Nova Iorque, 2016
Esgueirando-se pela janela do décimo andar do Hospital Central de Nova Iorque, em meio ao silêncio da madrugada, Natasha esforçava-se para manter a escuridão sem nenhum ruído e passar desapercebida dentro daquele quarto, como fizera também nas outras quatro noites anteriores àquela.
Mesmo após a queda da Shield, as missões para os Vingadores aumentaram consideravelmente, pois sempre havia algum dissidente da Hidra que não tinha sido capturado anteriormente e aparecia tentando vender algum objeto ou experimento secreto roubado por eles para algum terrorista ou governo que estivesse disposto a pagar o preço cobrado. Apesar de bem treinados, geralmente não passavam de humanos normais, facilmente derrotados pelos poderes dos heróis. No entanto, a última missão tinha sido difícil, pois a quadrilha era formada por ex-agentes nível 10, que tinham em suas mãos um lote inteiro de armamento especial, feito com tecnologia alienígena. A batalha foi dura e os Vingadores saíram bastante feridos, incluindo ela mesma. Sua perna ainda não estava totalmente recuperada e escalar a parede externa do edifício do hospital todos os dias não estava ajudando. Mas ela não se importava. Afinal, a ferida na perna era pouco perto de perder a vida. E ela teria perdido se não fosse por ele, de novo. Em um momento crucial da batalha, quando ela não tinha mais chance de defesa, ele mais uma vez apareceu com seu escudo para salvá-la do perigo. Porém, ele conseguiu protege-los de apenas um dos golpes que, por ter sido muito forte, fez com que o escudo voasse longe, obrigando-o a usar o seu próprio corpo de escudo. Ela não se feriu gravemente, no entanto, ele ficou entre a vida e a morte.
Passada quase uma semana, o perigo de morrer já era inexistente e o soro proporcionava uma recuperação espantosa ao Capitão. No entanto, mesmo sabendo que o pior havia passado, Natasha seguia religiosamente com as visitas noturnas ao quarto 107, para acompanhar a recuperação dele e velar seu sono.
Após passar alguns momentos mirando diretamente o semblante aparentemente sereno de Steve Rogers, ela puxou uma cadeira e sentou ao lado de seu leito, pensando em tudo o que já tinha acontecido entre os dois até aquele momento. E após muita reflexão, chegou a uma conclusão óbvia, porém, que a assustava e ainda tentava, inutilmente, negar: ela o amava.
Seu coração se despedaçou quando ficou sabendo que corria o risco de perdê-lo para sempre. Ficou sem chão só de pensar que poderia não mais se ver no azul profundo dos olhos dele ou ver sua face ruborizar após alguma piada de duplo sentido. Sentiu o desespero tomar conta de si ao perceber que poderia não tê-lo mais ao seu lado em missões ou batalhas. Quem mais seria seu porto seguro?
Como se tivesse escutado seus pensamentos gritando na sua mente, ele mexeu-se um pouco na cama, fazendo com que Natasha ficasse alerta, pronta para sair dali rapidamente. Ela aguardou mais alguns poucos segundos, até certificar-se que ele de fato ainda dormia, e se reaproximou da cama. Passou delicadamente os dedos pelos fios louros de seu cabelo por diversas vezes, descendo-os após para a face dele. Tirou a mão de seu rosto e usou-a para apoiar-se, debruçando-se por cima dele delicadamente, de forma que seus lábios se tocassem suavemente. Ela fechou os olhos e saboreou a sensação maravilhosa de tê-lo ali, apenas para ela e imaginou como seria perfeito se ele correspondesse todas as vezes que ela o tinha beijado nessa última semana, ou todas as vezes em que sentira vontade de fazê-lo, nos últimos meses. Afastou-se assustada ao notar que essa vontade estava se tornando cada vez mais frequente e maior nesse último período. Caminhou novamente em direção à janela com os batimentos acelerados, mas isso não era devido ao som de vozes que ela ouvia se aproximando no corredor, mas sim, devido à certeza de que ele ocupava seu coração de uma forma que ninguém nunca tinha ocupado antes. E isso era algo que ela não sabia se ainda estava preparada para sentir.
XXX
Nova Iorque, 2023
Denvers puxou bruscamente Loki para que ele se levantasse, fazendo com que o grupo ao seu redor se afastasse, dando-lhes espaço.
