História Vinculum - Chapter XVII

O dragão negro continuava a sobrevoar entre círculos, acima daqueles que se entreolhavam no pedaço de floresta queimada. A fera soltava fumaça pelas enormes narinas, de tempo em tempo, preparando-se para um novo ataque. E sob efeito de magia, o cheiro do oraculo, atiçava ainda mais os sentidos do dragão.

DongHae sentia o sangue gelar em suas veias, e LeeTeuk podia perceber aquele medo, devido a face pálida do elfo da água. Aquela era uma tarefa muito pesada para um elfo sem domínio do elemento. E, apesar de se dar bem com a água, DongHae não tinha confiança alguma no que se dizia respeito ao domínio máximo. Aquilo era algo que apenas seu irmão conseguia fazer com perfeição.

― Não.. Não posso.. – sussurrou desnorteado. Os olhos do elfo marejaram. Ele se sentia um inútil naquele momento, por não proteger seus amigos e a pessoa que amava.

― Escute DongHae, você pode! Seu elemento é o único capaz de destruir esse dragão. Lembra-se das aulas a respeito das lendas de Wavallon? – LeeTeuk insistiu, arquitetando um plano completamente diferente em sua cabeça.

― Dragões não são pareis para elfos da água, quando há magia. – respondeu distante, rememorando as aulas que mais prendiam sua atenção. LeeTeuk assentiu. ― Mas, não sei usar magia. Nem meu irmão que tem um domínio máximo do seu elemento, sabe. É impossível. Não dá. – gemeu num tom desesperado, ao ouvir um alto grunhido vindo do céu.

― Mas é claro que é possível. Tudo é possível para um oraculo atento como eu. – sorriu perigosamente, desviando o olhar para o lado, ligeiramente.

LeeTeuk sentia duas energias bastante conhecidas por si, vindo naquela direção. E num estalo, já havia encontrado uma solução para tirar todos dali com vida. Os lábios do oraculo se firmaram em uma linha reta e seu olhar se tornou duro. Só de voltar a pensar na audácia de KangIn, se sentia tolo por ainda sustentar sentimentos do passado. Se o bruxo pensava que se livraria dele tão facilmente, estava muito enganado.

O dragão cessou as voltas, direcionando um voo rápido e declinante na direção deles. Os olhos de LeeTeuk se ligaram aos olhos da fera. Era como se tivesse apenas os dois ali. E não houve mais dúvidas de que ele era a missão daquele dragão. Uma missão de morte, com certeza.

― Zhoumi! Intervalo de dez segundos! Proteja o humano! – usou o código que o lobo logo entendeu. O dragão atacaria rapidamente e após dez segundos faria um segundo ataque mais longo. LeeTeuk era bom em ler os seres de Wavallon, independente do que fossem.

Zhoumi rosnou na sua forma canina, mas obedeceu LeeTeuk. Mordeu a blusa folgada de HyukJae, girando o pescoço para lançar o humano para suas costas. HyukJae não sabia o que fazer, estava preocupado com DongHae, e queria ir para perto do elfo, mas lhe restou apenas segurar firmemente nos pelos do lobo que corria para uma certa distância do oraculo.

― HyukJae! – Donghae gritou, pronto para correr também, sendo impedido pelo agarre firme de LeeTeuk. ― Não quero morrer longe dele. – choramingou.

― Quem disse que morrerá? – LeeTeuk sorriu, posicionando o elfo atrás de si, quando o dragão liberou uma chama de fogo. ― Speculo! – bradou a magia, ficando de lado com o braço direito inclinado.

O fogo do dragão bateu direto contra o braço exposto, sendo desviado contra ele mesmo. Aquilo não afetava a fera de maneira alguma, mas protegia os outros dois. E, ainda que o fogo estivesse sendo mandado de volta, LeeTeuk sentia a pele que era atingida arder terrivelmente. Trincou os dentes durante todo o ataque, até o dragão voltar a alçar voo, se preparando mais uma vez.

― Seu braço.. – DongHae disse assustado. A lateral do antebraço do oráculo estava em carne viva, devido a intensa queimadura.

― Algumas magias tem seu preço. – LeeTeuk respondeu, dando de ombros. ― Isso não é nada que não possa ser curado. Agora vem a melhor parte. – escureceu o olhar.

O dragão voltou a declinar, abrindo a boca para lançar as chamas. Os dez segundos haviam se esgotado. A corrente de chamas foi lançada imediatamente. LeeTeuk empurrou DongHae fazendo este cair no chão. Logo em seguida, o oraculo agachou. E como se tudo estivesse meticulosamente calculado, HeeChul surgiu detrás das árvores que ainda existiam ao redor, abrindo os braços e movimentando as mãos em um sinal convidativo. Como se fosse atraído por um imã, o fogo foi totalmente desviado na direção daquele elfo de fios avermelhados.

