Era uma bela manhã na cidade de Seul. Eu andava vagarosamente, sentindo a brisa fria tocar meu rosto e encarando meus pés enquanto andava pela calçada. O tempo não estava tão gelado, porém o fato não me impediu de usar um casaco longo e um cachecol, além de óculos escuros. Os acessórios pareceriam aos olhos de outras pessoas coisas que alguém usaria por não ser tão resistente ao tempo ameno. Porém, elas desconheciam o verdadeiro propósito de me vestir assim.
Olhei para os lados, passando por bancas de revistas, onde havia inúmeros jornais e revistas nos quais eu poderia ver minha própria foto, meu próprio nome nas manchetes. “Estrangeira participante de reality show namora um idol?”, “Grande segredo revelado envolvendo membro do Super Junior”. Em algumas capas, KyuHyun me segurava e meu rosto não era tão visível por estar parcialmente coberto pelo dele. Em outras, eu aparecia sozinha em fotos menos recentes, quando eu era só uma pessoa que vinha de longe para participar de uma espécie de intercâmbio.
Ouvia as pessoas conversarem sobre mim enquanto paravam para olhar as revistas. Ouvia quando diziam o meu nome enquanto mexiam no celular e logo se inclinavam para o lado para que a pessoa que as acompanhavam também lesse as notícias. Puxei meu cachecol para cima, afundando meu rosto nele para tentar me esconder mais ainda, e continuei a andar.
“Por favor, fique”.
Não havia parado para pensar se a minha decisão havia sido a correta. Eu havia concordado em passar mais um tempo, agora indefinido, no país, vivendo em algum hotel enquanto KyuHyun tentava organizar tudo, acostumar as pessoas com a notícia e decidir o que faria dali para frente. “É apenas por algum tempo, enquanto nós decidimos o que fazer”. Como eu poderia dizer não para aqueles pedidos? Para aqueles olhos? Quando eu mesma não queria partir? Era simplesmente impossível. Então, decidi fazer algo que eu não me permitia fazer com freqüência: seguir meu coração.
Puxei o pedaço de papel do meu bolso e li mais uma vez o endereço do hotel que KyuHyun havia me recomendado. Disse que não era um local muito chamativo e que não era tão longe de seu dormitório, portanto, seria um lugar perfeito para minha estada. Ele até havia se oferecido a pagar para mim, mas eu recusei. Após checar que estava indo para o lugar certo, coloquei o papel de volta no meu bolso e continuei a caminhar.
Passei por mais algumas ruas, dobrei a esquina e segui em frente mais um pouco, até que parei em frente a um pequeno prédio, com apenas quatro andares, mas que era imponente por sua arquitetura simples e elegante. Um portão preto guardava o local, que era delimitado por paredes baixas na cor branca. Um belo jardim se entendia por sua entrada, a grama baixa e verde contrastando com o colorido das diversas flores que adornavam o local. Um caminho de pedra havia sido aberto pelo jardim, levando até a porta do lugar. O prédio tinha um tom rosado bem claro, com contornos brancos na sua porta e nas suas janelas. Era um belo local.
Fui até a campainha e a toquei, ouvindo o som ecoar por dentro do local. Não passou muito tempo até que uma senhora sorridente que devia estar em seus 40 e poucos anos saiu e veio até o portão. Abriu-o e me olhou, colocando as mãos uma sobre a outra na frente de seu corpo.
-- Olá, moça! Em que posso servi-la?
-- Hã... Eu reservei um quarto aqui. – disse de forma acanhada.
A mulher esperou que eu continuasse, seu sorriso doce nunca deixando seu rosto. Suspirei e puxei o cachecol de meu rosto para baixo, revelando-o. Sua expressão não mudou muito ao perceber quem eu era, mas não perdi o leve arregalar de olhos que ela deu por um instante, logo estendendo sua mão para me cumprimentar adequadamente.
-- Olá, senhorita Marie. Separei o seu quarto, acompanhe-me, por favor.
Concordei com a cabeça, esforçando-me para não tremer diante de tamanha estranheza que aquela situação me causava. Era muito esquisito que todos de repente soubessem o meu nome e conhecessem o meu rosto. Mas, por algum motivo, aquela mulher não me despertava medo nem desconfiança. Acompanhei-a pelo caminho de pedras até a entrada.
O interior do local era tão elegante quanto o exterior. O térreo tinha o saguão e um balcão grande em forma de meia-circunferência, onde os recepcionistas se encontravam, todos com um ar simpático. Ao longe, um espaço para alimentação, com várias mesas redondas. Fui até o elevador e entrei com a mulher, olhando para os lados, tentando me acostumar com o local.
-- Meu nome é HyeMi, a propósito.
-- Prazer em conhecê-la – eu disse, sorrindo, e ela retribuiu.
Quando o número 3 apareceu no letreiro no elevador, a porta abriu e nós saímos. Havia um corredor e três portas, cada uma indicando um quarto diferente. Paramos em frente à porta do meio, que ela indicou ser a minha reserva. Ela então me entregou uma chave e disse que mais tarde voltaria para me explicar mais algumas coisas sobre o local. Agradeci-a e me despedi com um curto aceno com minha mão. Esperei que ela entrasse no elevador e girei a chave na fechadura, ouvindo o clique da tranca. Entrei.