- Não vai pedir nada para beber dessa vez? – Stark perguntou irônico, colocando a mão no ouvido, como que fazendo força para escutar algo que Loki estivesse falando – Me desculpe, mas não ouvi a sua piada sarcástica. Ah, espera! É porque não teve uma piada dessa vez.
Loki sentiu o ardor da frustração tomar seu coração e o ódio borbulhar em seu sangue por ter fracassado mais uma vez. Seu plano era perfeito, e ele chegou muito perto de conseguir o que queria, porém, por mais que não quisesse admitir, sabia que agora seria muito difícil reverter a situação. Era isso. Estava acabado.
- Tire logo esse traste daqui antes que eu deixe minha compaixão de lado e acabe de uma vez com a raça dele... – Stark completou.
- E o que vamos fazer com ele? – Sam perguntou.
- Deixem comigo – Thor disse – Vou levá-lo de volta a Asgard, de onde nunca deveria ter sido.
- Asgard? A mesma Asgard que foi destruída por Thanos? – Rocket questionou.
- Não. A Asgard de 2012, para onde ele deveria ter ido desde o início e de onde me encarregarei que não saia.
- E gastaremos partículas Pym apenas para mandar esse louco para 2012? – Clint falou.
- Na verdade, já teríamos que dar um pulinho em 2012 de qualquer forma, para devolver a joia que esse larápio aqui pegou... – Stark completou, dando um tapa na cabeça de Loki, que enfureceu-se ainda mais e cerrou os dentes.
Peggy sentia-se desolada e, ao ver que Loki estava controlado, correu para perto de Steve e ajoelhou-se ao seu lado. Tudo o que lhe vinha à mente era o rosto de sua filha e como ela faria para explicar que o pai não voltaria mais para casa. Abaixou a cabeça e começou a chorar, não fazendo questão alguma de esconder a tristeza imensa que sentia por perdê-lo de novo, bem na frente de seus olhos.
Ela via todos os momentos que passara junto dele diante de seus olhos como em um filme. E como em todo filme, havia a parte boa, a parte dramática, a triste, a de comédia e o fim. E ela sabia que o fim deles já tinha se desenhado mesmo antes dele morrer. Na verdade, por mais que não quisesse e que lhe doesse admitir, ela sabia que tinha o perdido na guerra, quando ele caiu no mar heroicamente, a bordo de um avião. Quando ele voltou, ela sentiu-se renovada e viva, porém, não demorou muito a perceber que havia uma nuvem entre eles, algo que não permitia que ele fosse seu plenamente. E quando Natasha apareceu, ela conseguiu enxergar com nitidez, percebendo que a nuvem, na verdade, era uma pessoa, um fantasma que nunca deixou de estar ali.
Ver os dois juntos em batalha lhe machucou ainda mais, pois ela pôde perceber mais que sincronia e treinamento. Ela pôde perceber duas partes que se completavam, que se encaixavam e que ainda se queriam. E podia ser exagero, mas ela não tinha certeza se a dor de perdê-lo pra ela não era equivalente à de perdê-lo pra sempre. Peggy era prática e objetiva, analisava os fatos com frieza. Por isso, já sabia em seu íntimo, embora não quisesse admitir, que nem mesmo uma filha poderia matar o forte amor entre aqueles dois. Ela realmente achava que era apenas uma questão de tempo para que ficassem juntos. E de certa forma, sua decisão de ir ao futuro tinha a ver com isso também. Poderia de alguma forma, impedi-lo de deixar tudo para trás para ser feliz. E não seria egoísmo querê-lo para si, impedindo que fosse atrás de sua felicidade? Sim, era egoísmo. Mas isso agora não importava. Não mais.
- Me desculpe, não consegui te proteger e nem te salvar. – Peggy falou, limpando as lágrimas – Eu espero que possa me perdoar... – completou, colocando a mão no peito dele, sem seguida – Gostaria de ter mais uma chance, eu... queria ao menos tentar te fazer feliz... Me perdoe...
Peggy olhou em direção da ruiva, mirando-a nos olhos. Suas lágrimas eram de tristeza sim. Mas também eram, de certa forma, de inveja. Ela gostaria de ter sido merecedora do amor que a espiã tinha.