LeeTeuk se levantou rapidamente, satisfeito, puxando o braço de um DongHae atônito, colocando-o de pé. O elfo da água não conseguia acreditar que seu irmão mais velho estava ali, a alguns passos dele, e vivo. Sorriu inconscientemente, enquanto seus olhos marejavam mais uma vez. Só que de felicidade.

― É hora de fazermos nossa parte. – LeeTeuk disse calmo, atraindo a atenção do elfo. ― Sei que está emocionado. Mas, ainda terá tempo para matar a saudade, certo? Primeiro temos que nos manter vivos.

 DongHae assentiu, e LeeTeuk acariciou de leve a cabeça do elfo, notando que SiWon saia de dentro da floresta e provavelmente corria na direção onde KyuHyun e SungMin permaneciam desmaiados.

― Uhuu! Isso é tão bom quanto da vez que pulei nos vulcões da zona litorânea. – HeeChul gritou eufórico. As partículas do fogo estavam emaranhadas com as dele. Pra quem via, era impossível distinguir um elfo ali. Se assemelhava mais a uma grande tocha. ― Mas, que tal fazer o que você mais gosta pra irritar seu hyung, pequeno DongHae? – voltou a gritar. Mesmo adorando todo aquele fogo, sabia que tinham que derrotar aquele dragão. Até porque, seu tempo em meio a tanto fogo era limitado.

― Apagar o fogo. – DongHae disse mais pra si mesmo.

― DongHae, olha pra mim. – LeeTeuk pediu, sendo atendido pelo outro. ― Vamos acabar com todo esse fogo.

― Mas..

― Shhh. – articulou bem baixo, não perdendo tempo em colar sua boca na boca entreaberta do elfo da água.

DongHae abriu os olhos, assim como HyukJae do outro lado daquela área devastada da floresta. Zhoumi não perdeu tempo em morder o braço do humano, com força necessária apenas para mantê-lo parado no lugar.

― Merger. – LeeTeuk sussurrou contra os lábios alheios, enrolando quase superficialmente sua língua na de DongHae. Aquilo não o agradava muito, mas era preciso para a realização da magia.

DongHae não teve tempo de reagir. Era come se ele estivesse hipnotizado. E o que seguiu, o deixou confuso. Uma luz branca e intensa, cobriu os dois corpos, que se atraiam, se colando cada vez mais. E então, os dois se desfizeram como fumaça, se unindo em seguida. A fumaça, voltava a adquirir uma forma concreta, porém, de apenas um ser. E quando a luz se dissipou, os dois elfos eram apenas um, por efeito da magia.

O produto daquela fusão, era um pouco mais alto e com o corpo mais firme. Os fios de cabelo eram mesclados entre negro e dourado. A feições do rosto bem definidas, uma verdadeira mistura dos dois. Os olhos eram como cristais de gelo azulados. E o mais importante, a mente pensante ali era a de LeeTeuk, porque a mente de DongHae, havia entrado em transe, como um estado adormecido. Ele sabia o que estava acontecendo, mas não era capaz de controlar aquele corpo, apenas o oraculo.

― Vamos acabar com isso de uma vez. – disse LeeTeuk, ouvindo como sua voz e a de DongHae pareciam falar ao mesmo tempo. Era a primeira vez que o oraculo realizava uma fusão. Aquilo o animava. Quanto mais ampliava sua magia exitosa, melhor era.

O dragão não cessava o fogo, e HeeChul continuava a receber aquele elemento com gosto. HyukJae estava imóvel ao lado de Zhoumi, não acreditando na magia que seus olhos haviam acabado de presenciar. Apesar de que o fato do oraculo beijar seu elfo, o enlouquecia. SiWon passava as mãos por cima do corpo de KyuHyun e SungMin, verificando se ambos realmente estavam bem. E LeeTeuk, começou a fazer uso do seu atual estado.

O oraculo sentia como a dominação de água corria por cada molécula do seu ser, naquele novo corpo. Com sua audição mais aguçada, teve certeza que um rio volumoso corria pelas proximidades. Se posicionou de costas para o som da água corrente, e começou a mover seus braços e mãos com força, por cima da cabeça, para trás, logo, para frente.

Os movimentos se intensificavam e ao longe, uma tranquila corrente de água começou a ondular para fora do rio. LeeTeuk se concentrou o máximo que pôde, murmurando palavras de uma língua antiga. Continuava com o movimento dos braços, ouvindo a água chegar por cima da floresta, como se estivesse flutuando no ar e literalmente, estava. Aquilo era o belo resultado de uma dominação da água em união com a magia poderosa de um oraculo.

