Diogo está sentado na nossa cama há uns quarenta minutos e pela cara dele me esperar não está sendo nada agradável. Me movimento de um lado para o outro, tiro e coloco roupa, sapatos e acessórios e tudo que ele faz é me observar com uma calma disfarçada, sei exatamente o que passa pela cabeça dele agora. Queria entender por que todos os homens vêm com essa configuração de fábrica, esperar nós mulheres ficarmos ainda mais lindas do que somos devia ser quase um entretenimento.
Realmente não entra na minha cabeça toda essa impaciência, ainda mais pelo fato do meu marido ter crescido rodeado de mulheres. Sair de casa nunca deve ter sido fácil pra ele, já deveria ter se acostumado, não? Vejo ele olhar pro relógio duas vezes em menos de dois minutos e respirar fundo antes de dizer:
— Amor, estamos atrasados, sabia? Me diz que está perto de terminar, por favor?
— Eu pedi pra você não me apressar, não pedi? — Resmunguei sem muita paciência colocando a cabeça pra fora do closet. — Para de ser chato e vem me ajudar a fechar o vestido, vem.
— E eu sou maluco de não ir? — Diogo se levanta num pulo e ao chegar perto de mim paralisa. Estou com um vestido azul que vai até o meio da perna, justo e elegante apesar de ser simples. Nos pés estou usando saltos e o cabelo preso num rabo de cavalo baixo. Pelo visto ele gostou. — Eu já disse que você é a mulher mais linda que já vi na vida?
— Sim, inclusive no nosso primeiro encontro. — Olho pra ele através do espelho e espero que suba o zíper pra me virar de frente pra ele e fitar seus olhos lindos. — E eu já disse que você é muito especial pra mim?
— Não, pelo menos não que eu me lembre. — Diogo finge desentendimento e eu acabo rindo dando um tapa no seu braço de leve. — Te amo, você sabe disso.
— Sei, e quem ama não reclama da demora do outro, tá? — Ele revira os olhos e eu gargalha alto. — Só vou me maquiar e a gente sai, não vai demorar quase nada.
— Você é perfeita, meu amor, não precisa de maquiagem nenhuma.
— Boa tentativa mas não vai funcionar, meu bem. — Pisco o olho pra ele e me viro pro espelho pra começar a passar os produtos no rosto. — Quer me ajudar?
— O que eu posso fazer, afinal?
— Pegar os pincéis e produtos conforme eu for precisando e pedindo, ué.
— Tipo como se a gente tivesse numa cirurgia onde você é a médica e eu seu assistente? — Ele brinca e lanço um olhar mortal em sua direção. — Tudo bem, não está mais aqui quem brincou. O que quer que eu pegue, madame?
Vou dizendo os nomes dos produtos e percebo que ele não faz a mínima ideia do que estou falando. O coitado se confunde, erra, é repreendido e no fim, acabo expulsando-o do closet. Explico que ele estava atrapalhando ao invés de ajudar e o Diogo se defendo dizendo que realmente não tem noção do que é corretivo, base, iluminador e todas as outras coisas que estão à minha frente.
Ele volta para a cama e para o estado inicial de espera, provavelmente se perguntando quanto tempo mais ficaremos aqui. Diogo se deita no colchão, fecha os olhos e pega no sono me deixando puta da vida. Acorda atordoado com a minha voz lhe chamando, levanta grogue e tenta me acompanhar até a porta mas acaba tropeçando dos próprios pés e se não fosse eu pra lhe amparar teria caído de cara no chão.
— O que deu em você? Eu nem demorei tanto assim, Diogo!
— Se não tivesse demorado acha que eu teria dormido? — Ele devolve me seguindo pelo corredor. — Aliás, por quê você está brava, hein?
— Porque será? Eu só fui fazer uma make básica e além de dormir você nem me elogiou!
— Como é que é? Eu disse que você era a mulher mais linda que eu já tinha visto na vida, lembra?
— Isso foi antes da maquiagem. — Paro e me viro pra ele visivelmente chateada. — Olha só pra mim, Diogo. Não mudou nada desde aquele momento em que você me viu em frente ao espelho?