Natasha, por sua vez, estava alheia a tudo e não percebia a mirada da outra sobre si. Ela ouvia tudo o que se passava a sua volta, mas sem nada escutar. E até percebia o movimento de todos, mas sua atenção estava totalmente voltada para o corpo de Steve Rogers caído no chão. E ela não conseguia pensar em nada que não se resumisse ao fato de que mais uma vez o perderia, que ficaria sem tê-lo ao seu lado. E dessa vez, seria para sempre. Sentia-se tão desolada que não tinha forças para impedir a teimosa lágrima que queria escorrer de seus olhos há tempos. Ao ver Peggy ali, cerrou os punhos, tentando conter sua frustração: ela nem poderia se despedir dele como gostaria, afinal, a esposa dele estava ali.
- Deus, por favor... – Natasha rezou consigo – Não o tire mais uma vez de mim. Se não sou merecedora de ficar com ele, que ao menos ele possa seguir sua vida e ser feliz. Já me dou por satisfeita se puder ao menos olhar aqueles olhos azuis uma vez mais...
Como se Deus por milagre a tivesse ouvido, Peggy sentiu em sua mão o fraco batimento cardíaco de Steve. Arregalou os olhos e aproximou-se mais, pensando ter sido apenas impressão sua. Ele tinha perdido muito sangue, não podia estar vivo. E ao debruçar-se um pouco mais sobre ele, escutou um gemido baixo e viu o rosto retorcido de dor do Capitão América contrair-se enquanto ele mexia a cabeça para o lado vagarosamente.
- Está vivo! Você está vivo! – Peggy gritou, exaltada, chamando a atenção de todos. Era a vida lhe dando uma segunda chance, a chance que ela tanto havia pedido.
Natasha sentiu-se transbordar de alegria e sua expressão se transformou de tristeza profunda para um sorriso aliviado. De repente, a vida tinha voltado a ficar colorida. Deus, pela primeira vez, tinha ouvido suas preces.
- Alguém! Ele precisa de ajuda! – gritou a ruiva, sendo prontamente atendida pelo Dr. Estranho, que se deslocou até mais próximo do loiro e, com sua magia, fez o corpo dele levitar do chão.
Loki ficou com a expressão ainda mais sombria ao notar que o Capitão América estava vivo. Nem ao menos essa vitória ele havia conseguido. Porém, percebendo o momento de distração de todos, resolveu arriscar uma última manobra. Sabia que não tinha como reverter aquele jogo, mas não permitiria que os Vingadores saíssem ilesos de tudo isso: ele não tinha mais nada a perder.
- A única pessoa que precisará de ajuda será você, Viúva Negra! – Loki gritou, aproveitando-se da distração de Denvers para se movimentar rapidamente, golpeando Stark e pegando o báculo – Graças a você, o plano que passei anos para executar foi por água abaixo. Mas eu não irei ao inferno sozinho!
O que aconteceu depois, passou-se em uma fração de segundos. O tempo suficiente apenas para que todos voltassem seus olhos na direção do asgardiano, sem nada poderem fazer. O deus teletransportou-se de forma instantânea na direção de Natasha, e nem ela nem os demais conseguiram ter reflexo suficiente para tirá-la de lá.
Naqueles milésimos de segundos antes do fim, a vida da ruiva passou em sua cabeça como um flash, terminando com a visão do Capitão América se mexendo no chão, ainda com um suspiro de vida. Ela fechou os olhos e lembrou-se dele sorrindo. Essa seria a última imagem que teria dele. Essa seria a última imagem que teria na vida. A imagem de seu eterno salvador, que dessa vez, não conseguiria salvá-la. Era isso. A vida não tinha lhe dado mais uma chance. Ela realmente não merecia ser feliz.
- Eu te amo, Steve. – falou baixinho para si, preparada para o golpe final.
Ninguém poderia fazer nada, estava tudo perdido. No entanto, alguém fez. Alguém que percebeu toda a movimentação do deus da trapaça enquanto todos estavam distraídos.
Foi tudo rápido demais. Em um momento Natasha estava na direção da lança de Loki. Em outro, estava no chão, empurrada por outra pessoa que deixou-se acertar em seu lugar.
- O quê? Por quê? – Loki indignou-se, tirando a lança da pessoa à sua frente enquanto tomava mais um golpe certeiro de Denvers, que o jogava para longe. O deus voou e atravessou a parede do complexo dos Vingadores, caindo desacordado, com seu báculo ao seu lado, que foi imediatamente pego pela teia de Peter, e jogado nas mãos de Thor.
- Acho que isso acaba por aqui. – Peter respirou aliviado quando notou que tanto Thor quanto os demais agora olhavam todos na mesma direção, na direção daquela que tinha salvado a vida da Viúva Negra.
