor vocês entrarem queridos, a orientação vai começar logo. Eu vejo vocês a noite!
Harry puxou a alavanca da porta para sair do carro quando Percy soltou um som engasgado. Quando eu olhei pra ele, seus olhos estavam arregalados e ele parecia um pouquinho em pânico. Eu segui o seu olhar e vi Paul cumprimentando uma menina de cabelos ruivos frisados com uma roupa toda estampada.
— Percy? — chamamos todos, preocupados
— O que foi? — perguntou nossa mãe, preocupada
— N-nada — respondeu ele — A escola tem uma entrada lateral?
Eu e Harry nos entreolhamos de novo. Nada de errado minha bunda!
— Descrendo a rua, á direita. Por quê? — respondeu mamãe, sem entender.
— Até mais tarde — foi tudo o que Percy disse, antes de sair correndo.
— Argh, eu odeio quando ele faz isso — reclamou mamãe, e depois se virou para nós, com expressão séria — vão atrás dele e fiquem todos juntos. Se houver algum problema, é mais fácil se vocês tiverem uns aos outros para se ajudarem. Infelizmente Percy é um ímã para problemas, então por favor se cuidem!
— Sem problemas, mãe. Tenho bastante experiência cuidando do Thor, Percy não deve ser tão difícil — respondi, saindo do carro atrás de Harry, seguindo para a entrada lateral que Percy tinha ido.
— Então — comentou Harry com um tom de voz casual, como se estivesse falando do tempo — eu odeio dizer, mas eu também sou um ímã para problemas.
— Eu também, mas eu jogo a culpa em outra pessoa — respondi, fazendo Harry gargalhar. Quando finalmente alcançamos Percy, ele tinha sido emboscado no topo da escadaria por duas garotas com estranhas roupas de tom roxo e branco. As saias roxas eram bem curtas e as blusas justas, deixando a barriga e os ombros de fora. Era claro que as roupas tinham o propósito de seduzir, o que eu estranhei, porquê nem Percy nem Harry citaram nada do gênero enquanto me contavam sobre como era nas escolas. Uma delas era loura com olhos azuis que pareciam pedras de gelo – e eu sei o que são pedras de gelo, acredite, Asgard era uma geleira – e pele parecia feita de leite e mel, enquanto a outra tinha pele de cor de canela e cabelo preto com cachos perfeitos. Elas mantinham sorrisos brilhantes e amigáveis, mas olhavam para o meu irmão como se ele estivesse coberto de sujeira das minas dos anões. A garota de pele de canela estava tão perto de Percy que por um instante eu achei que ela fosse empurrar o meu irmão escada abaixo.
— Qual o seu nome, calo? — ouvi ela perguntar quando nos aproximamos. Imediatamente eu senti um forte gosto de menta na boca, e encarei as duas garotas com cuidado. Apesar dos Aesir não terem poderes tão ilimitados como os Olimpianos, nós ainda éramos deuses, por isso nós conseguíamos perceber rapidinho quando o valor que nós representávamos estava por perto. Mamãe Frigga sentia gosto de cerejas quando uma mulher grávida chegava perto. Balder sentia gosto de uvas quando a justiça precisava ser exercida em algum lugar próximo. Até Thor sentia gosto de galinha quando uma tempestade se aproximava, o que na minha opinião era péssimo, mas Thor gostava de galinha. No meu caso, toda vez que alguém mentia ou trapaceava na minha presença, eu sentia gosto de menta, mas acho que nunca senti o gosto tão forte a ponto de fazer minha língua praticamente dormente.
— Calo? — perguntou meu irmão
— Calouro — explicou ela, agora a expressão do rosto combinando com a de desdém dos olhos
— Hã, Percy.
As duas garotas se entreolharam e alguma coisa fez meus instintos de perigo apitarem. Pelo canto do olho percebi que Harry tinha ficado tenso, como se estivesse se preparando para correr ou lutar a qualquer instante.
— Ah, Percy Jackson — disse a loira — Estávamos a sua espera.
Fez-se um silêncio por uns segundos, até que uma única palavra saiu da boca do meu irmão.
— Σκατά.
Merda.
A mão de Percy começou a se aproximar do bolso onde ele guardava Contracorrente, enquanto eu e Harry corremos para perto dele já segurando as varinhas discretamente, prontos para caso a coisa piorasse. Nossa aproximação fez as duas garotas desviarem o olhar de Percy por um instante, parecendo finalmente perceber nós dois atrás dele, e pela expressão surpresa e queixo caído, elas perceberam nossa semelhança.
