Tenho saudade de tudo que nunca aconteceu
E uma esperança morta nos braços
— Giulia Staar
O motor rugia enquanto o carro deslizava pela estrada deserta. Peter Stark estava no banco de trás, agitado como uma fera enjaulada. Seus pensamentos giravam como um redemoinho, o coração martelando no peito.
— Você simplesmente não pode fazer isso comigo! — Peter exclamou, a voz carregada de indignação. — Eu não sou alguma mercadoria que você pode arrastar para onde quiser!
Wade Wilson, com a paciência de quem já viu de tudo, mantinha o olhar firme na estrada. Seus dedos apertavam o volante, os músculos tensionados. — Sabe, Stark, se você não parar com essa choradeira, posso considerar te deixar na próxima curva.
— Que belo plano! — Peter retrucou, o sarcasmo escorrendo em cada palavra. — Claro, porque abandonar um jovem no meio do nada é a solução perfeita!
— Quem sabe te ensine a ficar quieto? — Wade respondeu, a voz carregada de ironia.
Peter se inclinou para frente, os olhos arregalados, como se tentar encarar Wade fosse de alguma forma reverter a situação. — Você invadiu minha casa, me sequestrou, e agora acha que pode simplesmente me arrastar para qualquer lugar?
Wade suspirou profundamente, como se estivesse lidando com uma criança birrenta. — Ah, os dramas de juventude. Como sobrevivi até agora sem eles?
— Não é drama! — Peter quase gritou, as emoções à flor da pele. — Eu tinha uma vida antes de você aparecer e estragar tudo!
— Tinha? — Wade lançou um olhar de soslaio pelo retrovisor, seu tom claramente provocativo. — Porque, francamente, parece que você estava apenas esperando alguém para salvar sua pele.
Peter se calou, mordendo o lábio com força. O comentário de Wade atingiu um ponto sensível, mas ele não estava pronto para ceder. — E agora você quer me levar sabe-se lá para onde, sem sequer perguntar o que eu quero?
Wade deu um sorriso de canto, cheio de desprezo. — Perguntar? Não sou exatamente o tipo que faz consultas antes de tomar decisões. E, para ser franco, você estava indo direto para um buraco. Estou te fazendo um favor.
O silêncio pesado voltou a dominar o interior do carro, quebrado apenas pelo som das rodas contra o asfalto. Peter olhava para fora, tentando encontrar alguma lógica naquele caos. A noite parecia mais sombria, como se o mundo estivesse conspirando para tornar tudo ainda mais insuportável.
— Para onde você está me levando? — Ele perguntou depois de algum tempo, a voz agora mais controlada, mas ainda carregada de desconfiança.
— Para minha casa, onde você vai viver de agora em diante. — Wade respondeu secamente, sem se importar com a reação do jovem.
— E se eu não gostar? — Peter murmurou, a incerteza transparecendo em suas palavras.
— Não é uma questão de gosto, garoto. — Wade retrucou, sua voz firme e impassível. — É sobre sobrevivência, e isso não envolve as suas preferências.
Eles entraram em uma estrada cercada por árvores, onde a escuridão parecia quase tangível. Ao longe, a silhueta de uma mansão enorme surgiu, destacando-se contra o céu noturno. A construção tinha uma aura de mistério e perigo, que só aumentava a ansiedade de Peter.
Os portões de ferro se abriram automaticamente, como se estivessem esperando por eles. Wade parou o carro e, sem sequer olhar para trás, disse com um tom cortante: — Bem-vindo ao seu novo mundo, Stark. Não torne as coisas mais difíceis do que já são.
Peter olhou para a mansão que se erguia à sua frente, sentindo-se mais perdido do que nunca. A partir daquele momento, nada seria como antes, e ele teria que enfrentar um futuro que não escolheu, ao lado de um homem que ele mal conhecia, mas que já conseguia odiar.
Ao passarem pelos portões de ferro, que se fecharam atrás deles com um rangido sinistro, Peter sentiu um nó no estômago. Estava prestes a perguntar a Wade sobre a casa, mas sua atenção foi rapidamente desviada por algo inesperado.