— Não. — O canalha finge estar sério e eu bato nele com a bolsa. — Calma, eu só tô brincando, meu amor. Você está linda, ou melhor, você é linda. A mais linda de todas!
— Hum. — Cruzo os braços e saio andando a sua frente ainda emburrada. Ele corre atrás de mim, me segura pelo braço e encosta meu corpo na parede pra que possa me olhar nos olhos. — O que foi agora?
— Para de drama vai, eu só dormi por causa do cansaço da vida mesmo. Sabe que vivo viajando de um lado pro outro então a maior parte do tempo estou com sono. Não fica chateada comigo, por favor.
— Tudo bem, eu desculpo você. — Ele ri provavelmente por não ter me pedido desculpas mas eu estar o desculpando mesmo assim. — Mas vou jurar aqui na sua frente que ainda vou te fazer pagar com a língua todas as vezes que reclamou da minha demora em se arrumar.
— Posso saber como, rainha da vingança?
— Um dia teremos uma filha e você vai saber do que estou falando, me aguarde.
— Como pode afirmar que teremos uma menina? Virou vidente agora? — Diogo tira onda de mim e ao invés de rir eu fecho a cara. — Qual é, amor? Não dá pra saber qual vai ser o sexo do nosso futuro filho, ou dá?
— Veremos. — Rio sem humor e tento sair do lugar mas seus braços a minha volta não permitem. — Dá pra me deixar sair?
— Só se você falar a verdade, está chateada comigo?
— Não, eu já disse que desculpo você. — Diogo se inclina pra me dar um selinho e eu o agarra com força aprofundando o beijo bem mais do que ele pretendia fazer. Quando nos afastamos estamos completamente sem fôlego. — Viu só? Eu falei que não estava chateada, agora vamos!
Saio andando na frente dele que fica ali parado no lugar alguns segundos, provavelmente tentando processar o que aconteceu e o que eu quis dizer. Saímos de casa depois de avisar à tia Biga pra onde iríamos e o Diogo faz questão de abrir a porta do carro pra mim e ainda me ajudar com o cinto de segurança como o bom cavalheiro que é. O trânsito não está tão ruim quanto eu achei que estaria e uns trinta minutos depois chegamos no restaurante que ele havia escolhido e ainda bem que as nossas reservas ainda estavam lá ou o Diogo colocaria a culpa em minha demora pra se arrumar.
Fomos recebidos com muito carinho, nos conduziram até uma área mais reservada e longe de todos os olhares curiosos e nos sentamos de frente um pro outro prontos pra beber uma taça de vinho enquanto esperamos nossos pedidos. Olho para todos os lados deslumbrada com o lugar e me sinto feliz por sempre ser surpreendida.
— Que bom que gostou do restaurante.
— Eu amei, na verdade. — Ainda estou encantada com cada detalhe, é a nossa cara um lugar assim. — Obrigada por sempre me mostrar lugares lindos, você parece ter esse dom.
— Faço tudo que puder por você e não é exagero. — Abro um sorriso e bebo um gole de vinho pra disfarçar o fato de ter ficado corada. — Quando perguntei o que você ia preferir pra hoje à noite achei que fosse escolher algo mais intimista e em casa, sabe? Disse que estava exausta da viagem.
— Você tinha razão quando disse que fazer amor tira metade do nosso cansaço. — Pisco o olho toda sedutora e ele se inclina na mesa pra pegar uma das minhas mãos. — Me sinto revigorada e pronta para a próxima.
— Ótimo, não vejo a hora de tirar esse vestido do seu corpo. É só o que tenho pensado desde que te vi nele em casa.
— Safado! — Digo rindo e seguro na mão do Diogo com força demonstrando ter o mesmo interesse que ele. Amo o fato da gente ter o mesmo desejo desenfreado um pelo outro. — Agora me conta dos seus planos para os próximos dias. Aposto que o Afonso vai afastar você de mim por intermináveis semanas.
Diogo balança a cabeça rindo do meu drama e passa a me contar o que planejou para esse mês, das agendas e de todos os compromissos. Faço careta a maior parte do tempo e juro que já sinto saudade antecipada. O garçom nos interrompe ao entregar a comida e se despede nos desejando um bom apetite. Conversamos e jantamos entre goles de vinho e risadas. Parece até que não existe mais ninguém no local além de nós dois.
