Sentia uma forte dor na região de sua nuca, além de que o resto de seu corpo parecia dormente.
Abria os olhos com dificuldade, piscando inúmeras vezes para se acostumar com a luz.
Ao abrir completamente as pálpebras, olhou em volta, apenas movimentando seus orbes azulados, já que sua cabeça parecia não responder o comando de olhar para os lados.
Estava em um quarto branco, deitado numa cama e tinha uma bolsa de sangue ao seu lado.
Um hospital?
- Ah, vejo que acordou. – Seguiu a voz com o olhar, encarando um homem de jaleco branco, feição cansada e olhos gentis. Suas rugas e olheiras demonstravam que há tempos não dormia direito e seu cabelo preto acinzentado parecia de alguém que tinha acabado de acordar. – Não se esforce muito, você e a garota saíram com vida por sorte.
De repente, tudo fez sentido para o cubano, que arregalou os olhos e levantou o tronco.
- A Romelle! Onde está a Romelle?! – Gritou, puxando a seringa do sangue para tentar sair da cama.
- Ei, ei, ei, calma! – O médico falou, segurando o latino pelos ombros. – Ela está bem. Está em outro quarto. – Conseguiu sentir que os ombros do mais novo relaxaram, voltando a sua posição inicial. – O que está sentindo?
- Dor. – Falou com uma voz rouca e irônica, mesmo que não tentasse.
- Hm. Interessante. Mais alguma coisa? – O acinzentado percebeu a imaturidade do maior, arqueando uma sobrancelha e deixando de anotar algo em sua prancheta para olha-lo.
- Também estou com fome. Tem alguma lanchonete por aqui? – Perguntou, olhando para o teto.
O mais velho suspirou, deixando os papéis na mesa e cruzando os braços ao lado do mais alto.
- Olha aqui, Lance. Eu estou tentando te ajudar. Talvez você não confie em mim, ma-
- Onde estou? – O cortou. Também tinha a possibilidade de ter sido raptado no caminho, certo?
- Está na base dois mil seiscentos e quarenta e sete da Blade of Marmora.
- Por que estou aqui?
- Você saiu muito ferido da casa de uma das agentes, e seu amigo, Hunk, o trouxe ‘pra cá. Você e a senhorita chegaram muito machucados aqui. Mas não se preocupe. Daqui a uma semana poderá ter alta.
Os olhos claros de Lance se arregalaram outra vez.
- Daqui a uma semana?! Não posso! Tenho trabalho ‘pra fazer! E-eu não posso simplesmente-
- Lance. – O menor segurou seu ombro esquerdo, o encarando. – Sei que trabalha no Galra Empire. Sei que está tentando salvar seu namorado. – Olhou para baixo, voltando a encara-lo logo depois. – Mas não vai conseguir ajudar machucado assim. Você levou um tiro nas costas e recebeu uma pancada forte na cabeça. Não sei como não teve uma concussão. – Disse, esfregando os olhos com o dedão e o indicador, suspirando em seguida. – Olhe, para o seu próprio bem, só saia daqui a uma semana, entendeu?
O rapaz mais novo nada respondeu, apenas se virando para o lado oposto ao médico e deitando sua cabeça no travesseiro.
Ouviu o mais baixo suspirar e sair do cômodo. Fechou os olhos, dormindo um pouco.
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Já era de noite quando acordou, já que tudo parecia silencioso, exceto pelo medidor de batimentos cardíacos ao seu lado.
Descolou seu tronco do colchão e se levantou da cama, retirando os equipamentos médicos de si.
Pegou suas roupas normais e as vestiu, calçando o tênis por último.
Abriu a porta lentamente, olhando os dois lados dos corredores, percebendo estar sozinho ali. Foi de porta em porta, procurando pela loira, quando chocou com um corpo menor que seu e percebeu ser Romelle.
- Lance? Deveria estar descansando! – Gritou num sussurro.
- E você também, espertinha. – Falou no mesmo tom, a puxando para saírem juntos dali. – Mas pelo menos te encontrei mais facilmente. Tem ideia de como saímos daqui?
- Vai ter uma escadaria que nos leva até uma loja. A essa hora deve estar fechada, não tem ninguém lá.
- Ótimo. – Disse, a levando para o local que ela dizia ser.
Passaram por diversos corredores, mas no final, conseguiram sair da base e da loja. Lance ligou para Hunk, pedindo que o mesmo os fossem buscar.
- Mas o médico já deu alta? ‘Pros dois? – O samoano perguntou no momento em que os dois entraram no carro. Sua voz meio rouca e os pijamas que vestia denunciavam que fora acordado de seu sono. – Não ‘tá muito cedo, não?
