“Eu ainda a quero, entretanto, não privando-a de você. Vim para que pudéssemos conversar sobre isso. Eu quero conhecê-la, quero ser um pai para ela. Quero isso mais que tudo. Posso entrar?”
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Robin continuava parado esperando por uma permissão sua, mas ela simplesmente tinha congelado, como se ainda estivesse absorvendo tudo o que tinha acabado de despejar sobre ela. Parando um pouco para pensar, falou tão rápido e afobado que talvez ela nem tivesse entendido. Contudo, Regina continuava ali, agarrada a maçaneta como se sua vida dependesse daquele pequeno objeto e se não fosse pelo fato de que Mills piscava, teria acreditado que tinha sido congelada. Seu corpo inteiro tremeu em expectativa, o coração batendo desenfreado no peito, pois a mera possibilidade dela se virar e fechar a porta na sua cara faziam suas pernas quase não sustentá-lo em pé.
“Ele teria estragado tudo com sua atitude impensada de ameaçá-la mais cedo?”
Naqueles minutos infinitos que mais pareceram uma eternidade, eles continuaram se encarando e não resistindo mais, Robin deixou seus olhos passearem por ela inteira. Não queria, até porque estava chateado e ferido justamente por sua causa, todavia, era involuntário. Pelo visto jamais seria imune, então se tornava impossível se conter. Era Regina ali na sua frente, incrivelmente mais fascinante que a menina de 18 anos que ele tinha conhecido, e não saberia dizer, mas se sentia quase gravitando em sua direção, tão atraído quanto uma mariposa pela luz, totalmente à mercê dos encantos naturais que aquela, agora, mulher, ainda possuía sobre ele.
Como ela conseguia ser tão adorável vestida em um conjunto de moletom? O que tinha naqueles olhos castanhos que o arrematavam e desconsertavam por inteiro? Mesmo quando estavam tão grandes e assustados como agora. O que passava em sua mente? Era dele que ela tinha medo? Estava tentando manter o foco no argumento da conversa que esperançosamente teriam, porém estava perdendo totalmente o rumo. Ele quase podia sentir a raiva esvaindo só de olhar a expressão em seu rosto.
E quando se perdia em pensamentos (que sempre o conduziam a ela), a morena a sua frente abriu a boca e a movimentou como se quisesse dizer algo, mas não foi em frente. Seus olhos voltaram ao nível dos dela, em expectativa, sentindo todos os pelos do seu corpo se eriçarem com aquele reencontro. Teria ela sentido o mesmo? Engoliu a seco, ainda sustendo o olhar. Regina se afastou alguns passos para a esquerda quebrando o contato, trazendo a porta consigo e lhe oferecendo passagem. Ele refutou por alguns milésimos de segundos se entrava ou não, sentindo-se aparentemente muito atraído por qualquer mancha em seu par de sapatos. Sua vida mudaria após colocar os pés naquela casa e por um momento a idealização foi assustadora.
“Ele estava preparado para se tornar um pai? Por mais que quisesse tanto aquilo, seria uma boa referência para aquela menininha?”
Ignorando o medo e todos os pensamentos negativos que assaltavam sua mente, apenas respirou fundo, ergueu o olhar e entrou. Parando no pequeno hall de entrada, colocou as mãos no bolso enquanto sentia sua ex namorada fechar a porta atrás de si. Podia igualmente sentir os olhos dela sobre ele, quase perfurando suas costas de tão penetrantes, mas também curiosos e hesitantes, assim como os passos, calmos e apreensivos. Quis se virar para encará-la e dizer alguma coisa, porém lhe faltou coragem, preferiu deixar os olhos vagarem pelo singelo apartamento. De onde estava avistou uma sala de estar muito modesta e aconchegante, podia sentir o cheiro de família e amor ainda fresco no ar, era estranho saber que aquilo pertencia a ela, mas não a ele. Doía na verdade.
Ignorando a pontada de dor que começou a incomodar seu coração, percebeu uma cestinha com alguns brinquedos e mais alguns ainda espalhados pelo chão. Tinha certeza que ela estava colocando tudo no lugar antes que ele chegasse e a interrompesse. Sorriu ao imaginar a garotinha que havia visto aquela manhã brincando naquela sala, encantadora o suficiente para convencer sua mãe a permitir um pouco de desordem. Pois se ele ainda conhecia Regina, sabia que antes, ela jamais permitiria que alguém deixasse as coisas desarrumadas em sua casa.
