- O quê? - Alicia olhou para o outro lado, pode ver Segismundo correndo em direção à porta. – Olhe o seu amiguinho fugindo com a minha mochila.
Fernanda tentou atingir Segismundo com um copo de barro, mas o menino desviou. Correu atrás dele gritando:
- Pega ladrão!
- Eu sinto muito senhorita, mas tenho que sobreviver. – Segismundo sorriu vitorioso.
Ele já havia alcançado a porta quando um homem de estatura grotesca e largura descomunal levantou-se barrando a saída do menino.
Segismundo deu dois passos para trás.
- Igor, que surpresa vê-lo aqui. – Sorriu trêmulo enquanto observava o homem de duzentos quilos abaixar-se, estendendo a mão direita para ele.
- Dê-me a bolsa! – O gigante esbravejou.
- Claro, ela é toda sua. Eu já estava mesmo de saída. – Entregou o objeto ao grandalhão e escapou por uma janela.
Alicia caminhou até o gigante de careca reluzente.
- Agradeço muito senhor. Obrigada por recuperar nossa bolsa.
- Sua bolsa? Quem disse? - Deu um pequeno sorriso com os lábios fechados.
- Eu digo, todos aqui viram quando o menino roubou minha bolsa, eu a tinha o tempo todo enquanto estava no balcão. – Alicia tentou gesticular.
- Ele deu a bolsa para mim, portanto ela me pertence. Não concordam? - Encarou todos na estalagem.
Os homens, temerosos, concordaram, acenando positivamente com as cabeças.
Fernanda pensou no mapa e desesperou-se.
- O senhor não pode ir pegando as coisas dos outros assim.
- Eu não peguei nada, me deram a bolsa. – Riu.
Os outros o acompanharam com gargalhadas nervosas.
- Isso é roubo! – A pequenina esbravejou.
- Está dizendo que eu sou um ladrão? - Socou a mesa de madeira, que rachou em duas partes.
- Deixa isso para lá Celina, vamos chamar os outros. – Alicia puxou a irmã.
- Vai chamar mais ciganos? - Estalou os dedos. – Vai ser divertido bater em todos.
Senhor Ramirez cuspiu no chão aproximando-se da porta.
- Não no meu estabelecimento!
Igor o pegou pela gola da camisa.
- Eu faço o que me dá vontade!
- É claro, eu não disse nada, nem gosto de ciganos. – As fracas pernas de Ramirez tremiam.
O gigante o jogou no chão.
Fernanda zangou-se.
- Como pode bater em um velho indefeso? Isso é covardia.
- Celina ninguém te perguntou nada! – Alicia tapou a boca da caçula, sussurrando em seu ouvido. – Não vamos ganhar nada o irritando, precisamos chamar o Sadoc, agora venha. – Puxou a irmã para saída.
- Tem medo de me enfrentar gorducha? - Igor colocou a mochila no balcão.
- Não fale assim com ela. – Alicia resmungou abraçando a irmã.
- Eu não falei com ela. – Igor sorriu malicioso.
Alicia parou de caminhar para a porta, soltando-se de Fernanda.
- Você...Vo-ce... – Ainda não acreditava no que ouviu. – Você me chamou de gorda?
- O que foi menina, nunca se olhou em um espelho? - Todos riram com Igor.
Alicia cerrou os punhos.
- É você que nunca se olhou em um!
- Eu sou um homem, não preciso de objetos afeminados. Não vá me dizer que você é um menino disfarçado de cigana?
- Você me chama de gorda e de garoto?
- Na verdade foi garoto gorducho. – Fernanda comentou.
Alicia ficou vermelha.
- Se você é homem peça desculpas agora e devolva minha bolsa!
- O quê? Como ousa falar assim comigo? - Igor franziu as sobrancelhas.
- Foi o senhor que começou!
- Pois eu vou acabar... Te dando uma lição ciganinha!
Igor correu até Alicia, ele era um pouco lento, a jovem conseguiu abaixar-se, escorregando por entre as pernas do grandalhão.
O gigante sentiu-se humilhado.
- O quê? Ousa caçoar de mim menina?
- Nem se eu quisesse, não haveria vocabulário suficiente no mundo para descrever a sua feiura!
Vermelho de raiva, o homem emitiu um urro e voltou a correr atrás da cigana.
Alicia saltou para cima do balcão, pegando a mochila, jogou-a para Fernanda.
- Vai buscar o Sadoc! – Pegou um pote de barro e jogou na cabeça de Igor, ele caiu no chão atordoado.
Ninguém ousou ajuda-lo.
- E você? - Fernanda preocupou-se com a irmã.
O grandalhão recobrou os sentidos.
- Vá logo pirralha! – Esbravejou.
Fernanda correu para fora com a mochila nos braços.
Igor saltou na direção de Alicia, ela pulou em cima de uma mesa, todos que estavam sentados nela correram.
- Fuja enquanto pode cigana. – Igor berrou enquanto corria. Abaixou-se, estendendo os braços para alcança-la.
Alicia saltou da mesa, derrubando- a. Igor bateu com a cabeça no tampo de madeira, quebrando-a. Zonzo, tentou caminhar, mas ela empurrou um barril em sua direção, fazendo com que caísse novamente.
