Sentada em minha cama, eu encarava a parede a minha frente, branca como minha mente. Eu não tinha ação, nem falava nada. Depois de tantos sentimentos e pensamentos terem me invadido em pouco tempo, é como se minha mente por um tempo tivesse sofrido uma pane, para me salvar de um colapso. Amber estava ao meu lado e escutava meu silêncio ensurdecedor. Eu havia contado tudo a ela, claro, de manhã cedo, quando ela acordou. A culpa não me deixara dormir direito e eu tinha olheiras escuras contornando meus olhos. Ela não disse nada e apenas ficou ao meu lado enquanto eu me destruía por dentro. Ela sabia que era o melhor a se fazer naquele momento e eu era muito feliz por ter uma pessoa a quem eu podia contar tudo sem ser julgada.
Não importava quantas desculpas até plausíveis eu pudesse arranjar, nenhuma delas justificava minha ação. E, de fato, não havia como justificá-la, pois não importava como se olhasse para o que eu tinha feito, tinha sido errado. A culpa tinha sido inteiramente minha. Eu havia discutido com KyuHyun pela cena que eu havia presenciado mas, horas depois, eu fazia o mesmo, de uma forma bem pior. Eu me sentia hipócrita e terrível.
Eu entendia o que tinha acontecido. Naquele momento, eu me senti fatalmente atraída; essa era a verdade e não havia sentido em negá-la. Talvez a confusão de pensamentos e minha enorme afeição por ele me tivessem feito confundir as coisas por um momento. Ainda assim, eu nunca me perdoaria por ter me deixado levar por algo momentâneo.
Eu agradecia mentalmente por não haver ninguém em casa. Já era à tarde, e todos eles haviam saído de manhã para cumprir suas agendas. Amber avisou que iríamos ficar em casa e esperaríamos por eles para gravarmos o programa no fim da tarde. De manhã, quando falei com eles para lhes desejar um bom dia, não consegui encarar DongHae. Não que eu estivesse brava com ele. Eu estava brava comigo mesma. Sentia que não merecia dirigir-lhe a palavra e nem conseguiria fazê-lo. Ele me olhou com pesar algumas vezes, como se pensasse em algo para dizer, mas por fim sem sucesso. Pelo visto, KyuHyun continuava bravo comigo. Quando eu pensei que não poderia ficar pior, eu dava um jeito de afastar duas das pessoas que eu mais amava no mundo.
Eu até estava disposta a tentar dar um fim nessa briga boba entre mim e KyuHyun, mas não sabia como encará-lo agora. Eu me sentia mal pelo que eu tinha feito, pelo que ele tinha feito e por outros pensamentos que invadiram minha mente, tornando tudo mais obscuro.
Eu não devia estar perdendo o precioso e curto tempo que eu tinha com ele por causa dessas discussões. Eu não podia esquecer que o 30º dia estava muito próximo. Outra coisa que eu havia me dado conta de repente era sobre o fato de KyuHyun nunca ter dito que me amava. Eu já havia dito várias vezes, mas ele nunca respondia. Por que? Será que não era isso o que ele sentia? Por um lado, era até compreensível. Amor é uma palavra preciosa e forte que não deve ser usada em vão. Ainda assim, não pude deixar de sentir uma ponta de tristeza.
Eu e Amber passamos a manhã e parte da tarde normalmente, cada uma entretendo-se da forma que achava mais divertida, sem tocar em qualquer assunto relacionado ao que tinha acontecido. Ela tentava não deixar tudo pior e só me fazia companhia. Ainda assim, fora uma manhã longa.
Os primeiros a chegar ao dormitório foram DongHae e Siwon. Recebi Siwon com um sorriso amigável, perguntando-lhe como havia sido seu dia. Ele conversava do seu jeito habitual, gentil e educado, sem se dar conta de qualquer clima ruim que pairasse no lugar. Não tive coragem de falar com DongHae e pelo visto ele também não. Amber percebia toda a situação, sem comentar nada. Após algum tempo, os outros três chegaram ao dormitório. Ofereci-me para ajudar Amber no preparo de alguma coisa e fui à cozinha com ela, tentando me manter ocupada e esquivando-me do encontro com um dos dois.
Após terminar tudo, pusemos a mesa e deixamos tudo pronto para que eles comessem quando todos estivessem prontos. Fui até a sala e sentei-me no sofá, encarando a TV desligada como se fosse a coisa mais interessante do mundo. Percebi alguém se aproximar. Virei meu rosto em direção do som e tentei disfarçar meu nervosismo quando vi DongHae passando a minha frente, sem jeito, indo em direção ao seu quarto. Suspirei. Ouvi a porta se fechar.
[KyuHyun’s POV]
-- KyuHyun.