A advogada se colocou simetricamente ao seu lado ainda nesse momento, cruzando os braços em torno da barriga, sem jeito e pelo visto, pegando seu olhar distraído no cesto de brinquedos e finalmente falando alguma coisa:
- Desculpe a bagunça – sorriu internamente, pois, fora aqueles poucos brinquedos, não conseguia ver nada fora do lugar – eu certamente não estava esperando visitas – deu de ombros enquanto o fitava de canto e lhe oferecia um meio sorriso.
- A menina com certeza é boa em dobrar você. Se eu mexesse nas suas coisas e não as colocasse no exato lugar, você me arrancava as mãos fora – descontraiu, lhe devolvendo o meio sorriso.
Sustentaram o olhar por um pouco mais de tempo, era fácil se perder naquele encontro e esquecer-se do real porquê de estarem ali. Porém, tinham tanto a dizer um ao outro, estava tudo escrito nas írises de ambos. Os castanhos sempre tão intensos e misteriosos quanto sempre foram, já os azuis, tempestuosos e temerosos, como aquelas ondas tímidas, que agitam o mar e prenunciam uma tempestade. Era atraente na mesma proporção que assustador. Não sabendo mais como lidar com toda magnitude de sensações que os mantinha presos naquele enlace, Robin agradeceu aos céus quando Regina lhe indicou o caminho até o sofá erguendo a mão direita.
- Muitas coisas mudaram depois de Louise. Manter tudo em ordem é uma delas – respondeu enquanto caminhava e o fitava sobre os ombros – Venha, vamos nos sentar, acho que precisamos esclarecer algumas coisas – ele apenas acenou e a seguiu.
* * *
Obviamente era estranho tê-lo ali, sentado no seu sofá, as dez e cinquenta da noite de uma quinta-feira. Entretanto, o que lhe surpreendeu foi o fato de que Robin parecia a peça que faltava naquele apartamento e na cotidianidade que ela tanto adorava ao lado de sua filha.
Engolindo a seco, tentou ignorar a estranha perfeição com que ele quase automaticamente se encaixava em seu espaço. Talvez fosse porque olhar nos olhos dele sempre lhe passaram a sensação de casa, de lar. Então ele se foi e logo em seguida veio Louise, com aqueles mesmos olhos anis cheios de aconchego, se tornando para sempre sua moradia preferida. Mas agora, foi o mesmo sentimento de voltar à casa dos pais depois de sua temporada de intercâmbio na França. Ao mesmo tempo em que era sua casa, já não parecia tão mais sua assim.
E era estranho, pois nem mesmo com seu namorado fora assim, aquela enxurrada de emoções que pareciam desestabilizá-la e deixá-la sem ação. Só que o fato dele estar ali, não queria dizer que permaneceria. Não depois de tudo. Muito menos por ela. Existia um abismo entre eles e ainda que ousasse superá-lo, não conseguia ver nem mesmo os fragmentos de uma possível ponte para isso. Não enquanto existia Daniel. Jamais o machucaria. Mesmo que não fosse admitir para si, no fundo, Locksley era tudo o que seu coração desejava, mas nunca teria outra vez.
Esse mesmo coração, junto de sua mente, estava em conflito. Até aquela manhã, antes do telefonema com seu pai, antes de saber que ele nunca tinha abandonando-a como acreditava, era fácil olhar naqueles olhos e achar razões para odiá-lo, mas e agora que sua maior escusa tinha sido desarmada? Como controlar aquela tempestade de sentimentos que tê-lo por perto causavam nela? Ainda existiam lacunas em aberto, todavia, Robin se parecia muito menos como o cafajeste que tinha acreditado que ele fosse todo esse tempo.
Suas mãos suavam frio e ela começou a encarar fixamente os brinquedos na mesinha a sua frente. Sua mente trabalhava freneticamente em um início para aquela conversa, uma forma de romper o silêncio constrangedor que parecia um monstro querendo devorá-los.
- Robin – seu chamado atraiu a atenção do loiro – acho que preciso começar dizendo que sinto muito por tudo. Eu te devo um pedido de perdão, principalmente depois do que descobri hoje – ele continuava encarando-a e um vinco de confusão se formando em sua fronte – durante a conversa que tivemos, dissemos tantas coisas horríveis um para o outro e no meio de tantas acusações, não paramos para tentar juntar as peças desse quebra cabeça – Robin concordou e ela prosseguiu, desviando sua atenção para um fio solto em sua calça moletom – por que não veio me ver quando marquei aquele primeiro encontro no café? – voltou a olhá-lo de soslaio.
