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História World Legacy Saga - Parte 1: A Jornada Fur Hire - Jornada - História escrita por Quilua - Spirit Fanfics e Histórias
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História World Legacy Saga - Parte 1: A Jornada Fur Hire - Jornada


Escrita por: Quilua

Notas do Autor


PS. A imagem não é uma representação fiel da Banheira

Capítulo 7 - Jornada


Fanfic / Fanfiction World Legacy Saga - Parte 1: A Jornada Fur Hire - Jornada

O resto da noite foi tomada por uma calorosa discussão entre Filo e Wiz, por um lado, a jovem queria a todo custo leva-los até onde se encontrava o navio voador dos Fur Hire. Afirmava e reafirmava tantas vezes que somente ela sabia onde Fandora se encontrava que parecia não encontrar tempo ou palavras para criar outros argumentos favoráveis para a sua ida com os outros. Do outro lado, Wiz era terminantemente contra a ideia de levar uma criança, ainda mais nova que os gêmeos e, ainda por cima, num estado tão lastimável de saúde. A pobrezinha teve vários ossos quebrados e até uma parte do seu bico parecia meio rachado. Claro, agora Wiz havia decidido levar Auram junto, mas a diferença entre os dois machucados era bem grande. Filo não precisava entrar de cabeça numa missão, possivelmente, suicida, naquele estado. O estado do humano também a preocupava, mas sabia que não tinha escolha.

Os quatro jovens tentaram fazer parte da discussão em favor da mais velha, tentando botar um pouco de sensatez naquela cabeça teimosa de Filo, mas nada parecia adiantar. Ela estava decidida a ir insistindo que só ela saberia chegar até a Cachoeira do Dragão Soberano, onde, segundo ela, era onde repousava Fandora com o corpo inerte de Seal lá dentro. Mas fora aí que ela se entregou, talvez por causa dos ferimentos ou da exaustão, ela acabara entregando mais do que deveria, uma informação que só ela tinha conhecimento. Filo acabara de entregar a única pista que tinham sobre o paradeiro de seus companheiros.

Wiz não era conhecida como a Sábia dos Fur Hire à toa, ela tinha um vasto conhecimento sobre várias coisas no mundo e sobre o mundo. Ela sabia exatamente onde ficava essa cachoeira e não era tão longe quanto pensara. Depois das montanhas que cercavam a cidade, depois de uma densa floresta onde acabavam as árvores kokiri, se encontrava A Cachoeira do Dragão Soberano, que outrora era o lar de um Dragão tão poderoso e temido, mas que agora se encontrava vazio. O dragão havia sumido séculos atrás e ninguém nunca mais ouvira falar do mesmo. Presumidamente morto há centenas de anos. Mas nem por isso era um lugar menos perigoso. Se aproveitando da ausência do dragão que ali comandava, várias outras criaturas se apoderaram do lugar. E a floresta logo antes não era menos perigosa, tendo sofrido do mesmo destino da cachoeira, infestada de monstros perigosos. Sabia que seria uma missão difícil, ainda mais sem um meio de transporte.

Quando já beirava meia noite e a lua estava bem alta no céu, Filo acabou pegando num profundo sono, estava não só exausta de sua longa viagem, como também de seus inúmeros ferimentos e, para concluir, horas de intensa discussão, terminaram de exaurir suas últimas forças. Adormeceu ali mesmo, na porta da sala de reuniões e Wiz a levara para um dos muitos quartos vazios, deixando-a coberta e fechando a porta ao sair. Não sem antes colocar um feitiço na porta que impedia que sons externos invadissem o quarto.

Infelizmente, Filo não havia entregado muito mais informações além da possível localização de Fandora. Ela não sabia dizer o que houve com os outros Fur Hire, além de Seal, que ela havia visto antes de fugir, ela parecia não se lembrar do que havia acontecido com os outros. Disse que uma tempestade os havia separado, mas não parecia se recordar se tinham ido para algum lugar específico ou se estariam desaparecidos. Um pouco mais de interrogação provavelmente teria revelado mais informações, informações mais precisas. Mas era exigir demais de uma criança tão machucada, exausta física e mentalmente. O trauma em sua cabeça deve ter apagado algumas de suas memórias. Quando ela se recuperasse completamente, certamente teriam mais respostas. Mas já estavam ficando sem tempo.