- Não! – Natasha gritou, enquanto levantava-se do chão e corria na direção da aglomeração de pessoas.
Empurrou uns dois ou três até cair ao chão de joelhos, na poça de sangue já formada.
- Peggy... por que fez isso? – perguntou a ruiva, levantando a cabeça da morena, que estava no chão.
Peggy suspirou e sorriu. Quando percebeu o que estava prestes a acontecer, naquele curto espaço de tempo, teve que tomar a difícil decisão de viver e tentar abraçar a segunda chance que teria, ou fazer o que que seu coração sempre a guiou para fazer, e que foi o princípio que a norteou e guiou para criar a Shield: arriscar-se para salvar a vida de alguém que não merecia morrer. Ainda que esse alguém fosse a única ameaça a sua felicidade. Doeria abrir mão de tudo. Mas seria terrivelmente avassalador conviver com a dor de Steve por perder Natasha, principalmente sabendo que ela poderia ter feito alguma coisa.
- Eu... fiz o que tinha que fazer... – ela falou, já com a voz baixa – O que ele gostaria que fosse feito... – ela sorriu fracamente, olhando o corpo de Steve ser carregado com cuidado por Stephen Strange para longe dali.
- Não... Você tem uma filha... – Natasha falava com lágrimas no rosto e na voz.
- E ela tem um pai... – Peggy falou quase sem força. E segurando na mão de Natasha, completou – Prometa para mim que vai cuidar dele. Ele vai precisar de você. Ele sempre precisou.
- Eu... não posso.
- Mas é claro que pode... Só você pode... Natasha... prometa para mim.
- Eu... eu prometo. – A Viúva Negra falou aos prantos.
- Bom... Obrigada. – Peggy sorriu, piscando os olhos longamente, antes de fechá-los para sempre.
- Não... Peggy! – Natasha chorava copiosamente com a cabeça da agente em suas mãos e o corpo sem vida dela no chão. Loki podia não ter atingido seu objetivo, mas tinha conseguido destruir aquela vitória, deixando-a com um terrível gosto amargo para os Vingadores. E Peggy tinha cumprido com a missão mais difícil de toda sua vida: sacrificar-se pela felicidade de quem se ama.
XXX
Nova Iorque, 2023 – alguns dias após o término da batalha com Loki
Do lado de fora do complexo dos Vingadores, ainda semi destruído devido à batalha recente, Hulk fazia os últimos preparativos no túnel quântico que enviaria Thor e Loki novamente a 2012. Parou por um momento e suspirou profundamente olhando o deus do trovão segurar fortemente no braço do irmão de criação, que estava preso com algemas mágicas, as mesmas que o haviam prendido em Nova Iorque, da primeira vez. Foi inevitável não lembrar-se de que há alguns meses ele estava ali, naquela mesma posição, preparando o retorno do Capitão América para devolver as joias do infinito. Foi o fim de uma batalha e o início de outra, embora ninguém soubesse disso à época. E tudo o que ele sinceramente esperava é que, dessa vez, tudo realmente tivesse um fim.
- Passarão apenas alguns segundos para nós, mas para você, será muito mais tempo. – Banner alertou – Assim que devolver Loki, mentalize onde deve retornar a joia da mente e siga com o plano. Quando finalizar tudo, apenas aguarde o bip do relógio. Será seu sinal para retornar.
- Não se preocupe, eu sei bem como isso funciona. – Thor falou sorrindo.
- Apenas não se perca por aí. Odiaria ter mais alguém que preferiu viver no passado. – Hulk finalizou.
- Nah, isso não vai acontecer... – Rocket interrompeu, vestido em seu traje quântico e se posicionando ao lado de Thor e Loki – Eu vou junto, para garantir que tudo saia certo dessa vez.
- Agradeço a ajuda, lebre, porém, isso não será necessário. – Thor reforçou.
- E eu não estou te pedindo permissão. – Rocket disse, encerrando o assunto – Ô Verdão, liga logo esse negócio aí.
- Eu só espero que tenha certeza do que está fazendo... – Hulk falou consigo, balançando a cabeça negativamente, enquanto fazia os últimos ajustes – Ligando em 3, 2...
E antes mesmo de ouvir o 1, Thor já se viu naquele cenário luxuoso e próspero de Asgard. A Asgard ainda inteira, aquela que foi seu lar e da qual ele se lembrava. Não pôde deixar de sentir uma ponta de tristeza. Era ainda muito dolorido saber que nada daquilo existia mais.