Do lado de fora da entrada principal, um robusto pit bull surgiu em disparada, atravessando o pátio com a velocidade de um foguete. Antes que Peter pudesse reagir, o cão já estava sobre ele, derrubando-o no chão com um salto inesperadamente ágil. O jovem Stark se desesperou, soltando um grito sufocado enquanto tentava proteger o rosto.
— Sai, sai de cima! — Peter exclamou, apavorado, sentindo a língua do cachorro lambendo seu rosto sem parar. Ele se debatia, tentando se livrar do enorme animal, mas sua força era claramente insuficiente.
Wade, que havia descido do carro com calma, observava a cena com um sorriso mal disfarçado. Ele cruzou os braços, claramente se divertindo com o desespero de Peter.
— Relaxa, Stark. Ele só está sendo amigável. — Wade falou, a voz carregada de ironia. — Esse aí é o Príncipe.
Peter, ainda lutando para afastar o pit bull, lançou um olhar incrédulo para Wade. — Príncipe?! Esse nome não combina nem um pouco com ele!
Wade deu de ombros, um brilho de diversão nos olhos. — Ah, ele pode não ter a aparência mais delicada, mas é de um coração de ouro. Ou algo assim.
Finalmente, Wade estalou os dedos e o pit bull recuou, voltando para junto do dono com o rabo abanando. Peter se levantou, ofegante, tentando limpar o rosto lambuzado.
— Que recepção calorosa… — murmurou Peter, lançando um olhar acusador para Wade. — E eu achando que as coisas não poderiam piorar.
Wade deu um tapinha nas costas de Peter, forçando um sorriso sarcástico. — Se o Príncipe gostou de você, quem sabe você não se acostume mais rápido.
Peter não conseguiu responder, ainda tentando se recuperar do susto, enquanto Wade começava a subir os degraus que levavam à entrada da mansão, com o pit bull seguindo obedientemente atrás dele. No fundo, Peter sabia que aquela seria uma adaptação complicada, mas agora, tudo o que conseguia pensar era em como evitar o próximo "abraço" caloroso do Príncipe.
Quando Peter finalmente entrou na mansão, foi imediatamente recebido por uma fileira de empregados, todos de pé, com expressões neutras e posturas rígidas. Eles pareciam já saber que ele estaria ali, como se sua chegada fosse esperada há muito tempo. Isso incomodou Peter de imediato; ele sentia como se fosse apenas mais uma peça sendo movida em um jogo que ele nem sequer entendia.
— Eles... sabiam que eu viria? — Peter perguntou, lançando um olhar desconfiado para Wade, que seguia à frente.
— Claro que sabiam. — Wade respondeu com uma leve arrogância, sem sequer olhar para trás. — Eu não faço nada sem planejamento, Stark. Além disso, você não acha que seus pais deixariam isso ao acaso, acha?
Peter estreitou os olhos, irritado pela maneira casual com que Wade falava, como se tudo aquilo fosse a coisa mais normal do mundo. — Você fala como se minha vida fosse um plano que você traçou. Como se eu não tivesse escolha alguma.
Wade parou abruptamente no meio do saguão, virando-se para encarar Peter com um olhar gélido e cínico. — Escolha? — Ele deixou escapar um riso curto, quase cruel. — Ômega, você acha mesmo que tem algum tipo de escolha nessa situação?
Peter sentiu o sangue subir à cabeça, o estômago revirando de raiva. — Não me chame assim! — Ele exigiu, apertando os punhos ao lado do corpo. — Meu nome é Peter. Use-o.
Wade deu um passo à frente, sua presença se tornando ainda mais intimidadora. — Ah, então o pequeno Stark quer ser tratado com respeito? — Ele inclinou a cabeça, um sorriso sarcástico curvando seus lábios. — Aqui não há espaço para egos feridos, ômega. Você vai aprender isso, cedo ou tarde.
Peter sentiu as palavras de Wade atingirem-no como um tapa na cara. A palavra "ômega" saindo da boca de Wade soava desprezível, como se fosse um insulto. Ele sentia-se reduzido, como se todo o seu valor tivesse sido anulado naquele único momento.
— Eu não sou inferior a você! — Peter rebateu, a voz tremendo de frustração. — E não vou permitir que me trate como se fosse!
