História WandaVision - Capítulo V

Não reconhecia aquela mulher no meu reflexo.

Não reconhecia aqueles cabelos lisos e loiros que batiam na minha barriga grande e redonda que carregavam dois meninos.

Eu estava certa no final das contas, eram gêmeos.

Eu pensei que seria uma baita briga para podermos escolher um nome para eles, mas eu esqueci que o Visão era o Visão e deixou a decisão para mim.

Tommy e Billy, foram os nomes que escolhi.

Nomes simples, sem um significado por trás além de meu querer de nomear meus filhos com o que seriam apelidos de qualquer outra pessoa.

Eu estava diferente, não só fisicamente. Mas mentalmente.

Eu estava... feliz? Definitivamente.

Eu estava feliz, resplandecente. Mas na calada da noite, uma sensação ruim pesava em meu corpo. 

Era fácil ignorar a princípio, mas agora ela está mais presente, quando o Visão está dormindo ao meu lado e eu tento acalmar a agitação silenciosa na minha barriga.

Não literalmente. Eles não se contorcem na minha barriga ou algo do tipo, é apenas a presença que me incomoda.

Todas as mulheres grávidas, ou que já estiveram grávidas, com quem conversei - e foram muitas - disseram que apesar das dores constantes e mudanças de humor, amaram estar grávidas. Amaram carregar e produzir a vida dentro de si. Mas eu não sou como elas.

Eu me sinto limitada, presa com essa presença, com a presença deles em mim. Eu apenas quero parir logo e finalmente me livrar dessa contenção. 

*** 

O Visão virou uma mãe coruja desde o momento em que lhe contei que consegui engravidar, sempre perguntando se eu precisava de algo ou como eu estava. Ele estava sempre me mimando e me tratando como uma rainha, e, apesar de eu gostar de toda essa atenção e dedicação, uma parte de mim se incomodava. Não se sentia merecedora de tal mordomia.

Mas era apenas uma vaga e breve sensação, e passava logo que ele trazia uma grande xícara quente de café puro junto com um pedaço de bolo de morango.

Nesse momento eu estava lendo um dos livros ao qual Visão me presenteou e comecei a sentir o cheiro de comida sendo preparada. Inspirei mais fundo, paprikash. 

Visão estava fazendo paprikash.

Quase corri em direção a cozinha, tamanho o êxtase. Ao chegar lá o cheiro preencheu todo o meu corpo.

   –Ah – suspirei –Isso era tudo o que eu precisava!

Visão sorriu verdadeiramente e rugas marcaram seu rosto, ele adorava me fazer feliz.

   – Dessa vez eu coloquei páprica – ele ironizou com um sorriso de lado.

Cheirei o pote que continha o pó laranja avermelhado e tive a confirmação, dessa vez era páprica.

Não demorou muito para que os dóis estivéssemos sentados na mesa e nos servindo de generosas colheradas de paprikash. Quando o gosto picante preencheu minha boca não pude conter o gemido de aprovação.

   – Pelos deuses Visão, o que diabos você fez para ficar tão bom?

Perguntei de boca cheia o que o fez dar uma risada.

   – Acho que estou pegando o jeito da coisa – ele responde enquanto cutuca com o garfo a comida no prato. 

Não que ele não gostasse da comida, ele só não gosta, ou não sente a necessidade de comer, como ele próprio disse-me uma vez. 

Era estranho, quem não precisava comer?

Mas o Visão era estranho. Há muitas coisas nele que me deixam confusas, como o fato dele não possuir espermatozoides, mas ainda assim eu consegui ficar grávida dele.

Era confuso, mas aconteceu. Eu não havia me deitado com outro homem ou algo do gênero, eu havia apenas engravidado, mesmo que não fosse biologicamente possível.

Talvez tenha sido um milagre, eu tentava me confortar quando começava a ponderar sobre a questão.

Mas era o que era, tentava. Eu não conseguia aceitar essa ideia. 