Eu já estava me perguntando se seria necessário puxar as minhas facas quando uma voz de dentro do prédio se fez ouvir:
— Percy?
Eu podia não conhecer Paul por muito tempo, mas reconheci a voz dele sem nenhum problema. Percy ficou claramente aliviado, e as garotas estranhas recuaram, parecendo irritadas. Percy estava tão ansioso para passar por elas que acidentalmente esbarrou o joelho na coxa da morena, e ouvimos um som metálico e oco.
— Aí! — reclamou a garota — Presta atenção, calo.
É, só havia uma conclusão lógica: essas duas eram monstros. Quando Percy contou sobre como monstros andavam disfarçados por aí, eu honestamente não imaginava que o disfarce fosse tão bom. Não era como um truque de luz, onde você podia estreitar os olhos, procurar pela magia distorcendo a luz e desfazer pra ver o que estava acontecendo: quando eu tentei, minha vista ficou quase completamente borrada, como se uma cortina de vapor extremamente denso cobrisse o que eu estava tentando ver. De qualquer modo, eu não precisava ver o que elas eram de verdade pra saber que eram problemas, mas considerando que elas se afastaram quando Paul chegou perto, desde que nós ficássemos em um lugar cheio de gente, ficaríamos bem.
— Aí estão vocês! — exclamou Paul — Bem-vindos a Goode!
— E aí Paul... — Começou Percy, mas parou duvidoso
— Hã, devemos te chamar de Sr. Blofis de agora em diante? — perguntou Harry, polidamente. Hum, então chamar alguém pelo sobrenome era sinônimo de respeito por aqui? Ainda bem que eu mudei o meu.
— É melhor que vocês me chamem de Sr. Blofis durante as aulas, mas quando estiver só nós, Paul está bom — respondeu ele em um tom despreocupado, até que ele franziu a testa — você está bem Percy? Está com cara de que viu um fantasma.
Aquilo fez Percy voltar a prestar atenção na conversa, já que ao que parece ele estava olhando em volta desconfiado
— Ah não, não é nada. É só que, hã...
— Ei, eu sei que você está nervoso, mas não se preocupe — disse Paul em um tom de voz tranquilizante que eu honestamente nunca achei que fosse ouvir de nenhum homem além do meu pai biológico e deu um tapinha nas costas de Percy, o que me fez lembrar de Thor — temos uma porção de alunos aqui com dislexia, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Os professores sabem como ajudar, você vai ficar bem.
Meu irmão fez uma cara estranha, e eu sabia que ele estava pensando que a dislexia era o menor dos problemas no momento, mas obviamente não dava pra dizer ao Paul que duas alunas na verdade não eram humanas. De repente Percy se aprumou como se estivesse pronto pra correr pela sua vida.
— Onde é a orientação? — perguntou ele, com voz urgente
— No ginásio — respondeu Paul, apontando para um dos corredores amplos do lugar — é por ali, mas...
— Tchau — e saiu correndo na direção apontada
— Percy?! — chamou Paul, mas nosso irmão não respondeu.
— Droga, de novo? — resmungou Harry — ele devia parar de ficar correndo pra todo lugar! Mamãe disse para ficarmos juntos!
— Percy está estranhamente nervoso hoje — disse para Paul, tentando deixar as reações de Percy menos estranhas. Meus irmãos pelo visto não eram nem um pouco sutis, e apesar de Paul parecer uma pessoa tranquila, ele era um professor, e desrespeitar abertamente alguém em posição de poder sem ter nenhum tipo de vantagem contra essa pessoa nunca era uma boa ideia.
— Sem problemas Loki — respondeu Paul sorrindo — eu me lembro de quando estava indo para o primeiro ano do colegial, eu estava mais aterrorizado do que nervoso. No fim vai ficar tudo bem.
— Certo, eu vou encontrar meus irmãos — disse, já que Harry já tinha sumido no corredor indo atrás de Percy — obrigado pela ajuda!
