Meu peito subiu e desceu numa respiração profunda ainda tentando entender o que ela fazia ali.
— Ah, Estella! — Marta pareceu me chamar sorridente.
Caminhei até as duas parando ao lado da mais velha.
— Você nem ao menos avisou que vinha... — comentei.
— Surpresa! — Ana Clara levantou as mãos numa animação contida e eu permiti que meus lábios liberassem uma risadinha. — Senti sua falta, mana.
E então numa ação rápida ela levantou unindo nossos corpos. Abracei aquele corpo tão conhecido por mim. Até mesmo na altura éramos parecidas.
— A mamãe comentou que estava bem triste aqui sem você, organizei tudo pra vir e ai ela avisou que você tinha voltado mas estava meio deprê. — Ana explicou levando um leve beliscão de Marta.
— Marta, somos parecidas mas eu não sou substituível! — uma falsa cara de indignação tomou meu rosto, mas logo ríamos.
Ana Clara Ramires era a filha única de Marta que vive com o pai no Rio Grande do Sul desde os seus 9 anos de idade. A menina era mais chegada a figura paterna e fatores desconhecidos por mim, além da separação do casal, influenciou a estadia da mais velha aqui no hotel.
Naclara, forma como eu a chamava quando criança e que acabou pegando, nos visitou durante um período, mas logo era Marta quem ia até ela. Embora quatro anos de idade nos separasse, Ana e eu costumávamos nos dar bem pelos raros momentos que lembro termos quando crianças.
— Você tá a mesma pirralha de sempre.
— E você continua achando que ser mais velha te deixa automaticamente responsável. —rebati.
Clara me explicou do encerramento da sua faculdade de jornalismo e de como era o curso que ela gostava, embora tivesse bastante talento com roupas. Parte da nossa noite foi conversando até a Marta nos dar um basta para dormirmos.
Eu terminava de remover o vestido vermelho e longo da festa dos anos de casamento de Marina e William. Tudo tinha saído tão bem quanto o planejado. Carolina, Naclara e eu passamos o início da manhã sob o sol carioca brincando na praia e à tarde apreciamos a comemoração.
Agora já era noite e eu observava meu celular gritar como um louco. Eu tinha ignorado todas as outras redes sociais dando prioridade somente para as fotos do instagram antes que as perdesse na galeria.
— Te quebraria inteiro no chão se não fosse tão novo. — murmurei sentando na ponta do colchão.
A quantidade de mensagens perguntando sobre meu termino com o Shawn me deixou confusa, já que não tínhamos ao menos conversado e nosso suposto relacionamento não era algo público, somente especulações.
Então as fotos de um restaurante escuro começaram a surgir na minha busca, eles chamavam de Shailey e muitos eram atrevidos o suficiente para colocarem foto da loira entre mim e Shawn, como numa manchete de fofoca.
Mas esse era o maior problema, era mesmo fofoca??!
Shawn era compreensivo e paciente, talvez tivesse entendido a explicação de Carolina sobre minha distância. Na minha cabeça, aquilo não fazia o menor sentido. Talvez tivéssemos terminado, mas ele me falaria...ou será que me ligou pra falar isso?!
Que droga, Shawn!
Meus pés rumaram para o banheiro e eu pedi mentalmente que a água gelada relaxasse meus pensamentos. Vesti um dos pijamas mais confortáveis de todos que possuía e agarrei meu aparelho atravessando a enorme porta de vidro de forma a chegar na varanda.
O toque soou por todo o local antes que eu pudesse ver seu nome e sua foto brilhando no ecrã.
Meus pensamentos viajaram entre atender ou não, mas minhas mãos foram desobedientes o suficiente aceitando a ligação de vídeo e mostrando seu rosto cansado do outro lado da tela.
Seus cabelos pareciam extremamente bagunçados faziam um contraste perfeito com a camisa branca amarrotada. De fundo eu conseguia enxergar o violão e a cabine característica do estúdio. Nem tinha levado em conta o fuso-horário.
— Graças a Deus! Eu...eu não achei que fosse atender. — seu sorriso fechado me contagiou, embora eu continuasse a sentir o bolo de lágrimas que dificultava minha respiração.