De volta a sala de reuniões, os gêmeos já haviam pegado no sono, dormindo um em cima do outro na poltrona que ficava no fundo da sala. Donpa roncava bem alto, mas Recon não ficava muito atrás de seu irmão nesse quesito. Auram e Beat estavam sentados um do lado do outro, discutindo sobre algo, provavelmente teorizando o que haveria acontecido não só com a jovem ave, mas também quanto ao resto de seus amigos. Quando Wiz adentrou na sala, a conversa entre os dois se encerrou e, com um cutucar de sua espada de madeira, Beat acordou a raposa fêmea gentilmente que em seguida tratou de acordar seu irmão. A sábia fechou a porta atrás de si e usou outro feitiço na porta, parecido com o anterior, mas este, não deixava o som escapar da sala. Seria improvável que Filo acordasse depois de um dia tão cheio, mas tomou uma precaução a mais.

Todos os jovens queriam falar algo ao mesmo tempo, mas era impossível distinguir algo razoavelmente coeso no meio de tantas vozes juntas. Wiz ergueu sua mão direita, pedindo que fizessem silêncio e, assim, a reunião para as preparações de sua missão havia começado. Wiz já havia pensado num plano para leva-los para fora da cidade, exceto por Auram que havia sido excluído da missão dias antes. Então, ela só precisou fazer algumas modificações para encaixar o jovem em seus planos e agora tinham uma rota certa, não mais vagariam sem rumo atrás de pistas.

O plano era bem simples: No hangar onde ficava Fandora, havia mais um transporte. Bom, dentro de Fandora havia alguns mini barcos voadores usados para missões de reconhecimento, mas estes estavam fora de cogitação, afinal, foram levados a bordo de Fandora. Mas não eram os únicos meios de transporte que possuíam, o transporte em questão era um pequeno barco voador, de formato redondo, mais parecido com uma bacia de madeira do que um barco propriamente dito, não havia mastros nem velas, ele possuía um pequeno dispositivo de flutuação que só funcionava com magia. Magia era seu combustível e ainda era apenas um protótipo em fase de teste. Trabalho feito por Wiz, Helmer e Seal, as maiores mentes dentro dos Fur Hire (Embora Helmer só entendesse de navios voadores.)

Na falta de opções, teriam de usá-lo. Apesar de pequeno, caberia umas oito pessoas, embora ficasse um pouco apertado. Considerando que ela só levava quatro crianças, sendo duas delas de tamanho tão diminuto, não haveria problemas. Ou, pelo menos, era o que Wiz esperava.

A segunda modificação no plano era a de que Auram não deveria, de forma alguma, entrar numa luta, ele deveria ficar longe da linha de frente e apenas os ajudar na retaguarda, evitando a todo custo uma batalha, já que seu estado não era dos melhores atualmente. Auram, embora relutante, não via outra opção além de concordar com aquilo, acrescentando mais dor a sua humilhação anterior. Aceitou, já que era única forma de conseguir acompanha-los. Wiz o fez jurar, com o punho sobre o coração, para mostrar que aquela promessa era séria e não poderia ser quebrada de forma alguma. Não importava a situação, Auram não poderia interferir fisicamente. E foi assim que Recon se ofereceu para lhe dar algumas aulas de tiro particulares, assim, não precisaria entrar no campo de batalha ao mesmo tempo em que ajudaria. Wiz concordou que era uma boa ideia, mas que ele ainda assim, não deveria exagerar.

Foi decido que partiriam nos primeiros minutos que o sol surgisse no céu, sairiam pelos fundos, em direção ao hangar e levantariam voo o mais breve possível. Levar Filo junto era impossível, impensável, mas deixa-la naquela mansão sozinha, sem cuidados médicos por sabe-se lá quantos dias, também seria imprudente. Então, Wiz, pegou uma grande concha dourada que ficava sobre a mesa de reuniões e a colocou no ouvido. Aquela era uma concha mágica, enfeitiçada de forma que, ao ser usada, poderia transmitir sua voz para uma outra concha a grandes distâncias, assim como também poderia receber a voz da pessoa com quem estava se comunicando. Bastava dizer o nome da pessoa com queira falar, visualizá-la em sua mente, que a concha fazia o resto do trabalho. Essas conchas magicas eram o meio de comunicação principal não só dos Fur Hire como também de toda a cidade.

Wiz mentalizou a pessoa com quem queria se comunicar e disse seu nome na abertura da concha. Alguns instantes se passaram e Bova respondeu do outro lado da cidade, com sua voz saindo perfeitamente de dentro da concha. Bova era uma fenari comum, não fazia parte dos Fur Hire e nunca quis fazer parte, mas era uma auxiliar extremamente importante em diversas tarefas do grupo de mercenários. Sempre ajudando da forma como podia, mas sem participar diretamente de missões. Ela era bem gorda e um tanto velha, não tendo condições nem se quisesse. Mas ajudava sempre que precisavam. Com conselhos, recados, mensagens, comida, guia e, também, era uma excelente médica. Sua medicina combinada com a magia de cura de Wiz poderia curar qualquer machucado não importasse o quão grave fosse. Embora tivesse se recusado a ajudar um humano semanas atrás, porém, Auram não se ressentia dela. Sabia como o povo dali o enxergava.