Wade arqueou uma sobrancelha, visivelmente divertido com o surto de indignação de Peter. — É mesmo? E o que você vai fazer a respeito? Usar essas suas mãozinhas de bebê para me espancar!? — Sua voz carregava uma malícia fria, deixando claro que ele não levava Peter a sério.
Peter hesitou, a fúria em seu peito começando a se misturar com o medo. Ele queria gritar, resistir, mas ao mesmo tempo sentia-se completamente impotente diante do alfa.
Os empregados, que haviam observado a troca sem expressar qualquer emoção, continuaram imóveis, como se a cena fosse apenas mais um dia comum na casa. Aquilo só aumentou o sentimento de alienação de Peter; ele estava sozinho, cercado por pessoas que pareciam saber mais sobre seu destino do que ele mesmo.
Wade se aproximou ainda mais, ficando a poucos centímetros de Peter, sua voz agora baixa e perigosamente calma. — Ouça bem, ômega. Você está aqui porque seus pais confiaram em mim. Você acha que tem uma escolha, mas a verdade é que, a partir do momento que passou por aqueles portões, suas opções acabaram. Agora, ou você se adapta, ou as coisas podem ficar muito mais difíceis para você.
Peter sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Ele sabia que não tinha mais controle sobre a situação, mas também sabia que não poderia simplesmente ceder. Mesmo que estivesse com medo, ele se recusava a ser tratado como algo menor.
— Eu... não vou me curvar para você, Wade. — Peter disse, sua voz mais firme do que ele sentia. — Você não vai quebrar meu espírito.
Wade o encarou por um longo momento, o sorriso cínico ainda presente. — Veremos. — Foi tudo o que ele disse antes de se afastar, deixando Peter sozinho no meio do saguão, com as palavras de Wade ainda ecoando em sua mente.
Peter olhou ao redor, sentindo o peso da mansão cair sobre ele. Era como se estivesse em uma prisão de luxo, e todos os olhares ao seu redor pareciam apenas reforçar isso.
Ainda estava tentando processar tudo o que havia acontecido quando notou um dos empregados se aproximando. O homem tinha uma aparência mais desleixada, as roupas eram as mesmas dos outros funcionários, mas usava vestes visivelmente mais largas, o que dava um ar descontraído, quase excêntrico. Seus olhos eram gentis, embora carregassem um brilho enigmático.
— Bem-vindo, querido. — A voz do homem era suave, mas marcada por uma formalidade antiquada que fez Peter prestar atenção. — Meu nome é Robert, mas pode me chamar de Bruce. Estou encarregado de levar suas malas e de lhe alojar em um dos quartos da mansão Wilson. Poderia vir comigo?
Havia algo reconfortante na maneira como Bruce falava, como se ele estivesse genuinamente interessado no bem-estar de Peter, ao contrário da frieza implacável de Wade. Peter, ainda tenso e com o coração acelerado, hesitou por um momento, mas logo se lembrou que não tinha muitas opções.
— Claro... Bruce. — Ele respondeu, tentando imitar a mesma polidez. — Obrigado.
Bruce sorriu de maneira suave e fez um gesto convidativo com a mão. — Não precisa agradecer, senhor Stark. Aqui, queremos que se sinta... em casa, por mais estranho que possa parecer no momento.
Peter percebeu a escolha cuidadosa das palavras de Bruce, e isso o fez questionar o que exatamente ele quis dizer. No entanto, decidiu não pressionar, ainda tentando entender seu novo ambiente.
Enquanto seguia Bruce pelos corredores amplos da mansão, Peter não pôde deixar de pensar em como tudo parecia surreal. A grandiosidade do lugar, a estranha formalidade dos empregados, e, acima de tudo, o comportamento imprevisível de Wade. Nada fazia sentido, e ele não sabia se alguma vez faria.
— Este é um dos quartos de hóspedes. — Disse Bruce, parando diante de uma porta maciça e bem trabalhada. — Espero que seja de seu agrado, senhor Stark. — Ele abriu a porta, revelando um quarto luxuoso, decorado com um gosto impecável, mas também com uma certa austeridade.
Peter entrou lentamente, observando cada detalhe do quarto. Era grandioso, mas não aconchegante. Sentiu-se pequeno, quase perdido no espaço.