Assustei-me quando ouvi meu nome sendo chamado, tirando-me da distração causada pelos meus pensamentos. Olhei para a entrada do quarto e vi DongHae parado, com uma expressão ilegível. Olhei-o por um momento, logo voltando a olhar para a bagunça de roupas que eu estava dobrando antes de ele chegar.
-- Diga.
Ele se aproximou um pouco. Olhei-o de soslaio e vi que ele afagava a nuca e olhava para o chão, sem jeito. Continuei com minha atividade nas roupas.
-- Bem... – ele continuou – Eu não queria me intrometer nem nada, mas... Eu meio que fiquei sabendo da sua discussão com a Marie e...
Esqueci as roupas e olhei-o, prestando atenção. Notei o seu cenho franzido que mostrava preocupação.
-- Eu acho que você devia falar com ela. Ela está super mal e tudo. É que... ela realmente gosta de você – ele disse com uma convicção que anulava a sua hesitação em falar alguns momentos antes.
Eu já havia tido tempo suficiente de refletir sobre isso e concluir que tinha sido uma bobagem. Sim, eu havia tido motivos para ficar bravo na hora, quando a minha irritação me impedia de pensar direito, mas agora, com os pensamentos organizados, eu não via mais motivos para continuar com essa discussão. Afinal, DongHae era meu amigo e eu confiava nele. Por mais que muitas vezes a sua proximidade com ela me incomodasse, isso era algo que eu já tinha aceitado e que eu não iria mudar.
-- Eu sei – eu disse – Estava planejando fazer isso hoje.
Ele assentiu algumas vezes, lentamente, e voltou a olhar para o chão. Estranhei sua ação; ele não fazia menção de que iria embora.
-- Você... tem mais alguma coisa a dizer? – perguntei com curiosidade.
Ele olhou para os lados algumas vezes e colocou as duas mãos nos bolsos da frente de sua calça. Eu não me lembrava da última vez que eu havia visto DongHae tão sem jeito.
-- É... Os outros já chegaram, Leeteuk disse para ir comer logo antes que esfrie.
-- Tudo bem, assim que eu terminar isso – indiquei as roupas a serem dobradas em minha cama – eu vou.
Ele concordou com a cabeça. E ainda não tinha ido embora. Olhou para os pés e ficou se balançando levemente para frente e para trás. Eu estava convencido de que ele queria falar mais alguma coisa e já estava ficando impaciente com essa enrolação. Franzi as sobrancelhas.
-- Se você tem mais alguma coisa a dizer, diga logo, eu hein.
Ele voltou a olhar para mim. Busquei os seus olhos na tentativa que captar algo deles. Eles ainda mostravam a mesma preocupação de quando ele entrara no quarto, mas agora tinha algo a mais. O que era? Tristeza...? Ansiedade...? Arrependim... Culpa.
-- KyuHyun.
Eu esperei que ele continuasse. O que não aconteceu.
-- Esquece, não é nada demais.
-- Tá bom... – mesmo achando muito estranho, resolvi deixar passar.
-- Eu vou indo agora.
-- Okay.
Encarei as suas costas até que ele fechasse a porta.
[KyuHyun’s POV - end]
Eu olhava para a porta do quarto deles com expectativa. Assim que vi DongHae saindo, tomei coragem e fui até ele. Ele parecia distraído quando saiu de lá, então se assustou um pouco quando apareci do nada na sua frente.
-- Ai, é você, Marie, oi – sorriu.
Não pude evitar sorrir de volta.
-- Eu posso falar com você um momento?
-- Claro.
Indiquei com a cabeça que me seguisse e ele o fez. Fui até o meu quarto e fechei a porta. Encarei a maçaneta por um tempo, organizando mentalmente o que diria a ele. Ele esperava pacientemente no meio do quarto. Senti seu olhar em minhas costas.
-- Eu – disse, virando-me para ele – queria te pedir desculpas - levantei uma mão quando vi que ele abria a boca para interromper. Pensei por mais um momento e voltei a falar:
-- A culpa foi inteira e unicamente minha. Não importa se eu estava triste ou confusa, eu não tinha o direito de ter feito o que fiz. Eu não quero causar nenhum tipo de dano à amizade de vocês, até porque eu acho que um namorado nunca irá substituir um amigo, principalmente um tão antigo e precioso como você.
-- Não é assim – ele protestou - Você sabe que também é muito importante para ele e para mim.
-- Não, não, não é a mesma coisa – insisti. Ele não parecia convencido do meu ponto de vista mas não falou mais nada.
-- É que – voltei a falar – É ele, DongHae. Sempre foi, sempre será ele.
-- Eu sei – ele disse, sorrindo – Você não tem que se desculpar por nada, não estou bravo, nunca estive, você sabe.