A conversa entre as duas não durou muito e ela alegremente concordou em cuidar de Filo até todos eles voltarem sãos e salvos. Embora, ela tenha parecido mais feliz em cuidar do jardim do que de uma criança enferma. Tendo isso ser resolvido, nada mais faltava a tratar e todos estavam dispensados. Wiz retornou aos seus aposentos. Os gêmeos brigavam para ver quem tomaria banho primeiro. Havia vários banheiros espalhados pela mansão, mas, na área dos dormitórios femininos, onde somente Donpa tinha permissão para dormir, já que era inseparável de sua irmã e, por tanto, dividiam o mesmo quarto, havia o que julgavam ser o melhor banheiro de toda a residência, com uma ampla banheira de água quente e as toalhas mais macias dali. Beat retornou ao seu quarto, chamando seu amigo para ir junto, afinal, acordariam logo pela manhã para o dia mais importante de suas vidas. Mas Auram se recusou, disse que precisava de um tempo e na sala permaneceu.

Sentado na poltrona, contemplava a cadeira na ponta norte da mesa, a cadeira destinada para o líder dos Fur Hire, outrora ocupada por Rafale, mas atualmente sendo o lugar de Wiz. A cadeira do líder. Auram sentou-se nela, sentindo o estofado macio abaixo e atrás de si, repousou os braços nos altos braços da cadeira e pôde perceber, mais uma vez, o quão pequeno era. Não só em seu tamanho, mas também em sua existência. Rafale era, de fato, bem grande, aquela cadeira parecia pequena quando ele se sentava nela. Mas a cadeira era maior. Maior em sua importância. Ali somente se sentavam os grandes líderes, por gerações e gerações de mercenários. A cadeira era grande. E carregava consigo um peso imenso, um enorme fardo. O fardo da responsabilidade. Ser um líder não significava apenas mandar e desmandar, distribuir ordens para que os outros acatassem. Não, a liderança carregava o peso da responsabilidade, o líder tem que olhar para seus homens não só como figura de poder, mas também tinha que vê-los como companheiros. Companheiros para os quais daria a vida e que também alegremente dariam suas vidas pelo líder e pela equipe.

Sentiu-se tolo sentado naquela cadeira tão pesada, sabia que ali não era o seu lugar. Jamais poderia tornar-se o líder dos Fur Hire. Jamais seria um líder de qualquer coisa, não enquanto continuasse tão fraco e dependente da ajuda dos outros. Ali não era o seu lugar. Levantou-se devagar, deslizando a mão suavemente ao longo da cadeira e a admirando pelo que poderia ser a sua última vez vendo tal símbolo de liderança, afinal, qualquer coisa poderia acontecer com ele a partir de amanhã. Pensar daquela forma encheu seu corpo de calafrios e começou a tremer. “Um líder daria sua vida por seus companheiros e seus companheiros fariam o mesmo por seu líder. Mas serei eu capaz de dar a vida por meus amigos?”. Lembrou-se agora de que ainda era uma criança, poderia estar no bosque, brincando e rindo sem preocupações com seus dois amigos, não deveria estar indo para o campo de batalha onde a linha entre a vida e a morte poderia se encurtar cada vez mais.

Uma lágrima desceu lentamente por sua face, quente e nostálgica. Bosque? Dois amigos? De onde havia tirado isso? Por que estava chorando? Por que sentia aquela sensação tão incômoda em seu peito? Aquilo era... Saudade. Mas de quê? Por quê? De quem? Auram não tinha resposta para nenhuma daquelas perguntas, ficara tão perdido em seu pensamento que nem notou que havia parado de tremer. Enxugou a lágrima com a ponta do polegar, observou a gotícula que havia saído de seus olhos na ponta de seu dedo. Aquela lágrima parecia carregar muitos sentimentos, mas que não sabia de onde vinham. Era estranho.