- É que os nossos ferimentos são leves. – Encarou a menor pelo canto do olho, que assentiu, apesar de que o moreno não conseguisse a ver.
- Hm. Se é assim, tudo bem. – Falou por fim, os levando para a casa dos dois.
Desceram do veículo, entrando na residência dos rapazes. O oceânico subiu para o seu quarto, praticamente dormindo, e os mais velhos fizeram o mesmo.
- Lance. – A
de olhos claros ditou, chamando a atenção do acastanhado. – A sua bochecha está descoberta. – O de cabelos curtos tentou olhar sua maçã direita, não conseguindo ver nada. – Está arranhada, só isso. Vou fazer um curativo. – O maior assentiu, a levando para o seu quarto.
Se sentou na cama, esperando que a mais velha colocasse a atadura em seu rosto.
Viu quando a mesma entrou no cômodo com a caixa de primeiros-socorros, pegando firmemente em seu rosto e passando água oxigenada.
- Ai! ‘Pra que isso? O médico já limpou aí! Ai!
- Não limpou tudo. Aliás, você merece sofrer com isso tudo. Quem disse ‘pra responder aquela garota doida? E quem disse que era ‘pra você levar um tiro? Idiota. – O mais novo grunhiu ao sentir dor de novo, resmungando algo em espanhol. – Mas a culpa disso tudo foi minha. – O garoto a encarou, com a sobrancelha levantada. – Se eu não tivesse feito barulho naquela hora, você não teria se machucado. Se eu não tivesse suspirado, Yorak talvez não estivesse... não estivesse-
- Ei, calma, ainda não sabemos o que houve com Yorak. – O cubano a cortou, a abraçando. – A culpa não foi sua. Você reagiu do modo certo. Afinal, ouvir que mais de oitocentas pessoas são sequestradas e provavelmente mortas não é fácil, não. – Falou, dando um beijo em sua testa, lhe confortando. – A culpa não foi sua, Romelle. Não foi de ninguém. – Segurou seus ombros, sorrindo. – Então, pare de se culpar, ok? – Ela assentiu, coçando os olhos. – Vai se trocar, vai. Tem roupas ‘pra você no banheiro. – Acenou com a cabeça, indo em direção ao cômodo.
O latino suspirou, dando um sorriso pequeno.
Tirou suas roupas, vestindo apenas seu calção-pijama. Deitou na cama, colocando seu cobertor por cima e fechando os olhos.
Conseguiu ouvir a loira abrir a porta do banheiro e suspirar, acariciando seu cabelo.
- Boa noite, Lance. – Disse, se deitando no colchão.
O acastanhado sorriu, feliz.
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Passava as folhas com uma das mãos, enquanto a outra segurava sua bochecha esquerda. Suas pernas estavam abertas e em cima do sofá, uma deitada e a outra levantada, em noventa graus as duas.
Suspirou, fechando a pasta e olhou para frente, ainda com a mão no rosto.
Os gritos incessantes do garoto no cubículo o faziam ficar com dor de cabeça. Caralho, ele não podia ficar quieto?
- Senhor Lotor, o item 59-04 parece apresentar algum tipo de progresso.
- Só me responda uma coisa. – Ela o respondeu com um “sim, senhor”. – Qual o nome dele mesmo? – Apontou para a sala a sua frente, de onde vinha os gritos.
- Seu nome é James Griffin, senhor. Ele nasceu em Nova Iorque, mas mora em Los Angeles desde pequeno. Tem dezessete anos, vai fazer dezoito daqui a três meses, e acabou de sair do colégio.
- Qual o bicho? – Perguntou, ainda entediado.
- Foi inserido o sangue do Electrophorus electricus, mais conhecido como poraquê. Um animal das águas dos rios do Amazonas, um estado do Brasil. O poraquê é uma enguia elétrica, podendo dar um choque de até mil e quinhentos volts. – O platinado tirou a mão da bochecha, com uma sobrancelha arqueada e um pequeno sorriso ladino.
- Ah, agora ficou interessante. – Disse, se levantando e batendo as mãos na calça. – Bom, ‘tá na hora de conversar com o... – Encarou a mulher.
- James?
- Isso. James. – Falou, andando até a porta de metal, com as mãos nas costas. – Abra a porta.
Esperou um tempo, até passar pelo portão e chegar perto do acastanhado.
Ficou encarando o garoto. Seu rosto e mãos estavam caídos e seu corpo estava preso a uma maca vertical. A roupa estava rasgada e por toda a pele tinha arranhões e machucados de eletricidades.