Milagre.

Milagres não existem, o que existe é a vida e o que acontece nela. 

Tudo é possível e nada é impossível, talvez isso seja resposta o suficiente para a questão.

Eu apenas engravidei.

Sem mais.

***

Nós estávamos jogados na cama, completamente exaustos. Não era para pouco, eu ainda conseguia sentir o molho pesar no meu estômago e a sonolência começar a me atingir.

Mas eu não conseguia dormir, novamente.

Infelizmente a inquietação havia me pego essa noite e, apesar de meu corpo estar exausto, meus olhos estavam bem abertos e minha mente ativa.

Não soube quanto tempo estava parada ali, apenas correndo os olhos pelo quarto escuro e esperando a hora em que minha mente se aquietaria o suficiente para eu conseguir dormir. Mas pelo visto aquilo não aconteceria nem tão cedo.

Finalmente abandonei a cama e sai do quarto vestindo uma blusa de listras coloridas por cima da vermelha lisa que eu estava usando para dormir e sai procurando algo para me distrair e matar o tempo.

Desci as escadas lentamente e com cuidado, minha barriga estava grande o suficiente para dificultar e até impossibilitar alguns movimentos. Descer as escadas era um deles.

Quando desci o último degrau soltei um suspiro de alívio, eu odiava aquilo. O quanto eu me sentia impossibilitada e presa ao meu próprio corpo.

Espere só um pouco mais, disse a mim mesma, apenas poucos meses a enfrentar e seus filhos não estarão mais dentro de você.

Percorri meus olhos pela sala, procurando algo para me entreter com e avistei um violão no canto da parede. Um leve sorriso se instalou nos meus lábios enquanto eu me dirigia em sua direção. 

Eu sabia tocar algumas poucas músicas, uma delas é uma que está fazendo muito sucesso atualmente e que não consigo tirar da cabeça: I'm Not In Love - 10cc.

Comecei a toca-la, ainda meio atrapalhada em relação a transitar os dedos entre as cordas.

     I'm not in love

     So don't forget it

     It's just a silly phase I'm going throug

Comecei a cantar a música em voz baixa.

     I'd like to see you

     But then again

     It doesn't mean you mean that much to me

Minha voz não era uma das melhores ou mais bonitas, mas também não era horrível. 

     I keep your picture 

     Upon the wall

    It hides a nasty stain that's lying there

Eu amava música, sempre amei e essa me tocava de um jeito que eu não sabia explicar.

     I'm not in love

     No, no

     It's because

Quase no final da canção o som do telefone tocando preenche o ambiente e minha voz imediatamente morre.

Largo o violão apoiado no sofá ao qual eu estava o tocando e vou rapidamente atender para não acordar o Visão.

   – Alô – falei, mas não tive resposta.

Alguns desconfortáveis segundos de silêncio se passaram e uma leve respiração era a única coisa que podia-se ouvir na ligação, até que qualquer quem seja a pessoa do outro lado da linha desligou. 

Desconfiada, coloquei o telefone lenta e cuidadosamente de volta no guincho na mesa. Quem poderia ser essa hora, por que a pessoa não disse nada?

Perguntas do tipo me rodeavam enquanto eu apenas estava parada lá, como se esperando para algo acontecer.

E realmente aconteceu.

Me sobressaltei de susto quando a campainha berrou anunciando que havia alguém na porta.

Havia alguém na porta.

Terror e medo preencheram minhas narinas, aquilo era muito suspeito.

Mesmo assim a curiosidade me venceu e fui cuidadosamente caminhando até a porta, com uma mão repousando na barriga. A campainha soou novamente e estremeci.

Quando cheguei a porta aproximei meu olho no “Olho Mágico” para descobrir quem era o ser que batia na minha porta no meio da noite.

Fiquei sem fôlego ao perceber quem era, meus olhos se encheram de lágrimas e um sorriso iluminou o meu rosto.

Pietro.