Voltou para o seu quarto onde encontrou Beat já dormindo profundamente na cama debaixo da sua. Ele parecia tão calmo e sereno, nem parecia que estava pronto, ou sequer se lembrando, de que, no próximo dia, estariam fora da cidade. Fora das montanhas. Fora do único mundo que conheciam por toda a vida. Subiu para a sua cama tentando fazer não fazer nenhum barulho e repousou a cabeça cansada em seu travesseiro. Admirou o teto pelo que pareceu uma eternidade. Nada havia ali, somente um teto de madeira, mas o humano parecia ver além do teto, além do telhado, além do céu e além das estrelas. Visualizava o seu futuro e se, teria algum. Quando menos esperava, caiu num sono profundo.

Encontrou-se num lugar estranhamente familiar, embora não se recordasse de ter ido até lá alguma vez em sua vida. A sua frente, muito longe, havia uma grande árvore verde, solitária no meio de um pequeno monte de terra, como uma pequena ilha isolada rodeada por um lindo lago azul, que brilhava sereno com a luz o sol refletindo em sua superfície. Sendo o próprio lago, cercado por um bosque extremamente verde. Apertando os olhos, Auram conseguiu visualizar as figuras de duas pessoas, uma com água do lado até os joelhos e outra sentada a sombra da majestosa árvore. Daquela distância, não conseguia distinguir nenhum traço característico das duas pessoas, sequer enxergar seus rostos, mas tinha certeza que, de alguma forma, as conhecia.

Tentou caminhar na direção das duas pessoas, mas seus pés não saíam do lugar. Tentou correr, mas suas pernas se transformaram em gelatina, tremiam sem sair do lugar. Tentou gritar, mas sua voz parecia não alcançar. De repente, a distância que se encontrava da árvore, pareceu dobrar. O bosque pareceu fugir do seu alcance. Não, Auram estava sendo puxado para longe, o bosque estava parado no lugar, enquanto o jovem apenas era arrastado para trás, por uma força irresistível e invisível. A imagem do bosque começou a ficar minúscula, parecia estar agora a quilômetros de distância, enquanto seu corpo aos poucos começava a ser engolido por uma forte luz branca. O bosque parecia emoldurado pela luz branca e Auram se via cada vez mais longe de alcança-lo.

— Hmmmm, é mesmo um lugar muito bonito.

Disse uma voz feminina atrás de Auram, após ouvir tal voz, seu corpo parou de ser arrastado bruscamente, quase como se tivesse atingido uma parede atrás de si, mas não havia nada além de um vazio branco. Olhou para os lados e para trás, não conseguindo localizar de onde viera a fonte da voz e foi só então que percebeu que estava num sonho. Respirou aliviado, sabendo que em breve acordaria e talvez sequer se lembrasse daquilo.

— Imagino que aqueles dois sejam seus amigos, certo? — Disse novamente aquela voz, mas, dessa vez, parecia vir de cima de onde Auram estava e, quando o mesmo levantou seu rosto, viu-se de cara com uma garota branca olhando diretamente para ele, com o rosto tão perto que parecia impossível não ter percebido sua presença antes. A menina estava de cabeça para baixo, pairando no meio do nada, suas duas longas tranças loiras caindo para baixo, descendo. Eram quase tão grandes quanto o próprio humano. Tinha um grande laço rosa na trança esquerda e sua roupa era bem simples, branca com um pouco de verde aqui e ali, porém com uma única peça de uma armadura prateada: Um saiote que lhe cobria metade das coxas e as mesmas sendo cobertas pelo que parecia ser uma meia-calça branca com detalhes em dourado. Em sua mão esquerda, segurava um longo cajado reto de madeira, porém, na ponta, a madeira era toda retorcida e no centro daquilo, havia um orbe azul claro brilhante. Seus olhos tinham um brilho dourado, parecia ouro líquido centralizado em duas pequenas esferas e aqueles dois olhos dourados olhavam para os olhos azuis de Auram fixamente.

O garoto não tinha palavras, os olhos da garota pareciam deixa-lo hipnotizado e com sono. Era possível sentir sono dentro de um sonho? Parecia algo estranho de sentir, mas nada daquele sonho parecia fazer sentido. A menina deu um giro no ar, fazendo suas tranças voarem, como em uma valsa e então, parou em pé na frente de Auram. Sorriu para o mesmo antes de virar-se de costas para ele, fitando a imagem emoldurada do bosque, estático como um quadro, tão distante.

— Você quer voltar para lá? — Perguntou a menina, estendendo o braço esquerdo com a palma da mão aberta, apontando para o bosque. Borboletas surgiram e voaram da palma de sua mão, dançando pela imensidão branca onde se encontravam até desaparecerem com a mesma facilidade que apareceram.