A primeira palavra que me veio à cabeça com a visão do local foi conforto. Havia uma cama de casal com lençóis brancos e travesseiros da mesma cor no canto do lugar. Um criado-mudo com um abajur e um relógio ao lado da cama. Um tapete redondo, uma mesinha de centro rodeada por três cadeiras acolchoadas. Uma porta branca no canto da parede, que devia ser o banheiro. Uma cômoda enfeitada por alguns objetos de porcelana. Um frigobar e um pequeno fogão, ao lado de um armário com utensílios de cozinha. Era tudo simples e elegante. O lugar me passava uma sensação de conforto, de lar. Sim, aquele seria o meu lar por agora. Abandonei a minha mala perto da cômoda, uma forma de lembrar a mim mesma que teria que arrumar minhas roupas depois, e fui até uma saída em forma de arco que levava à sacada.
Apoiei meus braços no balcão semi-circular e observei a paisagem. Tentei ignorar o meu medo de altura enquanto olhava o jardim lá embaixo, reluzindo sob os raios do sol, algumas pessoas, provavelmente outros moradores, entrando pelo portão. A mulher que me atendeu mais cedo jogando água em algumas flores com um regador. Não sei se “hotel” era a palavra certa para chamar o lugar. Era algo mais familiar, mais como uma pensão. Decidi que gostava do lugar.
De repente, senti meu celular vibrar em meu bolso. Vi o nome na tela e atendi rapidamente.
-- Amber?
-- Oi, Marie. Já chegou ao lugar que você reservou?
-- Já sim, e você?
-- Eu também, há pouco tempo. Acho que não é tão longe do seu, pelo que vi no endereço. Dá para ir a pé se eu não estiver com preguiça.
-- E quando você pretende vir?
-- Acho que mais tarde, depois de arrumar minhas coisas e tomar um banho. E comer. E dormir.
-- To vendo que você só vem amanhã então – fingi irritação.
-- Não, eu tentarei ir hoje, não se preocupe – ela riu e eu a acompanhei. Depois, um silêncio se alojou e eu fiquei séria de repente. Voltei a falar.
-- Amber.
-- Hum?
-- Você acha que tomamos a decisão certa? Que tomei a decisão certa?
Ela ficou em silêncio por um tempo, como se analisasse minha pergunta. Por fim, disse:
-- Não sei, isso só saberemos com o tempo. Mas, deixando isso de "certo ou errado" de lado, estou feliz por termos ficado. Embora eu não saiba por quanto tempo a mais, é bom estar aqui.
Sorri e concordei com um “uhum”. A ligação encerrou com ela dizendo que ia arrumar as coisas e eu me despedi com um “até mais”. Chequei a hora no relógio, que marcava 10h30min e decidi que era um horário bom para ligar para meus pais e atualizá-los dos acontecimentos.
Enquanto falava com minha mãe, expliquei que tinha decidido ficar por mais um tempo, já que agora não tínhamos nenhum compromisso com o programa e podíamos andar mais livremente pelo país sem precisa se preocupar com horários de gravação. Omiti o fato de estar conhecida pelo país inteiro por conta de minha relação com um ídolo famoso e o fato de meu rosto estar em quase todos os sites de notícias, revistas e jornais. Ela não precisava dessa preocupação. Dedicada como sempre, ela me perguntou se eu não precisava de mais dinheiro e, antes que eu pudesse assegurá-la de que não seria preciso, ela já disse que iria mandar mais para minha conta amanhã (ou mais tarde, de acordo com o meu fuso-horário) mesmo. Suspirei, desistindo, Conversei com meus pais por pouco mais de meia-hora, atualizando-me dos fatos que tinham acontecido enquanto eu estava longe, mas logo tive que desligar (ligação internacional era cara demais).
O resto da manhã e parte da tarde se resumiu a organização de minhas roupas e minhas coisas pela suíte, interrompidos pelo banho e almoço. Optei por comer no térreo junto com alguns outros moradores, já que não havia tido tempo ainda de comprar comida para encher minha pequena geladeira.
Mais tarde, depois de todo o dever feito, sentei-me em minha cama e encarei a paisagem no lado de fora, ao longe. Era quase fim de tarde e os raios alaranjados entravam pelo arco da sacada, colorindo o meu quarto. Sabia que KyuHyun devia estar muito ocupado com sua rotina corrida e com reuniões com os diretores de sua empresa, os membros de seu grupo e seus managers, enquanto tentava convencer a todos que o que ele tinha feito não era errado, enquanto tentava acostumá-los com a idéia, enquanto tentava organizar tudo para que nem ele, nem eu e nem seus amigos saíssem prejudicados. Suspirei, sentindo um leve aperto no meu peito com tal pensamento. Sabia que Amber devia estar em seu sétimo sono, já que não havia aparecido ainda. Não podia ligar para nenhum dos dois e, por falta melhor do que fazer, decidi ligar o notebook e navegar na internet.