Eu imaginei que estivesse chegado no tal de ginásio quando encontrei um espaço amplo lotado de gente. Por causa das arquibancadas lotadas o lugar me lembrava de uma arena, mas ao invés de circular ela era retangular. Uma banda tocava um estranho grito de guerra com a mesma afinação de um grupo de Einhenjar bêbados, uma série de garotos mais velhos uniformizados estavam em cima de um pódio se exibindo como Freya quando ganhava um vestido novo, professores andavam pelo local apertando as mãos dos alunos e bandeiras coloridas estavam penduradas no teto com letras tão grandes e contrastantes que dislexia não agia muito, me deixando ler as frases “BEM-VINDOS, ALUNOS DO PRIMEIRO ANO!”, “A GOODE É LEGAL!” “SOMOS TODOS UMA FAMÍLIA”, e mais uma série de frases cafonas. Curiosamente, apesar de toda a fanfarra, nenhum aluno do primeiro ano parecia feliz de estar ali.
Eu varri os olhos pela arquibancada até que encontrei Percy em um canto, sentado meio afundado no acento como se não quisesse ser visto, e logo em seguida achei Harry costurando pelas cadeiras andando na direção do nosso irmão fujão.
—...E a mamãe disse pra ficarmos juntos! — ouvi Harry reclamando quando eu finalmente cheguei perto dos dois — fala sério Percy, o que tá acontecendo?!
— Você precisa ser mais discreto — falei, me sentando ao lado de Harry — se ficar agindo desse jeito, os professores vão achar que você está fazendo alguma coisa de errado!
— Tá, me desculpem — respondeu Percy, irritado — é só que eu tô tentando evitar...
De repente, alguém agarrou o ombro do meu irmão, e eu ouvi uma voz desconhecida perguntar:
— O que você está fazendo aqui?
Percy pulou na cadeira como se ele tivesse levado um choque e olhou de olhos arregalados par a garota ruiva de cabelo frisado e roupa estampada que eu vi entrando na escola mais cedo.
— Rachel Elisabeth Dare — disse Percy, e por algum motivo o queixo da garota despencou. Hum, parece que aquelas garotas de roupas estranhas não eram as únicas pessoas que o Percy estava tentando evitar.
— E você é Percy não sei de quê — retrucou ela — não cheguei a saber o seu nome todo dezembro passado quando você tentou me matar.
Eu e Harry olhamos indignados para Percy, mas agora parecia que era ele que estava com o queixo caído.
— Mas eu, eu não tava... Eu não queria... O que você está fazendo aqui?
Boa Percy. Sutil como um coice de cavalo.
— O mesmo que você eu acho. Orientação — respondeu ela, como se fosse óbvio.
— Você mora em Nova York? — perguntou Percy surpreso
— Você achou que eu morasse na Barragem de Hoover? — retrucou ela, e pela expressão do meu irmão eu imaginava que a resposta era ‘sim’. Acho que aquela era uma das conversas mais sem-noção que eu ouvi na vida.
— O que é uma barragem de Hoover? — perguntei para Harry curioso, mas meu irmão só ergueu os ombros parecendo tão confuso quanto eu. De repente um garoto sentado atrás de nós falou:
— Ei, calem a boca! As líderes de torcida estão falando!
Eu olhei para o centro da estranha arena retangular e no pódio onde antes estavam os garotos uniformizados agora estavam as duas garotas que encurralaram Percy na entrada.
— Oi pessoal! — disse a loura com uma animação tão falsa que minha boca ficou fria com o gosto de menta — meu nome é Tammi, e essa é a Kelly!
— Que tipo de nome é Kelly? — resmunguei enquanto Kelly fazia uma acrobacia
— Já ouvi piores — resmungou Harry de volta, mas nossa atenção foi tomada pela garota ruiva ao lado de Percy quando ela soltou um grito curto e repentino, como se tivesse sido espetada por uma agulha, fazendo os garotos sentados atrás de nós soltarem risadas abafadas. Rachel olhava para as duas garotas com uma expressão horrorizada e olhos arregalados, e eu soube na hora que ela conseguia enxergar o que elas eram. Curioso, estreitei os olhos novamente para enxergar a magia e ver se eu conseguia desfazer a ilusão que cobria as duas, mas novamente tudo o que eu vi foi uma grossa cortina de vapor que cobria as duas completamente. Enquanto isso, Tammi ignorou a agitação e continuou a explicar animadamente sobre todas as atividades que você poderia fazer na Goode como um aluno do primeiro ano.
— Corre — disse Rachel, com voz estrangulada — Agora.
— Porque? — perguntamos em uníssono, mas ela não respondeu. Ao invés disso, ela rapidamente se levantou e começou a costurar pelas cadeiras até a lateral da arquibancada, ignorando os professores que franziam a testa e os alunos que reclamavam ao levar um pisão no pé.