— Voltar? Mas eu nunca estive lá. — Auram foi pego de surpresa por sua voz finalmente ter conseguido sair de sua boca, soou estranha até mesmo para ele como tivesse anos que não a ouvia. Subiu as mãos até sua garganta, tateando seu pescoço para constatar se havia algo errado consigo, mas tudo parecia normal. Olhou para o bosque e de volta para a menina. — Eu... Eu nunca estive nesse lugar.

— Ah, você ainda não percebeu? — Retrucou a menina, flutuando de forma tão graciosa quanto vagarosa ao redor de Auram, dando uma volta completa ao redor de seu corpo até parar de novo a sua frente. Mas, dessa vez, cruzou suas pernas finas, sentando-se em pleno ar. — Isso não é um sonho, é uma memória. Sua memória.

Tal informação pegou Auram de surpresa, como poderia aquela ser sua memória se não se lembrava de alguma vez já ter estado ali? Sequer sabia quem eram aquelas pessoas lá longe. Aliás, também não conhecia aquela menina que parecia estar brincando com a sua mente, flutuando e falando coisas sem sentidos. Claro que aquilo só poderia ser fruto de sua imaginação. Estava sonhando, certo?

— Hihi, bobo. — A risada da menina era delicada, quase como a de uma criança embora ela parecesse já ser, no mínimo, uma adolescente. — Se acha que é um sonho, tudo bem. Mas, sabe, eu posso fazer seu sonho virar realidade. Você gostaria disso “Auram”? — O jeito como ela pronunciou seu nome com um tom de sarcasmo foi estranho, estaria ela zombando dele? E o que ela queria dizer com realizar seu sonho? Auram não teve tempo de verbalizar aquelas perguntas pois, a menina aproximou-se novamente do seu rosto, mas dessa vez, muito mais perto. Tocou-lhe a parte de trás da cabeça com a mão esquerda e o puxou para perto de si. Tocou seus lábios macios na testa de Auram e pareceu cheirar seus cabelos louros cor de palha por alguns instantes. Depois, levou seus lábios até sua orelha e sussurrou delicadamente ali, o humano podia sentir seu hálito quente lhe causar arrepios. — Se quiser que eu realize seu sonho, Auram, venha até mim, me procure, me encontre, me faça um pedido, deseje com todo o seu coração. Me olhe, me admire, me venere. Me ame, me tema, me adore, me odeie, me amaldiçoe, me sinta. E eu irei realizar seu sonho. O levarei de volta ao Bosque Sagrado, até lá, não esqueça meu nome. Me chame pelo meu nome, grite meu nome, sussurre meu nome e eu irei até você. Ikelos é o meu nome, nunca se esqueça. Ikelos.

O nome da garota pairou no ar por um longo tempo. Ecoando por toda aquela luz branca, por todo aquele vazio branco. Como se um milhão de vozes o repetisse ao mesmo tempo e em diferentes tons. A imagem emoldurada do bosque pareceu trincar, algumas rachaduras prateadas surgiram ao longo do desenho. Primeiro no canto superior direito, depois no meio, depois a imagem inteira estava trincada e se despedaçou em pedacinhos minúsculos e brilhantes, como pó de estrela. Depois, todo o vazio branco fora tomado por sons de rachadura e logo as rachaduras apareceram, em cima, em baixo, em frente, atrás, esquerda, direita. O lugar inteiro estava se quebrando, se despedaçando, se desfazendo, até não sobrar mais nada além de escuridão, até Auram sumira, engolido em meio aos cacos de seu sonho tão caótico e desaparecendo em meio a escuridão.

Um fino raio de luz surgiu em meio a escuridão e esse pequeno fecho de luz foi se expandindo, devagar, mas certamente estava aumentando. Demorou para enfim perceber que era a luz do sol, que aos poucos começava a iluminar o quarto onde dormia e mirava bem no seu rosto, fazendo que acordasse devagar, com um longe e satisfeito bocejo. Beat havia aberto as cortinas e já não se encontrava mais no quarto, mas, ao inspecionar melhor o quarto, depois de se sentar na cama, pôde perceber que o elmo de chifres de Beat, assim como sua espada de madeira, não estavam mais ali. O fenari já estava pronto. Auram não podia ficar para trás e, quando se preparou para saltar de sua cama, viu que me seu travesseiro estava escrito uma palavra. “Ikelos”, ele leu. Não estava familiar com aquela palavra e nem se lembrava de ter escrito aquilo antes de dormir. Passou a ponta do indicador sobre as letras, parecia ter sido queimado ali e parecia fresco. Teria sido um recado de Beat? Não deveria ter sentido o cheiro de fumaça? Bom, de qualquer forma, em breve poderia perguntar ao seu amigo sobre isso. No momento, tinha que se preparar.

