POV. Hope
Tudo aconteceu em um piscar de olhos e sem que eu me desse conta ou entendesse o porquê, vi Josie se jogando contra a Penélope e logo depois e o som ensurdecedor de um tiro ecoando por todo o galpão, e por fim as duas ficaram imóveis no chão. Por instantes eu não respirei, apenas vi aquela cena se desenrolar.
Quando as duas caíram, coloquei o Thomas no chão e corri em direção as duas.
— Ei! — Chamei de dentro do carro. Ela pareceu não me reconhecer e continuou andando, e eu a seguindo com o carro. — Josie, sou eu, Hope.
— O que você está fazendo? — Falou enquanto continuava a andar.
— Onde você mora?
— Aqui perto.
— Perto quanto? Conheço todos que moram “perto” e isso não inclui você. — Continuei seguindo-a com o carro.
— Depois do lago.
— Mas são mais de dois quilômetros daqui. Entra no caro que te levo lá.
— Não precisa.
—Entra no carro Josie, ou você vai congelar antes de virar a esquina. Se fosse de dia tudo bem, mas a essa hora é fora de questão. — Ela continuou andando. — Será que terei que chamar o Sheriff? Você escolhe, ou entra no carro ou te faço passar a noite numa cela.
—Não durma, fique comigo. — Sussurrei para ela, mas ela não me respondeu. — Não ceda à vontade e de fechar os olhos, converse comigo, o que você estava fazendo naquela chuva?
— Fique acorda ok? Seja forte como eu sei que você é.
Eu queria dizer que era por ela que eu estava assim, mas não tive coragem.
—Josie! —Chamei tirando-a de cima da Penélope. Ela tinha o olhar fixo e estava completamente ensanguentada, procurei desesperadamente pôr o lugar onde a bala tinha atingido ela, mas não havia nada. —Graças a Deus, meu amor. — Disse a tomando em meus braços. Josie se agarrou em mim e começou a hiperventilar enquanto as lágrimas escorriam. —Calma, Josie, respira comigo.
Então comecei a respirar como todos normalmente respiram e ela começou a me acompanhar, mas sua respiração realmente só normalizou quando o Thomas veio caminhando até nós.
—Ma-ma, ma-ma. — Ele veio choramingando e se jogou sobre nós, também se sujando de sangue.
Naquele dia eu tive o meu filho sequestrado, uma arma apontada para a minha cabeça e depois para a mulher que eu amo, e por segundos achei que a tivesse perdido.
Ainda estava no chão com Josie e o Thomas quando a ouvi tossir, a Penélope estava tossindo por estar engasgada com o próprio sangue. Deixei o Thomas e a Josie juntos e tentei prestar algum socorro a ela, eu não sabia o porquê de estar fazendo aquilo, mas não podia deixar que alguém morresse na nossa frente. Coloquei a cabeça dela de lado para evitar que ela continuasse a se engasgar, depois procurei onde a bala a tinha atingido, ela havia tido o pulmão esquerdo perfurado e jorrava sangue, rasguei um pedaço da sua roupa e fiz pressão sobre o ferimento, mas não parecia adiantar, ela continuava sangrando. Pedi para que Josie ligasse para o hospital e para a polícia, o que com muito esforço ela fez, mas antes que qualquer socorro chegasse, a Penélope perdeu a consciência e depois o pulso. Quando a ambulância chegou no início da noite, a Penélope já não estava mais entre nós.
Os policiais que vieram pediram para que nós os acompanhássemos até a delegacia, mas dado ao estado de Josie e a minha profissão, eles permitiram que fôssemos no carro dela, peguei as chaves do carro dela e nos levei até a delegacia.
Entramos nós três na sala do delegado, pois o Thomas não queria soltar de uma de nós e nem eu queria deixá-lo longe de mim. Depois de passar pelo o que passamos, era de se esperar que nenhuma de nós estivesse bem, e não estávamos, principalmente a Josie, as perguntas do delegado a atordoavam ainda mais, então assumi a situação como advogada e testemunha, contei sobre a chantagens, sobre os nossos esforços para nos livrarmos dela incluindo os contratos públicos, o rapto do Thomas e as claras tendências homicidas dela. O delegado nos informou que seria aberto um inquérito policial a respeito da Park’s Construcion, e como a Penélope não poderia mais responder por a empresa, os pais dela seriam contatados.