Eu achei que iríamos ignorar o aviso e ficar sentados, afinal as duas criaturas com certeza não iriam nós atacar no meio de uma multidão se elas resolverem recuar só com a presença do Paul, então foquei em Tammi e sua explicação sobre como iríamos nos dividir em grupos e fazer um passeio pela escola, mas então Percy levantou e foi andando atrás da ruiva, rapidamente seguido por Harry, o que me fez olhar para cima, exasperado.
— Sangue de Odin — praguejei, seguindo os três. Encontrei eles numa sala cheia de instrumentos musicais, onde Rachel e Percy estavam visivelmente escondidos atrás de uns tambores, enquanto Harry olhava em volta procurando um esconderijo mais sólido
— O que elas são? — ouvi Percy perguntando — o que você viu?
— Você... Você não iria acreditar em mim — respondeu a ruiva apreensiva
— Ah, iria sim — respondeu Percy — eu sei que você consegue ver através da Névoa.
— E eu realmente queria saber como você consegue. Eu tentei duas vezes mas parece que tem uma parede de vapor me bloqueando! — reclamei
— Você consegue ver a Névoa? — perguntou Percy impressionado
— Sim, dá pra ver quando você olha a magia — expliquei
— Ah, foi assim que você viu a proteção de sangue da rua dos Alfeneiros! — exclamou Harry — você precisa me ensinar isso! E Percy, sai de trás desses bongôs, o esconderijo é horrível!
— O que é essa Névoa? — perguntou Rachel, curiosa
— É... Bom, é como um véu que esconde o que as coisas são de verdade. Alguns mortais nascem com a habilidade de ver através dela. Você com certeza enxerga.
Rachel franziu a testa e encarou Percy.
— Você fez isso na Barragem de Hoover. Disse que eu era mortal. Como se você não fosse.
Nessa hora Percy virou para nós dois com uma expressão completamente perdida de ”e agora, o que eu falo?!”, e Harry e eu demos de ombros, respondendo com uma cara de ”eu sei lá, a verdade?”.
— Me diz — implorou Rachel, fazendo nossa atenção se voltar pra ela. Ela nos olhava com uma expressão ansiosa, como se nós tivéssemos a solução para um problema que ela estava desesperada para resolver — vocês sabem o que é isso? Todas essas coisas horríveis que eu vejo?
Nós nos entreolhamos e de algum modo que eu não sei como, chegamos em um consenso de que explicar as coisas não ia fazer nenhum mal.
— Isso vai soar estranho — começou Percy — você sabe alguma coisa sobre mitologia grega?
Ela franziu a testa
— Como... Como o Minotauro e a Hidra?
— É, mas tenta não dizer os nomes enquanto a gente estiver por perto, tudo bem? — pediu ele, lembrando da conversa que tivemos com Contracorrente.
— E as sereias? — perguntou ela, se animando — e as Fúr... — nós três conseguimos tampar a boca de Rachel com a mão antes dela terminar a frase
— SHHH, não fale os nomes em voz alta! — exclamou Harry — eles ouvem quando são chamados e se puderem vão atrás de você!
— Nós vamos te soltar mas você não vai mais falar os nomes, tudo bem? — avisei
Rachel empalideceu e arregalou os olhos, mas acenou com a cabeça e nós três destampamos a boca dela.
— Em fim, todos esses monstros, e todos os deuses gregos.... Eles são tudo verdade — finalizou Percy
Os olhos dela se iluminaram.
— Eu sabia! Vocês não sabem como é difícil, durante anos eu pensei que eu estava enlouquecendo! E eu não podia contar pra ninguém, porque então eles também iam achar que eu era maluca e... — de repente seus olhos se estreitaram — Quem são vocês? Quer dizer, de verdade.
— Nós não somos monstros! — exclamou Harry ofendido, me fazendo pensar em todas as formas monstruosas que eu poderia tomar com minha habilidade de metamorfose e em como uma das minhas várias alcunhas em Asgard era pai de monstros. É, melhor deixar quieto.
— Eu sei que vocês não são monstros, eu veria se vocês fossem! — respondeu Rachel — mas vocês... Não são humanos, são?