Não conseguia enxergar seus olhos, então o maior apenas puxou o queixo do mais baixo, podendo ver sua face.
O mais novo deu um rosnado, e o mais alto sentiu um choque em sua mão, a retirando rapidamente. Encarou o menor, que o encarava com os olhos semicerrados, mostrando seus dentes.
O de cabelos longos deu um sorriso.
- Você tem belos olhos. – Os orbes do mais novo eram da cor azul, mas umas listras tortas, que pareciam raios, estavam por cima das írises.
- Vai a merda. – Voltou a encarar o chão, se jogando para frente. – Me deixe em paz.
- Então... James. – Percebeu o de cabelos curtos tencionar, sorrindo. – O que você acha que está fazendo aqui?
- Estou sendo usado como bicho de laboratório. Mas a polícia vai acabar com você. ‘Cê vai tomar no cu, cara. – O de orbes azulados sentiu o americano lhe dar um soco na barriga o fazendo grunhir.
- Você diz que eu vou tomar no cu. Mas não consegue ver sua situação. – Deu uma risada.
Deu-lhe as costas, andando para fora.
- Continuem com o experimento. Aumentem a dose em vinte e cinco por cento. – Disse, conseguindo ouvir mais gritos vindo de trás de si, e algumas luzes amareladas. Deu um sorriso ladino, saindo da ala de testes. – Como está o item 42-63?
- Ele estava bem da última vez que foram lá.
- Alguma informação do Lance?
- Nada, senhor.
- Uhum. Obrigado. Se precisarem de mim, estarei na minha sala.
- Sim, senhor.
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O cubano se espreguiçou, bocejando. Coçou a barriga, se levantando da cama, pisando na mão da loira sem querer. Sorte que ela tinha sono pesado e apenas grunhiu algo, se virando para o lado oposto.
O rapaz – com mais cuidado – passou por cima dela, pegando uma muda de roupa para trocar depois de tomar banho.
Ao sair do chuveiro, desceu as escadas, se encontrando com Pidge e Hunk, que conversavam.
O latino arqueou a sobrancelha.
- Vocês não deviam estar no trabalho?
- Hoje a gente não tem. Não me pergunte porquê, eles só disseram que a gente não tinha. – A italiana lhe respondeu, folheando o jornal. – Hunk, o macarrão ‘tá pronto?
- ‘Tá quase, Pidge. Se acalma, esfomeada.
- Não sou esfomeada. Só estou com fome.
- Pidge, são meio-dia e dez e você tomou café de nove horas da manhã. Você é, sim, esfomeada. – A loira não disse nada, apenas murmurou algum muxoxo, escondendo o rosto nas páginas.
- Ei, Hunk? – Ouviu um “hm?” como resposta. – ‘Cê pode me dar uma carona até o G.E? É que a minha coluna ‘tá doendo um pouco ainda. – O samoano parou de olhar para a frigideira no fogão para encara-lo, com a sobrancelha arqueada.
- Mas você não disse que o médico te deu alta?
- E me deu. Mas ainda ‘tá doendo.
- O que aconteceu? – A europeia perguntou, ainda lendo alguma matéria que parecia ser mais interessante que o assunto, mas todos sabiam – incluindo ela mesma – que era apenas um modo de demonstrar a Lance o quanto ela ainda estava chateada e com raiva. – Você arranhou a coluna em algum lugar ou coisa parecida?
- Eu levei um tiro nas costas. E fiz algumas aftas na minha boca. E meu pescoço ‘tá doendo como o inferno. – Ela fez um “uhum, parece legal”, tentando ao máximo ignorar a dor que sentia pelo amigo. – E aí, vai me levar ou não?
- Por que você não tira uns dias de folga? – O oceânico deu uma ideia, que foi logo descartada ao ver a face do mais velho. – Tudo bem, eu entendi. Sem chance alguma que você vai deixar o Keith sozinho.
- Exatamente. – Disse, se sentando na mesa e comendo o que o moreno tinha acabado de cozinhar.
Ao terminar, se levantou da cadeira, indo escovar seus dentes e pegar seu celular, voltando para chamar Hunk e dizer que eles estavam atrasados.
- Vai, Hunk, vai, Hunk, vai, Hunk! – Falava enquanto batucava com os dedos o descanso de braço do carro do maior.
- ‘Tô indo, ‘tô indo! – Disse, dando uma curva.
Mais alguns minutos, o acastanhado saiu pulando do veículo, entrando no local e dirigindo-se a sua ala de trabalho.