O dragão estava próximo de cessar o fogo e se preparar para um novo ataque, mas foi surpreendido.

LeeTeuk fez um último movimento com o braço de maneira bruta, ocasionando que um grande volume de água caísse diretamente sobre o dragão. A fera não teve tempo de voar para longe da água que o prendeu em uma grande bolha suspensa.

Das mãos daquele novo corpo que LeeTeuk conduzia, água começou a ser liberada. Água esta que se ligou a bolha de liquido que agora envolvia o dragão. O oraculo iniciou movimentos circulares com as mãos, cada vez mais rápido. A água girava ao redor do dragão, que urrava fortemente, tentando escapar.

LeeTeuk interrompeu todo movimento abruptamente, soprando com suavidade aquela água que flutuava sobre o solo. E em um piscar de olhos, a água se tornou gelo. Uma grande bola redonda de gelo, que envolvia todo o dragão.

― HeeChul, pode derrete-lo? – LeeTeuk perguntou alto o suficiente para o elfo que ainda parecia uma tocha humana.

HeeChul não respondeu, lançou uma bola de fogo em direção ao gelo, cobrindo-o por inteiro. E em meio a fumaça pela água evaporada, o dragão foi destruído definitivamente, sem deixar qualquer vestígio. HeeChul conteve o fogo, tomando o controle do próprio corpo, enquanto o fogo em sua pele ia se extinguindo.

Próximo a ele, a magia entre LeeTeuk e DongHae foi interrompida, lançando cada um para cada determinado lado, com força. O elfo da água caiu desmaiado no solo, enquanto um afobado HyukJae corria em seu encontro.

LeeTeuk estava consciente, mas gemeu de dor ao se sentar no chão. Ele estava mais fraco por causa da magia recém utilizada, consequentemente conseguia sentir a dor da queimadura em seu braço mais do que devia.

― Nada de perguntas para todos vocês. Vamos imediatamente para a moradia de Shindong. Lá esclareceremos o que se deve. – disse para os quatro ali com alguma lucidez.

HeeChul deu de ombros, indo até DongHae e empurrando o humano de perto do irmão para pegar o elfo da água nos braços, sorrindo com alegria. HyukJae sabia que não podia reclamar e ouvindo o chamado do seu professor de história, acomodou SungMin em suas costas, enquanto SiWon se encarregava de KyuHyun. Os três olharam brevemente para LeeTeuk, iniciando a caminhada que os levaria até um lugar seguro: a casa de ShinDong.

ZhouMi se aproximou lentamente do irmão mais velho, olhando-o com cautela. O elfo cão, sabia que o dragão havia sido mandado. E logicamente, apenas KangIn poderia fazer algo como aquilo. E ver o antebraço de LeeTeuk em carne viva, o deixou furioso.

― Não rosne assim, dongsaeng. Não tome minha dores, já lhe disse inúmeras vezes. Isso é um problema entre KangIn e eu. E, felizmente estamos todos bem. – ZhouMi rosnou com mais força e LeeTeuk suspirou. ― Certo, me machuquei um pouco. Mas, não é nada que não possa ser curado. Agora, só preciso descansar.

ZhouMi fez sinal afirmativo com sua grande cabeça peluda e LeeTeuk o agradeceu internamente. Sem perder mais tempo, o oraculo levantou-se cambaleante, subindo nas costas no irmão. O pelo de ZhouMi era tão macio, que ele tentou relaxar, se esquecendo momentaneamente da dor em seu braço... e em seu coração.  

(...)

O bruxo negro encarava fixamente seu filho junto ao humano de pé, dentro de seu escritório. Se dependesse dele, aquele humano teria o mesmo destino do elfo que havia tirado a vida mais cedo, porém, segundo RyeoWook, o tal Yesung poderia ser de grande ajuda para eles na guerra.

KangIn admitia, aquele humano tinha maldade exposta em seus olhos negros. E, por mais que soubesse que estava em uma dimensão diferente, rodeado de seres desconhecidos, não demonstrava qualquer vestígio de medo. E então, começou a pensar que talvez alguns humanos não fossem tão desprezíveis quanto a maioria da sua raça.

Mas, apesar de tudo, o bruxo queria ter certeza de que Yesung poderia ser leal para ele. E o mais importante, queria saber o que Yesung tinha a oferecer. E de antemão, já suspeitava que aquele trunfo poderia ter alguma ligação com o novatos de Wavallon que vieram com o príncipe.

― Senhor, como lhe disse, Yesung pode nos oferecer uma grande ajuda. – RyeoWook voltou a ressaltar.

― Pois bem, o que pode me oferecer, humano? – falou as últimas palavras como se tivesse nojo.