Mais a frente no corredor deu pra ouvir uma série de pessoas saindo do ginásio, e percebi que o tal passeio pela escola iria começar agora. Não teríamos muito tempo para ficar conversando, ainda mais porque agora estávamos vulneráveis sem nenhuma pessoa por perto para fazer as criaturas recuarem. Se Rachel já sabia o que elas eram, elas não teriam motivo pra não mostrarem sua verdadeira cara.
— Somos meio-sangue — respondeu Percy — somos metade humano.
— 1/3 na verdade — corrigi.
— E metade o quê? — perguntou ela, mas nesse momento Tammi e Kelly entraram na sala e fecharam as portas atrás delas com um grande estrondo, deixando a janela como a última rota de fuga.
Eu sabia que devíamos ter ficado no ginásio.
— Aí está você, Percy Jackson — disse Tammi com um sorriso venenoso, que aumentou quando ela olhou para mim e Harry — porquê não nos apresenta seus irmãos? Afinal, está na hora da sua orientação!
Ah Ymir, ela é uma dessas que gosta de ouvir a própria voz. Eu não precisava de mais essa.
— Elas são horríveis! — chiou Rachel, olhando para as duas horrorizada.
— Qual é a aparência real delas? — perguntou Percy, curioso, mas Rachel ainda estava chocada demais pra responder.
— Ah, deixa ela pra lá! — disse Tammi com um sorriso brilhante e começou a caminhar na nossa direção. O gosto de menta ficou tão forte na minha boca que queimava, e de repente minha cabeça parecia estar cheia de algodão. Eu sabia o que Tammi estava fazendo. Se eu ganhasse um draupnir todas as vezes que eu me transformei em uma garota bonita pra manipular alguém, eu teria dinheiro o suficiente para comprar o reino inteiro. Eu usei esse truque vezes demais para que ele não funcionasse comigo, mas dessa vez tinha alguma coisa a mais que fazia minha cabeça parecer enevoada. Eu apostava que era algum tipo de mágica compulsória.
— Percy, o que você tá fazendo?! — eu ouvi Harry dizer, indignado, e forçando a minha concentração eu percebi que Percy tinha andado de trás dos bongôs e estava indo, mesmo que lentamente, em direção a Tammi.
— Hein? — respondeu meu irmão, parecendo perdido
— Percy, dê o fora daí! — chiou Rachel quando Tammi deu mais um passo. Eu não sei bem quando, mas de repente Percy estava segurando Contracorrente, o que me deixou um pouco aliviado em saber que ele não estava totalmente no controle de seja lá o quê Tammi estava usando para nos deixar dopados.
— Ah, para com isso! — disse Tammi, irritada — nós não precisamos brigar. Que tal um beijo?
— Fica longe da gente — rosnou Harry, puxando Percy pela camisa alguns passos para longe de Tammi
— Ele só está com ciúme! — retrucou Tammi, e a minha cabeça pareceu clarear um pouco quando ela olhou para Kelly — posso continuar, senhora?
Kelly lambeu os lábios com uma expressão faminta.
— Vá em frente, Tammi, está indo bem!
— Nem pense em chegar perto, sua mula perneta! — a voz de Contracorrente ecoou na sala, apesar de só nós três conseguirmos ouvir.
— Mula perneta? — perguntamos em uníssono, curiosos. Aquilo claramente foi a coisa errada a se dizer já que Tammi e Kelly ficaram com uma expressão completamente assassina.
— COMO VOCÊS OUSAM?! — gritou Tammi, e logo senti uma onda da sua mágica estranha de compulsão quando meus pensamentos ficaram tão lentos que poderiam muito bem ter parado completamente. A cor parecia ter sumido do rosto e dos braços de Tammi, deixando a pele branca como cera. Duas presas enormes surgiram na sua boca e seus olhos ficaram completamente vermelhos. O mais estranho, apesar de tudo, era que uma de suas pernas era marrom e peluda como uma perna de burro, enquanto a outra tinha o formato de uma perna humana, mas era feita de bronze — somos empousai, servas de Hécate! A magia negra nos criou a partir de um animal, do bronze e de fantasmas! Existimos para nos alimentarmos do sangue de homens jovens, e vocês, meio-sangues, estão na nossa escola! Agora venha e me dê aquele beijo!
Tammi avançou contra meus irmãos, mas foi atingida na cara por um tambor que Rachel jogou na direção do monstro. Tammi sibilou e mostrou as presas, e em resposta Rachel atirou um xilofone na direção de Tammi. Ela deu um tapa no xilofone, que saiu voando para o outro lado da sala e avançou na direção de Rachel, as presas bem visíveis.