Como que lendo os pensamentos do asgardiano, Rocket questionou:
- Não vai amolecer agora, né?
- Não. Não se preocupe. – falou o loiro de forma séria, se recompondo – Vamos resolver logo isso e dar o fora daqui.
- É assim que eu gosto de ouvir. – Rocket comemorou – Agora, para onde vamos? E qual é o plano para devolver seu irmão?
Thor nada disse, ficando apenas a olhar para Rocket com cara de paisagem. O guaxinim bateu a mão na testa, indignado e balançou a cabeça negativamente – Você não tem ideia do que fazer, não é mesmo? Nem sequer elaborou um plano!
- Esse tipo de coisa não requer prática nem planos elaborados. – argumentou Thor – Eu conheço Asgard como a palma da minha mão, basta localizarmos algum dos caminhos secretos que nos levará à prisão e...
- E como exatamente o gênio pretende se esconder da sua própria e esbelta versão de 2012? – Rocket interrompeu, sinalizando com a cabeça que o Thor de 2012 se aproximava.
O loiro assustou-se ao dar-se conta do que estava ocorrendo e jogou Loki atrás de um muro, sentando sobre ele na sequência e puxando Rocket pelo rabo, ao que o guaxinim gritou:
- Ei, o que pensa que está fazendo?
- Quieta, lebre, a ideia é passarmos desapercebidos. – Thor falou, observando atentamente sua outra versão, ao longe desconfiar dos ruídos que estavam fazendo e olhando ao redor, como se procurasse algo, mas sem se aproximar da onde estavam.
Ouviu mais alguns ruídos e esbravejou, sussurrando uma vez mais para Rocket:
- Eu disse para ficar em silêncio! Quer que sejamos descobertos?
- Mas eu não falei nada!
- Mas se não é você... – falou Thor, notando que os barulhos seguiam – O que é então?
- Acho que seu irmão está carregando mais peso do que aguenta... – Rocket falou e sinalizou com a cabeça para Thor, que só então notou Loki já quase roxo por ter o loiro sentado sobre si.
O deus do trovão rapidamente saiu de cima do outro e virando-se na sequência para o Guardião das Galáxias, como se nada tivesse havido, e respondendo, fingindo irritação:
- Temos mais coisas com que nos preocupar além de fazer piadinhas... Como pensar em um plano.
- Você pode não ser preparado, mas eu sou. – Rocket falou, enquanto engatilhava sua arma – Estamos longe de onde pretende levar seu irmão?
- Não, é logo ali.
- Essa sua pança permite a você ser rápido?
- Sim, mas é claro! Eu sempre sou ágil e... ei!! Pança?
- Ótimo, era só o que eu precisava saber... – Rocket interrompeu, saindo de trás do muro. Vá, tranque esse doido no calabouço que encontrar e retorne para cá. Estarei te esperando.
Dito isso, o guaxinim mirou na torre de vigilância que ficava do lado do pátio externo do palácio, oposto da onde se encontravam. Atirou e acertou o adorno do topo da torre, chamando a atenção imediata do Thor de 2012 e do grupo que se encontrava com ele.
- Previsível... – Rocket falou consigo enquanto via Thor voar com seu martelo em direção ao ruído – Ei Gordão, parece que...
O guaxinim parou de falar ao notar que Thor já não estava mais ali, completando em seguida:
- É... ele ainda é ágil mesmo...
Quase do lado de dentro do palácio, Thor espreitava pelo muro, aguardando o melhor momento de entrar na região onde se encontravam as prisões. Mas por mais concentrado que estivesse, não desgrudava de Loki por um segundo sequer. Sabia que se abrisse qualquer brecha, certamente o irmão aprontaria alguma para tentar escapar.
E Loki realmente já tinha preparado alguns truques. Thor olhou para o irmão para certificar-se que ele estava ali, virou-se na direção dos guardas e, quando olhou novamente, assustou-se: Loki tinha se transformado em Jane Foster.
Thor arregalou os olhos e mirou bem no fundo dos olhos de Jane, que estavam vermelhos e lacrimejantes. Passou dois de seus dedos na face dela, que fechou os olhos e fez uma expressão de sofrimento e agonia, tentando comover o loiro. Thor abraçou Jane e falou em seus ouvidos:
- Como você me faz falta...