Devido a investigação, mais tarde descobrimos que os pais da Penélope estavam internados em um “lar de repouso para idosos” fora do país. Ela como filha única havia atestado a invalidade mental dos pais e pagado o triplo para interna-los na clínica mais cara e mundialmente conhecida por o seu tratamento peculiar para com os internos.
Levei a Josie para o meu apartamento, coloquei ela no banho e dei uma muda de roupa limpa para ela, e depois fiz o mesmo com o Thomas e comigo. Peguei nossas roupas e coloquei em saco, não sabia se a polícia iria querer. Ela não estava falando muito, respondia apenas o necessário, mas quem poderia culpa-la.
Deitamos para dormir da mesma forma que fizemos na casa de Josie, com o Thomas entre nós. Eu precisava tê-los ali, ao alcance dos meus olhos e das minhas mãos.
Bom, dizer que dormimos foi pretensão minha, diferente do Thomas, passamos a noite acordadas, sempre que eu abria os olhos depois de parecer ter cochilado um pouco, Josie estava lá, me olhando, e quando ela finalmente dormiu um pouco, acordou assustada no meio da noite devido um pesadelo, fato esse que se repetiu quase todas as noites nos dias que se seguiram. Ela não quis falar sobre o pesadelo, mas diante do que passamos, não era muito difícil adivinhar. Demorou, mas próximo do amanhecer ela conseguiu dormir mais um pouco.
Quando amanheceu levantei cedo para preparar o café da manhã. Peguei um Thomas sonolento, levei ele comigo para cozinha e o coloquei no carrinho, Josie precisava descansar e eu não queria que ele acordasse a acabasse acordando-a como consequência.
Já tinha terminado o café da manhã e dava o lanche do Thomas quando Josie entrou na cozinha.
—Você e essa sua mania de não me acordar. —Ela disse se sentando.
—Bom dia para você também.
—Desculpa por ter acordado daquele jeito na madrugada.
—Tá tudo bem. Você quer café?
—Uhum, mas termina de dar a comida para o Thomas, pode deixar que eu me sirvo. —Ela se apressou em dizer quando eu ia começar a servi-la.
—Você está se sentindo melhor?
—Depende da sua definição de melhor. —Ela falou bebericando o café. — Eu já fiz muitas coisas controversas nessa vida, mas eu nunca tinha sujado as mãos de sangue.
—Josie, isso não foi culpa sua. Você ariscou a sua vida por nós, o que aconteceu foi uma fatalidade, e outra, não dá para saber quem realmente puxou o gatilho. Você não pode se culpar, não faça isso consigo.
—É difícil, Hope, eu senti o sangue dela encharcar a minha roupa e até poucas horas atrás eu estava toda suja dele, nós estávamos, até o Thomas estava.
—Ei — Falei pegando a sua mão por sobre a mesa. — Você fez algo imensamente arriscado, eu tive muito medo daquela bala ter te atingido, implorei para quem estivesse me ouvindo que não tivesse sido você, e não foi. Nunca fui de acreditar nessas coisas, mas talvez esse fosse o destino dela, ou o nosso, não sei. Eu não consigo pensar em outra forma de ficarmos em paz, se não essa. Aconteceu o que tinha de acontecer.
—É, talvez você esteja certa.
—É, talvez. Mas eu sei que estou certa em dizer que você deve se alimentar.
—Você foi tão benevolente com ela, mesmo estando assustada eu não sei se conseguiria, eu mal consegui ligar para polícia e para o hospital.
—Eu fiquei pensando nisso. Apesar de tudo, eu fiz o que achei certo, mesmo uma parte minha se opondo aquilo.
—É isso que os heróis fazem, fazem o bem sem ver a quem.
—Não acho que eu seja uma heroína, mas você com certeza nos salvou.
—Sabe, Hope, eu sempre tive a impressão de que você via em mim mais do que eu permitia que vissem, e você sempre disse que via como eu realmente era. Eu nunca entendi isso, mas agradeço que veja.
—Eu sempre vou procurar ver o melhor em você.