Saltou da cama diretamente em cima de suas botas, calçando-as imediatamente. Passou as mãos sobre os cabelos, mas, como de costume, não conseguia arrumá-los de uma forma minimamente decente, então apenas ignorava. Ajeitou seu cachecol no pescoço, cheirando-o sem saber o motivo de ter feito aquilo. Vestiu sua blusa marrom puída e prontamente saiu do quarto, descendo diretamente para a sala de reuniões, não havia ninguém lá, mas o cheiro que sentiu, denunciou que havia comida fresca na cozinha. Assim que chegou lá, encontrou todos reunidos, já terminando de comer um café da manhã extremamente reforçado, com ovos, bacon, leite fresco (Nada dessas comidas vinham de outros fenari, por sinal. Criavam animais comuns na cidade). Suco de laranja natural, pão quentinho, uma enorme variedade de frutas e bolinhos redondos, feito com uma massa macia e recheados de frutas e folhas kokiri, nutritivo e delicioso.

Os gêmeos pareciam comer como se aquela fosse a última refeição deles, o que, de fato, poderia ser. Pegavam um pouco de tudo e enfiavam na boca apressados, nem o olhar julgador de Beat os incomodava. O mesmo, inclusive, já havia acabado de comer o seu café da manhã e estava limpando alguns dos pratos. Pela primeira vez, Recon não respondeu animada ao “bom dia” de Auram, estava ocupada demais com toda a comida. Wiz não estava presente e Beat o informou que ela havia ido pegar alguma coisa, mas não sabia dizer o que era.

Auram sentou-se para comer e só então Recon o notou ali, tentou dar-lhe um beijo na bochecha com a boca ainda cheia de comida, mas fora separada por seu irmão. O humano partiu para cima da comida, afinal, também poderia ser a sua última refeição. Wiz voltou para a cozinha, satisfeita em encontrar todos já prontos e decididos, embora ainda tivesse receio de leva-los. Trazia em suas mãos algo enrolado num longo pano branco e chamou Beat e Auram para que se aproximasse. Beat foi na mesma hora, mas Auram quase engasgou com a comida, limpou a boca e foi de encontro a sua mestra.

Ela desenrolou o lençol, revelando duas espadas dentro de suas bainhas de couro marrom. Uma tinha um tamanho normal para uma espada de uma mão só, já a outra era um pouco mais curta, mas com a lâmina mais larga. Automaticamente os dois perceberam que eram espadas para eles e, pelos tamanhos, souberam qual pertencia a cada um. Beat percebeu que a sua espada, bem acima da guarda-mão, no meio, onde começava a lâmina, havia um “B” estilizado ali, com detalhes em prata. Reconheceu que era o brasão de seu pai e ficou extremamente surpreso, olhando estupefato para Wiz. Ao que ela acenou com a cabeça e começou a dizer.

— Sim, Beat, essa espada pertencera ao seu pai quando era mais jovem. Quando havia acabado de entrar para os Fur Hire, a espada que usava antes de ter se tornado o 98º líder. — Estendeu a espada para Beat, que a segurou hesitante com a mão direita. Sentiu o quão surpreendentemente leve ela era e quão bem encaixava-se em sua mão. Parecia ter sido feita para ele. Mas fora feita para seu pai, que, também era um coelho de estatura baixa, porém com bastante força e sede de batalha. — Esta espada é sua agora, use-a com honra e responsabilidade, jovem Beat, filho de Blast, filho do antigo líder dos Fur Hire e futuro líder que nos guiará para uma nova era de glória.

Todos ali presentes já sabiam do papel que o pai de Beat havia desempenhado antes de sua morte e também sabiam que Beat era o próximo cogitado a ser líder no futuro, mesmo assim, foram pegos de surpresa com tais palavras. Até os gêmeos pararam de comer para observarem a cena. Beat, curvou sua cabeça respeitosamente, repousando a espada em suas duas mãos e em seguida, substituiu a espada de madeira na sua cintura por sua nova espada, sem sequer desembainhar antes. Curvou novamente a cabeça e em seguida bateu com o punho fechado no peito, sem dizer sequer uma palavra, todos entenderam seus sentimentos e intenções e caminhou até a janela mais próxima. O peso da responsabilidade que Auram tanto temia, havia acabado de cair sobre os ombros de seu melhor amigo. Não sabia se devia se sentir feliz ou triste por ele, então, também permaneceu em silêncio, até que Wiz falou com ele.