Loki sorriu e se preparava para esquivar-se de Thor, quando o deus do Trovão agarrou-o e jogou-o na frente dos guardas, gritando em seguida:
- Peguem a intrusa!
Os guardas olharam para Loki transformado em Jane no chão e correram na direção dele. Thor aguardou até que uma quantidade razoável de soldados aparecesse. A distração foi suficiente para que Thor saísse de trás do muro e, com poucos golpes, nocauteasse os guardas.
- Obrigado, irmão, sabia que não me decepcionaria... – Thor falou erguendo Loki do chão e caminhando apressadamente para dentro da prisão, agora, sem nenhum guarda à vista.
Caminhou com cautela pelos longos corredores, desvencilhando-se de mais um ou dois guardas que encontrou pelo caminho, de forma rápida. Encontrou o painel que liberava acesso a uma das celas vazias e acessou-o, rezando para que ainda se lembrasse da senha. Para sua sorte, um bip sonoro se fez e a cela foi liberada. Thor apenas jogou Loki lá dentro, travou a cela e, acenando com um tchauzinho, despediu-se do irmão, saindo apressadamente do palácio, deixando para trás o irmão e as recordações.
Não demorou muito, chegou atrás da coluna, onde Rocket o aguardava, impaciente.
- Achei que tinha resolvido ficar.
- E eu acho que temos que dar logo o fora daqui.
- Concordo. – Rocket falou, acionando o GPS – Mas antes, olhe bem para o seu eu de 2012 e tente usá-lo como inspiração.
- O quê? Por quê? – Thor perguntou, acionando seu GPS também.
- Quem sabe você não se lembra de como era poder enxergar os próprios pés quando está de pé.
Thor apenas balançou a cabeça sem nada responder e os dois sumiram, segundos antes do Thor de 2012 retornar e passar bem na frente de onde estavam.
XXX
2023, Nova Iorque – Algumas semanas após a batalha contra Loki
Na sala de espera do Hospital Central de Nova Iorque, Natasha batia a perna nervosamente no chão enquanto aguardava o médico que atendia Steve Rogers aparecer. Todos os Vingadores se revezavam no local diariamente, porém, Natasha era uma das únicas que não se afastava nunca de lá. Era muito difícil fazê-la comer alguma coisa ou mesmo sair para dormir. Clint era o único que se arriscava a aproximar-se dela para convencê-la a cuidar de si mesma e era o único que ela escutava.
E assim, como fazia todas as manhãs, lá estava ele com um copo de café grande em suas mãos e um pote com vários biscoitos da Laura, em uma de suas difíceis tentativas diárias de fazer Natasha sair de lá para comer.
- Por favor, Nat... Todo dia é a mesma coisa. Já disse que fico aqui até você voltar.
A ruiva suspirou sem nada dizer, apenas pegou a comida da mão de Clint e saiu a passos rápidos em direção ao refeitório.
Clint se jogou no sofá branco e confortável da sala, no mesmo local onde antes Natasha estava sentada. Abaixou a cabeça e colocou as mãos no rosto, bufando em seguida. Estava se sentindo esgotado e tudo o que desejava era abrir os olhos e perceber que isso era um pesadelo. Levantou-se e olhou para o lado e encontrou a mesma expressão perdida nos olhos de Sam e Bucky que, junto com Nat, eram os únicos que batiam ponto todos os dias ali.
Tamborilou os dedos nas pernas e então lembrou-se de que tinha trazido mais biscoitos. Tirou mais dois potes da sacola e entregou um para Sam e outro para Bucky, recebendo olhares de gratidão em resposta.
- Alguma notícia? – perguntou, tentando puxar assunto.
- As mesmas de ontem... – Sam respondeu desanimado. Bucky apenas seguia olhando para o nada.
- O médico ainda não passou aqui hoje?
- Era exatamente o que eu estava esperando quando você chegou. – Natasha falou, aparecendo repentinamente.
Clint espantou-se com a rapidez do retorno dela. Com certeza não haviam passado nem 10 minutos desde que ela havia saído, o que queria dizer que ou ela havia comido rápido demais ou que não havia comido. Achou melhor não comentar nada, não estava com disposição para dar ou ouvir sermão.
- Bem, eu já vou indo então. – Clint disse, levantando-se do sofá – Mais tarde eu volto. De qualquer forma, se tiver qualquer notícia...