—E como que o Thomas está? Ele estava tão assustado ontem.
—Ele me parece bem, quer estar sempre próximo da gente, mas está bem.
—Ela não o machucou, não é?
—Não, não há nenhuma marca ou arranhão.
—Que bom. — Ela disse respirando visivelmente mais aliviada.
—Ah, ontem o seu celular ficou na sala, que a proposito vibrou muito, mais cedo. A sua família já deve estar ciente do ocorrido, a construtora da Penélope é a mais conhecida na cidade, com certeza eles já devem estar sabendo do que aconteceu, ou pelo menos de uma versão deturpada da história. Talvez fosse melhor você conversar com eles.
—E eu vou, eu preciso encontrar a minha mãe e a minha irmã, preciso contar para elas tudo que aconteceu. Você se importaria em ir comigo? Eu não queria ir sozinha, podemos levar o Thomas conosco.
—Se você quiser eu vou.
—Eu vou ligar para a minha mãe.
Então ela foi pegar o celular na sala e ligou de lá mesmo. Pude ouvir poucas partes do que ela falava.
—Eu explico tudo quando chegar... Não dá para falar sobre isso por telefone...Eu sei mãe, eu sei... Eu preciso que a Lizzie também esteja aí...
—Josie! —A mãe dela falou nos recebendo na porta e a abraçando.
—Oi mãe, acredito que você lembre da Hope.
—É claro que lembro. Vocês estão bem, Hope? — Perguntou se referindo a mim e ao Thomas.
—Agora estamos.
—Vamos entrar, temos muito o que conversar. — Josie falou.
A casa da matriarca das Forbes Saltzman dava a mesma sensação que a de Josie, que nem um mísero grão de poeira se arriscaria a estar fora do lugar.
Quando entrou, Josie foi logo bombardeada por Lizzie.
—Onde você estava Josie? Apareceu no noticiário que a Penélope morreu e que você pode ter sido responsável por isso. O que está acontecendo? E porque que a Hope está aqui?
—Calma, Lizzie, você não pode se exaltar assim. — O seu esposo falou.
—É por isso que eu estou aqui, eu vou explicar tudo para vocês, tudo que aconteceu nesse último mês.
Eu e Josie nos sentamos no sofá menor de frente para Caroline e Lizzie que estava no outro sofá, e Mg se postou em pé ao lado de Lizzie.
—Eu sei que vocês têm muitas perguntas, mas deixem que eu fale logo tudo de uma vez, porque eu já não aguento mais ficar revivendo isso. —Todos concordaram com a cabeça. —Depois que nós conseguimos o meu divórcio a Penélope me procurou e me chantageou, ela disse que se eu não cancelasse o divórcio e voltasse a viver com ela, ela tiraria o Thomas da Hope, disse que daria um sumiço nele e que nunca mais o encontraríamos, e que por medo de que ela cumprisse a ameaça ou que futuramente fizesse algum mal a Hope, eu aceitei. — Ela falou fazendo um carinho no Thomas, que institivamente agarrou o dedo dela com a sua mãozinha e não soltou mais, fazendo com que ela sorrisse. —E então para ser mais fácil para mim, eu assumi a minha antiga postura, magoei a Hope e com certeza decepcionei vocês duas, finalmente havíamos entrado em um território neutro, e eu sentia que estava estragando tudo, isso foi me consumindo, mas para mantê-los seguro eu ia seguir em frente, até que a Hope me confrontou. Então eu procurei a Lizzie e pedi que ela marcasse um encontro com a Hope, eu não podia arriscar que a Penélope descobrisse, por isso pedi que você fizesse isso, e então eu contei a verdade para Hope. Nós duas pensamos em usar a má conduta empresarial da Penélope ao nosso favor, mas ela acabou descobrindo e raptando o Thomas ontem.
—Ela fez o que? — Lizzie falou exaltada.
—Tenta se manter calma, isso não faz bem para você e nem para o bebê. —Disse Mg. —Pode continuar, Josie.
—Ela mandou uma mensagem para a Hope com o endereço de um galpão abandonado, achei que ela apenas iria me chantagear novamente, mas quando nós chegamos lá ela estava... estava armada. —A partir daí ela não conseguiu mais continuar. Josie passava a mão no rosto, nos cabelos, esfregava os olhos... Essa parte da história devia ser a mais difícil para ela, afinal, eram sobre isso os seus pesadelos. — É...