- Oh, Lance! – Ezor lhe chamou, sorrindo. – Como você está?
- Bem, e você? – Perguntou, apressado, enquanto vestia a armadura.
- Ah, ‘tô bem também. – Lhe respondeu, brincando com algum fiapo de sua blusa, assobiando.
Quando o mais alto terminou, pediu para Zethrid abrir o portão, o deixando passar.
Andou pelo gramado, retirando peça por peça da vestimenta, que, além de quente, era pesada demais.
- Keith! – Gritou, chamando pelo mais velho. – Keith, seu cabeção! – Sentiu algo bater em suas costas e logo se viu deitado de barriga no chão, ouvindo risadas vindo de cima de si.
- Senti sua falta, Lancey. – Disse, saindo de cima dele, o que fez o maior se levantar e ficar sentado no chão, com pernas de índio e coçando a nuca, com uma expressão de dor. – ‘Pra que essa careta? Só porque eu pulei em você? Prometo não fazer de novo, me desculpe. – E só então percebeu a atadura na bochecha do mais novo, o que o fez franzir o cenho. – O que houve? – Perguntou, puxando seu queixo para encara-lo melhor. – Você se machucou?
- Não foi nada sério. – Falou, retirando as mãos do menor de seu rosto, as beijando. – Também senti a sua falta, meu amor. – Comentou, passando a dar selinhos pelo rosto do coreano, que sorria, dando umas risadinhas fofas.
Se levantaram, indo em direção a floresta, de mãos dadas, jogando conversa fora. Lance perguntava se mais alguém tinha feito algo consigo. Keith respondia que não, mesmo o latino percebendo o asiático parecer um pouco mais triste. Keith perguntava como estava o seu dia-a-dia, nunca lhe contando a plena verdade, já que tinha medo do mais velho ficar puto consigo depois do que aconteceu ontem.
- Ei, Lance. – Fez um “hm” como resposta. – Como pretende me tirar daqui? Não é algo assim tão fácil e você fala como se tudo fosse ser do jeito que planeja.
- Tenho que ser otimista quanto a isso, certo? – O de olhos claros sorriu pequeno, sentindo as mãos pálidas do namorado puxarem seu rosto para perto do dele.
Encarou aquele violeta como se fosse o céu antes de anoitecer e logo depois do sol se por. Díos, por que Keith tinha que ser tão lindo?
- Você ‘tá mentindo com alguma coisa. – O de orbes avioletadas deduziu, se separando do de cabelos curtos, cruzando os braços. – Eu sei que sim.
- Não estou, Keith.
- Mentiroso. – Se levantou. – Sei quando mente. Seus olhos fecham um pouco e suas sobrancelhas caem. Além de que fica sorrindo assim, triste. E logo depois dá um suspiro, porque sabe que eu sei que é verdade. – O acastanhado suspirou. Que merda, por que o moreno tinha que lhe conhecer tanto?
- Tudo bem, você venceu, eu estou mentindo sobre algo, mas não posso dizer o que é.
- Lance. – O de cabelos longos arqueou as sobrancelhas, arregalando os olhos. – Vai me dizer. Você quer me dizer. Eu te conheço, cara. – O mais novo deu uma risadinha, o que aliviou um pouco a preocupação de Keith. Apenas um pouco.
- Isso é estranho vindo de você, Keith. Afinal, quando eu pergunto, você não responde. Eu não forço você a nada. Então, poderia fazer isso comigo também, por favor? – Encarou o namorado, com um sorriso ladino, o que fez o mais velho estremecer. Essa era a sensação de sentir que seu amado não estava bem e ele não responde nada? Não o fazia ficar menos preocupado, apenas o contrário?
- Tsc. – O latino deixou de olhar para o chão, fitando o de cabelos longos, que escondia seus olhos com a ajuda da franja do cabelo. – O que quer saber? – Sussurrou.
O cubano franziu as sobrancelhas.
- O que?
- O que quer saber? Se eu te contar o que aconteceu comigo, você me conta a verdade? Me conta tudo o que eu perguntar?
- Só se eu puder fazer o mesmo. Sem nenhuma desculpa. – O menor suspirou, assentindo. – Ótimo. – Parou para pensar um pouco, voltando a encara-lo. – O que aconteceu com você naquele dia?
- Eu não sei, exatamente. Só me lembro de ter ouvido o barulho do portão se abrindo e fui checar. Lembro de ter visto alguns homens armados, e então, lutar contra alguém forte. Aí eu acordei ouvindo sua voz.