— Essa espada é para você, Auram. Sinto muito, mas é apenas uma espada comum do nosso armazém. E você estará proibido de usá-la nessa missão. Você entende isso, certo? — Disse, com um olhar severo dirigido para o humano, a espada permaneceu estendida em suas mãos, mas recuara um pouco. — Só pegue-a se puder cumprir sua promessa para comigo. Quero que me prometa de novo.

Auram já havia estendido a mão para pegar a espada, mas as palavras de Wiz o fizera recuar e hesitar por alguns instantes. Olhou fixamente para a espada, sabia o que ter uma espada de verdade significava, uma espada tinha o poder de proteger vidas, mas também tinha o poder de tirá-las. Auram, obviamente, não usaria ela nessa missão para nenhum dos dois fins, mesmo assim, o peso metafórico de uma arma ainda era algo existente em seu coração. Nada disso importava na verdade, havia feito uma promessa e estava decidido a acompanha-los na missão, usar ou não a espada, tirar ou não tirar uma vida, nada disso importava. Tudo o que importava era poder manter sua promessa para ajudar seus companheiros, seus amigos. Bateu com o punho direito tão forte sobre seu peito que fez um estalo ecoar pela cozinha. Não disse uma palavra, apenas olhou sem piscar para os olhos de Wiz, não iria hesitar mais, iria cumprir sua promessa e iria até o fim com ela. Ajudaria seus amigos sem derramar sangue.

A sábia ficou orgulhosa, o jovem não precisou dizer uma palavra para que ficasse claro seus sentimentos. Auram e Beat eram tão diferentes, mas ao mesmo tempo eram tão parecidos que pareciam irmãos que passaram uma vida inteira juntos, mesmo que só três anos haviam se passado desde que se conheceram. Estendeu novamente a espada na direção do humano, que a segurou com a mão direita e a colocou na cintura, olhando de volta para Wiz, mas agora, com um sorriso no rosto. Estaria ela sorrindo também? O véu sempre impossibilitava que soubessem disso.

— Agora, vocês são membros oficiais dos Fur Hire e, por causa disso, merecem um título. — Começou Wiz, chamando todos para que se aproximassem. Formando um semicírculo ao redor dela. — Eu sou conhecida como a Sábia Fur Hire e acho que já tenho um título perfeito para cada um de vocês. Beat, você será o Esgrimista Fur Hire. — Disse, então Beat se aproximou e ela tocou-lhe a testa com a ponta do seu cajado que havia conjurado do nada. Uma pequena luz prateada brilhou de onde havia sido tocado e despareceu tão rápido quanto apareceu. — Agora, você, Donpa.

Donpa se aproximou, tinha o rosto com alguns farelos de comida misturado em meio aos seus pelos azuis, mas, se percebeu isso, parecia não se importar. Wiz tocou sua testa com a ponta do cajado e a mesma luz prateada apareceu, nomeando-o o Atirador Fur Hire. Depois foi a vez de Recon, que parecia sempre mais comportada que seu irmão mais velho. Aproximou-se pomposa e orgulhosa, mas também não estava livre de ter o rosto meio sujo de comida. Wiz repetiu o ritual e a nomeou a Batedora Fur Hire. Os três já reconhecidos, se afastaram, dando espaço para Auram.

O ritual foi repetido no humano, mas a luz que brilhou em sua testa não era tão forte e parecia vacilante, tremia como uma vela sendo soprada por um vento calmo. Wiz nada falou, mas seu olhar entregava que aquilo não parecia algo normal de se acontecer. Auram não fazia ideia do que aquilo significava e, de repente, a luz brilhou muito mais forte que antes. Numa intensidade tão forte que, exceto por Wiz e Auram, todos ali tiveram que desviar seus olhares para não ficarem cegos. Embora a luz não parecesse incomodar os outros dois. Algo fazia os cabelos de Auram ficarem em pé e seu cachecol se balançar tanto que parecia estar no meio de uma tempestade, embora não houvesse vento. A intensidade da luz foi diminuindo mais rápido do que esperavam e por fim cessou completamente. Todos voltaram seu olhar para o humano que parecia tão perdido quanto eles. Um breve silêncio pairou no ar, até que foi quebrado por Wiz, enfim concedendo seu título: O Espadachim Fur Hire.

