》Dominic《
[16:58]
Cinco dias para a cirurgia. Falta pouquíssimos dias para que eu finalmente esteja curado e sair desse lugar que fiquei por 3 anos.
Estou procurando sites aleatórios e fazendo quizzes inúteis do Buzzfeed. Mas parece que as horas não passam. Cada segundo se arrasta no relógio, sem pressa.
Alguém bate na porta. Nina, provavelmente.
- Entra.
Uma pequena garota com os cabelos ruivos e uma touca branca entra no quarto. Reparo que ela usa muletas e anda graciosamente sobre elas.
- Katherine! Se te verem aqui...
- Shh.. calminha, apressado. - Katherine caminha lentamente até a minha cama, enquanto eu me apresso para guardar meu notebook. - Precisamos conversar.
- Ah é?
- É. - Katherine deixa as muletas ao lado da minha cama e se senta na mesma, olhando para mim enquanto fazia isso. - Nós dois percebemos que nos afastamos muito. Concorda comigo?
- Concordo com você. - observei a garota deitar na cama e dar um sorriso encantador. Existe alguém mais linda do que ela?
Katherine olha ao redor, e para o olhar em mim. Seus olhos se demoram nos meus. Ela dá outro sorriso e se eu fosse um picolé, já estaria derretido.
- Então. - Katherine disse. - Acho que você sabe perfeitamente que eu preciso explicar o que foi aquele alvoroço naquele dia. - Antes de eu falar qualquer coisa, Katherine acrescenta. - Espero muito que você me entenda, porque eu só vou falar uma vez!
Sorrio para ela.
- Sim senhora.
Deito no lado contrário da minha cama, de modo que nossos rostos se encontram e nossos corpos fiquem de lados opostos. Seus olhos estão mais escuros hoje e suas olheiras, mais suaves. Sua boca perfeitamente desenhada está coberta por gloss rosa. Particularmente, sempre gostei de meninas usando gloss, é atraente e fofo ao mesmo tempo.
O cheiro de mel e menta do seu cabelo se alastra pelo ar. Esse cheiro irreconhecível. Mal me lembro se ainda tenho o creme que peguei no primeiro dia que fui no quarto dela.
- Minha mãe me machucava muito quando era criança. Ela não me aceitava do jeito que eu sou. - Katherine fala, friamente. - Ela não aceitava que eu tenho autismo e... você sabe.
- Eu sei? - Sabia o quê?
- Eu não te mostrei? - ela retruca.
- Não mostrou o quê? - essa garota era cheia de segredos.
Vejo ela afastar as mangas compridas dos braços e mostrar hematomas roxos e cortes profundos. Algumas cicatrizes antigas e outras recentes.
- Katherine?
- Eu... sinto prazer em fazer isso. - Katherine fala rapidamente e esconde as marcas. - Sei que é errado, mas eu não consigo me controlar. É tão bom..
- É.. é errado. - digo. - Você precisa arrumar outras coisas para... desestressar.
- Você!
- Pera, eu?!
O quê?
- Você vai me ajudar, Dominic. Eu sei que vai, não vai?
Suspiro.
- Vou. Eu vou te ajudar, Katherine. - toco minha mão na bochecha dela. - Você me desculpa por gritar com você naquele dia?
- Ahn.. não.
- Mas..
- Brincadeira, bicolor. Eu te desculpo.
- Espera. - sorri. - Bicolor?
- Seus olhos. Por quê? Alguma menina aqui te chama de bicolor também?
Essa garota é sensacional.
- Não. Só você.
- Hmpf. - ela sorriu. Dessa vez eu não me controlei. Tive que me aproximar do seu rosto e colar nossos lábios. Katherine soltou um leve som de satisfação e retribuiu o beijo.
E nossas línguas se tocaram. Hesitei por um momento, mas Katherine sorriu e mordeu meu lábio inferior.
- Kat..
- Hmmm? - ela me beijou de novo e se afastou. - Gostei desse apelido. Kat.
Antes que eu respondesse, Katherine... Kat me beijou mais uma vez. Nossas línguas se tocando, nossas respirações se tornando uma só, o tempo passando e passando...
Kat morde meu lábio inferior de novo e se afasta.