A tela fez um movimento abrupto e em seguida balançava levemente enquanto eu via o cômodo ficar pra trás dando lugar ao que eu julguei ser um quarto. O canadense sentou-se e eu consegui ver que se tratava de um sofá no canto do local.
— Pronto. —e como se indicasse que agora conseguiria me dar atenção Shawn sorriu mais uma vez. - Como foram esses dias?
Permaneci calada observando o homem do outro lado da tela. Meu coração soava alto nos meus ouvidos embora o vento bagunçasse levemente parte dos meus cabelos úmidos. Se eu abrisse a boca choraria.
— Fala comigo, meu bem.— seu tom foi baixinho, como se tivesse sendo tão difícil quanto pra mim.
Meu peito subiu e desceu tentando acalmar a confusão que começava a criar forma em minha frente.
—Soaria estranho se...se eu disser que já sinto sua falta? — questionei.
Pela primeira vez naquela ligação seu sorriso deixou visível os dentes branquinhos. Foi tão largo e natural que eu acabei fazendo o mesmo embora já conseguisse sentir os olhos marejando maximamente.
— Soaria sim.— foi quase que uma confissão. — Mas ainda bem que somos dois estranhos.
— Como tá o trabalho do álbum?
— Tranquilo, consegui inspiração e gravei uma música que tinha começado a escrever. — ele bagunçou os cabelos tirando parte dos fios do rosto.
Nossos olhares sustentaram-se um sobre o outro por alguns segundos e sorrimos. Eu desejei que todos os sorrisos fossem de felicidade, mas a melancolia da falta era visível.
— Quer que eu cante uma parte pra você?
Concordei silenciosamente com um aceno de cabeça e observei o mais velho levantar o celular ser deixado em algum suporte, pelo espelho ao lado eu conseguia vê-lo melhor. Sentado de frente a um piano as primeiras notas começaram soaram.
— I know that I have made mistakes like when I introduce you as friend... — dedilhando as teclas Shawn me olhou rapidamente. — And I pray to God is not too late as I dreaming wide awake again. — reconheci a última frase deixando escapar uma carinha animada.
No dia em que fui pra sua casa e depois da briga do Cameron com o loiro imbecil, Shawn estava acordado durante a madrugada cantando exatamente essa parte enquanto anotava num caderninho. Lembro, também, de ter dado uma advertência nele sobre sono ser importante e quase fundido nossos corpos num abraço até que nossas respirações indicassem que estávamos dormindo.
— Yeah we got so close I couldn't see...
Queria aquela sensação mais uma vez. Queria seus braços sobre meu corpo enquanto adormecia. Era real, ficamos tão próximos e absortos no turbilhão de sentimentos que ao menos paramos pra analisar.
Consegui ouvir sua voz distante, mas acabei não compreendendo.
—What if I told you a story, all about someone who loves you? What if I told you he's sorry he made you wait? And what if I told you he's dying cause he can't change the history? And what if I told you that someone was me?
Ele abriu os olhos que tinham sido fechados por alguns segundos e brincou com os dedos sobre o piano me arrancando uma risadinha; fazendo o mesmo enquanto pegava de volta o celular.
— What if I told you that I record this?— não aguentei a piada e Shawn gargalhou.
— Eu diria que você pode postar somente a última parte.
— Então tá.—arqueei a sobrancelha numa careta mal feita.
Ele voltou para o lugar de antes e eu aproveitei pra puxar uma outra cadeira esticando meus pés.
— Shawn...—chamei após alguns minutos de silencio atraindo sua atenção. — Você acha que vamos dar certo?
—Nós estamos namorando, já demos certo. — mas não era essa a questão e ele sabia. — Eu não vou desistir de você.
—Você entendeu minha pergunta.—meu leve tom de reclamação fez ele rir nasalmente.
—Você quer saber se eu estou disposto a manter um relacionamento baseado em vídeo chamada e mensagens?! — concordei balançando a cabeça. — Eu estou disposto a qualquer coisa com você.
—Nós dois sabemos das viagens e compromissos...—respirei fundo. — Isso seria mais um contratempo, mas ficaria mais fácil se eu estivesse ai. —minha última frase foi baixa, era mais uma constatação minha do que algo para ele ouvir.
— Exatamente por isso quero que você fale com o Eduardo. — parece que ele ouviu.
—O que você quer que eu fale com meu pai, Shawn?
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