Igor tornou a levantar, parecia mais furioso do que nunca. Alicia subiu no balcão, estava muito longe da saída e ninguém parecia querer ajuda-la. Olhou pra o teto, respirou fundo e deu um salto, alcançando uma das tábuas que segurava o telhado bem no momento em que o gigante saltou para pegá-la. Igor atravessou o balcão, quebrando varias garrafas e caindo próximo a cozinha.
Alicia continuou pendurada em uma tábua, torcia para que Sadoc chegasse logo, não aguentaria por muito tempo. No passado fora uma ginasta e treinava todos os fins de semana, mas agora era uma sedentária que não fazia nada mais aos sábados, exceto ir ao shopping, comer fast food e fazer compras com as amigas, ou ficava em casa se enchendo de pipoca enquanto assistia a reprises de Pretty Little Liars e Revenge.
Voltou à realidade. Igor já estava de pé, aquele gigante nunca ia desistir. Ouviu o barulho de algo se quebrando.
- Ô-ou. – Sabia o que estava quebrando, a tábua em que estava pendurada, podia sentir a madeira cedendo.
Igor se aproximo e Alicia estava desesperada. Em um ato de coragem, proporcionado pelo mais profundo desespero, balançou seu corpo impulsionando-se para o mais longe que podia. Buscou suas raízes de atleta, onde quer que estivessem escondidas e saltou para o mais longe que conseguiu, próximo a saída.
Igor estava embaixo da tábua velha no momento em que essa quebrou, parte do teto, feito de pedra, cedeu junto com ela, soterrando o gigante.
O velho Ramirez veio da cozinha trazendo uma vassoura para bater em Alicia.
- Olha só esse buraco no meu telhado! Tome cigana miserável. – Tentou acerta-la com a vassoura.
- Nem vem. – Alicia arrancou a vassoura da mão do homem e começou a gira-la pelo cabo, igual as suas baquetas quando fazia apresentações de ginástica artística.
Ramirez afastou-se. O resto dos homens se levantaram.
- Mais alguém? - Alicia os encarou com um olhar ameaçador.
Todos fizeram sinal de negativo com as cabeças e saíram correndo.
Sadoc, Toribio e Fernanda entravam na estalagem quando viram toda aquela correria, muita poeira, um gigante desfalecido no chão e o velho dono da estalagem ajoelhado aos pés de Alicia implorando:
- Por favor, não bata em mais ninguém, não em todos eles, vou ficar sem clientes. Por favor dona Esmeralda!
Toribio e Sadoc ficaram sem reação.
Fernanda correu para abraçar a irmã.
- Você se machucou Li?
- Acho que quebrei uma unha, aí! – Levou o dedo mindinho a boca.
Eanes e Inara não acharam nada e nem ninguém na floresta, por isso decidiram retornar. Ao chegarem à aldeia encontraram seus companheiros sentados em frente à hospedaria.
- Porque estão com essas caras? - Inara perguntou.
- Fomos expulsos da estalagem por causa da briga. – Toribio explicou.
- Se meteu em uma briga irmão? - Eanes sorriu. – Em quem você e Sadoc bateram?
- Nós? Eu sou um ser pacifico, só luto quando é necessário, deveria fazer essa pergunta para a senhorita Esmeralda. – Indicou Alicia que estava sendo consolada pela irmã.
- Já disse que foi o grandalhão que começou. – Ela tentou se explicar mais uma vez. – E nós não fomos expulsos!
- Por que o dono da estalagem está morrendo de medo de você. – Sadoc concluiu.
- O quê? - Eanes não entendia nada, olhou para dentro da estalagem, toda destruída, o velho tentava acordar Igor. – Não acredito!
- Gente eu sou testemunha que toda a culpa foi do grandalhão, se ele não fosse tão grosso e tivesse ficado quieto nada disso teria acontecido. – Fernanda entregou a mochila para irmã.
- E você pirralha, tome muito cuidado em quem confia. – Alicia abriu a bolsa para conferir os objetos, tudo estava lá.
- Devemos ir antes que o grandão acorde e resolva se vingar. – Sadoc aconselhou. – Vamos, temos um longo dia pela frente.
Ramirez já desistira de acordar Igor, resolveu limpar a estalagem. Levantou as cadeiras, recolheu a louça que havia quebrado, tentou desvirar uma mesa, mas ela era muito pesada para o velho, então retornou para o balcão.
- Ciganos, só me dão trabalho. Como vou consertar esse teto? – Passou a mão na testa limpando o suor. – O senhor vai querer mais alguma coisa? - Encarou um pequeno homem encapuzado que tomava aguardente em um canto escuro do bar. Ramirez não conseguia ver seu rosto por causa do capuz marrom.
- Não desejo mais nada. – Colocou dois sistos no balcão revelando uma pequena mão repleta de verrugas. – Quanta confusão. Aqueles ciganos estão hospedados aqui?
- Infelizmente sim. Para quem queria se esconder, fizeram uma bagunça e tanto.
- Esconder?
- É o que me parece. Chegaram quando todos estavam em suas casas e acordaram muito cedo para que ninguém os visse. Como são ciganos, penso que estão fugindo das autoridades ou de coisa pior.
- Não me diga? – O pequeno corcunda deixou a vista os olhos amarelos e seu largo sorriso repleto de dentes escuros. – Talvez nem sejam ciganos... – Ofir parecia satisfeito com o que ouvira.
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