Assenti com a cabeça.
-- Eu precisava pedir perdão para pelo menos me sentir um pouco melhor.
Ficamos um momento num silêncio confortável.
-- Por favor – pedi, a voz falhando levemente – não se afaste de mim. Eu não acho que serei capaz de agüentar.
Ele sorriu, seus olhos pueris e doces sorrindo junto, e se aproximou de mim, abrindo os braços. Nem sequer pensei antes de correr e me embalar neles.
-- Você sabe que eu nunca faria isso – garantiu.
Acenei positivamente com a cabeça em seu peito. Ainda sentia que não merecia a amizade e o carinho de uma pessoa tão maravilhosa, mas estava disposta a me acostumar com a idéia. Afastei-me um pouco, olhando para ele e levantei meu dedo mindinho.
-- Promete?
Ele riu, enrolando seu dedo mindinho no meu.
-- Prometo.
-x-
Eu olhava para a porta do quarto deles com expectativa. Mas, desta vez, eu esperava por outra pessoa. Todos já estavam na cozinha e eu podia ouvir o barulho de talheres e a conversa animada vindo de lá. Tentei colocar todo o nervosismo de lado quando parei à frente da porta, a mão na maçaneta. Quando tentei virá-la, percebi que ela já se mexia e dei um passo para trás. Olhei para o rosto de KyuHyun e quase pude ver meu reflexo nos seus olhos escuros, tamanha era a sua surpresa. Provavelmente, eu tinha a mesma expressão que ele. Encaramo-nos feito dois bobos por um momento e ele foi o primeiro a quebrar o silêncio.
-- Aonde você estava indo?
-- F-falar com você. E você?
-- Também.
Mais um momento estático se passou até que nós dois, ao mesmo tempo, buscamos os braços um do outro. Uma enorme sensação de alívio tomou conta de mim quando pude sentir a pele morna de seu pescoço abrigar eu rosto. Não pude evitar o sorriso que aparecia em meus lábios.
-- Me perdoa, por favor – eu disse, a voz abafada.
-- Tudo bem, tudo bem, não vamos mais falar disso.
Ficamos daquele jeito por um tempo, sem falar nada. Naquele momento, eu percebi que o nosso erro comum tinha sido a falta de comunicação, o ciúme, o orgulho. Percebi também que nós dois havíamos descartado o último - e maior – para tentarmos fazer com que tudo voltasse ao normal. Eu sabia que, assim como não foi fácil para eu fazer isso, não tinha sido fácil para ele também. Mas para tê-lo ali comigo, sorrindo para mim, eu faria o que fosse. Dali em diante, decidi ser mais compreensiva, decidi que iria ouvi-lo antes de surtar com qualquer coisa, que iria me livrar do meu orgulho idiota que só piorava tudo sempre que fosse preciso, decidi fazer o que fosse possível para que tudo desse certo. Porque era isso que o amor fazia.
Porém, ainda havia algo que eu tinha que dizer. Eu tinha medo de sua reação e de como as coisas ficariam depois que eu contasse, mas eu não podia agir como se não tivesse acontecido nada.
-- Kyu, eu preciso te falar uma coisa.
-- Hum? – ele perguntou, afastando-se para olhar para o meu rosto.
Fiquei incapaz de encará-lo naquele momento, então olhei para baixo. Ele levantou meu queixo com seu dedo, obrigando-me a olhar para ele. Olhava para mim como se tentasse ler minha mente e entender a minha hesitação. Porém, sua expressão me deu confiança o suficiente para começar:
-- Aconteceu uma coisa...
-- O que? – me encorajou a falar.
Senti meus olhos arderem com lágrimas que ameaçavam aparecer. Respirei fundo para conseguir falar sem que elas descessem:
-- Antes de te falar, eu quero pedir que me perdoe, eu prometo que isso nunca, nunca irá acontecer de novo – meu tom era suplicante, quase desesperado.
-- Ei, tudo bem, não chore – ele disse, afagando meu rosto com as costas da mão.
Fiquei em silêncio. Não tinha nem idéia de com qual cara eu iria falar aquilo para ele. Ele tinha uma expressão que parecia mostrar que ele estava se lembrando de alguma coisa. Fitou o nada por um momento, o cenho franzido, e voltou a olhar para mim. Antes que eu pudesse falar alguma coisa, ele disse:
-- Você me ama?
-- Sim.
-- Essa é a única coisa que me importa saber – ele assegurou, sorrindo.
Estranhei sua reação. Era quase como se ele já imaginasse o que eu ia falar. Porém, a sua mão que segurava a minha e o seu polegar que a afagava eram suficientes para me garantir de que tudo estava bem novamente.
-x-
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