- Porque eu nunca soube Regina – ele a fitou com um semblante derrotado, suspirando antes de continuar – quando saí do seu escritório hoje, fui até a única pessoa que poderia me esclarecer tudo o que você tinha lançando sobre mim – a morena estremeceu, tinha certeza que ele tinha ido até Eleanor e apenas a menção dela lhe dava calafrios – Imagino que saiba que falo de minha mãe – concordou com um movimento de sua cabeça.
- Você foi até Londres? – pediu surpresa com o quanto ele tinha perambulado aquele dia.
- Sim, era a única maneira de confrontar Eleanor. E foi assim que soube que quando me mandou aquela mensagem, ela estava por perto, viu antes de mim e depois apagou antes que eu pudesse ver – a advogada suspirou como se tivesse levado um soco no diafragma e lhe faltasse ar. “Oh Deus! Não!” – Nunca soube que queria me ver para falarmos sobre nós. Como disse mais cedo, estava tão desesperado para falar contigo, se tivesse sabido daquela mensagem eu teria ido muito voluntariamente. Você tinha intenção de me contar sobre a gravidez ali?
Regina apenas acenou. Ainda muito mexida com as revelações que ele lhe fazia. Porque nunca tinha lhe passado pela cabeça que ele não soubesse da existência daquela mensagem. Talvez tivesse sido todo o teatro de sua mãe e Marian. Ou o fato de ter descoberto sobre a gravidez da outra mulher também naquele dia. Todavia, estava se sentindo horrível por tê-lo julgado tão baixo. Porém, como poderia saber?
- Eu tinha planejado dizer a você naquele encontro. Ainda estava magoada, mas eu iria te contar sobre a gravidez. Precisava saber o que faríamos, eu tinha que falar com meus pais. Então sua mãe chegou com Marian, me dizendo coisas horríveis como de praxe, inclusive que você estava me dispensando, pois tinha um compromisso com sua noiva grávida – estremeceu ao lembrar – Me senti tão mal descobrindo que ela estava esperando um filho seu, que você estava me deixando por ela e o pior, que não tinha tido consideração nenhuma comigo para me dizer pessoalmente – a advogada puxou uma respiração profunda na tentativa de se conter e impedir que suas emoções levassem o melhor dela – eu saí correndo rumo ao banheiro para vomitar. Sabe, pensei que poderia morrer de tanta tristeza aquele dia Robin, meu coração se partiu em incontáveis partes e meu mundo ruiu – a morena precisou parar para se recompor antes de continuar, já podia sentir as lágrimas se formando em seus olhos. Relembrar tudo ainda era doloroso. Puxando uma outra longa respiração, continuou:
- Depois ela apareceu no meu quarto me oferecendo dinheiro para abortar o bebê – Robin já tinha ouvido aquilo mais cedo, da boca de sua própria mãe, mas não pode evitar de sentir outra vez pesar por ela, se controlando para não estender sua mão e envolver a dela – me disse que não era a primeira vez que você engravidava uma garota e que ela tinha que resolver o “problema”. Você tinha sumido completamente, não foi difícil acreditar na versão que ela me contou.
- Isso... – vacilou, não porque estivesse contando uma mentira, mas porque estava se sentindo enjoado outra vez com a crueldade de Eleanor – nada do que ela falou era verdade Regina, eu nunca engravidei ninguém, nem mesmo Marian, foi tudo uma armação. Não consigo me lembrar se dormi ou não com ela naquela maldita noite – cerrou os punhos – porém, esse bebê nunca existiu e eu nunca tive pretensão de me casar com ela. Estava determinado a assumir a criança, entretanto, esposá-la estava fora de questão – o loiro buscou seus olhos, ambos lacrimejavam. E com ele ali diante dela, pode sentir toda verdade da declaração que viria a seguir – Eu tinha um compromisso contigo, eu te amava demais para estar com outra mulher – sentindo seu coração errar uma batida e uma lágrima escorrer por sua bochecha, indagou:
- Eu só não consigo entender porque não me ligou? Eu cheguei até mesmo a te enviar uma mensagem perguntando porque de ter me enganado e mentido daquela forma, mas nunca obtive uma resposta sua.