- Por que não me respondeu no Facebook?
- Hm? E como achou meu nome?
- Muito fácil! - ela tocou minha boca com o dedo indicador e deslizou pelos meus lábios, distraidamente. - Eu procurei seu nome nos registros desse hospital e joguei no facebook.
- Você é uma hacker?
- E você é um idiota? - Kat mexia nos meus cabelos agora. - Sabe tanto sobre doenças mas não sabe que os autistas são extremamente inteligentes, huh?
Ela me encara.
- Você ganhou de novo.
- Aah, obrigada!
Passo meus dedos pelo cabelo dela e ela fecha os olhos como resposta.
- Daqui a cinco dias, eu vou fazer minha cirurgia de transplante de medula óssea. Achei uma pessoa compatível.
- Hmm... eu sei.
Ela já sabe?
- Como?
- Bicolor, EU sou a sua pessoa compatível.
Só podia ser brincadeira. Katherine é a pessoa que vai fazer o transplante em mim?
- Você está zuando... não tá?
- Claro que não. - ela responde, confiante. - Por que mentiria para você?
Dei um beijo rápido nela.
- Sabe o que você acabou de fazer?
- Uuh, beijar você?
Ri.
- Você salvou minha vida, Kat!
Ela sorri e algo inacreditável acontece. Katherine fica corada.
- Quando Nina me disse que eu tinha possibilidade de te curar, eu concordei na hora. - ela está muito feliz contando isso. - Eu sinto que algo nos conecta...
- Como a Lenda da Linha Vermelha.
- Sim. - Kat assente, olhando nos meus olhos. Ela se levanta. - Vamos! Você tem que treinar! Aah, e vai ter uma festa amanhã! Você vai comigo, né?
- Pera! Não dá para treinar agora. E que festa que é ess... pera, você tá me convidando???
- Estou, idiota. - Kat pega as muletas.
- Eu que devia te convidar. Não estou sendo nada cavalheiro.
Ela ri e balança a cabeça. As mechas laranjas voando no ar.
- Estamos no mundo moderno, Bicolor. Esquece essa de quem vai pedir primeiro.
- Hm ok. - reviro os olhos e me levanto. - Mas sim, aceito em ir com você.
[18:00 - refeitório]
- Peço a atenção de todos, por favor.
Nina pedia. Ela estava a frente de todos nós. O refeitório ficou em silêncio. Helen, Aline e Kat estavam na mesma mesa que a minha. Escutávamos a enfermeira com atenção.
- Obrigada. - Nina respira fundo. - Como vocês já perceberam, nossa querida amiga Lola está ausente por 4 dias. Nós descobrimos que dois médicos impostores estavam andando em nosso meio por mais ou menos 2 semanas.
Todos nós ficamos chocados. Médicos impostores! Nina continua:
- Infelizmente, nossa criança Lola foi a vítima deles. Os dois médicos estavam cientes da rotina de Lola e pesquisaram a ficha da garota, assim eles conseguiram alterarar a quantidade de remédios, colocando mais intensos e com altos riscos para a saúde cardíaca da garota, além de mantê-la trancada e presa em uma das salas de cirurgia da Ala 4B, que raramente usamos, já que está velha e sem manutenção.
- Pobre maluca. - Kat comentou e Aline deu uma cotovelada.
- Katherine! - a asiática advertiu a ruiva, que ficou em silêncio quando Nina continuou passando as informações.
- Os médicos foram presos nessa tarde. Lola está mais magra que o normal e extremamente fraca, além de estar inconsciente por conta dos remédios extremamente fortes. Lola ficará afastada por mais um tempo, mas já está tendo os devidos cuidados por nós.
Depois do aviso, Nina sai rapidamente do refeitório.
- Lola não merece isso. - comentei.
- Ninguém merece isso, Dom. - Helen responde e abaixa a cabeça. - Nem aqueles médicos impostores idiotas, escrotos, filhos da p...
- Ok já entendemos. - Aline cobre a boca da garota com a mão.
Katherine estava em silêncio, processando todas as informações que Nina havia passado.
- Kat, você está bem?