- Só isso? Keith, se estiver mentindo, eu-
- Não estou mentindo! – O cortou, com raiva. – Eu realmente não lembro de nada. Talvez ele tenha batido em alguma parte da minha cabeça. Talvez tenham colocado alguma coisa em mim ‘pra eu esquecer. Eu só lembro dos dentes afiados e de água. Muita água. Um tanque cheio. – Lance parou de olhar para o chão ao perceber que o mais baixo tremia. – Água. Água até os ossos. E-e também ele. Ele não parava de me seguir. E dor. Dor demais. Ele falava de machucar. Não podia deixar machucar. Não posso deixar machucar.
- Keith? – Tentou tocar em seu ombro, mas, ao fazer isso, ele deu um grito, como se tivesse assustado.
- Não pode machucar! – Gritou, empurrando o mais novo para o chão, o que o fez bater com as costas na grama.
O maior se preparou para gritar, quando percebeu que o de cabelos longos não fez nada consigo. Apenas olhava para os lados, atento a todos os mínimos barulhos possíveis. Sussurrava que não podia machucar, não podia deixar machucar.
Estava assustando Lance. O de olhos claros não sabia se ele sabia, mas conseguia ver que o moreno não estava pensando claramente. Parecia até mais assustado que si.
Fechou as pálpebras, respirando fundo. As abriu novamente, pegando o rosto do de orbes violetas pelas bochechas, o obrigando a encara-lo.
As írises do mais velho não paravam quietas, rolando de um lado para o outro, nunca ficando no mesmo lugar.
Deu uma bufada, não acreditando no que faria.
Segurou as bochechas do menor com mais força e bateu, com a sua testa, no nariz dele.
O de olhos escuros saiu de cima de si, massageando o local enquanto grunhia.
- Por que fez isso?
- Eu poderia te responder melhor se eu soubesse o porquê de ter enlouquecido. – O respondeu, franzindo o cenho com a dor.
- Enlouquecido?
- É.
- Do que está falando?
- Enlouquecido, Keith. Começou a tremer, chorar, gritar. – Suspirou. – Eu ‘tô preocupado, Keith. Por que não me diz logo o que aconteceu?
- Lance, eu não enlouqueci. Não sei do que está falando.
- Você começou a chorar quando falou a palavra “água”. – Seus olhos se arregalaram, se afastando um pouco. – Tudo bem, não posso falar a palavra com “a”. Beleza. – Deu um suspiro pesado, pegando na mão do coreano, que se assustou com o ato, encarando o mais novo.
O latino sorria para si, o que fez suas bochechas corarem.
O maior riu, beijando o topo de sua cabeça e tirando um papel do bolso da calça.
- Esse é o plano. Lembra dele. Vai ser nessa sexta, não esqueça. – Falou, se levantando e colocando sua armadura. – Cuidado com tudo.
- Lance. – Segurou seu pulso antes do acastanhado sair.
- O que foi? – O olhou de volta.
- Não precisam fazer tudo isso por mim. Eu não mereço. – Sentiu um peteleco na sua testa, o que o fez resmungar.
- Claro que merece só pelo fato de ser da minha família. Então, Keith, faça-nos o favor e cala a boca. – Disse, o beijando.
Se separou dele, percebendo que o mais baixo ficou sem reação, o que fez o cubano rir.
- Desse jeito mesmo. – Escutaram o portão abrir, o que fez o mais alto suspirar, sorrindo. – Da próxima vez que nos vermos, será ‘pra te tirar daqui. – O de orbes violetas sorriu de volta, puxando o rosto do namorado para perto dele, selando seus lábios.
- Vou estar esperando. – Ditou, passando o polegar pela sobrancelha esquerda do de cabelos curtos, subindo numa árvore logo depois.
O de olhos claros saiu em seguida, indo em direção ao portão e conversando um pouco com Ezor.
Vai dar tudo certo, pensou. Não vai?
Houve um tempo
Em que eu estava sozinha
Sem ter para onde ir
E nenhum lugar para chamar de lar
Meu único amigo era o homem na lua
E mesmo às vezes
Ele iria embora também
Então, numa noite
Assim que fechei os olhos
Eu vi uma sombra voando alto
Ele veio até mim
Com o seu sorriso mais doce
Me disse que queria conversar um pouco
Ele disse
Peter Pan
É como eles me chamam
Eu prometo que você nunca mais estará sozinha
E desde aquele dia
A Terra do Nunca é o lar de garotos perdidos como eu
E garotos perdidos como eu
São livres - Lost Boy, Ruth B.
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