- Minha mãe conseguiu alguém para sabotar nossos telefones Regina. Também tentei te ligar várias vezes e enviei milhares de mensagem que nunca tinham retorno. Pensei que não quisesse falar comigo e te dei espaço, foi quando o anúncio do meu noivado saiu, vi que Eleanor tinha ido longe demais e dei um basta naquilo. Nunca pedi Marian em casamento – como Regina queria ter ouvido aquelas palavras anos atrás, a convicção e verdade com que ele afirmava cada sentença, sempre olhando em seus olhos como se lhe pedisse perdão por algo que não era culpa sua. Ele também tinha sido uma vítima, pena ela ter descoberto tarde demais – Nós discutimos, continuei te ligando e como não resultava em nada, finalmente fui até você. Te procurei no seu dormitório e me deparei com uma Emma enfurecida – sorriu de leve imaginando o que sua amiga tinha dito a ele – mas no fim me deu seu endereço e me pediu para não deixá-la partir, pois você tinha algo a me dizer. Agora consigo entender o que ela queria dizer. Fui até sua casa e seu pai me disse que você já havia ido embora e não me deu nenhum contato seu.
- Sinto muito Robin, juro que nunca soube que você tinha ido me procurar, meu pai só me confessou tudo isso hoje quando o confrontei. Naquele dia, em que veio atrás de mim, eu ainda estava em casa e juro pela vida da minha filha, que tudo o que eu mais sonhava era que você viria me procurar e dizer que me queria, que tinha sido tudo um mal entendido – suspirou, estava muito difícil reter tudo o que estava sentindo. As lágrimas já começavam a descer pelo seu rosto – tudo o que eu mais almejava era ouvir essas mesmas palavras que está me dizendo agora – sorriu incrédula e sem humor algum do quanto o timing deles era horrível – Eu fiquei no aeroporto todo tempo olhando pelos lados, imaginando que você apareceria como naqueles filmes românticos clichês que sempre terminam com um final feliz. Mas você não veio.
- Por que eu não sabia! – foi impossível não a interromper. Frustração e indignação causando uma revolta dentro dele.
"Deus! Como ele teria dado tudo para conversar com ela aquele dia!"
- Agora eu sei, mas naquela época não Robin, e não poderei nuca descrever o quanto machucou – abaixou a cabeça e limpou o rosto com uma das mãos, voltando a encará-lo – Eu não queria partir, não queria criar uma criança sozinha, eu tinha imaginado tudo bem diferente e foi difícil aceitar que aquela seria minha realidade. Eu tinha sonhado em um futuro ao seu lado e tive que me conformar com a ideia de que você não queria o mesmo comigo.
- Regina, era tudo o que eu mais queria!
“O que ainda quero!”
Foi o que quase saiu da sua boca, mas, já não sabia se era o que queria mesmo, estava tão perdido que sua única certeza, era que queria conhecer sua filha. Ele e Regina já não poderiam voltar a acontecer. Independentemente de como terminasse aquela conversa.
- Era tudo o que mais desejava também Robin, mas fomos privados de ter isso. E eu sinto tanto, mais tanto – Regina o encarava com uma expressão de profundo pesar, a qual não passou despercebida ao advogado sentado ao seu lado – por não ter confiado na sua palavra e por ter escondido a gravidez e consequentemente Louise. Eu tinha um acordo com meu pai, não deveria procurá-lo nunca, foi a condição dele para me ajudar e então a mudança para cá. Meu coração machucado só pensava que quanto mais longe de você eu estivesse, melhor seria. Foi o que eu acreditei na época, me perdoe por isso, sei que o privei de muita coisa, mas tudo o que eu acreditava era que você estava vivendo seu casamento de contos de fadas, criando seu filho e sendo feliz com outra mulher. Não ousei nem mesmo saber sobre sua vida pois temia ver a possível felicidade que você compartilhava com outra pessoa e te odiei por isso. Sei que fui uma covarde, mas essa é a verdade.
Robin soltou uma pequena risada de incredulidade. Felicidade? Ela realmente não tinha ideia do quanto sua vida tinha sido o contrário daquilo. Totalmente monocromática, justamente porque ele não a tinha. Compartilhou pequenos momentos de alegria com as pessoas que agora ele considerava família. Mas, felicidade? Foi muito longe daquilo.
- Regina, você sabe o que eu fiz assim que sai da sua casa? – ela apenas discordou com um movimento de sua cabeça – Fui até minha mãe e fiz o que sempre te prometi que faria, renunciei minha herança e me mudei para Nottingham apenas com algumas economias – fora impossível não se surpreender com sua confissão – Conheci amigos em um bar e eles se tornaram minha família, depois abrimos um escritório juntos, sei que tem um nome de merda – ela soltou uma risada em meio as lágrimas que ele acompanhou – mas aquela é a cidade do Robin Hood e parecia muito apropriado para um grupo de advogados que ajudavam pessoas pouco abastadas. Eu estive muito longe de tudo o que você imaginou.