— Bombarda! — meus pensamentos clarearam completamente quando Harry transformou Tammi em uma nuvem de pó amarela bem em cima de Rachel, que começou a tossir.
— Que nojo! — disseram ela e Harry ao mesmo tempo
— Ah, isso acontece quando você mata os monstros — disse Percy
— Você podia ter avisado! — reclamou Harry
— Você matou a minha estagiária! — gritou Kelly — precisa de uma lição sobre espírito esportivo, meio-sangue! — então ela também começou a se transformar, os cabelos se tornaram chamas negras bruxuleantes, os olhos ficaram vermelhos, a pele pálida que nem cera e presas ainda maiores que a de Tammi, apesar dela também ter as pernas esquisitas.
— Eu sou a empousa sênior! — grunhiu Kelly — Nenhum herói me derrota a mil anos!
— Mesmo? — perguntou Percy — então já passou da validade! — e deu um golpe com Contracorrente. Mas Kelly era bem rápida e se esquivou do golpe, rolando para o lado e derrubando uma fileira de trombones com um ruído enorme. Rachel correu para o outro lado da sala, e eu e meus irmãos nos colocamos entre ela e Kelly.
— Pobrezinho — riu Kelly — você não sabe nem o que está acontecendo, não é? Logo o seu lindo acampamentozinho vai ficar em chamas, seus amigos se tornarão escravos do Senhor do Tempo e não há nada que você possa fazer para evitar isso. Seria até misericordioso dar um fim em vocês agora, antes que tenha tempo de assistir tudo!
Percy pareceu congelar com as palavras de Kelly, e no curto silêncio que se seguiu, deu para ouvir vozes no fim do corredor. Um grupo de pessoas se aproximava, e dava pra ouvir um homem falando sobre combinação de cadeados. Os olhos de Kelly de repente se iluminaram.
— Excelente! Vamos ter companhia!
Ela apanhou um estranho instrumento musical metálico (e enorme) e jogou na nossa direção. Nós abaixamos para evitar o projétil, mas o instrumento voou direto por cima da nossa cabeça e quebrou a janela. As vozes nos corredores silenciaram.
— Percy! — gritou Kelly, se fingindo de assustada — por que você atirou aquilo?
Ah não. Eu sabia o que ela estava fazendo. Não comigo aqui, cretina.
Kelly pegou um suporte de partitura e jogou na direção das clarinetas e flautas, fazendo a prateleira inteira desabar com estrondo. As pessoas começaram a correr pelo corredor, vindo na nossa direção.
— Hora de cumprimentar nossos visitantes! — cantarolou Kelly com um sorriso maldoso, no mesmo momento em que eu lancei um bom e velho feitiço nela.
Ela foi se virar na direção da porta e quase caiu quando seus pés ficaram grudados no chão.
— FIQUE LONGE DE NÓS SUA PERVERTIDA! — gritei o mais alto que eu pude — VOCÊ SEMPRE TENTA MOLESTAR OS ALUNOS DO PRIMEIRO ANO?!
Rachel, meus irmãos e Kelly me olharam de queixo caído por um momento.
— Se for se fazer de vítima — rosnei para Kelly em um tom baixo que quase não deu pra ouvir com a barulheira lá fora — faça direito!
E então a porta da sala de música se escancarou, e Paul e uma turma de alunos começaram a entrar na sala, prontos para proteger os pobres alunos do primeiro ano que estavam sendo molestados quando de repente Kelly explodiu em chamas, fazendo os recém-chegados recuarem quando o fogo começou a consumir o vão de entrada.
Foi o caos. Adolescentes corriam e gritavam pelo corredor. Sirenes tocavam e de repente começou a chover dentro da escola.
— Percy, Loki, Harry! Vocês três estão bem?! — ouvi Paul gritar do outro lado da porta, preocupado
— Vocês precisam sair daqui! — gritou Rachel, o que eu concordava, porquê o fogo estava começando a consumir a sala de música. Percy disparou em direção a janela destruída, e, assim como fizemos durante toda a manhã, eu e Harry corremos atrás dele, até ele trombar com uma garota quando saiu da viela na 81 Leste.