—Dizendo que voltaria com ela se nós ficássemos em segurança, a Josie conseguiu pegar o Thomas, mas daí Penélope chegou à conclusão de que só teria novamente a Josie para si se eu não existisse mais, então ela apontou a arma para mim. —Continuei em seu lugar. —Antes ela gritava descontrolada, mas de repente ela mudou, ficou fria, parecendo um psicopata homicida. Ela mirou a pistola em Josie, mas acredito que ela percebeu ser um blefe, e então se jogou em cima da Penélope, e o disparo aconteceu. Sra. Forbes, a Josie arriscou a vida dela para salvar a mim e ao meu filho, o que aconteceu foi uma fatalidade, e eu nunca serei grata o suficiente por o que ela fez.
—Porque você não nos contou, Josie? Eu sou a sua mãe, eu teria ajudado você. —Caroline falou com os olhos lacrimejando.
—Eu não po... —Mas antes que terminasse de falar foi envolvida no abraço de sua mãe.
—Minha menina.
—Eu não queria envolver vocês também. — Josie falou chorosa dentro do abraço.
Ainda em choque, Lizzie se levando e abraçou a mãe e a irmã.
—Desculpa ter falado com você daquele jeito, eu não podia imaginar...
Quando conheci Josie, em poucos dias ficou claro que a sua relação familiar não era das melhores, principalmente com a sua mãe. Lembro que quando descobri que Caroline iria testemunhar a favor da Penélope na ação do divórcio, me perguntei que tipo de mãe seria capaz de fazer algo do tipo, mas hoje eu já não a via mais assim, e muito menos a Josie.
Eu e Mg assistíamos de fora, aquele momento não nos cabia, eram um momento só delas.
—Não quero que a Lizzie passe mal. —Josie disse se afastando.
—Então esse é o Thomas. —Caroline falou se aproximando de mim e se abaixando para ficar na altura do Thomas que estava sentado no meu colo. —Olá rapazinho. —Ela disse pegando em sua mãozinha, mas devagarzinho e a puxou de volta.
—Ele ainda está assustado.
—Não é para menos, tão pequeninho, mas já sabe o que é o horror. Você é um pequeno guerreiro, Thomas. — Disse por fim tocando na ponta do nariz dele, assim como Josie fazia. —Sei que estamos todos ainda imersos nessa história, mas eu sou a mãe e preciso cuidar dos meus, vou pedir para servirem o almoço.
—Mãe, você pode pedir para empregada faz uma papinha para o Thomas?
—Josie... — Tentei argumentar.
—Claro que posso.
Almoçamos todos em silêncio, dei a papinha do Thomas enquanto a Josie almoçava, e depois que ela terminou, pegou o Thomas para que eu pudesse comer. Me sentia um pouco desconfortável por estar ali, mas daquele dia em diante, eu estaria onde a Josie estivesse.
Depois do almoço voltamos a sala, mesmo existindo muitas perguntas na cabeça de todos, não tornamos a falar sobre os recentes acontecimentos. Conversamos sobre a reta final da gravidez da Lizzie e sobre o parto, ela me fez algumas perguntas sobre a minha gravidez e sobre o Thomas, enquanto o mesmo dormia tranquilamente nos braços de Josie.
Eu conversava com os demais, mas quem tinham realmente a minha atenção eram eles dois.
—E o que você vai fazer agora, filha? —Caroline perguntou quando o nosso assunto anterior pareceu ter fim.
Em resposta ela olhou para o Thomas e depois para mim, isso foi o suficiente.
Quando saímos da casa de sua mãe, Josie disse que passaríamos na sua casa.
Quando chegamos ela entrou no hall da casa, mas não prossegui, ficou estagnada ali, olhando para os lados.
—Está tudo bem, Josie?
—Eu não poso ficar nessa casa, Hope, não enquanto me lembrar ela. Talvez eu fique um tempo a minha mãe, ou alugue um apartamento, mas eu não consigo ficar aqui agora.
—Vem comigo para o meu apartamento, Josie.
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