- Te ligamos, pode deixar. – Natasha falou, aproximando-se de Barton e abraçando-o, em seguida – Obrigada, Clint. Por tudo. – concluiu, falando baixo em seu ouvido.
O Gavião Arqueiro nada respondeu, apenas acenou positivamente com a cabeça e partiu.
Assim que Clint se retirou, Natasha aproximou-se da grande janela da sala de espera do Hospital, que dava para um imenso jardim florido. Aquela paisagem lhe transmitia certa paz, e ela gostava de olhar para lá para tentar fugir por alguns segundos – minutos, com alguma sorte – daquela terrível realidade que vivia. A brisa que batia suave do lado de fora, naquela manhã ensolarada, balançava também os pensamentos e lembranças da Viúva Negra. Por mais que ela tentasse focar nos bons momentos e recordações, não lhe saía da cabeça quais teriam sido as razões que levaram Peggy a se sacrificar por ela, abrindo mão de Steve e da filha para salvá-la. E isso amargurava ainda mais seu coração. Quando Rogers enfim despertasse – e ela tentava firmemente acreditar que isso era apenas uma questão de tempo – como ela diria o que tinha acontecido? E o pior, o que ela diria à filha dele, caso tivesse que retornar ao passado sem seu pai e a mãe? O pai e a mãe que ela jurou proteger? Isso incomodava o coração da ruiva tanto ou mais que a possibilidade de perder Steve e, quando pensava nisso, ela logo balançava a cabeça, na tentativa de espantar esses pensamentos e manter apenas os beijos e carinhos.
Seu ciclo de desespero foi interrompido por passos próximos, que fizeram com que tanto ela quanto os outros dois Vingadores ali presentes se levantassem e vidrassem os olhos na direção do médico que ali chegara, cobrando sem palavras algum discurso que fosse diferente de “Não sabemos quanto tempo levará para que ele acorde e nem se ficará com alguma sequela”.
- Bom dia, Senhores. – disse o médico, com o mesmo ar sério. Sem receber resposta e notando o olhar ansioso sobre si, seguiu – Recebi agora os resultados dos exames que foram realizados ontem à noite e, infelizmente, ainda não temos nenhuma novidade.
Sam e Bucky se jogaram novamente no sofá enquanto Natasha ficou estática, anestesiada pelo que tinha acabado de escutar. E era sempre assim que ela se sentia quando o médico vinha com esse discurso de tempo. Ah, tempo! Como ela odiava ter que esperar! Sempre detestou, mas agora, parecia que a espera a consumia, pois era uma espera sem data para acabar. Podia levar horas – ou anos. Não tinha como saber.
Sem receber nenhuma pergunta ou comentário, o médico despediu-se e virou-se para sair. No entanto, foi interrompido pela súplica quase inaudível de Natasha:
- Doutor...
- Pode vê-lo, se quiser. Já sabe das regras, Srta. Romanoff. – respondeu o médico, sem olhar pra trás.
Natasha olhou para Bucky e Sam que concordaram com o olhar que ela fosse vê-lo. E assim, lá foi a Viúva Negra, uma vez mais, caminhando por aqueles corredores brancos e sem vida do Hospital, até alcançar o quarto onde repousava desacordado Steve Rogers.
Entrou no local tentando fazer o mínimo de barulho possível, como se qualquer ruído fosse capaz de acordá-lo e ele estivesse apenas adormecido. Aproximou-se da cama e esboçou um sorriso ao notar que ele já tinha bem menos hematomas que no dia anterior. Era impressionante o poder de cura do soro que corria em suas veias. Ela apenas desejava que ele também fosse bom o suficiente para curar a cabeça dele, despertando-o desse sono forçado.
Olhando-o ali, aparentemente sereno, foi inevitável não lembrar-se de anos atrás, quando ela entrava sorrateira naquele mesmo hospital para cuidar dele e rezar para que se recuperasse logo. Impossível também foi não lembrar-se de que foi neste momento que ela se deu conta de que o amava. Foi também quando ela sentiu-se perdida, por não saber como lidar com esse amor.
Arrastou a poltrona que estava próxima, de modo que pudesse se sentar de frente para ele, na cama, e ficou ali, a observá-lo, tentando não pensar em nada, mas sem conseguir interromper o ciclo de pensamentos de mais cedo. E estando sozinha, não conseguiu segurar as lágrimas oriundas do aperto que sentia no peito ao se lembrar novamente da pequena Natasha, que aguardava em 1955 ansiosamente pelo retorno dos pais. Permitiu-se chorar, baixinho, tentando não incomodá-lo com seus soluços.