Yesung não se incomodou com aquilo de nenhuma maneira. Graças ao seu irmãozinho bastardo, sua vida tinha mudado maravilhosamente. Além de poder se vingar do seu irmão, ele podia ter um poder do qual nem havia sonhado, e para completar, tinha um delicioso elfo ao seu dispor. E ele agradecia por pelo menos algo de bom seu irmão ter o ensinado: o quanto homens poderiam ser melhores que mulheres. Ou aquilo era o que ele tinha concluído.

― Creio que não sabe da ligação entre meu irmão mais novo e esse tal príncipe. – disse com maldade. ― É algo que me deixou surpreso. E, pelo que andei conversando com RyeoWook, isso pode ser uma peça chave.

― Ligação? Irmão mais novo? – KangIn meditou, concluindo o que deveria ser obvio: o guardião do Vanyar. Mas, um humano? ― Não pode ser.

― Foi o que pensei, meu pa... digo, senhor. Penso que gostará de ouvir o que Yesung tem a dizer.

KangIn concordou.

― Ótimo, vocês me convenceram, por hora. Diga-me tudo o que sabe a respeito do seu irmão mais novo, principalmente os acontecimentos mais recentes.

― Será um prazer. – Yesung sorriu maldosamente, olhando intensamente para RyeoWook, que abaixou a cabeça constrangido.

Um humano como aliado? Aquilo era novidade, mas KangIn se deu conta de que não desprezava totalmente aquela ajuda. E enquanto ouvia os relatos de Yesung, se perguntava se LeeTeuk estava bem. Se não tinha pegado muito pesado ao mandar de encontro ao oraculo um dragão que odiava sua espécie. No fim, ele continuava se contradizendo.

(...)

ZhouMi e LeeTeuk foram os últimos a chegarem a moradia de Shindong. Diferente das construções de Wavallon, se tratava de uma casa mediana de dois andares, feita inteiramente de pedras. As pedras cobertas por musgos, davam uma aspecto verde a casa. Em frente haviam algumas poucas árvores e variadas flores, mas, ao redor, estava facilmente escondida pela floresta.

ZhouMi caminhava lentamente, tendo LeeTeuk ainda meio adormecido em suas costas. Ao parecer, todos os outros já estavam acomodados dentro da casa e ninguém os esperava do lado de fora. O que era certo, já que a noite começava a cair, e todos deveriam descansar. Pela manhã logo começariam o treinamento. O elfo sabia que LeeTeuk não perderia tempo, principalmente depois do ataque do dragão que haviam sofrido.

O oraculo despertava com um singelo sorriso, sentindo o cheiro da criaturinha que mais amava, bailar pelo ar. Não só o cheiro, bem como a energia do maior amor de sua vida andando pelas proximidades. E o que ele mais queria era abrir os olhos e ver o lindo sorriso que derretia seu coração.

O elfo cão conteve o caminhar, deixando os caninos a mostra, num sinal de fúria. Bem ali, em frente à casa de Shindong, um lindo gato cor de palha andava de um lado a outro, balançando o rabo felpudo ritmadamente. Se tinha algo que ZhouMi realmente odiava, eram os felinos, qualquer um deles. Seus genes caninos permitiam o aparecimento daquele ódio.

Em todos os anos se disfarçando de cão na dimensão dos humanos, tinha perdido a conta de quantos gatos havia eliminado. Era um instinto mais forte do que ele.

― ZhouMi, não! – LeeTeuk se sentou nas costas do irmão, completamente desperto.

A voz do oraculo, fez com que o gatinho miasse manhosamente, ao reconhecê-la. O bichano vinha correndo na direção de LeeTeuk, sem se importar com o lobo que o olhava com ódio.

ZhouMi girou a cabeça para o lado, fazendo pouco caso das palavras do irmão, enquanto o retirava de suas costas e o colocava do chão o mais devagar que podia. O gato cor de palha viu aquela cena com ciúmes. Não entendia porque aquele lobo agia daquele jeito com o oraculo que era só seu. Aquilo não o agradava e ele se apressou em mudar de forma para se equiparar ao lobo.

ZhouMi voltou a olhar para o felino, se surpreendendo ao encontrar um enorme tigre em sua frente, mas, continuando a rosnar. Poderia ser mais difícil, mas definitivamente ele acabaria com aquele felino

― ZhouMi! Não! – LeeTeuk voltou a repetir alarmado, ficando de pé, soltando uma leve queixa de dor. ― Não machuque seu sobrinho, por favor. – pediu, tocando a lateral do corpo do irmão. ― Não machuque o Henry. – acrescentou, calmo.

O elfo cão grunhiu, e seus olhos confusos passaram do seu irmão para o tigre a sua frente. Aquilo era simplesmente, absurdo.