— Se precisar de algo, estou sempre à disposição. — Falou com um tom que parecia tanto um aviso quanto uma oferta. — Não hesite em me chamar.
— Obrigado, Bruce. — Peter repetiu, sentindo-se estranho ao dizer isso mais uma vez.
Bruce inclinou a cabeça em um gesto respeitoso antes de sair, fechando a porta atrás de si. Peter ficou sozinho no quarto, o silêncio envolvendo-o como um cobertor pesado. Sentiu-se cansado, não só fisicamente, mas emocionalmente. Sabia que aquela seria a primeira noite de muitas em um lugar que, apesar de luxuoso, parecia ter segredos em cada canto. E, naquele momento, Peter não sabia se poderia confiar em alguém, nem mesmo no homem que acabara de lhe oferecer um sorriso e um quarto na mansão Wilson.
O pequeno ômega caminhou lentamente até suas malas, que haviam sido deixadas ao lado da cama por Bruce. O quarto, apesar de todo o seu luxo, parecia frio e impessoal, como se não pertencesse a ninguém. Talvez fosse verdade, afinal de contas, ele era apenas mais um hóspede na mansão de Wade Wilson.
Com mãos trêmulas, ele começou a desfazer as malas. Tirou algumas roupas, dobrando-as cuidadosamente antes de colocá-las nas gavetas do guarda-roupa. Cada movimento era meticuloso, como se o simples ato de organizar suas coisas pudesse trazer algum conforto em meio ao caos que sua vida havia se tornado.
Ao abrir a última mala, os olhos de Peter caíram sobre um pequeno quadro envolto em tecido. Ele hesitou por um momento, sentindo o peito apertar enquanto retirava cuidadosamente a moldura. Era uma fotografia de seus pais, tirada em um dia ensolarado durante uma das raras férias em família. Tony e Steve estavam sorrindo, o tipo de sorriso que Peter não sabia se conseguiria ver novamente, e ele, ainda mais jovem, estava entre eles, abraçado de ambos os lados.
Peter segurou o quadro com delicadeza, os dedos traçando o contorno dos rostos na imagem, como se pudesse sentir a presença deles de alguma forma. O quarto ao seu redor parecia ficar ainda mais vazio, e a solidão o envolvia com uma força quase sufocante. Ele mordeu o lábio inferior, lutando contra as lágrimas que começavam a se formar.
A dor da perda era avassaladora, e o vazio deixado pelos seus pais parecia crescer a cada segundo. Peter sabia que se permitisse chorar agora, poderia desmoronar completamente. E isso era algo que ele não estava preparado para fazer, não naquele momento, não naquela casa.
Ele respirou fundo, tentando controlar a respiração, os olhos marejados fixos na foto. “Eu sou mais forte do que isso”, pensou, repetindo para si mesmo, quase como um mantra. Seus pais sempre haviam acreditado em sua força, e ele precisava acreditar também, mesmo que tudo ao seu redor dissesse o contrário.
Lentamente, ele colocou o quadro sobre a mesa de cabeceira ao lado da cama, como uma lembrança silenciosa de que, não importa o que acontecesse, ele ainda tinha algo deles com ele. Mesmo que fosse apenas uma foto.
Peter se afastou, sentindo a pressão das lágrimas ceder um pouco, mas o peso da tristeza permanecia, como uma sombra que ele sabia que o seguiria por muito tempo.
(...)
Peter não sabia exatamente quando havia adormecido. O cansaço e a carga emocional acabaram pesando mais do que ele esperava, e, em algum momento, seus olhos simplesmente se fecharam, levando-o a um sono inquieto. O quadro com a foto de seus pais ainda estava ao lado de sua cama.
Ele foi despertado por batidas firmes na porta. Acordou com um sobressalto, o coração acelerado, enquanto tentava entender onde estava. O quarto luxuoso, mas estranho, rapidamente o trouxe de volta à realidade.
— Senhor Stark? — A voz educada de Bruce soou do outro lado da porta. — É hora do jantar. Wade não gosta de atrasos.