- Oh Deus Robin, eu sinto muito, muito mesmo – Voltou a chorar. Mas dessa vez, copiosamente. Ele tinha feito tudo o que havia prometido. Ela até ousou, por rápidos segundos, imaginar-se ao lado dele, vivendo aquela vida, junto com Lou Lou e lhe pareceu tão perfeita que não conseguia mais conter o choro – eu deveria ter confiado em você – falou em meio aos soluços.
- Sim, você deveria – a voz dele saiu embargada – E ainda dói saber que você não o fez. Dói porque eu passei um ano desesperado rastreando seu nome nos arquivos de incontáveis universidades americanas e os outros quatro esperando com todo meu coração te encontrar.
- Oh Robin – olhando para ele, pode ver que sua face também estava tomada pelas lágrimas, tristeza estampada em cada pequeno traço, um reflexo seu e acabou por cobrir o rosto com as mãos, deixando algo exposto que chamou a atenção do loiro. "Ela tinha mantido o anel de noivado até hoje? O que aquilo significava?" – você poderá me perdoar algum dia?
- Era para ter sido tudo muito diferente não é mesmo? – sorriu de lado, novamente sem humor algum, pensando em como o destino tinha sido injusto e cruel com eles. Puxando um suspiro profundo para acalmar as coisas dentro de si, prosseguiu – e agora que sei de tudo isso, consigo encontrar um lugar no meu coração para começar a perdoá-la. Está muito claro que nós dois fomos vítimas da maldade dos nossos pais e a pessoa mais prejudicada em toda essa história, acabou sendo a mais inocente, nossa filha – ela concordou, sentindo o coração bater mais forte ao ouvi-lo dizer “nossa filha”. Era tão certo – por ela, eu quero que possamos conviver em paz, pois essa manhã, quando saí daquele escritório, estava decidido a fazer você sofrer como eu estava sofrendo – soprou o ar, fechando os olhos e expulsando os sentimentos ruins que queriam revisitar seu coração e tomar posse dele – comecei a imaginar tudo o que eu perdi na vida de Louise, e estou tentando não focar nisso, lembrando que eu não sou o tipo de ser humano que faz os outros sofrerem, especialmente quando esse alguém é você – acenou esperançosa, sem entender bem o que aquilo significava – E saber que você estava procurando por mim ajudou na minha decisão.
- Como você soube? – Regina o indagou surpresa.
- Você não se perguntou como eu vim parar aqui? – vê-lo diante da sua porta fora tão inesperado, que não se atentou ao fato de como ele tinha chegado até lá.
- Quando eu estava saindo da sede da Locksley em Londres, topei com um ex colega de classe, ele me disse que fazia um tempo que Kilian me procurava e me entregou um número de telefone, me pedindo para entrar em contato pois ele tinha urgência em falar comigo. No momento não associei Kilian a tudo isso, depois, com mais calma me lembrei que ele costumava namorar Emma e poderia saber de alguma coisa, foi quando fiz a chamada e descobri que eles estavam casados e que você estava me procurando para falar sobre a menina. Emma me deu seu endereço, sob ameaças devo dizer – Regina soltou uma risada inesperada no meio de uma fungada – e voei até aqui para tentar reparar as coisas – hesitante, prosseguiu – Você vai me deixar ser um pai para ela?
- Claro Robin! – as linhas de expressão em sua testa suavizaram e ela lhe ofereceu o melhor sorriso que podia em meio à confusão de lágrimas que ela tinha se tornado – Isso é tudo o que Louise mais quer, ela sonha em conhecer o pai e me pedia sempre, foi por isso que decidi procurá-lo, eu iria me dedicar mais a isso nas minhas férias, quando esse último caso terminasse. Jamais imaginei que meu último caso fosse contra você.
- Muito menos eu – trocaram um olhar compreensivo e Robin levantou os ombros – Espero que possamos conviver harmonicamente pelo bem dela. Não vou ser falso, nem mentir, ainda estou chateado e sei que você certamente tem suas queixas contra mim, pois errei muito lá atrás e teremos um longo caminho pela frente, mas vamos deixar o passado aonde deve estar por ela, certo? – ele estendeu sua mão, como quem estende uma bandeira branca em um conflito, tomando a dela que estava largada sobre o sofá, apertando-a.