— Posso te fazer uma pergunta? — Indago um pouco receosa e ele assente confuso. — Mas não vale dizer que não.
— Tudo bem, fala logo o que é.
— Mariana me contou que recebi um convite pra ir até um dos maiores orfanatos do Rio de Janeiro a fim de levar esperança, sonhos e um pouco de alegria para as crianças. É uma ação social muito bonita que estão fazendo com alguns artistas e eu quero muito participar. Será que você pode tirar um dia, por mais que os seus sejam corridos, pra me acompanhar?
— É uma iniciativa muito bonita, vou tentar estar com você, prometo. — Bato palmas empolgada e volto a comer. — Se coincidências existissem eu diria que essa é uma delas. Estávamos falando de filhos hoje e agora surgiu esse convite pra um orfanato.
— É só uma visita, amor. Não significa que temos que sair de lá com uma criança, até por que o processo de adoção não é nada fácil.
— Não é mesmo. — Ele respira fundo e muda de assunto. Sabe que falar sobre filhos não é algo que me deixe muito confortável. — Gostou da comida daqui?
— É muito boa mas a sua é...excepcional. — Ele abre um sorriso e tenta não inflar o ego com meu elogio. — Aliás, não vejo a hora ver você cozinhar pra mim de novo.
— A senhorita bem que podia ajudar ou tentar aprender.
— Meu bem, por favor entenda que algumas pessoas nasceram para cozinhar e outras para verem as pessoas cozinharem. — Diogo solta uma gargalhada com esse comentário por que sim, sou muito folgada mesmo. — Adoro ver você sem comisa se movimentando pela cozinha de um lado pro outro, cortando aqueles legumes e dando um show de maestria!
— Quer dizer que você me observa atentamente? — Assinto mais de uma vez e ele continua rindo. — Bom saber que tenho uma espectadora tão minuciosa e aplicada.
Continuamos conversando sobre seus dotes culinários, minha capacidade de observá-lo e em todos os outros dotes que temos juntos. Terminamos a comida, o vinho e ficamos só na água que fizemos questão de intercalar durante toda a bebida pra não ficarmos bêbados. Me levanto para ir ao banheiro na intenção de retocar o batom e ver como o cabelo está e na volta, já perto da nossa mesa, alguém toca em meu braço me deixando em alerta.
— Paolla? — Conheço essa voz, me parece familiar. — O que está fazendo aqui, cão?
— Marco? — Relaxo um pouco mais e nos abraçam apertado. — Nem lembro a última vez que vi você, garoto! Onde estava? O que tem feito?
— Tava fazendo uns trabalhos fora do país mas já voltei. — Ele aperta minha bochecha depois do abraço e não para de sorrir, esse reencontro realmente foi inusitado. — Veio jantar com alguém? Soube que está namorando.
— Sim, ele está bem ali, deixa eu apresentar vocês! — Puxo ele pela mão e ao chegar na mesa o Diogo se levanta pra apertar a mão dele de maneira formal. — Diogo, esse é o meu amigo Marco Pigossi, fizemos uma novela juntos há uns anos. Marco, esse é o Diogo Nogueira, meu namorado.
— Prazer. — Eles se cumprimentam e eu sorrio. — Adoro esse restaurante, vocês curtiram? A comida não é dos deuses?
— Maravilhosa, eu gostei muito do local. — Respondo ao perceber que o Diogo não ia falar nada. — Você veio sozinho?
— É, não tive a mesma sorte que você. Ainda não achei um par pra mim. — Marco diz meio frustrado e volta a olhar pra mim. — Tava pensando em ir pra um barzinho agora, vocês me acompanham? Vai ser divertido.
— Não vai dar, cara. Chegamos de viagem hoje e estamos um pouco cansados, sabe? — Ele fala rápido antes que eu tenha tempo de arranjar uma desculpa qualquer. — Fica pra outro dia, pode ser?
— Mas a Paolla ainda não falou se quer ir ou não, Diogo. Diz aí, cão. O que acha da gente beber um pouquinho e colocar os papos em dia, hum?