Peter piscou, tentando afastar o sono de sua mente enquanto as palavras de Bruce penetravam sua consciência. Wade não gosta de atrasos. Claro que não gosta, pensou Peter, com uma ponta de irritação. Ainda assim, levantou-se da cama, ciente de que desobedecer às regras de Wade não seria sábio, especialmente em sua primeira noite ali.
Mas, ao mesmo tempo, uma pequena chama de rebeldia acendeu dentro dele. Ele estava cansado de ser empurrado de um lado para o outro, de ser tratado como se não tivesse controle sobre sua própria vida. Então, decidiu que não seria tão rápido quanto Wade esperava. Se Wade não gostava de atrasos, Peter faria questão de não se apressar.
Escolheu suas roupas com uma calma deliberada, escovando o cabelo e lavando o rosto como se tivesse todo o tempo do mundo. A imagem de Wade, com seu olhar severo e palavras cortantes, passou por sua mente, mas Peter se forçou a não se intimidar. Ele sabia que estava jogando com fogo, mas, naquele momento, não se importava.
Quando finalmente saiu do quarto, a casa estava silenciosa, exceto pelo eco distante de passos no corredor. Peter seguiu o som, seu coração batendo um pouco mais rápido com a antecipação. Ele sabia que Wade provavelmente estaria irritado, mas, de alguma forma, isso o fez sentir-se um pouco mais no controle.
Ao chegar à sala de jantar, a visão que o recebeu foi inesperada. Wade já estava sentado à mesa, o rosto parcialmente iluminado pelas luzes suaves do ambiente. O que chamou a atenção de Peter imediatamente foram os machucados visíveis no rosto do homem. Havia um corte acima da sobrancelha esquerda, e um leve inchaço em seu maxilar, como se tivesse se envolvido em uma briga. A presença de tal violência contrastava de maneira gritante com a postura arrogante e controlada.
Peter sentiu a curiosidade crescer dentro de si, mas reprimiu qualquer vontade de perguntar o que havia acontecido. Wade não parecia do tipo que explicaria suas ações, e Peter não queria dar-lhe o prazer de parecer preocupado.
— Vejo que decidiu se arrumar com calma. — Wade comentou com ironia, seus olhos perfurando Peter como lâminas afiadas.
— Não quis parecer apressado. — Peter respondeu, tentando manter a voz firme, mas sem soar desafiador.
Wade soltou um riso seco, que não alcançou seus olhos.
Peter desviou o olhar, sentando-se na outra extremidade da mesa. Ele podia sentir a tensão no ar, mas não deixou transparecer sua apreensão. Enquanto a comida era servida, ele percebeu que estava sendo testado, e, embora não soubesse quais eram exatamente as regras do jogo, decidiu que não seria fácil de dobrar.
A refeição seguiu em um silêncio desconfortável, mas Peter estava decidido a não ceder à provocação de Wade, mesmo que seu coração estivesse batendo forte no peito. Ele sabia que aquela era apenas a primeira de muitas batalhas. E ele estava determinado a sobreviver a todas elas.
Wade terminou de comer em silêncio, a expressão dura e os machucados em seu rosto permanecendo um mistério para Peter. Quando finalmente colocou os talheres de lado, limpando os cantos da boca com o guardanapo, ele olhou diretamente para Peter, os olhos brilhando com algo que Peter não conseguia decifrar.
— A partir de amanhã, você vai cuidar do jardim. — Wade anunciou abruptamente, como se estivesse distribuindo uma tarefa trivial.
Peter piscou, surpreso pela inesperada responsabilidade. — Cuidar do jardim? — Ele repetiu, tentando entender o porquê da escolha.
Wade inclinou-se ligeiramente para frente, seu olhar permanecendo fixo em Peter. — Isso mesmo. Você é novo aqui e precisa aprender que não há espaço para ociosidade. Todo mundo na mansão faz sua parte.
Peter sentiu um misto de emoções borbulhando dentro de si. Por um lado, estava irritado com a maneira como Wade o tratava, como se ele fosse um simples servo ao invés de alguém que havia perdido os pais recentemente. Mas, por outro lado, a ideia de cuidar do jardim trouxe uma sensação inesperada de conforto.