- Sim – Regina sorriu, olhando primeiro para as mãos unidas e por um instante, permitiu-se esquecer do mundo ao seu redor e apreciar o calor que tomou aquela parte sua com aquele pequeníssimo contato. Quando se voltou para fita-lo, aquela sensação se expandiu por todo seu corpo. Ele lhe ofereceu um sorriso e finalmente ela relaxou, sentindo que o peso que carregou por longos cinco anos finalmente a estava deixando. Mantendo o aperto, reforçou – agora que não existe mais um segredo entre nós podemos recomeçar, por Louise. Obrigada por escolher seguir a estrada do perdão.
- Você também vai seguir essa estrada comigo? – ainda encarando-o ela se viu meio perdida a respeito do que ele falava, inclinando um pouco a cabeça, fazendo uma pergunta silenciosa que ele entendeu – Eu nunca soube se você pode me perdoar por aquela noite com Marian...? – Regina fez um perfeito O com a boca, surpresa pela pergunta. Mas a respondeu serenamente:
- Acho que nós dois combinamos em deixar o passado para trás, você escolheu começar a construir uma ponte para acabar com esse abismo que criamos Robin, seja pelos nossos próprios erros ou induzidos por outras pessoas – Regina nem percebeu, porém começou a acariciar com o polegar a mão dele que estava mantendo, lhe dando um sorriso encorajador – não deixarei que a construa sozinho, eu começarei a construir aqui do outro lado, em algum momento nos encontraremos no meio do caminho e a ponte estará finalmente pronta.
O loiro sorriu e colocou a mão livre sobre as mãos já unidas, reforçando que estava bem com a decisão que estavam tomando. Não tinha mais nada a ser adicionado, pelo menos não naquele momento. Todavia, não queria desfazer o contato, não ainda. Eles só continuaram ali, olhando dentro dos olhos um do outro, vendo uma ou outra lágrima teimosa cair, sentindo a espessa áurea entorno deles se tornar mais leve. Tanto que ele a surpreendeu, vencendo o espaço existente e a abraçando.
* * *
Robin estava se sentindo exausto, depois dos extremos pelos quais tinha transitado aquele dia, encarar Regina e dialogar tinha sido o ápice. Suas emoções estavam a flor da pele, mas o final daquela conversa tinha sido incentivador. Ele se atreveu até mesmo a abraça-la. Não saberia dizer o que o guiou exatamente, talvez o cansaço, misturado a crescente sensação de compreensão que desenvolveram, então, não pensou muito, apenas seguiu o coração. Ele a manteve perto e Regina encostou a cabeça em seu peito soltando um suspiro. “Ela estaria chorando?”. Sua vontade era só mantê-la ali com ele e sentir seu calor, nem que fosse desajeitado como estava sendo. Ela não refutou e ele só aproveitou tê-la em seus braços por mais um pouco.
Talvez fosse seu inconsciente pedindo uma despedida. Já que parecia absurdo ter esperado tanto para vê-la e nem menos abraçá-la porque estava magoado. Passaria por cima do seu orgulho e se deliciaria com o cheiro fresco de maçã dos cabelos escuros e recém lavados, que agora estavam muito próximos do seu nariz. Estavam bem mais curtos, era verdade, entretanto, o corte lhe caia maravilhosamente bem. Não resistindo, lhe acariciou a ponta de uma mecha, delicadamente, sentindo falta dos cachos longos. Mas nada disse, nem ela. Só aproveitaria a sensação mais um pouco. Pois seria última vez. Quis sentir-se triste, mas lembrou-se de Louise e sorriu. E daí que não existiria mais eles? Seu maior interesse agora era sua filha e a ideia de que ela estava há um ou dois cômodos de distância o deixava excitado e apreensivo.
Deixou seus olhos passearem pelo ambiente uma outra vez, procurando por qualquer foto da menina, quando se ateve a algo na mesinha de centro. Era uma foto de sua filha e Regina... Envoltas no abraço de outro cara. O namorado dela. Engoliu a seco, sentiu-se um idiota, ela não era mais a sua garota, ela tinha outro para chamá-la assim e mantê-la tão perto só aumentaria a dor em seu coração, então rompeu com abraço, quebrando a pequena conexão criada ali:
- Então você seguiu em frente? – pegando seu olhar na foto que continha ela, Daniel e Louise abraçados, Regina se sentiu muito embaraçada.
“Deus! Ela teria mesmo que responder aquela pergunta?”
- Robin, eu...