— Diogo tem razão, estamos cansados. — Concordo com o Diogo que respira aliviado. — Mas me dá seu número, cão. Vamos marcar um jantar e eu quero atualizações de todos esses anos longe um do outro, tá bom?
— Tudo bem, pega o número aí. — Ele entrega o celular dele e o Diogo aproveita pra chamar o garçom, pedir à conta e pagar enquanto trocamos os números de telefone e algumas palavras. Quando ele volta a se aproximar da gente outra vez estende a mão pra mim que a segura depois de me despedir do Marco com um beijo na bochecha. — Foi bom demais te ver de novo, cão. Não esquece de marcar esse jantar ou vou até sua casa atrás de você.
— Juro que não vou esquecer, até mais. — Aceno pra ele e nós dois saímos do restaurante em silêncio. Assim que o Diogo abre a porta do carro eu bufo irritada e o olho com a cara feia. — Você é inacreditável mesmo.
— O que foi que eu fiz agora? — Ele indaga fechando a porta, dando a volta no carro pra assumir a direção e ligar o carro. — Você mesma falou que estava cansada, Paolla. O que fiz de errado, hein?
— Falou por nós dois sendo que eu nem tinha dado minha opinião ainda. E se eu quisesse ir, hum?
— Você quer ir? Então vai. — Ele para e espero que eu me mover mas nada acontece. — Não tô entendendo sua atitude, de verdade.
— Eu que não entendo por que agiu daquela forma, Marco e eu somos amigos há anos! — Digo furiosa e o Diogo respira fundo e olha pra frente tentando não ficar irritado. — Tava com ciúme? Sabe que não precisa sentir essas coisas, eu amo você, Diogo!
— É você quem está exagerando, Paolla.
— Claro, tinha que ser eu a exagerada! O que mais é culpa minha, me fala?
— Para de querer arranjar confusão por nada, garota. — Ele pede dando partida no carro. — Quer ir mesmo pro bar com ele? Posso te deixar lá e ir pra casa descansar.
— Não queria ter que ir sozinha. — Cruzo os braços e olho pra fora da janela visivelmente chateada. — Você é um chato.
— Eu nem acredito que vamos terminar uma noite tão linda como essa com a cara feia um para o outro. — Ele diz olhando pra mim e pra estrada ao mesmo tempo. — Para de fazer esse bico e me olha aqui vai.
— Não vou olhar coisa nenhuma! — Permaneço olhando para além da janela e ele estaciona o carro de repente me assustando de leve. — O que é isso? Ficou maluco?
— Você olhou pra mim agora. — Ele dá de ombros e eu o olho cheia de raiva. — Será que posso ganhar um beijinho também? Vamos esquecer essa mini discussão, o que acha?
— Não vou esquecer nada e você também não merece nenhum beijo!
— Amor, para com isso, vai. — Diogo estende o braço tentando encostar em mim que me afasto cada vez mais. — Não se afasta assim, vem cá. Me desculpa se falei alguma coisa que você não gostou, confesso que senti uma pontada de ciúmes quando o Marco apareceu, só isso.
— Pelo menos assumiu, já é um avanço. — Relaxa mais um pouco e olho pra ele. — E nunca mais ouse falar por mim, ouviu bem? Se eu realmente quisesse ter ido pra aquele bar nem o cansaço nem você teriam me impedido.
— Eu sei, e como sei disso. — Ele volta a colocar o veículo pra funcionar mas só até o estacionamento mais próximo. — Vem aqui vem.
Olho pra ele incrédula, não é possível que queira acabar de vez com a minha marra com sexo, ainda mais em um estacionamento. Os vidros do carro estão fechados mas quem passar por aqui pode nos ver, ele é completamente maluco.
Seu colo é convidativo demais e por mais que eu seja muito teimosa tiro o cinto de segurança e me sento sobre ele, completamente vestida. Seus olhos procuram os meus e quando os encontra posso ver a intensidade cavando ali, ele quer mais do que sexo, quer por um fim à todos os sentimentos ruins dessa noite pra que fiquemos apenas com os bons.
Me rendi de uma vez por todas e colocamos um fim à toda birra fazendo o que sabemos fazer de melhor: amor.
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