Passados tal misterioso evento, muitos enchiam Auram de perguntas e ele não tinha resposta para nenhuma delas. Wiz parecia estranhamente distante, pensativa, talvez sequer ela soubesse o significado daquilo. Beat parecia tão pensativo quanto, mas quando perguntara para Wiz o que poderia ser, ela não o respondera. Ninguém fazia ideia do que aquilo queria dizer e as perguntas não paravam de brotar em suas mentes enquanto caminhavam em direção ao hangar, caminho este que se encontrava perto do campo de treinamento, descendo um longo lance de escadas que parecia leva-los para o centro da terra. Estava absolutamente escuro e todos precisavam se guiar segurando no corrimão para que não caíssem. Nenhum dos mais jovens havia estado ali antes, tendo visto o hangar somente quando este se abria para liberar Fandora para uma missão.

Chegando lá, Wiz estendeu seu cajado e uma bolinha de luz dourada saiu dele, flutuando e dando saltinhos pelo ar. Cada saltinho da bolinha, fazia acender uma lamparina mágica. Em instantes, todo o hangar subterrâneo estava iluminado em vários pontos, parecendo um enxame de vagalumes. O hangar era frio e tinha um vento meio fantasmagórico passando por ali. Sem Fandora, que ocupava grande parte do hangar, parecia vazio, mas, no canto, bem escondido, estava um pequeno barco de madeira redondo, parecendo uma bacia velha de cabine única e pequena. Com um único gurupés longo se estendendo da proa.

— A gente vai voar nessa banheira? — Perguntou Donpa, o sempre irritante. Embora sua pergunta dessa vez fosse justificada. Aquele barquinho não parecia em condições de sequer boiar na água, quiçá voar pelo céu. Todos olharam para Wiz, que soltou uma risadinha e caminhou na direção do barco, respondendo enquanto caminhava.

— Bom, isso é apenas um protótipo que estávamos trabalhando. — Chegou até o barquinho e deu três tapinhas sobre a madeira do mesmo. — Essa é a “versão mini” de algo que pretendemos fazer numa escala bem maior. E ainda nem está pronto, por sinal.

— P-perai... Quer dizer que vamos voar numa coisa que nem mesmo está terminada?! — Indagou a raposa mais velha, boquiaberto e com os olhos tão arregalados que parecia que iriam saltar da órbita. — M-mas e se isso não funcionar?!

— Então será uma viagem bem curta. — Disse Beat enquanto caminhava passando por ele em direção ao barco, sem hesitar. Wiz abriu a porta do mesmo, que descia de cima para baixo, criando uma escada que todos subiram. Com Donpa ficando por último por estar com medo. Cada passo seu era cuidadoso, como se quisesse avaliar a estrutura do barco e ficava atento para qualquer rangido. Não houve nenhum. Uma vez que todos estavam lá dentro, Wiz ergueu seu cajado para o alto e sem demora, as enormes portas do teto do hangar se abriram, se afastando com um rangido alto e doloroso e fazendo cair terra e poeira lá dentro. Aos poucos a luz do sol foi iluminando e aquecendo lugar tão frio e escuro. A sábia adentrou na cabine, encaixando seu cajado num compartimento que parecia ter sido feito justamente para aquilo. O barco começou a tremer devagar e então vibrar intensamente, como se estivesse acordando de um longo sono e quisesse esticar os músculos há tanto fora de uso. Wiz botou as mãos sobre o cajado, fazendo-o brilhar e, devagar, o barco começou a subir. Levantando cada vez mais e mais, até pegar uma boa distância do chão.

Já tão no alto, Donpa olhou para baixo e se arrependeu logo em seguida de tê-lo feito, pulando para trás e caindo sentada de bunda no convés do pequeno barco. Sua irmã riu da situação, mas não parecia tão segura quanto gostaria. Beat estava na proa, com os braços cruzados e olhando para cima, com o céu se aproximando cada vez mais a medida que o barco subia e as portas se abriam. Já Auram, estava ao lado de seu amigo, nervoso, mas mal conseguindo conter um sorriso de empolgação. Era a sua primeira missão, sua primeira vez fora da cidade, além das montanhas, um mundo desconhecido e completamente novo para ele. Era agora um Fur Hire, mesmo sendo humano. Era agora um viajante. Era agora um espadachim. O barco finalmente cruzou as portas antes que terminassem de se abrir, era pequeno o bastante para passar entre elas. A brisa do céu matutino era suave e carinhosa como o beijo de uma amante em seus rostos e pelos. O barco ganhava cada vez mais altitude até alcançarem as nuvens, girou alguns centímetros para a esquerda, até apontar para o oeste. Assim, o barco zarpou e disparou naquela direção, em direção a Cachoeira do Dragão Soberano. Em direção a sua missão. Começava enfim a jornada para encontrar seus amigos.



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