- Deixa para lá, isso não é assunto meu. Desde que ele seja bom para minha menina, estou bem com isso – era tão mentira que sentiu um gosto áspero em sua língua. Seria uma tortura vê-la com outro homem. Tentou até sorrir, mas não tinha certeza se suas expressões colaboraram. Isso era só mais uma prova de que também precisava seguir em frente, focar em construir um relacionamento com Louise e não ansiar nada mais.
- Ele é um bom homem, para nós duas – o loiro se controlou para na revirar os olhos, como ela sempre fazia – estamos juntos há pouco menos de um ano, nos conhecemos no trabalho, não foi algo esperado, ele se aproximou e quando eu vi, nós duas já o adorávamos – Robin começou a se perguntar o porquê de ter pedido por aquilo, agora teria que ouvir Regina falar o quanto amava outro homem – me desculpe.
- Você não precisa se desculpar por isso – ele lhe deu um meio sorriso, mas era totalmente sincero – eu preciso ir agora, está bem tarde e ainda preciso ver se David não voltou para casa e desfez a reserva no hotel. Me passa seu número, precisamos conversar sobre como faremos para dizer a ela, quero muito conhecê-la.
- Qual hotel?
- Mayet – respondeu.
- Mas é do outro lado da cidade! Está tão tarde para você sair por aí em um lugar que não conhece – mordeu a ponta polegar enquanto considerava algo – Já são mais de meia noite – soltou um pouco apreensiva em oferecer o que estava pensando – Por que você não fica? Podemos contar para Lou Lou sobre você amanhã pela manhã quando ela acordar. Se você estiver bem com isso.
Robin ponderou. Seria uma boa ideia? Ele não saberia dizer e estava cansado demais para refutar. Com a única intenção de ser apresentado a sua filha quando o dia seguinte começasse, ele aceitou o convite.
- Ok – suspirou, sentindo o cansaço tomar conta dele – obrigado.
- Eu não tenho um quarto de hóspedes, mas esse é um sofá cama muito confortável segundo Emma – ele riu – espero que não se importe.
- Claro que não, você já está sendo muito gentil. Eu gostaria de tomar um banho, se não for muito incomodo.
- Não é incômodo nenhum – reparando que ele não tinha consigo uma mochila ou bolsa de viagem, pediu – você trouxe algo limpo para vestir?
- Foi a última coisa que pensei quando pulei de um avião para outro durante o dia.
- Ok, venha vou lhe mostrar aonde fica o banheiro e lhe dar uma toalha. Talvez eu tenha algo para você usar – ele quase soprou um riso ironicamente dizendo que não usaria nada do francês engomadinho, mas achou mais prudente apenas segui-la e quando ela lhe entregasse as roupas refutaria. A morena saiu andando pelo pequeno apartamento e ele a acompanhou.
Quando Regina entrou em um quarto que ele acreditou ser o dela, parou, percebendo que tinha uma porta entreaberta do outro lado do corredor, com uma luz fraca saindo de lá. Com certeza era o quarto de Louise. Se atreveu a espiar, colocando a cabeça para dentro e suspirando ao avistar a menina dormindo em sua caminha. Ela parecia um anjo, uma pintura bucólica isolada em uma área do museu aonde ninguém ia, apenas ele, o céu estrelado do Maine nas noites de verão, a floresta de Nottingham na primavera, uma trilha sonora do Coldplay em meio a uma road trip pela costa marinha, ela tinha cheiro de paz e tranquilidade, de todas as sensações que acalmavam seu espírito quando se sentia aflito. Ela parecia a estrada a certa a seguir quando tudo parecia fora do lugar. Como agora.
- Você pode entrar para vê-la mais de perto se quiser – se assustou virando-se para encará-la – Ela também é sua – lhe deu um sorriso encorajador indicando o quarto com a cabeça. Ele voltou os olhos para a porta, agora aberta, considerando – vou arrumar o sofá, o banheiro fica ali no fim do corredor – apontou enquanto lhe entregava uma toalha e umas roupas – são do meu pai, penso que sirva para passar a noite. Se quiser eu lavo as suas, não tenho secadora, porém, se colocarmos perto do aquecedor elas secam até amanhã.
- Obrigado – Robin continuava a olhando, agradecido e envergonhado ao mesmo tempo por toda a gentileza. Ela percebeu porque ele começou a coçar a nuca e resolveu dar-lhe espaço.
- Vou deixá-lo em paz. Se precisar não hesite em chamar – ela foi em direção a sala e o deixou ali, parado em frente ao quarto de Louise. Com um impasse na cabeça.