Foi uma péssima idéia.
Comentários odiosos envolvendo minha pessoa estavam postados por quase todos os sites de notícias que apresentavam minha foto com KyuHyun como manchete. “Quem essa garota pensa que é?”, “Deveria deixá-lo em paz e ir embora”, “Biscate”, “O que o Oppa vê nela?”, “Por quê?”, “Não gosto dela”. Senti meu estômago revirar enquanto meus olhos passavam por dezenas e dezenas de comentários desse tipo. Eu já devia imaginar que eu receberia esse tipo de tratamento, mas a imaginação não se comparava nem um pouco com a dura realidade jogada em sua cara. Mais uma vez, eu me via repensando minha decisão. Será que eu havia feito o certo? Será que valeria a pena? Será-
Ouvi batidas em minha porta. Fechei todos os sites e me dirigi à porta. Pensei que finalmente Amber tinha tomado vergonha e criado coragem para vir até aqui. Abri a porta. Não era ela.
KyuHyun me olhava com um leve sorriso, que eu sabia que ele estava usando para tentar esconder o cansaço e a preocupação de seus olhos. Ignorei a surpresa que sentia ao vê-lo e prontamente o puxei para dentro, fechando a porta e me jogando para ele para um abraço.
Ficamos assim por um momento, sem falar, apenas abraçados. Eu mal podia imaginar o que ele devia estar passando agora. Todos em sua empresa deviam estar furiosos com ele. Leeteuk devia estar dando tudo de si para tentar ajudá-lo, para impedir que sua imagem fosse prejudicada. Suas fãs deviam estar divididas, umas o apoiando incondicionalmente, outras o odiando, afirmando sentir-se traídas. Ele era o assunto de milhares de pessoas por algo que devia ser normal, que devia ser corriqueiro, mas que no mundo dele, no mundo da fama, era visto com maus olhos, com repreensão. Ele devia estar assustado, e devia se sentir culpado por mim, por seu líder e por seus amigos. E eu estava assustada com a fama repentina, com os ataques de ódio que eu estava começando a sofrer, por ver o meu rosto em revistas e artigos de internet. Estávamos amedrontados, mas achávamos forças nos braços um do outro e, por isso, permanecemos abraçados.
Quando finalmente nos separamos, ele foi o primeiro a falar.
-- Como você está? – disse, afastando meus cabelos de meu rosto.
Voltei a pensar nos comentários sobre mim, em tudo o que as pessoas estavam falando sobre mim, mas decidi que ele não precisava de mais preocupações e apenas proferi um fraco “bem”. Antes que ele pudesse ver através de minha mentira, continuei:
-- E você?
-- Está tudo bem... Quer dizer, todos ainda estão meio chocados, mas eu vou dar um jeito de fazer com que todos aceitem. Espere só mais um tempo.
-- E os outros?
-- Eles não serão prejudicados, não se preocupe. Apenas Leeteuk, que insiste em tomar a responsabilidade de tudo para si, é que está envolvido também, mas o assunto é comigo, então não deixarei ninguém colocá-los no meio.
Concordei com a cabeça. Ele olhou ao redor por um momento e voltou a falar.
-- Gostou do lugar?
-- Sim, adorei – sorri.
-- Claro, fui eu que escolhi, eu tenho bom gosto – disse, convencido. Dei um leve murro em seu braço e ele riu, brincalhão. Era admirável que ainda conseguisse manter o bom humor mesmo naquela situação. Segurou minha mão e voltou a olhar para mim.
-- Não tem nenhum problema você estar aqui? – perguntei.
-- Vim escondido. Estava passando por aqui perto e escapei por um momento. Tive pessoas para me ajudar, então não foi difícil.
-- Você é maluco mesmo – disse, impressionada com a sua coragem e inconseqüência. Ele apenas deu de ombros, como se não fosse nada demais. Passou mais algum tempo em silêncio, pensando. Eu apenas observava seu rosto.
-- Escuta... – começou – Eu sei que deve estar sendo difícil e estranho para você, mas acredite em mim quando eu digo que resolverei a situação, sim? Todo mundo só está meio surpreso, só isso, mas logo quando as coisas se acalmarem, decidiremos o que fazer. Por enquanto, apenas fique aqui e tenha paciência, certo? – ele pediu, como se estivesse com medo de minha resposta. Sorri. Numa situação como essa, ele ainda se preocupava mais comigo do que consigo mesmo. Aproximei-me dele e envolvi meus braços em seu pescoço.
-- Não se preocupe, eu não vou a lugar nenhum. Esperarei o tempo que for preciso – assegurei-o e percebi que relaxou com minha resposta. Aconcheguei meu rosto em seu peito e ele me abraçou de volta. Percebi naquele momento que sabia a resposta para minha pergunta feita mais cedo. Não importava o que aconteceria dali em diante, não importava que todos me odiassem, eu não me arrependeria da decisão de ter ficado por mais tempo. Mesmo sabendo que seria difícil, eu estava disposta a tentar fazer com que todos me aceitassem.
Eu havia tomado a decisão certa.
-x-
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