“Não sabemos quanto tempo levará para que ele acorde e nem se ficará com alguma sequela”.
As palavras do médico se repetiam feito um mantra em sua mente. Ela sabia que ele estava sendo lógico, prático, objetivo, como ela sempre foi ensinada a ser, como ela sempre foi. Porém, dessa vez ela realmente desejava que seu coração tivesse razão e que sua intuição estivesse certa por lhe dizer que acalmasse o peito e aguardasse, pois tudo seria resolvido. Fechou os olhos e tentou rezar, porém, não conseguia articular uma oração inteira. Não era religiosa e neste momento, lamentava por isso. Tudo o que ela desejava era se lembrar de alguma prece, qualquer uma, para poder pedir aos céus que tivessem piedade dele.
Sua concentração na tentativa de conversa com Deus era tamanha que podia jurar ter ouvido a voz dele, ainda fraca e baixa, mas sem dúvida, a voz dele, ali, ao seu lado. Ainda de olhos fechados ela tentava em vão se concentrar sem pensar na possível voz que tinha ouvido quando novamente, escutou ele falar alguma coisa. Já com a plena certeza de que estava louca, abriu os olhos e viu que Steve se mexia na cama e balbuciava alguma coisa, palavras que ela não entendia. Mas não importava, ele de fato estava despertando.
Natasha sentiu o coração disparar e subir até a garganta e a emoção era tanta que sequer lembrou-se de acionar o botão que chamaria as enfermeiras. Ficou acompanhando sem piscar cada movimento lento que ele fazia, vendo seu sorriso se desenhar e aumentar gradativamente à medida que ela percebia que ele estava mais e mais próximo de acordar.
Quando os olhos dele finalmente se abriram e encontraram os dela, Natasha já sorria largamente e nem se incomodava mais por estar derramando muitas e muitas lágrimas na frente dele, que a observava curioso e confuso.
- Você... você voltou! – foi tudo o que ela conseguiu dizer enquanto segurava a imensa vontade de se jogar nos braços dele.
A ruiva tentou tocar a mão dele que estava sobre a cama, porém, ele afastou a mão, recusando o seu toque. A Viúva Negra fechou o sorriso e sentiu o coração doer. Ela não entendia porque ele não correspondia à mesma felicidade dela. Parecia não saber onde estava.
- Steve... eu... – ela tentou se explicar, como se de alguma maneira ele soubesse tudo o que tinha acontecido.
- Onde... eu estou? – ele perguntou, esforçando-se para ficar sentado na cama.
- Você está no Hospital Central.
- O que estou fazendo aqui? – ele perguntou confuso, olhando ao redor de forma assustada, como se não reconhecesse nada naquele lugar.
- Você ficou bastante ferido após a batalha e...
- Batalha? Eu... eu lutei?
- Sim, contra o Loki e... – Natasha olhou bem dentro dos olhos dele e notou um brilho diferente. Não era o Steve que ela conhecia. – Você... não se lembra?
Vendo que ele nada respondia e ainda olhava atentamente ao seu redor, como que analisando o ambiente, ela tentou aproximar-se e tocá-lo uma vez mais. Porém, ele se afastou novamente, dessa vez, de forma mais brusca.
- Steve... – Natasha suplicou – Você está bem?
- Eu... eu preciso sair daqui... – ele falou enquanto tentava se desligar dos fios e cabos que o conectavam aos aparelhos. Pela sua força, nem parecia que estava quase morto há alguns minutos atrás.
- Não, você não pode! – ela falou, tentando impedi-lo de sair de lá – Precisa ver o médico antes.
Steve parecia não escutá-la e seguia tentando sair. Natasha segurou a mão dele e foi barrada. Os dois começariam uma luta se ela não tivesse parado de tentar bloqueá-lo e se afastasse.
- O que há com você?
- Eu tenho que sair desse lugar! – ele falou alto, levantando-se da cama e caminhando em direção da porta. Natasha deu um salto e bloqueou a passagem, impedindo-o de sair.
- Eu não vou permitir que você faça isso. – ela falou firme, olhando fixamente dentro daqueles olhos, que lhe pareciam tão estranhos agora. Sem alterar a expressão e ainda agitado, Steve respondeu a ela com outra pergunta:
- E quem é você, afinal?
XXX
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.