Ele lembrou-se imediatamente do jardim na mansão de seus pais, um lugar onde passava horas, cultivando plantas e flores com uma dedicação quase obsessiva. Aquele era o único espaço onde se sentia verdadeiramente em paz, onde podia se perder em seus pensamentos e afastar-se dos problemas do mundo. A ideia de ter algo semelhante ali, na mansão de Wade, era quase reconfortante.
— Eu… — Peter hesitou, ainda processando a notícia. — Eu não esperava por isso. Mas posso fazer.
Wade observou-o, talvez em busca de alguma reação que pudesse usar contra ele, mas Peter manteve a expressão neutra, sem revelar a surpresa que sentia. Se Wade esperava que ele reagisse mal, estava prestes a se decepcionar.
— Ótimo. — Wade disse finalmente, sua voz áspera, mas com uma ponta de satisfação.
Peter assentiu, sentindo uma estranha mistura de ansiedade e alívio. Cuidar do jardim não era exatamente o que esperava quando chegou àquela casa, mas talvez fosse a única coisa boa que poderia tirar daquela situação.
— Posso perguntar por quê? — Peter arriscou, tentando entender a lógica de Wade.
Wade deu de ombros, o olhar voltando a ser frio e distante. — Achei que você poderia usar um pouco de ar fresco. E, quem sabe, isso te distraia de… outras coisas.
Peter não sabia exatamente o que Wade queria dizer com "outras coisas", mas decidiu não insistir. Havia algo enigmático no homem à sua frente, e Peter ainda não conseguia decifrar suas intenções. Mas, por enquanto, ele focaria no que podia controlar. O jardim seria seu refúgio, assim como havia sido no passado.
— Eu vou me esforçar. — Peter respondeu, com uma firmeza que surpreendeu até a si mesmo.
Wade soltou um riso baixo, quase zombeteiro.
(...)
Peter não ousou passar mais tempo do que o necessário naquelas paredes opressoras. Cada canto da mansão parecia carregado de um silêncio pesado, quase ameaçador. Ele queria explorar, deixar que a curiosidade o levasse pelos corredores e quartos desconhecidos, mas a ideia de cruzar com Wade o fez desistir rapidamente dessa ideia. Wade, com seu jeito imponente e sua presença constante, fazia com que Peter preferisse manter-se recluso em seu quarto, pelo menos por enquanto. “Alfa idiota,” ele pensou, rangendo os dentes.
De volta ao seu quarto, respirou fundo, tentando acalmar os nervos. Aquele lugar, embora luxuoso, não era seu lar. Sentia-se como um intruso, como se cada objeto ao seu redor estivesse apenas esperando para lembrá-lo de que não pertencia ali. Decidiu ocupar a mente, pegando alguns livros de sua mala e colocando-os na estante vazia, uma tentativa de tornar o ambiente um pouco mais familiar.
Enquanto organizava os livros, algo chamou sua atenção. O silêncio da casa foi interrompido por um ruído abafado. Ele olhou pela janela e percebeu que Wade estava saindo da mansão. O relógio no criado-mudo marcava onze horas da noite.
Peter observou-o por alguns instantes, sentindo um arrepio percorrer sua espinha. Wade não parecia estar em seu estado habitual de confiança. Sua expressão era sombria, quase irritada, e o modo como vestia aquelas roupas, tão estranhas e volumosas, sugeria que ele estava se protegendo de algo, ou talvez se preparando para enfrentar algo perigoso. Mas o que realmente fez o coração de Peter acelerar foi o brilho metálico que viu em uma de suas mãos. Wade carregava uma arma.
A respiração de Peter ficou mais pesada, e ele rapidamente se afastou da janela, sentindo um frio na barriga. Sua mente disparou em mil direções diferentes. Quem era Wade Wilson, afinal? E mais importante, onde diabos ele havia se metido?
Com ambas as mãos sobre os lábios rosados, Peter se sentiu mais perdido do que nunca. A sensação de estar fora de lugar, de ser uma peça em um jogo que ele mal compreendia, tornou-se ainda mais intensa. E, pela primeira vez desde que chegara àquela casa, Peter sentiu um medo real, um medo que não estava relacionado apenas à perda de seus pais, mas sim à própria sobrevivência naquele novo e sombrio mundo em que fora lançado.
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