- É-é que... estou me sentindo culpada por fazer ela me odiar... por causa de você. - ela respondeu para mim e fiquei surpreso. Então realmente Katherine tinha ciúmes de mim com Lola.
- Eu tenho certeza que se você conversar com ela e tentar entender seu jeito, vocês duas se darão bem.
- É...
Os outros pacientes conversavam baixo sobre Lola. Ela estava desaparecida por 4 dias e nos últimos dias ela realmente estava um pouco alterada do que normalmente acontecia.
Sinto-me culpado por não perceber que Lola estava pedindo ajuda silenciosamente. Sinto-me culpado por não ser atencioso às reações de Lola.
Culpa
Culpa
Culpa
Aline diz:
- Como podemos ser tão burros por não perceber que tinha intrusos andando com a gente?
- Muitos de nós não podemos sair do quarto em certos horários, Aline. - Helen disse. - Você sabe disso.
- Claro que eu sei. - ela respondeu. - Mas... Lola é esperta. Por que ela?
- Ela é a mais nova de todos nós. - Katherine respondeu. - Talvez ela foi um alvo mais fácil para carregar até aquela sala que Nina disse.
- Faz sentido. - concordei com Kat. Lola realmente era muito leve.
[21:30]
Não consigo dormir. O rosto de Lola aparece a todo momento na minha mente. Como fui tão irresponsável de não sentir a falta dela?
Me levanto da cama. Preciso ir no quarto dela. Só assim terei paz.
Saio do quarto e bato na porta 7.
- Psiiu? Kat?
- Entra.
Abri a porta e um rangido desconfortável preencheu meus ouvidos. Kat estava desenhando, muitas bolinhas de papel e lápis estavam espalhados na cama dela. Ela estava com meias trocadas e os braços enfaixados.
- O que aconteceu com seus braços? - perguntei enquanto fechava a porta e caminhando até a cama.
- Eu me cortei de novo. Não está óbvio, Sherwood?
Suspiro. Imaginar Kat se mutilando revira meu estômago e me sinto completamente desconfortável.
- Mas nós conversamos que você arrumaria outras coisas para esquecer sua vontade de se cortar.
- E eu respondi que era você. - ela disse. - Eu me lembro.
- Então por que você fez isso de novo? - observei as faixas nos braços. Estavam manchadas de sangue.
- Bicolor, você não estava aqui quando eu precisei.
Uuh, essa doeu.
- Ooh.. me desc..
- Para de ficar pedindo desculpas toda hora, estressa.
- Hmm.. ok. Então o que eu falo?
- Bom... você não veio aqui atoa né? - ela olha nos meus olhos por meio segundo e os desvia.
- Não. Quero que vá até o quarto da Lola comigo.
- Um ótimo encontro! Estou dentro.
Kat coloca seus materiais de desenho de lado. Percebo que ela estava desenhando um guaxinim. Ela se levanta. Sua altura não passa do meu ombro. Sorrio.
- Minha pequena!
- Meu idiota! - ela sorri e encosta sua mão na minha.
Entrelaço nossos dedos e seguro sua mão delicadamente. Kat é como uma criança: fofa, cruel e baixinha.
Ela está com aquele gloss rosa sensacional. Seus lábios parecem tão macios, não que não sejam, mas assim... enfim. Katherine é perfeita!
- Por que olha tanto para a minha boca, bicolor? Quer me beijar?
Sim! Sim! Sim!
- Para de ser convencida.
Saímos do quarto de mãos dadas. Sua mão segurava firme na minha. Do quarto 12, Aline sai dando passos de fininho. Ela nos vê e cobre a boca com as mãos.
- Que susto porra!
- Shhh. - respondi e Kat deu uma risada baixa.
- Onde estão indo? - ela disse em linguagem labial.
- Ver como Lola está. - respondi da mesma forma. - E você?
- Vou no quarto da Helen. Ela disse que tem alguma coisa pra me mostrar. - Mesmo com a baixa iluminação, percebi Aline corar.
Kat fechou a porta atrás da gente.
- Boa visita, Aline.
- Pra vocês também, almas gêmeas.
Ela caminha em direção do segundo andar, enquanto eu e Katherine vamos até o quarto 8, quarto de Lola.
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