— Ei, você saiu mais cedo! — exclamou ela. Ela tinha pele bronzeada e olhos acinzentados faiscantes, cabelo loiro cacheado amarrado em um rabo de cavalo, usava jeans e uma camiseta laranja onde se lia ‘Acampamento Meio-Sangue’ e no momento segurava meu irmão pelo ombro para impedir que ele se estatelasse na rua — Olha por onde anda, Cabeça de Alga.
— Ah, então você é a Annabeth! — exclamou Harry. Percy havia contado sobre como Annabeth adorava chama-lo de Cabeça de Alga.
O queixo dela caiu quando olhou na nossa direção.
— Percy, você se multiplicou?!
— Annabeth, esses são meus gêmeos Harry e Loki — apresentou Percy, ainda meio sem fôlego da corrida para fora da escola — eu descobri sobre eles esse verão.
Annabeth franziu a testa, confusa.
— Como assim “descobriu”...?
— Percy! Espere! — Rachel veio correndo pela viela, ainda coberta de pó de monstro, parecendo que alguém a atacou com um saco de farinha. Annabeth franziu ainda mais a testa, parecendo perceber pela primeira vez a enorme coluna de fumaça que saia da escola e as sirenes.
— Percy, o que você fez dessa vez? E quem é ela? — perguntou Annabeth. Hum, ciúmes. Parecia que mamãe estava mais certa sobre a relação dos dois do que eu imaginava.
— Ah, Rachel... Annabeth. Annabeth... Rachel. Hã, ela é uma amiga, acho.
— Oi — disse Rachel, e depois se virou para Percy — Você está muito encrencado. E ainda me deve uma explicação!
— Percy — chamou Annabeth, a voz fria — precisamos ir.
É, definitivamente ciúmes.
— Quero saber mais sobre meios-sangues — insistiu a ruiva — E monstros. E essa história dos deuses — ela agarrou o braço de Percy, pegou algo que eu agora sabia ser uma caneta e escreveu uma série de números na mão dele — Vai me ligar e me explicar tudinho, ok? Você me deve isso. Agora vai, eu vou inventar uma história e dizer que não foi culpa de vocês. Vão logo! — e ela voltou correndo de volta para a escola.
Annabeth nos encarou por um segundo, mas daí se virou e voltou a correr.
— Ei! — exclamamos, correndo atrás dela.
— O que vocês semideuses têm que ficam correndo pra todo lado?! — brigou Harry, arfante — e por Morgana, o que foi aquilo?
— Você também é um semideus, lembra? — respondeu Percy — e de qual parte você tá falando? Da que as empousai tentaram nos matar ou quando ela explodiu em chamas?
— Da parte em que vocês não lutaram de volta! — reclamou Harry — Percy, você começou a andar na direção dela desarmado!
— Aquilo era magia pesada — comentei — elas disseram que são servas de Hécate, essa não é a deusa da magia? Eu honestamente não sei como você não teve reação nenhuma, minha cabeça parecia estar cheia de algodão!
— Bom, eu consigo resistir a maldição imperius — respondeu Harry, dando de ombros — se for isso, a magia que elas usaram com certeza é bem mais fraca.
— Eu estou mais preocupado com a parte que ela explodiu em chamas — comentou Percy — será que foi isso o que ela quis dizer com o acampamento pegar fogo?
— Você contou a uma garota mortal sobre os meio-sangues? — perguntou Annabeth, de repente.
— Ela pode ver através da Névoa. Viu os monstros antes da gente — explicou Percy
— Então você contou pra ela a verdade.
— É, ela me reconheceu da Barragem de Hoover...
— Você tinha encontrado ela antes? — exclamou ela, indignada
— Hã... O inverno passado — respondeu Percy, rapidamente acrescentando — Mas, sério, eu mal conheço ela.
— Ela é bem bonitinha — disse Annabeth com voz neutra, como se estivesse falando do tempo, e Percy a olhou confuso.
— Eu... Nunca reparei.
— Acabamos de ser atacados por monstros, a escola está em chamas e tudo o que você tem a dizer é que Rachel é bonitinha? — comentou Harry indignado, e eu tive que me esforçar para não levar a mão ao rosto em frustração. Annabeth aparentemente decidiu ignorar o comentário.
— Acho que a nossa tarde já era. É melhor a gente sair daqui antes que a polícia comece a procurar por vocês.
Percy olhou para trás, onde a coluna de fumaça ainda subia, e fez uma careta.
— Você tem razão. Precisamos ir para o Acampamento Meio-Sangue. Agora.
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