* * *
Robin preferiu fazer uma ducha primeiro e lavar todas as energias ruins que tinha pairado sobre ele antes de entrar no pequeno espaço de sua filha. Não queria carregar nada de pesado para aquele pequeno reino de tranquilidade que tinha espiado alguns minutos antes. Estava olhando o conjunto de moletom do homem que tinha sido responsável por parte daquele desastre e quis rir, o destino não cansava de cuspir na sua cara. Enquanto se secava, considerou até mesmo não vesti-lo, mas do que adiantaria aquele orgulho bobo? Tirando o fato que já havia entregue suas roupas sujas à Regina, então ou eram as roupas de Henry ou sair de toalha. O que seguramente não agradaria sua ex namorada.
Se encarou no espelho, seus olhos ainda estavam bastante vermelhos, não tinha o que ser feito, apenas uma boa noite de sono. O que ele duvidava que teria. Dormir seria difícil com tanto em sua mente. Pegou um pouco do enxaguante bucal que viu na prateleira e lavou sua boca, deixando o banheiro em seguida. Regina não estava mais a vista, possivelmente tinha entrado em seu quarto. A porta do quarto de Louise continuava aberta e ele se encostou no caixilho branco, analisando cada cantinho com interesse.
Era tudo tão lúdico e o azul predominava pelo ambiente. O papel de parede com notas musicais chamou sua atenção. Ela gostava de música? Tocava algum instrumento? Não vendo nada além de um Ipad também azul apoiado sobre uma caixinha de música, imaginou que não. Perguntaria se ela tinha vontade aprender, poderia ensiná-la, seria uma boa forma de iniciar um relacionamento com ela. Fez uma nota mental para não esquecer disso.
Quanto mais adentrava o quarto, percebia o quanto aquela menina era especial. Tudo naquele quarto parecia ter um significado, ela com certeza era um serzinho cheia de opinião como sua mãe, mas também tinha um espirito livre e aventureiro como o seu, não tinha certeza, mas as fotos que acabou vendo, dela com Emma, os avôs e Regina lhe deram uma boa leitura da personalidade de Louise Mills.
Caminhou até parar em frente a caminha de solteiro branca, estava repleta de diversos bichinhos de pelúcia, mas a girafa, que ele já havia contado ao menos três espalhadas em outros cantos, certamente era seu preferido. Encontrou um espaço vago entre a borda da cama e a barra de proteção, sentando-se ali.
Levou um tempo apenas observando-a, analisando seus traços, ele era Regina quase que da cabeça aos pés, as suas características mais marcantes que sabia que ela tinha herdado, com ela dormindo não eram visíveis. Os olhos e as covinhas. Mas observando melhor, pode perceber como a boca era muito mais parecida com a sua e o recorte do queixo também, sorriu. Ela estava dormindo tão serena, alheia a todos os problemas que a circundavam. E ele faria de tudo para que sempre fosse assim.
Ainda hesitante, muito vagarosamente acariciou sua bochecha com dois dedos, sentindo a maciez da pele rosada. Suspirando com o quão linda era sua criança. Parecia surreal, ele tinha mesmo uma filha. Vendo que ela tinha um sono tão pesado quanto o seu, tomou sua mãozinha, beijando o dorso e sussurrando uma promessa:
- Seu pai está aqui agora sweet girl. Eu cuidarei para que sempre se sinta especial e você será amada até o meu último suspiro – se inclinou e beijou sua testa, deixando cair uma lágrima sua no rostinho pacífico dela. O que ele não pode perceber, por estar muito focado em sua filha, era que Regina tinha vindo dizer que estava indo dormir e se deparou com a cena. Ela quis se virar e lhes dar privacidade, mas não conseguiu. Ver Robin com Louise a hipnotizou e se manteve ali, o coração batendo em um compasso particular, liberando um tipo de sentimento que ela ainda não tinha experimentando por ele. Mills não saberia dizer o que sentira, que sensação de serenidade arrebatadora era aquela, entretanto, depois ela compreenderia, que aquilo, aquele sentimento pulsando dentro dela, tinha o poder de harmonizar um caos. Aquilo, era amor em sua forma mais pura.
“Porque você é um pedaço de mim, que eu desejo não precisar, numa perseguição implacável, ainda luto sem saber o por que... Se o nosso amor é uma tragédia, por que você é meu remédio? Se o nosso amor é insanidade, por que você é minha lucidez?”
Clarity - Zedd
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